Vol. 39 (Nº 11) Ano 2018. Pág. 36
Patricia Grube dos Santos de LIMA 1; Altair JUSTUS NETO 2; Tatiana da Silva Melo MALAQUIAS 3
Recebido: 06/11/2017 • Aprovado: 14/12/2017
RESUMO: Objetivou-se elencar as concepções de pais e cuidadores em relação ao cuidado com a criança portadora de fissura labial e/ou fissura palatal. Optou-se por uma pesquisa descritiva exploratória de abordagem qualitativa. A descoberta de um filho com deformidade gera inúmeras reações diferentes nos pais como medo, susto, preocupação e choque os forçando a planejar um novo futuro. A maioria das dúvidas encontradas foi em relação à alimentação, perda de peso, afasia e medo da criança ficar fanha. Concluiu-se que as orientações iniciais feitas aos pais nem sempre são dadas corretamente gerando insegurança e dificuldades no cuidado. |
ABSTRACT: The aim of this research was to point out the conceptions of parents and guardians in relation to the care of infants with cleft lip and/or cleft palate. It was chosen an exploratory descriptive research of qualitative approach. The discovery of a child with deformity causes many different reactions on parents, like fear, scare, worries and shock, forcing them to plan a new future. Most part of the expressed doubts were connected to feeding, weight loss, aphasia and fear of nasalization in the child. It was concluded that the initial orientation given to parents is not always taught correctly, resulting in insecurity and difficulties in the care. |
Fissuras do lábio e/ou palato (FL/P) representam as anomalias congênitas mais comuns da face, correspondendo a aproximadamente 65% de todas as malformações da região craniofacial. As fissuras orais podem ser classificadas conforme seu local, lateralidade e sua complexidade (PARANAÍBA, 2010).
No mundo a ocorrência de FL/P é de uma a cada mil crianças nascidas, e no Brasil, há referência de que a cada 650 criança nascida uma é portadora de fissura labiopalatina. As fissuras labiais e labiopalatinas são mais freqüentes no sexo masculino e as fissuras somente de palato ocorrem mais no sexo feminino. A incidência cresce com a presença de familiares fissurados nas seguintes proporções: a) pais normais = 0,1% de chance de ter um filho fissurado; b) pais normais e um filho fissurado = 4,5% de chance de ter outro filho fissurado; c) um dos pais e um filho fissurado = 15% de chance de ter outro filho fissurado. Vale ressaltar que o risco nunca é exatamente zero para nenhum casal (CAIF, 2015; CTMC, 2012).
Estes defeitos acontecem muito cedo no desenvolvimento fetal, já que o tecido que se tornará o lábio geralmente estará formado com cerca de 5 a 6 semanas após a concepção. Já o tecido que se tornara o palato será formado com cerca de 7 a 8 semanas após a concepção (CAIF, 2015).
Vaz e Ribeiro (2010), realizaram um estudo com 8 mães de crianças portadoras de FL/P , que são atendidas no Hospital de Clinicas em Porto Alegre - RS, estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Os autores objetivaram levantar o conhecimento a cerca da deformidade e conhecer as crenças das mães de crianças portadoras de fissuras orais e malformações. Concluíram que a falta de informação acaba mobilizando sentimentos inesperados nas mães e que as crenças trazem que a malformação é decorrente de uso de medicações.
Trettene et al. (2014), realiza um estudo transversal, em um hospital referencia com 50 cuidadores de crianças portadoras de FL/P, submetidas a queiloplastia e palatoplastia. O objetivo dos autores foi identificar as principais duvidas dos cuidados de crianças com FL/P sobre os cuidados pós-operatórios das cirurgias de queiloplastia e palatoplastia. Com base nos dados obtidos os autores evidenciaram uma preocupação dos cuidadores em relação a alimentação e aos cuidados com a ferida pós-operatória.
Deste modo, o objetivo desta pesquisa é elencar as concepções de pais e cuidadores em relação ao cuidado com a criança portadora de FL/P, assim como o impacto inicial da descoberta dessa deformidade e as dúvidas e dificuldades encontradas no cuidado com essa criança.
Optou-se por uma pesquisa descritiva exploratória de abordagem qualitativa. Aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual do Centro Oeste – UNICENTRO (parecer nº: 1.740.218). O estudo foi realizado no Centro de Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF) de Curitiba - PR, e contou com 15 participantes, familiares ou os cuidadores principais de crianças com fissuras labiopalatal.
