Roberto Sbragia y Érica Cristiane Ozório Pereira
Para identificar os fatores de origem interna e externa que influem no êxito de empresas incubadas de base tecnológica de origem universitária, realizou-se uma pesquisa de campo. Essa pesquisa foi feita com empresas que estão ou foram incubadas no CIETEC - Centro Incubador de Empresas Tecnológicas, localizado em São Paulo, Brasil, e parceiro da USP -Universidade de São Paulo. Para tal escolheu-se as empresas que atendiam aos seguintes pré-requisitos:
Com base nesses requisitos, identificou-se cinco empresas no CIETEC que serviriam aos propósitos deste estudo, porém uma delas não se dispôs a participar da pesquisa, restando apenas quatro. A pesquisa foi feita através de uma entrevista semi-estruturada, com base em um questionário, aplicado pessoalmente a um dos sócios principais de cada uma das empresas. O questionário foi dividido em três partes:
Os itens e perguntas que orientaram a elaboração do questionário foram elaboradas a partir do referencial teórico comentado anteriormente, assim como das diretrizes metodológicas definidas pelo grupos de pesquisa dos vários países participantes do estudo, sob a coordenação do CINDA. As quatro empresas brasileiras que se enquadraram nos requisitos estabelecidos pelo projeto e que foram pesquisadas foram denominadas Gama, Alfa, Beta e Delta, para efeito de sigilo. Os dados coletados e as análises subjacentes são apresentados a seguir.
Os principais dados referentes ao perfil das empresas estudadas estão apresentados resumidamente na Tabela 1. O primeiro dado a ser tratado é a composição societária das incubadas. A empresa Alfa tem um ex-sócio e na entrevista foi relatado que houve diferenças de objetivos entre os mesmos, que não foram possíveis de serem solucionadas, levando a saída de um deles, tendo o mesmo ocorrido na empresa Beta. Segundo Santos (1987) as empresas têm dificuldades em encontrar sócios complementares, sendo esse um dos assuntos da administração bastante estudado: afinal, como lidar com os sócios?
A formação mínima dos sócios das empresas foi a de graduação e a máxima PhD. Isso se justifica pelo fato de se tratarem de empresas de base tecnológica, cuja formação científica é necessária. Por outro lado, a respeito da experiência profissional, apenas uma sócia tinha tido uma experiência em gestão e um ex-sócio uma especialização, mas eminentemente os outros tinham formação em áreas técnicas, sem complementos em gerenciamento. De acordo com Dornelas (2002), em um negócio de base tecnológica deve existir pessoas com conhecimentos da tecnologia-chave e também com conhecimentos e experiência em gestão de negócios. Ainda segundo o autor, isso deveria ser foco dos programas de treinamento dos incubados. Corroborando com esse autor, Santos (1987); Maculan (1996) e Dodgson e Rothwell (1992) apontam que uma das dificuldades das pequenas empresas de base tecnológica já graduadas é a falta de experiência gerencial dos empreendedores.
A empresa Delta, devido ao tipo de produto que comercializa, hormônios do crescimento, afirmou que não teria possibilidades de colocar o produto no mercado se não fosse a associação feita com um grande laboratório Nacional, a BIOLAB. Isso se deve ao fato dos custos de entrada no mercado e de produção, para esse tipo de produto, serem muito elevados. Segundo Dodgson e Rothwell (1992), essa é uma das dificuldades das MPE’s.
A respeito de patentes, três empresas afirmaram que não tinham e nem pretendiam obtê-las, pois achavam o processo muito “burocrático” e custoso. Além disso, tinham receio de tornar pública a composição ou a forma de produção dos seus produtos, que se faz necessária em uma solicitação de patente. Dodgson e Rothwell (1992) afirmam que existem custos muito altos com a solicitação de patentes, sendo esse um dos motivos pelos quais as pequenas empresas não a buscam.
