ISSN 0798 1015

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Vol. 39 (Nº 16) Ano 2018 • Página 29

Avaliação de impacto da Lei 12.973/2014 sobre a Estrutura de Capital das empresas de capital aberto listadas no Ibovespa

The impact of law 12.973/2014: An evaluation regarding the structure of capital in open capita companies listed in Ibovespa

Mirian Wawrzyniak CHIMIRRI 1

Recebido: 20/12/2017 • Aprovado: 20/01/2018


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados

4. Concluções

Referências bibliográficas


RESUMO:

Este artigo busca verificar o impacto da Lei 12.793/14 na estrutura de capital das empresas brasileiras listadas no Ibovespa. Como essa lei altera a mensuração de receita, acredita-se que as empresas possam buscar mais endividamentos para pagar menos impostos. Com a possibilidade de adesão a essa lei em 2014, sendo obrigatória só em 2015, temos uma divisão natural das empresas em grupos de tratamento e controle, permitindo a avaliação dessa minirreforma tributária para as empresas optantes no ano de 2014.
Palavras-Chiave: Estrutura de capital; Legislação tributária brasileira; Avaliação de impacto.

ABSTRACT:

This paper aims to verify the impact of Law 12.793/14 on the capital structure of Brazilian companies listed on Ibovespa. Since this law changes the measurement of income, it is believed that companies can seek more indebtedness in order to pay fewer taxes. With the law becoming optional in 2014 and mandatory in 2015, this period provides a clear separation of the companies in the treatment and control group, which allows the evaluation of the implementation of the mini tax-reform.
Keywords: Capital Structure; Brazilian tax legislation; Impact assessment.

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1. Introdução

A Lei 12.973 de 13 de maio de 2014 pode ser considerada uma minirreforma tributária, pois altera a legislação tributária federal relativa aos impostos IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica), CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido), PIS/Pasep (Programa de Integração Social e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público) e Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social). Ela veio para substituir o Regime Tributário de Transição (RTT), instituído em 27 de maio de 2009, mas que passou a ser obrigatório só em 2010. O RTT foi instituído para tratar dos ajustes tributários decorrentes dos novos métodos contábeis (IFRS) introduzidos pelas leis 11.638/2007 e 11.941/2009. Buscando a neutralidade tributária, esteve em vigor até que fosse instituída uma lei que disciplinasse os efeitos tributários dos IFRS, a Lei 12.973/14.

Dentre as principais mudanças trazidas às empresas pela Lei 12.973/14 está a mudança no conceito de receita bruta, que é utilizada para o cálculo de impostos, mas deixa agora de coincidir com o conceito de receita tributária. A nova lei aumentou as receitas que não mais integrarão a base, dentre elas estão as receitas financeiras decorrentes do ajuste a valor presente, as receitas relativas ao prêmio na emissão de debêntures, as receitas de subvenções de investimentos e as receitas de ganhos de avaliação de ativo e passivo com base no valor justo. Além disso, a nova lei institui e aumenta o valor de diversas multas relativas à contabilização equivocada da receita e por consequência do lucro, resultando em um valor distinto de impostos.

O artigo 75 do capítulo VII da Lei 12.973/14 descreve a opção para a pessoa jurídica optar pelos efeitos da lei já em 2014, dado que ela só se torna obrigatória em 2015. Essa opção é irretratável e deve ser manifestada na Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF). Isso nos dá uma oportunidade única de verificar o impacto desta lei, dado que essa opção divide as empresas em grupos de tratamento e controle. Entretanto, como essa divisão não ocorre de maneira aleatória é possível que as empresas que façam a opção tenham características individuais que interfiram em sua estrutura de capital, ou seja, temos um problema de viés de seleção. Para corrigir este problema assumimos a hipótese de que essas características individuais que levaram a empresa a optar ou não pela adesão em 2014 sejam constantes no tempo, assim é possível isolar o efeito do tratamento através do método de diferenças em diferenças.

O objetivo deste trabalho é verificar como esta minirreforma tributária pode afetar a estrutura de capital das empresas. Isso pode ocorrer, pois segundo Modigliani e Miller (1963) um maior endividamento da firma aumenta seu valor, dado que os juros são dedutíveis na apuração do imposto de renda das empresas. Portanto, mudanças na legislação tributária podem fazer as empresas adquirirem mais empréstimos para poderem diminuir o valor total de impostos pagos.