Foi utilizado como critério de inclusão, crianças com idade de até 05 anos. Os acompanhantes foram abordados na sala de espera do CAIF/AFISSUR, enquanto aguardavam consulta. Após serem esclarecidos a cerca do trabalho e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido foi iniciada a pesquisa.
A coleta de dados foi realizada em sala reservada, cedida pelo CAIF, por meio de um questionário semiestruturado, e gravado com auxilio de um gravador (Olympus, VN8000PC). Cada entrevista teve uma duração média de 12minutos.
As famílias receberam um número por ordem de entrevista, e a letra f, para abreviar Família. Assim, conseguimos discutir e manter o sigilo das famílias que estamos tratando.
A análise dos dados foi realizada através da análise de conteúdo, por meio do grupamento de conteúdo, com falas que apresentam semelhanças e aspectos em comum.
Na análise dos dados, foram constatadas três categorias: a) a concepção de pais e cuidadores em relação ao cuidado com a criança portadora de fissura palatina e fissura labial; b) o impacto inicial da descoberta dessa deformidade e; c) as dúvidas e dificuldades encontradas no cuidado com essa criança.
Em relação ao cuidado com a criança portadora de FL/P, foi observado que 10 familiares obtiveram orientações a respeito dos cuidados iniciais e, 5 familiares não obtiveram nenhuma orientação. Observou-se que mesmo nos casos em que as orientações foram passadas, elas foram feitas de modo superficial.
Segundo Araruna e Vendrúscolo (2000), as orientações são de fundamental importância, pois uma vez bem orientadas, essas famílias conseguem fazer com que as crianças tenham uma melhor taxa de desenvolvimento, pois alimentam-se com mais facilidade, e fazem com que a ansiedade dos pais seja menor. As orientações dadas se comprovam nas falas a seguir:
F1: É... já trazer ele pra cá, já entraram com pedido de consulta aqui, porque como eu tive ele aqui no hospital do trabalhador mesmo ele no sábado a noite, quando foi na segunda feira tive alta, na quarta feira já estava com uma consulta agendada aqui para poder passar com os medico, poder fazer né. Assim teve a nutricionista, aqui foi só com a nutricionista, na verdade a pediatra do hospital já tinha passado o leite pra ele porque ele não consegue sugar o peito né, ai já foi passado no hospital, dai aqui a assistente social já encaminhou pra nutricionista do portinho e a nutricionista entrou com o leite pra ele certinho e semana que vem eu vou ter a primeira consulta dele com a nutricionista daqui.
F2: Toma alimentação pela sonda.
F5: Orientações. Ah! Me passou a questão de, de orientação que teria que da mama pra ele sentadinho né, a posição pra ele dormir teria que ser mais em pé, questão pra não volta muito, porque voltava leite pelo nariz né.
F6: A primeira foi no hospital, do doutro, até esqueci o nome do doutor e a fonodiologa, foi ela que ensinou pra gente tudo certinho, como que tinha de cuida, o que tinha de faze, tudo né, então eles atenderam muito bem a gente e depois passaram nois e encaminharam pra Maringá, pra Associação de Apoio ao Fissurado Lábio-Palatal de Maringá(AFIM), que até o mês que vem eu vou pra AFIM, cada três ou quatro meis nois vamo passa ela la pela AFIM.
F7: Orientação? Que era pra da mama pra ela mais de pezinho e tinha que te o biquinhopróprio lá, porque você sabe né, assim, tinha que ter um mais especifico.
F9: Me explicaram o jeito que eu tinha que ta amamentando ela, eu tentei tira leite, não consegui, mais depois que eu fui pra lá eu tive esse acompanhamento com fono, com nutri, com psicologia que la não sei see você já sabe, já ouviu flar é excelente, eles esclarecem muito, tipo assim, eles tiraram metade da da minha insegurança.
F12: Há, foi la na Santa Casa na verdade em Maringá dai, tinha fonoaudióloga e tinha pediatra, elas foram me mostrando como dar o leite pra ele no copinho cam a boquinha dele, todas as orientações.
F13: Iniciais? É... eles queriam que ele amamentasse no meu peito, mais não tinha como ai comecei dá, ele mamo na sonda, ai depois tiro a sonda e foi mama no copinho e de pé, sempre de pézinho, nunca deitado, e foi assim.
F14: Que era pra gente vim pra cá que tinha cirurgia que resolvia né, que tinha correção. Dai quando ele nasceu eu tive a fono né, que dai ele ficou na UTI, ai eu tive os cuidado dela e das menina que trabalhavam, as enfermeira né, elas explicaram como amamentar certinho, como... começou na seringa.
