Espacios. Espacios. Vol. 31 (3) 2010. Pág. 28

Diferenças de gênero na atitude à inovação em estudantes universitários: um estudo exploratório

Gender differences in attitude to innovation in college students: an exploratory study

Diferencias de género en la actitud a la innovación en los estudiantes universitarios: un estudio exploratorio

Verónica Peñaloza *

Recibido: 01-01-2009 - Aprobado: 25-04-2010


Contenido


RESUMO:
Ciência e a Tecnologia (C&T) desempenham um papel importante em nosso cotidiano, impactando sobre diversos aspectos de nossa vida. Como a sociedade encara estes impactos são questões que fazem parte do campo de estudos da percepção pública da ciência, base para um estudo exploratório realizado com estudantes universitários da região nordeste do Brasil. Objetiva-se, conhecer a atitude à inovação e saber se existem diferenças de gênero e por tipos de conhecimentos entre os alunos. Os resultados da regressão logística indicam que a atitude inovadora positiva relaciona-se diretamente com o gênero masculino e negativamente com alunos de áreas menos técnicas.
Palavras chiave:
Atitude à inovação. Gênero. Percepção da ciência

ABSTRACT:
Science and Technology (S & T) play an important role in our daily lives, impacting on various aspects of our lives. As the company considers these impacts are issues that are part of the field of the public perception of science, the basis for an exploratory study with college students in northeastern Brazil. Objective, to know the attitude of innovation and whether there are gender differences and types of knowledge among students. The logistic regression results indicate that the innovative attitude positive is directly related to the male gender and negatively with students from less technical areas.
Key-words: Attitude to innovation. Gender. Perception science

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RESUMEN:
Ciencia y Tecnología (C & T), juegan un papel importante en nuestro cotidiano e inciden en diversos aspectos de nuestra vida. Como la sociedad considera estos impactos son temas que forman parte del ámbito de la percepción pública de la ciencia, usada como base para este estudio exploratorio con estudiantes universitarios en el noroeste de Brasil. El objetivo es conocer la actitud a la innovación y si hay diferencias entre los géneros y tipos de conocimientos entre los estudiantes. Los resultados de la regresión logística indican que una actitud innovadora positiva está directamente relacionada con el género masculino, y negativamente con los estudiantes de áreas menos técnicas.
Palabras clave: Actitud ante la innovación. Género. Percepción de la ciencia

1. Introdução

A C&T não só desempenha um papel crucial no mundo moderno, mas também afeta (positiva ou negativamente) o dia-a-dia das pessoas. A C&T impacta na economia, na política, na saúde, na educação, na segurança social e em outros inúmeros setores essenciais. Porém de que forma a sociedade encara os múltiplos impactos relacionados com a C&T? O que pensa sobre os resultados da aplicação de conhecimentos? Como assume os riscos envolvidos no desenvolvimento de certas tecnologias? O que pensa de como se distribui o conhecimento gerado? Confia nos cientistas e especialistas? Estas e outras interrogações são questões que a literatura especializada tenta responder há algum tempo.

Para os pesquisadores acadêmicos, estas questões estão sendo abordadas num campo de estudos denominado de “percepção pública da ciência” ou de “cultura científica”. Segundo Pardo e Calvo (2002), a mais influente corrente de análise das atitudes à ciência tomou forma dentro do quadro conceitual do paradigma rotulado “Scientific Literacy” nos Estados Unidos e "Public Understanding of Science" na Europa, cristalizados no final dos anos 1980, embora as suas raízes remontem a um período quase trinta anos antes. Outros autores, como Ferrer e León (2009), estimam que a cultura científica aparecera na Europa dois séculos atrás, ligada ao poder político e à forma de comunicar os progressos da ciência, que era essencialmente entre pares. Hoje este modelo está longe de responder às demandas das sociedades contemporâneas em que a atividade científica é institucionalizada, financiada em grande parte pelo Estado e com estreitas ligações com outras instituições. Já para Polino et al. (2003), o conceito de percepção pública refere-se ao processo de comunicação social e ao seu impacto sobre a formação do conhecimento, atitudes e expectativas dos membros da sociedade em matéria de ciência e tecnologia.