Avaliando o efeito dessa nova legislação pelo período de um ano nos que optaram por antecipar a aplicação de suas disposições verificamos que ela não causou impacto significativo no endividamento de curto e de longo prazo. Contudo, é preciso considerar que o tempo em que apenas o grupo de controle aderiu à Lei foi pequeno, portanto não conseguimos verificar impactos de longo prazo.

1.1. Breve revisão da literatura sobre o tema

Graham, Leary e Roberts (2015) estudaram as mudanças que ocorreram na estrutura de capital das empresas norte-americanas nos últimos 90 anos e buscaram determinar os motivos para estas mudanças. Através de dados contábeis e financeiros e do método de diferenças em diferenças eles chegaram à conclusão de que as mudanças no setor financeiro e atitudes governamentais são os principais determinantes da estrutura de capital das empresas. Um sistema financeiro melhor desenvolvido aumenta a alavancagem das empresas por facilitar a obtenção de crédito. Assim como existe uma associação negativa entre os empréstimos do governo e a emissão de dívida corporativa, pois o aumento da emissão de títulos do Tesouro afeta a alavancagem agregada por deslocar a curva de demanda por dívida corporativa.

Em 1986 Givoly, Hayn, Ofer e Sarig interagiram impostos e alavancagem utilizando uma reforma tributária que ocorreu nos Estados Unidos em 1986. Eles analisaram cerca de 900 empresas presentes na base de dados Compustat por 11 anos e seus resultados encontraram relação positiva e significante entre impostos e alavancagem, ou seja, uma mudança tributária afeta a decisão de financiamento nas empresas.

Dentre as pesquisas brasileiras na área se destaca a de Sirihal e Melo (1999), eles evidenciam a existência de um benefício fiscal no endividamento, ou seja, a empresa endividada ganha valor. Isso decorre da economia fiscal proporcionada pela dedutibilidade das despesas com jutos. Os autores procuraram determinar o benefício líquido do endividamento para as empresas brasileiras após a intervenção provocada pela lei nº9.249/95, apesar de encontrarem uma relação positiva entre a mudança na legislação e o benefício líquido, essa relação não se mostrou estatisticamente significante.

De acordo com Silva, Santos, Koga e Barbosa (2014), a Lei 12.973/2014 é resultado de um estudo dos métodos contábeis prescritos pelos IFRS. As alterações trazidas por ela baseiam-se, em geral, na neutralidade tributária e buscam reduzir o nível de interferência das regras tributárias sobre a escrituração comercial das pessoas jurídicas. Merece destaque a nova definição de receita bruta que não se confunde mais com receita tributária e é usada como base para os cálculos de impostos como IRPJ, CSLL, PIS/Pasep e Cofins.

Pinheiro (2014) atentou para o fato da Lei 12.973/14 trazer modificações na contabilização do lucro resultante da aquisição de participação societária, que agora passou a ser calculado pela diferença entre o custo de aquisição e o valor justo das ações. Com isso, o valor do lucro gerado pela aquisição de participação societária tende a diminuir, tornando operações desse tipo, menos interessantes. Dessa forma, o lucro para fins fiscais somente poderá ser dedutível em operações que envolvam partes dependentes.

Também cabe destacar o trabalho de Sauda (2014) que também notou um impacto negativo da Lei 12973/14 nas empresas que passaram por combinações de negócios, pois tiveram redução do benefício fiscal gerado pela amortização do ágio. O autor chegou a esta conclusão após estudar a fusão entre a Raia S.A e a Drogasil S.A em 2011 e verificou que com a mudança da lei em 2014, a empresa formada Raia Drogasil S. A teve diminuição no benefício fiscal da amortização do goodwill como resultado da mudança de cálculo do lucro.

1.2. Estrutura do artigo

O restante do artigo está organizado da seguinte forma: uma breve revisão da literatura sobre o tema, a metodologia utilizada, citando as fontes de dados e o modelo proposto e por fim os resultados encontrados e uma conclusão que destaca as principais contribuições deste estudo, bem como suas limitações.