F15: Eles ajudaram né, eu pode da mama pra ele tudo, só que dai como eu não tava conseguindo no peito direito dai foi pro NAN dai, no hospital ele já começou no NAN no copinho, eles me ajudaram como fazia, mais os cuidados.
Para Carvalho e Tavano (2000) a forma pela qual os pais conduzirão a formação de vinculo após o nascimento da criança portadora de fissura, poderá variar de acordo com: seus valores pessoais, mecanismos de defesa, experiências prévias, aspirações para com o filho, a maneira como a equipe médica informou a existência de anomalia facial no filho recém-nascido e o nível das orientações, precocemente recebidas, a respeito da fissura, seus cuidados e tratamento. Assim, observamos que essas respostas paternas terão grandes implicações para eles e seus filhos. A sucção insuficiente, os vômitos e os engasgos ocorrem nos casos de orientações inadequadas à mãe, quanto ao melhor método de alimentar o recém-nascido portador de fissura de labiopalatina (ARARUNA; VENDRUSCOLO, 2000).
A seguir estão as falas daquelas que não receberam orientação:
F3: Ela me falo que era pra mim procura a Associação Pontagrossense de portadores das deformidades faciais (PPDF) la da minha cidade que é onde elas iam me encaminhar para cá. A PPDF é assim uma... como posso te falar, é uma casa onde tem especialista.
F4: Na verdade não tivemos muita orientação né marido, de ninguém, nos que fomos atrás né, (pai: nois que se informamos onde que tratava, e o que fazia, comé que ia se, o que que era necessário antes, fomos procurar pessoas que tem la na cidade.
F8: Não, pior que não, só falo pra mim vim no, traze ela aqui pra se consulta, pra ela ih desenvolvendo mais, há... falo que, ela deu o leite dai pra mim dá na chuquinha, sentadinha.
F10: Na verdade a gente foi busca informação, a gente foi busca, eu não fui na google busca porque lá a gente vê muita coisa feia né, então, tem fissura muito severa, eu fui procura, eu fiquei sabendo no facebook que tinha as fissuradas né, dai a gente viu o depoimento das mães lá, e dai esse casal de colega lá de Castro que tem esse problema né, passo informação pra gente e assim no hospital, de medico mesmo assim. Eu fui encaminhada, que eu moro em Castro pra ter ele lá em Ponta Grossa por ter mais recurso, por ter uma UTI né, caso ele precisasse, nós não sabia como ele ia nasce né, e dai de informação mesmo a gente teve só depois que ele nasceu, que uma mulher lá da APPDF, assistente social foi lá fala com a gente, que a gente teria que ir lá pra fazer o cadastro dele pra poder acompanhar sabe, mais assim antes não, após o nascimento nada, nada nem os médicos sabiam, tipo, a gente tava mais orientado do que eles, eu tinha uma chuquinha que eu comprei sem saber meio que com o bico certo até sabe, que ele conseguiu ate no começo ele não tava, ele não consegue sugar sozinho sabe, tem que dar uma apertadinha, a gente tem que, foi descobrindo sozinho sabe, ninguém ajudo.
F11: Era pra mim esperar pra vê na outra ultrassom pra vê se tava mesmo, dai eu acabei pagando uma particular. Eles me explicaram mais dai, mais foi aqui já.
Para Gobby e Lúcia (2006) os aspectos envolvidos nos cuidados com estes pacientes abrangem inúmeras situações complexas, que envolvem, tanto as condições anatômicas, como as relações afetivas e sociais. Mostrando a importância de uma orientação de qualidade.
O período de gestação é marcado pela ansiedade e fantasia da espera de um filho, ao qual se projeta ideais, sonhos e vivencias anteriores. O nascimento de uma criança com uma deformidade gera um choque na família (MARQUES 1995).
O nascimento de um filho com deficiência pode alterar a rotina e estilo de vida dos pais, fazendo com que estes necessitem rever projetos e modificar sonhos que possam ser interrompidos por obstáculos que a deficiência possa causar, podendo causar uma crise na família pelos diferentes sentimentos gerados, que são vivenciados pelos pais com intuito de enfrentamento da situação considerada impactante, pois se perde bruscamente a normalidade esperada no filho idealizado (OLIVEIRA; POLETTO, 2015).