Apesar de esses termos muitas vezes se confundirem a alfabetização científica está mais associada a conhecimentos e ao acúmulo de informações adquiridas, enquanto o conceito de cultura científica é mais abrangente, complexo e se relaciona com a estrutura da sociedade. Segundo o CSMEE (1996), a alfabetização científica é o conhecimento, a compreensão de conceitos científicos e processos necessários para a tomada de decisões pessoais na participação na vida cívica e cultural dos assuntos e na produtividade econômica. Implica também em determinadas habilidades, por exemplo, a pessoa deve ser capaz de ler e compreender artigos sobre ciência na imprensa e outros meios de comunicação, ser capaz de identificar questões científicas subjacentes a decisões nacionais e/ou locais, capaz de expressar posições sobre elas, avaliar a qualidade da informação científica recebida, etc. (CSMEE, 1996). Já a cultura científica da sociedade é definida na forma como o indivíduo relaciona a atividade científica. Vale dizer, implica numa capacidade de análise e contextualização do que está acontecendo no mundo da ciência, portanto a cultura científica vai para além da "alfabetização" na ciência. Os dados, conceitos, teorias, invenções, entre outros fazem parte das informações mínimas de um cidadão educado, porém, o conceito de cultura científica transcende a isso, mais do que o conhecimento, é a compreensão da ciência como produção intelectual e social, a base fundamental para pensar a cultura científica (FERRER; LEÓN 2009).

O tema da percepção pública da C&T tem aumentado sua importância, tanto na preocupação dos cientistas, quanto no discurso dos políticos nos últimos anos, devido à tentativa da comunidade científica de assegurar o financiamento público necessário para o funcionamento das instituições e mecanismos da ciência. E mais recentemente, pelo surgimento de organizações e movimentos civis que evidenciam um possível conflito entre avanços tecnológicos e científicos e a manutenção de um meio ambiente saudável e seguro para as gerações atuais e futuras (POLINO et al., 2003).

Contudo, apesar do aumento crescente da literatura acerca das atitudes da população em relação ao conhecimento científico, a influência do gênero nessa relação tem recebido pouca atenção da pesquisa. O avanço na qualificação feminina tem permitido que as mulheres aumentem sua participação no mundo científico, porém, segundo Velho e Prochazka (2003), apesar de que nos últimos 20 anos as disparidades entre gêneros em termos de acesso à educação diminuíram sensivelmente na maioria dos países da América Latina e Caribe, este acesso não tem conduzido as mulheres a partilhar com os homens posições de poder no mundo da ciência. Sob este contexto, o presente trabalho busca então conhecer, através da metodologia de Bovenschulte (2007), as relações existentes entre atitude inovadora e conhecimento de C&T, evidenciando as possíveis diferenças de gênero.

2. Marco referencial

A percepção pública da C&T manifesta características regionais. Nos países desenvolvidos está focada no controle cada vez maior que a sociedade está tendo sobre o desenvolvimento da ciência, o que não é o caso da América Latina e do Caribe. Para Polino, et al. (2003), nos países dessa região ainda é prematuro sugerir uma participação direta dos cidadãos na tomada de decisões sobre os riscos, incertezas ou definições de relevância e utilidade da ciência. Já nos países desenvolvidos, a participação das pessoas individual ou grupalmente (através de ONGs, por exemplo) é mais ativa. Existem controvérsias com relação a alguns desenvolvimentos científicos e avanços tecnológicos: uso da energia nuclear, da aplicação da engenharia genética e da exploração do espaço, entre outros. Essa reação aos excessos e aos riscos do desenvolvimento da ciência tem jogado por terra a idéia da ciência considerada apolítica e neutra.

Para Pardo e Calvo (2002), os primeiros sinais de uma descida na “trajetória parabólica” das relações entre ciência e opinião pública se tornaram visíveis no final da Segunda Guerra, mas o declínio começou a manifestar-se efetivamente apenas no final dos anos 60 perpetuando-se no novo século. Segundo os autores, define-se um novo contexto onde se destacam duas dimensões importantes, por um lado, uma total dependência da ciência e da tecnologia para apoiar o crescimento econômico e os padrões de vida e, por outro lado, o aparecimento de efeitos colaterais e riscos significativos da ciência.

Nesse contexto, o desafio para a pesquisa acadêmica nos países em desenvolvimento é significativo, visto que embora seja reconhecida a importância dos indicadores na área, ainda se carece de acordo sobre a sua definição, construção e padronização, ocorrendo, em alguns casos, inexistência de padrões internacionais e, em outros, dificuldade de adaptação (POLINO, et.al, 2003). Para os autores de um modo geral, os indicadores tradicionais neste domínio estão organizados em três eixos analíticos: a) o interesse público na C&T como uma forma de medir a importância relativa dada à investigação e desenvolvimento na sociedade, b) o conhecimento como forma de analisar o nível de compreensão de conceitos científicos básicos são considerados como a natureza da investigação científica (metodologia etc) e c) as atitudes, o que inclui três aspectos: abordagem das informações sobre as atitudes da sociedade em relação ao financiamento público da investigação, inquéritos sobre a confiança do público na comunidade científica e, finalmente, a percepção dos riscos e benefícios da pesquisa e desenvolvimento.