2. Metodologia

Os dados coletados para esta pesquisa foram coletados através do software Economática, que disponibiliza dados das empresas de capital aberto de diversos países. A escolha das variáveis foi inspirada no trabalho de Brito, Corrar e Batistella (2007) que estudaram os fatores determinantes para a estrutura de capital das empresas brasileiras. Segundo eles as principais variáveis que determinam o endividamento são a rentabilidade, o tamanho e a composição dos ativos (proporção de ativos permanentes do ativo total).

O modelo proposto para este estudo pode ser descrito como na equação abaixo:

       (1)     

Sendo o endividamento a variável dependente, dada pelo total da dívida sobre o ativo total. As variáveis explicativas são a rentabilidade (lucro líquido em razão do patrimônio líquido), o tamanho (logaritmo natural das vendas totais), a composição dos ativos (ativo não circulante em razão do ativo total), a dummy que assume valor 1 se a empresa optou por aderir a Lei 12.973/14 em 2014 e 0 em caso contrário e a dummy de interação, cujo parâmetro nos mostra o efeito do tratamento sobre os tratados (ATT).

Da base de dados formada foram eliminadas as empresas do setor bancário (empresas cuja atividade em si é o endividamento, portanto são outliers quando desejamos estudar a alavancagem empresarial) e empresas sem os dados necessários. Na base final tem-se 561 empresas, sendo que 143 aderiram à opção em 2014; os dados são longitudinais, entre 2012 e 2015.

O método aplicado foi o de diferenças em diferenças, sendo o grupo de controle as empresas que não optaram pela lei em 2014, e o de tratamento, as que optaram. Como essa opção não foi aleatorizada é possível que as empresas que aderiram tenham características individuais que influenciam no seu endividamento. Para amenizar este problema de viés de seleção utiliza-se o método de diferenças em diferenças para eliminar as características individuais constantes no tempo que podem afetar a decisão de endividamento.

Para que o método seja válido é preciso que a hipótese de tendência comum seja válida, ou seja, a tendência para o grupo de tratamento se não houvesse o tratamento seria a mesma nos grupos de tratamento e controle se não houvesse tratamento (ANGRIST e PISCHKE, 2008). Neste caso esta hipótese pode ser testada pelo fato de possuirmos dados de quatro períodos, conforme mostra o gráfico 1.

Através do gráfico é sensato acreditar que a hipótese de tendência comum é válida, pois a variável endividamento segue uma tendência de crescimento ao longo dos anos tanto para o grupo de tratamento (firmas que optaram) quanto para o grupo de controle (firmas que não optaram).

3. Resultados

Inicialmente olhamos na tabela 1 as estatísticas descritivas de nossa base de dados separadas por ano. É interessante observar que a variável dependente endividamento, em média, aumentou entre 2012 e 2015, enquanto as outras variáveis analisadas, em média, não tiveram uma tendência clara de aumento ou diminuição.

Tabela 1
Estatísticas descritivas por ano

Ano

Média

Desvio Padrão

Nº de observações

Endividamento

2012

0.33

0.51

502

2013

0.35

0.54

515

2014

0.36

0.56

545

2015

0.39

0.59

563

Rentabilidade

2012

0.35

0.78

147

2013

0.24

0.43

153

2014

0.30

0.53

156

2015

0.40

0.75

156

Tamanho

2012

14.22

2.92

133

2013

14.18

3.01

139

2014

14.19

3.19

143

2015

14.20

3.11

142

Composição dos ativos

2012

0.66

0.23

148

2013

0.68

0.22

153

2014

0.68

0.23

156

2015

0.68

0.23

156

Média e desvios padrão das variáveis utilizadas no modelo para cada ano.

Já a tabela 2 mostra as estatísticas descritivas agrupadas para todos os anos, mas separadas em dois grupos: os que optaram por aderir a lei antecipadamente, e os que não fizeram esta opção.

Tabela 2
Estatísticas descritivas separadas entre os grupos de tratamento e controle

Optou

 

Não optou

Média

Desvio Padrão

Média

Desvio Padrão

Endividamento

0.363

0.440

0.357

0.593

Rentabilidade

0.263

0.493

1.050

1.300

Tamanho

14.380

2.709

6.898

1.535

Composição dos ativos

0.689

0.199

 

0.370

0.416

Média e desvios padrão das variáveis utilizadas no modelo, separadas por dois grupos: o das firmas que optaram pela adesão anticipada à Lei 12.973/2014  e o das que não optaram.

