Raphaela Maria de Castro e Silva Vidal*, Claudemir Inacio dos Santos** y Antonio de Souza Silva Júnior***
Recibido: 25-03-2010 - Aprobado: 19-09-2010
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ABSTRACT: The Brazilian Shipbuilding Industry takes the first steps to revival its activities though of Petrobras actions that promotes public tender and bids to construct vessels. In this scenery, The Atlântico Sul Shipyard arises located in Pernambuco State- Brazil. Pernambuco doesn’t have expertise in naval sector and will need quick capability process that can be achieve by a network focused on this mentioned aim. This research intends to describe and analyse the technological capability network of electrical-metal-mechanic sector towards naval construction. This research is exploratory using semi structured interviews and documental analysis. The results show that the network is not steady established. Key-words: Pernambuco. Network. Technological Capability. Atlântico Sul Shipyard. |
Na década de 1970 e início da década de 1980, a indústria naval brasileira era competitiva e alcançou a posição de segundo lugar em todo mundo pelo critério de número de encomendas em sua carteira (LIMA; VELASCO, 1998). Ainda na década de 1980, a indústria de navipeças perdeu competitividade, principalmente, devido à defasagem tecnológica, não acompanhando o ritmo de crescimento do setor mundialmente. A Indústria naval brasileira esteve estagnada por mais de uma década. Os anos de crise geraram impactos em toda sua cadeia de suprimentos, que foi fortemente desestruturada. Os estaleiros nacionais apenas atuavam no setor realizando pequenos reparos e sobrevivendo dos investimentos dos Governos. A partir de 2000, este setor começou a se reestruturar, retomando suas atividades com a movimentação da Petrobras em direção ao cenário nacional, através de sua subsidiária de transportes, Transpetro. Esta, em 2004, lançou o Programa de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro (PROMEF), promovendo em 2005, licitações para construção de navios, sendo o primeiro lote composto de 26 embarcações e o segundo lote de 16 embarcações, como forma de revitalizar sua frota. Cardoso (2005) salienta que o objetivo deste programa é expandir e modernizar a frota da Transpetro para atingir 100% na cabotagem e 50% longo curso, adquirindo embarcações dos tipos: Suezmax, Panamax, Aframax, Produtos e GLP (gaseiros).
A Petrobras toma a decisão estratégica de renovar sua frota, levando em consideração a idade elevada das embarcações, em torno de 15 anos (CARDOSO, 2005); o aumento da produção de petróleo, a partir da descoberta de reservas na África, China, Golfo do México e Brasil, e do direcionamento estratégico das nações em ampliarem suas reservas (BARBOZA, 2002) e a busca de se tornar independente da frota estrangeira, pois Petrobras gasta, anualmente, US$ 1,2 bilhão com fretamento de navios estrangeiros (CARDOSO, 2005), reduzindo seu custo e risco de frete em variações cambiais, dirigindo as encomendas de seus navios à indústria nacional que está ressurgindo com a ajuda do Estado.
Visando a retomada do crescimento da indústria naval por se caracterizar como setor estratégico, grande gerador de empregos, diretos e indiretos, e de divisas para um país, o Governo Federal como instituição representativa do Estado assume papel de protagonista para a condução do processo. Barboza (2002) ressalta a participação dos governos na criação de demanda interna e políticas públicas direcionadas à cadeia.
Neste contexto, está sendo construído em Suape, Pernambuco, o Estaleiro Atlântico Sul (EAS), formado de um consórcio celebrado entre os grupos Camargo Corrêa, PJMR, Queiroz Galvão e a Coreana Samsung Heavy Industries, o qual estará capacitado para produzir o que há de mais moderno em embarcações e plataformas de petróleo, podendo ocorrer em operações simultâneas. Atualmente, o EAS possui capacidade de processamento de aço em torno de 160 mil toneladas/ano e há previsão de ultrapassar 320 mil toneladas/ano em dois anos.