John Durant, (apud PARDO;CALVO, 2002) um pesquisador da compreensão pública da ciência, e seus colaboradores, foram os primeiros a oferecer uma formulação da dependência de atitudes no conhecimento. Argumentaram que a análise preliminar dos resultados em relação a estas medidas [de atitudes] indica que existem importantes relações entre a compreensão do público e atitudes públicas, com uma tendência para que as pessoas melhores informadas tenham uma atitude mais positiva no sentido geral da ciência e dos cientistas. Nesta afirmação está implícito o pressuposto que existe uma relação linear entre o conhecimento e as atitudes.

Posteriormente, este pressuposto é contestado. Pardo e Calvo (2002), por exemplo, afirmam que em diversas sociedades européias essa relação conhecimento-atitudes não seria uma relação linear, senão curvilínea. Já os países com um menor índice de industrialização apresentariam atitudes menos positivas para a ciência do que países mais industrializados. Sendo que alguns países altamente desenvolvidos manifestam atitudes menos positivas que aparentemente são semelhantes às observadas em sociedades com um baixo nível de desenvolvimento industrial. Este resultado pode ser explicado, no caso de países menos industrializados, associando a falta de atitudes positivas a um baixo nível de informação científica, já no caso das nações mais industrializadas, seria conseqüência de uma postura mais ativa e crítica dado um alto grau de familiaridade com ciência e os seus impactos (PARDO; CALVO, 2002).

2.1. A Influência Do Gênero

Apesar do aumento significativo na qualificação das mulheres e do o aumento na ocupação de cargos nas profissões científicas, as mulheres ainda são uma pequena proporção na área científica. Em função disso, alguns autores trabalharam a hipótese das diferenças de gênero nas atitudes para com ciência e conhecimento científico (HAYES; TARIQ, 2000; ROTEN, 2004; STURGIS; ALLUM, 2001).

Hayes e Tariq (2000), numa pesquisa realizada nos Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Nova Zelândia, focalizando as relações entre gênero, nível de conhecimento científico e atitudes em relação à ciência examinaram pressupostos estereotipados relativos a atitudes anti-científicas entre as mulheres. Esta pesquisa abordou uma questão importante, delineando as determinantes sociais e econômicas das diferenças de gênero nas atitudes em relação à ciência, uma questão que tinha sido negligenciada pelos pesquisadores. De acordo com os autores, os homens são significantemente mais propensos a apresentar atitudes mais positivas em relação à ciência do que mulheres. Contudo, não são as diferenças na aquisição do conhecimento científico, mas particularmente as diferenças na formação social que explicam as opiniões divergentes dos cidadãos em relação ao desenvolvimento científico.

O estudo de Roten (2004) para o caso da Suíça vem a corroborar com os resultados de Hayes e Tariq (2000). Em primeiro lugar, apóia a hipótese das diferenças de gênero nas atitudes para com ciência e conhecimento científico. Em segundo lugar, segundo o autor, na Suíça, as diferenças entre sexos deixam de ser significativas, uma vez que as variáveis sócio-demográficas são incluídas. Os conhecimentos científicos e de educação demonstraram ter efeitos independentes sobre atitudes em direção à ciência. Portanto, os fatores utilizados nesta análise não explicam completamente a tendência das mulheres a ter atitudes à ciência mais negativa que os homens, evidenciando que outros fatores podem explicar potencialmente a diferença entre os gêneros (ROTEN, 2004)

Sturgis e Allum (2001), numa réplica ao artigo Hayes e Tariq (2000), assinalam que os autores ao invés de demonstrarem que o conhecimento científico é insignificante para explicar as diferenças de gênero nas atitudes em relação à ciência, com seus modelos de fato apóiam a solidez do relacionamento positivo entre o conhecimento e atitude. Segundo os autores, em suas análises, Hayes e Tariq (2000) demonstram que a tendência geral nos quatro países analisados (EUA, Inglaterra, Canadá e Nova Zelândia) é que os homens são mais bem informados do que as mulheres e têm uma atitude mais positiva em relação à ciência. Para Sturgis e Allum (2001), dado o fato de que as mulheres tendem a ter menor conhecimento sobre ciência do que os homens, se as diferenças de conhecimentos desaparecem, deveria haver uma redução das divergências nas atitudes.

Para Velho e Prochazka (2003), a pequena proporção de mulheres em posições de poder e destaque na maioria dos ramos de atividade têm sido freqüentemente associada ao menor nível de escolaridade das mulheres. Segundo os autores, entre os matriculados na educação superior a participação dos gêneros é, no conjunto, equilibrada na região, até mesmo mais favorável para as mulheres em alguns países, sendo que as mulheres na educação superior e na pós-graduação representam hoje entre 35 e 50% do total de pesquisadores dos países latino-americanos. Porém, o acesso à educação é condição necessária, mas não suficiente para a almejada paridade entre gêneros em termos de inserção e progresso profissional, rendimentos financeiros e, principalmente, de poder (VELHO; PROCHAZKA, 2003).