A tabela 2 mostra que o endividamento das empresas que fizeram a opção é, em média, ligeiramente maior. Já a rentabilidade das empresas que não optaram em média é três vezes maior do que a das empresas que optaram. Já o tamanho e a composição dos ativos é bem maior para as empresas que fizeram a opção.

Na tabela 3 estão os resultados obtidos através da estimação dos modelos de diferenças em diferenças, conforme descrito na equação (1).

Tabela 3
Resultados das Regressões: Diferenças em Diferenças

Endividamento

Optou por adotar em 2014

0.02

(0.22)

Rentabilidade

-0.05

***

(0.02)

Tamanho

-0.008

(0.01)

Composição dos ativos

0.189

**

(0.09)

Dummy de interação

0.36

-0.23

R-quadrado

0.79

Número de observações

542

 

A variável dependente é o endividamento. Os desvios padrão estão entre parênteses.
Os símbolos ** e *** representam a significância estatística dos estimadores para 5% e 1%, respectivamente.

 A variável dummy de opção e o parâmetro referente à variável  (dummy de interação) não se mostraram estatisticamente significantes, o que mostra que a opção por aderir a Lei 12.973/14 em 2014 não teve efeito sobre o endividamento das empresas.

A variável de rentabilidade se mostrou negativa e significante a 1% para explicar o endividamento, mostrando que empresas que obtém maior lucro em relação ao seu patrimônio tem menor tendência de contraírem dívidas. Por outro lado, a composição dos ativos mostrou uma relação positiva e significante a 5% com o endividamento. Ou seja, empresas que possuem uma proporção maior do ativo total de ativos não circulantes são mais endividadas.

É importante destacar que este resultado não significa que mudanças na legislação tributária não afetem a estrutura de capital das empresas, apenas nos mostra que esta legislação em específico não afetou o endividamento das empresas no curto prazo. Podemos citar como possíveis causas para isso a mudança frequente das leis tributárias brasileiras e a dificuldade de obtenção de crédito, principalmente no curto prazo. Essa dificuldade na obtenção de crédito é confirmada por Barcelos (2002). Segundo ele, o Brasil é um caso atípico em que as taxas de juros para financiamentos de longo prazo são inferiores às de curto prazo. Com isso, não há incentivos para as empresas contraírem empréstimos de longo prazo, que são mais arriscados, e no caso específico do Brasil, mais caros.

4. Concluções

Este trabalho avaliou o impacto da Lei 12.973/14 na estrutura de capital das empresas brasileiras listadas no Ibovespa. Como a Lei teve a adesão de parte das empresas um ano antes de ser obrigatória, foi possível formar grupos de tratamento e de controle. Entretanto, esses grupos não foram formados aleatoriamente, pois a adesão à Lei em 2014 era uma opção para as empresas. Para controlar este problema de viés de seleção utilizamos o método de diferenças em diferenças a fim de eliminar características individuais das empresas constantes no tempo, que acreditamos ser o que diferencia nossos grupos de tratamento e de controle.

Os resultados encontrados mostraram que a opção de adesão à lei em 2014 não teve impacto no endividamento das empresas naquele ano. Contudo, não é possível afirmar o impacto desta lei na estrutura de capital das empresas no longo prazo. Portanto, a maior limitação deste estudo é ter apenas um ano em que só uma parte das empresas brasileiras aplica as disposições contidas nesta lei. Além disso, é importante destacar que os resultados são válidos sob a hipótese de tendência comum, ou seja, consideramos que a tendência para o grupo de tratamento se não houvesse tratamento seria a mesma verificada para o grupo de controle.    

 As principais causas do impacto não significativo de uma mudança da lei no endividamento empresarial são a mudança frequente de leis tributárias no Brasil e a dificuldade de captação de crédito, principalmente no curto prazo. Mas ainda há necessidade de muitos estudos acerca do tema, inclusive utilizando outras metodologias para determinar os reais fatores que afetam a estrutura de capital no caso específico de empresas brasileiras.

Referências bibliográficas

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1. Economista. Mestranda em engenharia de produção, na linha de pesquisa de economia, finanças corporativas e econometria na Universidade de São Paulo. mirianwk@gmail.com


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 39 (Nº 16) Ano 2018

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