O lead time para projetos de desenvolvimento de novos produtos variou de 6 meses a 10 anos, sendo que duas empresas apontaram em torno de 3 anos. Se for analisado o ciclo de vida geral dos produtos na atualidade, percebe-se que cada vez mais ele tem diminuído. Dessa forma, torna-se necessário que as empresas sejam rápidas no lançamento de novos produtos. Isso é confirmado por Dodgson e Rothwell (1992), que afirmam que a incapacidade de manter um esforço de P & D em escala apropriada é uma das dificuldades das MPE’s.
Sobre ter presença no mercado internacional, com exceção da empresa Delta, que ainda não exporta, uma iniciou as exportações há seis meses e as outras devem estudar mais a fundo esse assunto no ano de 2004, uma vez que precisam buscar mais informações a respeito. Dornelas (2002) apontou em sua pesquisa que o percentual de empreendedores (incubados) que tiveram treinamentos na área de exportação representavam apenas 8% e, segundo seu entendimento, isso traz indícios de que estes negócios estão mais focados no mercado local. Acredita-se que a falta de informações sobre como exportar pode ser um dos fatores que justifiquem esse resultado.
Os itens constantes das Tabela 2 e 3, apresentadas a seguir, versavam sobre perguntas feitas aos entrevistados na terceira parte da entrevista. Os mesmos foram solicitados a responder Sim (S) ou Não (N), e depois a justificar - em alguns casos não responderam (NR). A analise, a partir desses dados, é feita a seguir.
Do ponto de vista dos facilitadores de origem interna, sintetizados na Tabela 2, tomando-se como base os pontos mais destacados pelos entrevistados, evidencia-se inicialmente que as quatro empresas afirmaram que a criatividade era um ponto forte, assim como que seus produtos era inovadores, pelo menos nacionalmente. Contudo, em apenas metade dos casos os sócios foram considerados empreendedores natos. Conforme Lee et al. (apud Dornelas, 2002), a orientação empreendedora baseada na inovação influencia o sucesso das empresas.
Santos (1987) afirma que uma das dificuldades das empresas é o atendimento às exigências formais e legais. De fato, verificou-se na resposta dada a pergunta 15 pelas duas empresas de biotecnologia, teoricamente mais sujeitas a questões legais, que isso exatamente ocorre na pratica.
Quando questionadas a respeito do levantamento de dados sobre a demanda de seus produtos, as empresas afirmaram que foram motivadas pela Incubadora a assim proceder, inclusive já no processo de entrada, pois tiveram que apresentar um Plano de Negócios que contemplava esse item, inclusive tendo que ser revisto com o passar do tempo. De fato, Leite (2002) aponta a necessidade de se fazer um estudo de mercado para o sucesso das empresas de base tecnológica, pelo menos para o mercado nacional.
Com relação a atuação no mercado externo, as vendas e as parceria com empresas de outros países, contempladas nos itens 17 e 18 e corroboradas pelos dados da Tabela 1, evidenciam que as empresas apenas tem interesse em exportar. Uma delas já iniciou modestamente, outras ainda estão levantando dados e outras nem isso o fizeram. Isso pode ser visto como uma falta de visibilidade da empresa a respeito do mercado, apontado por Maculan (1996) como um dos problemas típicos das MPE’s.
Bizzotto (2002) aponta para a importância de se ter uma rede de contatos para as MPE’s. O item 19 demonstra que apenas uma delas achou que não estava atuando fortemente em networking. Esse autor também afirma que é fundamental conhecer a estratégia de posicionamento da empresa no mercado. A pesquisa apontou que uma empresa tem um planejamento para os próximos 18 meses (Alfa) e uma mencionou que o fez no processo de entrada para a Incubadora, como parte da elaboração do Plano de Negócio (Delta). Uma mencionou que irá elaborar algo para os próximos 3 anos (Gama) e uma que obteve verba da FINEP para fazer (Beta). A Incubadora parece ter um importante papel no incentivo e até cobrança da realização desse planejamento. A grande maioria das empresas afirmou usar técnicas participativas de gestão e ter cargos e funções bem definidas na sua estrutura de organização.
Do ponto de vista dos facilitadores de origem externa, a Tabela 3 sintetizam os dados obtidos, e são discutidos na seqüência.