Hayes e Tariq (2000) afirmam ainda que o interesse das mulheres nos recentes desenvolvimentos científicos tem aumentado, embora homens e mulheres apresentem interesses de tipos diferentes. Os homens apresentam um alto nível de interesse em explorações espaciais, invenções e uso de novas tecnologias. Entanto, as mulheres são mais propensas a interessar-se em descobertas médicas e questões ambientais, provavelmente devido ao fato de que descobertas nesses campos científicos têm um impacto maior na vida das mulheres. Os autores afirmam ainda que educação e crença religiosa são os preditores mais consistentes das atitudes em relação à ciência. Percebe-se então, que o impacto do gênero nas avaliações da população em relação à C&T não pode ser ignorado, porém não há consenso quanto a sua influência.

2.2. Atitude Inovadora

Nos últimos 50 anos, as pesquisas sobre inovação e os conceitos de inovação utilizados sofreram grandes mudanças metodológicas e conceituais (OECD, 1997; BERNARDES, 2003; CONDE, ARAUJO-JORGE, 2003). Os conceitos evoluíram de uma concepção linear, no início dos anos 50, para um integrado em cadeia nos anos 80. Segundo Conde, Araújo-Jorge (2003), os modelos lineares da inovação baseiam-se em duas áreas de teorização sobre o crescimento e desenvolvimento: as teorias clássicas, que tratam a inovação de modo mecanicista a partir de variáveis endógenas às empresas e como produto de seus processos internos; e as teorias neoclássicas, que tentam incorporar as forças externas e atribuir a mudança técnica a fatores externos. Já o modelo interativo do processo de inovação combina mudança no interior das empresas e interações entre as empresas individuais e o sistema de C&T mais abrangente em que elas operam.

A mudança do modelo linear de inovação para o modelo interativo trouxe também para a pesquisa sobre a inovação importantes questões sobre as relações entre a produção e acesso ao conhecimento científico, uma vez que o modelo linear, na sua base, sustentava-se justamente na produção e acumulação do conhecimento científico como condição essencial para a inovação. Com a mudança do paradigma para interativo, ficou em aberto a questão de estabelecer as relações entre a produção do conhecimento científico e a atitude de seus criadores para com o processo de inovação e a sua própria absorção pela sociedade em geral.

Os indicadores de atitudes são formulados sobre a base das opiniões do público a respeito das promessas ou benefícios da pesquisa científica e as reservas ou prejuízos da mesma. Indaga-se também sobre o posicionamento das pessoas com relação às despesas em C&T e o nível de confiança que tem nas instituições (OEI, 2003).

Bovenschulte (2002) fala de “atitude inovadora” como uma disposição que se traduz na capacidade de uma sociedade ou subgrupos dela de imaginar que a C&T têm um papel protagônico na projeção do futuro. Para o autor, a atitude inovadora não é necessariamente mediada pelo nível de conhecimento ou compreensão de fatos, teorias e leis científicas. Um indivíduo pode desconhecer aspectos fundamentais da ciência e ainda ter uma compreensão reflexiva das possibilidades, limites e seu impacto. Segundo Bovenschulte (2002), o termo "atitude inovadora" há décadas faz parte dos modelos de desenvolvimento e das mudanças nas empresas e organizações. Tem, portanto, uma história acadêmica, mas ainda não é possível afirmar claramente o que representa. Associa-se com uma atitude criativa, aberta, dinâmica e capaz de responder e ir além das regras, rotinas e tarefas definidas.

Para o autor, também é necessário distinguir entre uma atitude ingênua que está de acordo com qualquer maneira ou forma de desenvolvimento tecnológico e uma atitude reflexiva, que inclua a ligação entre os novos desenvolvimentos tecnológicos, as incertezas, os desafios e os objetivos da sociedade. Uma atitude reflexiva caracterizada pelo otimismo, mas também por um posicionamento crítico expresso em questões como: a sensibilização para as potencialidades e limites dos progressos científicos e tecnológicos e suas relação com o desenvolvimento social; a capacidade de distinguir entre determinados domínios da ciência e da tecnologia e os riscos relacionados; a confiança nas instituições democráticas para assumir o controle das decisões que afetam a trajetória da ciência e da tecnologia; e finalmente, as expectativas de que o avanço científico-tecnológico em geral produz maiores benefícios do que prejuízos (BOVENSCHULTE, 2002)

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* Universidade Estadual do Ceará - UECE. Email: veronica.penaloza@yahoo.com.br

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