Renato Dagnino
Embora as características da Tecnologia Social? já tenham sido, por exclusão ou por negação, enunciadas ao criticar a Tecnologia Convencional, é conveniente adicionar alguns elementos.
2. Como é (ou deveria ser) a TS?
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Ela deve ser adaptada ao tamanho físico e financeiro pequeno. Não discriminatória; liberada da diferenciação, prejudicial nos ambientes autogestionários, entre patrão e empregado; disfuncional e anacrônica. Orientada para um mercado interno de massa. Libertadora do potencial e criatividade do produtor direto. E, resumindo e finalizando, capaz de viabilizar economicamente os empreendimentos autogestionários.
E finalmente, uma questão que vai ser retomada ao longo deste trabalho: se o empreendimento autogestionário não for competitivo (ou não possuir sustentabilidade) em relação ao grande capital, ele não vai conseguir constituir-se numa alternativa econômica. Nem chegar a ser uma alternativa real de inclusão social para a população marginalizada.
A Tecnologia Convencional é funcional para a empresa privada, que no capitalismo é a responsável pela produção de bens e serviços para a população. Isto apesar de óbvio, merece ser salientado em função do enorme impulso que é feito pelos governos dos países avançados e pelas suas grandes empresas, no sentido de fazer com que essa tecnologia seja vista não só como a melhor, como a última, como a de ponta, a mais avançada, mas como a única que existe. Logo em seguida vamos ver como essa idéia se generaliza na sociedade tornando-se parte do senso comum. E como a universidade internaliza essa idéia que é no nosso entender equivocada.
3. O que faz a TC ser diferente da TS?
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A organização de profissionais que concebem a Tecnologia Convencional está imersa num ambiente político que a legitima e demanda. E porque trazem incorporados os seus valores, reproduzem essa tecnologia. Nós aprendemos na escola de engenharia que, por exemplo, quanto maior a escala de um sistema tecnológico (ou, mais simplesmente, de uma tecnologia) mais eficiente ela será. O engenheiro, como também, em geral, os cientistas, são treinados, condicionados, a reproduzir esse padrão de expansão da fronteira do conhecimento. Quer dizer, nós expandimos a fronteira do conhecimento científico e tecnológico de acordo com essa visão convencional, com essa estratégia materialista (como diz Lacey, 1999) ou capitalista (como dá a entender Feenberg, 2002), da pesquisa em ciência e tecnologia. Portanto, o problema não é apenas de organização do processo de trabalho, como supõe a maior parte dos autores que abordam essa questão a partir da perspectiva da Economia Solidária e da auto-gestão. Mas é da tecnologia latu senso e, mais do que isso, da forma como se faz e se concebe a ciência 3.
Chamo a atenção para o fato de que esta idéia é bastante diferente daquela que até agora se lê nos textos sobre o tema que nos ocupa. Esses textos praticamente reduzem o problema à forma de organização do processo de trabalho que, num empreendimento autogestionário, tem que ser transformada em autogestionária. O problema parece ser muito mais grave. Não é só a maneira como se organiza o trabalho (orgware), mas o substrato tecnológico (hardware e software), e o próprio substrato científico que de alguma maneira, produzem a tecnologia que vai ser utilizada na empresa o que precisa ser transformado. Não basta que o empreendimento seja de cooperados e nem que adote a autogestão. É necessário que disponha de Tecnologia Social.
3 Faço um tratamento detalhado deste tema em Dagnino, Renato (2002): Em direção a uma Estratégia para a redução da pobreza: a Economia Solidária e a Adequação Sócio-técnica In Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a ciência e a cultura, Sala de Lectura CTS+I de la OEI, disponível em http://www.campus-oei.org/salactsi/index.html.