Após ganhar no processo de licitação do PROMEF I, o consórcio firmou contrato, incluído no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), instituído pelo Governo Federal, com a Transpetro para a construção de 10 navios, tipo Suezmax (utilizados no transporte de petróleo), o que proporcionará o reaquecimento da indústria naval brasileira, fortalecimento da cadeia produtiva e impactos em todos os parceiros. Estima-se que a operação do Atlântico Sul gire em torno de US$ 1,2 bilhão só para a construção desses dez primeiros navios. O EAS também ganhou licitação para construir o casco da plataforma P-55 da Petrobras e recebeu encomenda de dois navios Very Large Crude Carrier (VLCC), utilizados no transporte de óleo cru, para o armador Noroil Navegação. Ainda integrando sua carteira de pedidos, o EAS recebeu a encomenda de 5 petroleiros Aframax, devido à desistência do Estaleiro Rionaval, o qual tinha ganho a licitação. Atualmente, há grande expectativa para o lançamento do segundo lote ofertado pelo PROMEF II, que incluiria a construção de quatro navios Suezmax (embarcação de grande porte), três Aframax (petroleiro), oito navios de produtos, cinco gaseiros (para o transporte de GLP) e três Bunkers - usado no transporte de combustível para embarcações - (PORTOS e NAVIOS, 2008).
A instalação de um empreendimento do porte do Estaleiro Atlântico Sul na região atrairá empresas que estão atentas às oportunidades de mercado. Sendo as empresas fornecedoras de serviços com maior potencial de instalação devido à premissa básica para o setor de serviços, de estar próximo aos clientes. Serra (2004 apud CUNHA, 2006, p.17) corrobora: “[...] a presença de estaleiros fomenta a formação de um tecido industrial rico e diversificado, incentivando o crescimento de outros setores, provendo para o país as condições para a produção dos navios necessários para a garantia das exportações e importações necessárias”.
Com a retomada do desenvolvimento do setor, surge um prognóstico positivo para as empresas de navipeças e serviços com o lançamento do edital que licitou os petroleiros da Transpetro. Este edital prevê um índice de nacionalização de até 65% dos navios, entre peças e serviços, promovendo o reaquecimento do setor, gerando benefícios para os segmentos de metalurgia, siderurgia, química e de instalações elétricas (TRANSPETRO, 2007). Nota-se, ao fixar o índice de nacionalização, a intenção do Governo em estimular e agregar a participação de empresas nacionais no desenvolvimento desse pólo industrial, principalmente da indústria eletro-metal-mecânica, pela natureza de suas operações.
Devido à tradição sucro-alcooleiro que envolve Pernambuco, a indústria metal-mecânica teve seu desenvolvimento vinculado e direcionado para dar suporte àquele setor agroindustrial. O setor enfrentou crises e perdeu competitividade devido à defasagem tecnológica, prejudicando o setor eletro-metal-mecânico. E diante da chegada do EAS e da expectativa de integrar-se à cadeia naval de fornecimento, este setor encontra-se em processo de reaquecimento. Com isso, torna-se razoável afirmar que o setor eletro-metal-mecânico será estimulado e desafiado a uma rápida capacitação para atender às exigências do grande empreendimento. Dessa forma, aborda-se o conceito de rede de empresas, considerando os benefícios que podem ser mais rápidos e facilmente alcançados a partir deste formato organizacional, focando nas ações de diversos atores públicos e privados integrantes de uma rede de capacitação tecnológica do setor eletro-metal-mecânico para atender à construção naval pernambucana.
Neste âmbito de rede de empresas, o Estado desempenha importante papel, promovendo ações de atração e fomento dos aglomerados, tais como: políticas de incentivos dos Governos Estadual e Federal, subsídios e benefícios fiscais que propiciem a entrada e permanência de fornecedores no mercado. No estado do Rio de Janeiro, onde estão localizadas 95% da indústria naval brasileira, as empresas já são financiadas pelo Fundo da Marinha Mercante (FMM), constituído por contribuições incidentes sobre fretes de importações. Tendo em vista a prerrogativa das empresas fluminenses, as indústrias do setor eletro-metal-mecânico de Pernambuco devem requerer o uso dos recursos da FMM para aquisição de máquinas e equipamentos para capacitar as empresas da região como fornecedores do novo estaleiro.
Na revisão bibliográfica, percebeu-se o envolvimento de órgãos empresariais em projetos e investimentos em redes, visando desenvolvimento econômico e social de uma localidade, como também a participação de Instituições de ensino e pesquisa, como formadores de mão-de-obra e como elo responsável por transferência de conhecimento e tecnologia, tornando-os importantes parceiros na capacitação.