Das quatro empresas pesquisadas, apenas uma delas mencionou que a Universidade não tinha se constituído em um entorno facilitador de iniciativas relacionadas com a criação da empresa, pois não conseguiu ter interação com os laboratórios e cursos da Universidade. Essa empresa justificou afirmando que a Incubadora era nova, pois tinha sido da primeira de uma serie de empresas incubadas, acreditando ter sido esse um dos fatores inibidores interação. As outras trs empresas foram categóricas em afirmar justamente o contrario, inclusive duas delas afirmaram que tiveram acesso a cursos e laboratórios, como os do Instituto de Pesquisas Tecnológica IPT. Essa pratica vem ao encontro da afirmação de Maculan (1996), que considera que uma das funções das incubadoras possibilitar o vínculo formal da empresa com universidades ou centros de pesquisa. Se for considerado somente o dado quantitativo do estudo, isso se confirma. No entanto, ao olhar para as que responderam positivamente, constatou-se que os sócios j possuíam um contato bastante próximo com os cursos e laboratrios utilizados, inclusive alguns exatamente trabalhavam nesses laboratórios anteriormente a abertura da empresa. Isso leva a crer que, uma vez que exista o contato anteriormente, o acesso facilitado a posteriori, uma vez que, no Brasil, h indicações muito claras de que a Universidade ainda não tem uma cultura voltada para a prestação de serviço para as pequenas empresas de um modo geral (Sbragia, 2002).
Todas as quatro empresas utilizaram linhas de financiamento para desenvolvimento de projetos tecnológicos, como as bolsas RHAE do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e tecnológico - CNPQ (todas), programa PIPE da Fundação de Amparo Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP, Fase 1 (tres delas) e Fase 2 (duas delas), e Financiadora de Estudos e Projetos
FINEP (uma). Além disso, conforme item 8, todas elas afirmaram que o vínculo com a Universidade serviu para auxiliar na obtenção desses financiamentos.
Pode-se constatar ainda que as incubadas do CIETEC estudadas estavam bem informadas a respeito das linhas de financiamento existentes e que as mesmas tm sido bem sucedidas nas suas solicitações. Isso pode significar que est ocorrendo um bom trabalho de apoio do CIETEC, porém não se pode afirmar isso categoricamente, pois teria sido necessário questionar como essas empresas tomaram conhecimento dessas linhas de crédito. Maculan (1996) afirma que as incubadoras devem intermediar a relação das empresas com as agências de apoio a inovação e que o acesso limitado ao financiamento para iniciar a produção um dos problemas das incubadoras. Santos (1987) corrobora, afirmando que a escassez de recursos financeiros e a dificuldade na aquisição de equipamentos são problemas das MPE’s. Em geral, uma das vantagens da empresa em estar na incubadora ter informações sobre as linhas de financiamento e receber ajuda para elaborar os seus projetos visando a obtenção de recursos financeiros, em espcie ou na forma de equipamentos e serviços.
Todas as empresas afirmaram que os serviços oferecidos pela incubadora foram importantes para o êxito da empresa, não somente por terem menor custo, mas pelas dvidas sanadas e treinamentos oferecidos. Como apresentado na Tabela 1, constatou-se a forte formação técnica e pouca gerencial dos sócios das incubadas. Isso reforça o papel da incubadora em auxiliar na formação gerencial dos empresários, descrito por Maculan (1996), como um dos papéis-chave da incubadora, e que pode contribuir para o sucesso do incubado. Apontou-se por três entrevistados que o networking com as outras empresas incubadas foram fundamentais para o aprendizado, tendo como justificativa principal a experiência trocada. A empresa Delta não respondeu esse quesito, justificando que seu ramo era muito especfico, mas que muitas vezes as empresas tinham problemas comuns e isso proporcionava uma busca de solução conjunta, podendo, portando, ser interpretado como um sim. Essa troca de informações parece ser muito interessante para a obtenção de novos conhecimentos gerenciais, visto que esse exatamente um ponto fraco apontado anteriormente pelas empresas. Tanto os serviços que a incubadora oferece, como a possibilidade de networking, foram apontados tambm por Carleial (1997) como fundamentais para o desempenho das empresas incubadas.