Figura 1: Forças institucionais
Fonte: Elaboração baseada no Modelo da Tríplice Hélice de Leydesdorff e Etzkowitz (1999)
A discussão dos elementos esquematizados na figura 1 remete ao estudo de Leydesdorff e Etzkowitz (1999), quando apresentaram o modelo da tríplice hélice que considera três forças institucionais, Empresa, Universidade e Governo, cujas intensas interações proporcionam inovação. O estudo utilizará os pressupostos deste modelo, estendendo a componente Empresa para atuação de Órgãos empresariais.
Dessa forma, o objetivo do estudo é caracterizar e analisar a rede de capacitação tecnológica do setor eletro-metal-mecânico direcionada à construção naval, tornando-se relevante por abordar a capacitação tecnológica sob a ótica de rede de capacitação, considerando os benefícios que podem ser mais rápidos e facilmente alcançados a partir deste formato organizacional, resultando na sua contribuição acadêmica. Do ponto de vista prático, abordar a capacitação tecnológica do setor eletro-metal-mecânico pernambucano torna-se algo indispensável, devido à instalação do EAS e ao gap de competências que se formou com a estagnação desse setor e a falta de competitividade. E no que diz respeito ao gap de competências, há uma notória falta de profissionais qualificados para suprir a demanda. Dessa forma, a rede de capacitação é considerada uma ferramenta para se alcançar objetivos em conjunto, com maior rapidez, compartilhando recursos e conhecimentos. Nesta questão, o tempo torna-se crucial, pois outros Estados como Rio de Janeiro e Santa Catarina já possuem expertise na área naval e a Bahia possui experiência com grandes empreendimentos no pólo de Camaçari, tal como uma refinaria, tendo condições de se adaptar mais facilmente em termos de qualificação mão-de-obra e processos para atender o EAS, o que seria uma grande ameaça para o setor pernambucano.
Vale ainda destacar que um estudo desta natureza, sobre a formação de uma rede de capacitação, ressaltando os pontos fortes e fracos, servirá de base para a formulação de outras pesquisas sobre o tema junto a empreendimentos estruturantes, principalmente, no Estado de Pernambuco que está recebendo a Refinaria Abreu e Lima, facilitando o processo de capacitação tecnológica e proporcionando o desenvolvimento do Estado.
Nas próximas seções, serão discutidos os principais assuntos que proporcionam fundamentação teórica essencial para o desenvolvimento da investigação, sendo necessário abordar as seguintes temáticas para melhor entender o problema e conduzir a investigação: O panorama do setor eletro-metal-mecânico; Construção naval; Capacitação tecnológica; Redes e Redes de conhecimento.
O setor eletro-metal-mecânico engloba um conjunto de sub-segmentos em que se destacam: material elétrico, siderurgia, fundição, autopeças, embalagens metálicas, laminação, usinagem, caldeirados e logística de serviços. Caracteriza-se como um dos segmentos industriais mais tradicionais no Estado de Pernambuco devido ao seu passado histórico. O setor foi estimulado e alcançou seu ápice econômico quando teve sua expansão associada ao crescimento do setor sucro-alcooleiro em meados do século XX, passando a fornecer insumos e equipamentos para a agroindústria.
Lima, Sicsú e Padilha (2007, p.7) comentam que:
nos anos 1990, ocorre uma perda de competitividade de alguns setores em vista da abertura da economia brasileira, ao lado de dificuldades na agroindústria sucro-alcooleira, por conta de passivos financeiros elevados e da menor proteção estatal que implicou na perda de benefícios antes carreados através do extinto Instituto do Açúcar e do Álcool. Esse contexto de maior exposição à concorrência levou ao fechamento de várias usinas industriais e a elevados índices de desemprego.
Por estar vinculado ao setor sucro-alcooleiro, o setor eletro-metal-mecânico sofreu muito quando àquele entrou em crise. Já nos anos 2000, o segmento eletro-metal-mecânico encontrou-se estagnado, pois não se encontravam mais construções ou ampliações de grandes complexos como, por exemplo, construções de hidrelétricas. Após longo período de estagnação, o setor apresenta-se defasado em termos de investimentos em máquinas e equipamentos, e capacitação de mão-de-obra para atender aos novos empreendimentos que estão se instalando em Pernambuco, necessitando de rápidas movimentações para corrigir o rumo do seu desenvolvimento e reaquecer o setor. Devido à natureza das atividades do setor eletro-metal-mecânico, em termos de produtos e serviços, tais como tubos, barras metálicas, perfis metálicos, ferramentaria, material elétrico em geral, conexões, caldeiraria e galvanização, percebe-se uma grande oportunidade econômica voltada para atender à construção naval, devido às suas necessidades de produção.
A indústria naval é considerada estratégica em todo o mundo devido à sua condição de grande geradora de empregos e por possibilitar favorecimento na balança comercial de um país (PRIMO; QUEIROZ; PINTO, 2008).Sua cadeia produtiva caracteriza-se pela fabricação de produtos por encomendas, mobilizando um grande número de fornecedores para gerar um produto final (CHO; PORTER, 1986). A produção é de alto valor agregado, com longo prazo de entrega e deve atender as necessidades, exigências e altos padrões de qualidade e certificações internacionais de matérias, processos e mão-de-obra, solicitados por armadores, existindo dificuldade de se obter uma produção em série.
A indústria de construção naval brasileira teve seu auge na segunda metade da década de 1970, tornando-se um dos principais produtores mundiais. Na década de 1990, alguns dos principais estaleiros estavam com suas atividades paralisadas. E a partir de 1999, houve uma retomada do setor, com a expansão do setor offshore, de plataformas e de embarcações para atender a demanda crescente (LACERDA, 2003).
Os anos em que a indústria naval esteve paralisada levaram à defasagem tecnológica da grande maioria dos fornecedores nacionais e até ao fechamento dos negócios. (PRIMO; QUEIROZ; PINTO, 2008). Atualmente, a participação da indústria da construção naval brasileira no mercado mundial é praticamente irrisória, representando apenas 0,2% das encomendas mundiais (CARDOSO, 2005). A construção naval mundial está concentrada na Ásia, em que Japão, Coréia e China respondem por 81% das encomendas mundiais.
Inicialmente, a indústria naval será pouco competitiva frente aos estaleiros coreanos, líderes mundiais em custo (CARDOSO, 2005). Contudo, inúmeros benefícios serão gerados a partir da operação do EAS em Pernambuco, como geração de emprego, renda e melhoria de infra-estrutura local.
De acordo com pesquisa realizada pela Transpetro, mais de 70% dos investimentos em materiais, peças e equipamentos, pode ser se destinado à indústria local nacional (CARDOSO, 2005). Porém, deve-se considerar que a fabricação de uma embarcação requer grandes exigências em relação à qualidade, necessitando uma gama de fornecedores altamente capacitados para atender à construção naval. Lima e Velasco (1998) reforçam que a qualidade e confiabilidade na execução de contratos são requisitos essenciais para os estaleiros conseguirem espaço no mercado mundial. Os autores (1998, p. 13) lembram que, os contratantes de encomendas de navios escolhem o estaleiro fornecedor tomando como base:
[...] na sua capacitação técnica, no histórico de confiabilidade e pontualidade na entrega de encomendas, nas condições políticas do seu país-domicílio e, finalmente, na disponibilidade de apoio governamental ou quase- governamental que possam de alguma forma resultar em impacto positivo (redução) no custo de construção.
Quando se fala em reaquecimento do setor eletro-metal-mecânico pernambucano para atender às demandas do EAS, deve-se atentar para dois aspectos: i) os níveis de qualificação de mão-de-obra, processos e produtos; ii) tempo e recursos disponíveis. Lacerda (2003, p.35) salienta que: “Uma nova articulação entre setor privado e governo na construção naval poderia colocar a indústria numa trajetória de crescimento sustentável. O papel do governo, nesse contexto, seria o de coordenador e norteador dos agentes privados, [...] “. O autor complementa que isto poderia se dar através da adoção de políticas públicas que focassem, entre outras coisas, no investimento em qualificação e treinamento de mão-de-obra e investimento em pesquisa e desenvolvimento.
Vol. 31 (4) 2010
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