As vivencias iniciais relatadas apresentaram-se da seguinte forma: Susto e Medo (8 vezes); preocupação (2 vezes); nervosismo (2 vezes); tristeza (2 vezes); estranheza (1 vez); choque, surpresa e abalo (3 vezes); insegurança (1 vez); frustração (1 vez) e desespero (1 vez), observa-se a existência de similaridades nos sentimentos encontrados. Segundo Oliveira e Poletto, 2015 os estudos revelam dificuldade dos pais em aceitar a deformidade que o filho apresenta e de como lidar com esta.
F1: É que eu não sabia o que, do que se tratava, depois que ela foi me explicar o que que era porque eu tenho até, porque dai i dele coo eu via que não tem uma deformidade nenhuma, dava pra ver que é uma coisa bem pequena, então não, pra mim assim, não teve um susto, mais eu fiquei bem assim, o porque né, porque se o outro que eu tive não deu nada e esse aqui né, mais.
F2: Não senti nada.
F3: Eu fiquei com medo, fiquei sem saber o que eles tavam me falando, por que eu até então não sabia o que, que era e eu fiquei bem assustada sabe.
F4: Meu sentimento foi de preocupação, preocupação porque ele já tinha tinha conhecimento do problema, porque a minha vó teve quatro filhos com fissura labial, então eu já sabia mais ou menos, mais não imaginava que ia acontecer conosco né, então... mas ficamos preocupados pra saber o grau.
F5: Foi bem estranho, eu não sabia, eu nem sabia o que era isso né, eu achei que poderia verifica isso na, verifica na ecografia né. Ai, que nem, eles foram conversando la no hospital, passei eu e meu marido, nos passamos por, pelo psicólogo do hospital dai eles já encaminharam a gente pra cá.
F6: Então, que nem diz é uma coisa... só que na hora a gente sempre leva aquele choque mesmo sabendo e tudo, aquele choque a gente, que nem eu to até... na hora que você olha assim, fala meu Deus como que eu vou fazer né, porque que nem ela era dos dois lados assim até o céu da boca todo então é difícil pra você pensa como você vai cuida né.
F7: Há, eu fiquei bem assustada porque eu nunca tinha visto fala nisto, (pai: -não tinha nem prestado atenção que existia) não sabia sabe, assim, dai eu fiquei bem, assim desesperada, é... não sabia qual o cuidado, se ela se afogasse, essas coisas assim.
F8: Eu fiquei surpresa né, medo também, porque eu nunca tinha visto.
F9: Há, fica assustado né, porque... muito, muita insegurança, se você vai da conta, como que vai ser, se foi difícil pra mim.
F10: Caiu a casa, a gente fico bem nervoso, bem triste, sei lá né o que, que deu, a gente fico frustrado, assim, a gente esperava, não que ele não seja perfeito que agora a gente vê que ele é perfeito, mais a gente a gente não esperava que a criança tenha uma fenda né, tipo assim, uma coisa que a gente não sabia, podemos dizer que o sentimento foi de, sei lá, tudo misturado né, a gente fico assustado assim né, ficou bem nervoso.
F11: Quando eu soube eu fiquei bem preocupada, eu me desesperei bastante.
F12: Eu não tinha conhecimento né, de fenda, dai eu fui procura na internet, no momento eu fiquei meio assustada, não vai mama, mais depois...
F13: A eu fiquei triste, medo não, eu fiquei triste mais por causa das pessoas, o que as pessoas iam dizer, sabe iam olha assim, só.
F14: Ai! Eu fiquei bem abalada, demais, fiquei bem assustada, que na minha família não tem esse tipo né, dai tipo assim, nois ficamo sem reação, não sabia o jeito que ia vim e tudo, a gente nunca teve conhecimento, nois nunca viu, nunca, nem como era.
F15: Há! Eu chorei muito, fiquei nervosa. Quando eu vi achei que o medico tinha machucado ele, quando eles tiraram de mim já me mostraram sabe, ele tava com sangue aqui, eu achei que os medico tinham cortado ele, dai eu disse “ Meu Deus o que fizeram com meu filho”, dai eles me deram outra anestesia eu desmaiei, me deram pra eu dormi né, dai eu acordei tava cheio de medico na sala dai me contaram o que era, o que acontece, e que não era... mais eu me assustei muito na hora.
Os pais enfrentam a situação de uma deformidade de formas diferentes, de acordo com a expectativa criada, sua personalidade, esperança, sonhos e seus valores adquiridos, ou seja, tanto o pai quanto a mãe serão afetados de maneira distinta, assim como irão reagir de diferente maneira a situação (FERLAND, 2009).
Segundo Vieira (2015), algumas pessoas podem reagir a descoberta de uma deficiência de várias maneiras, podendo agir de forma defensiva, indiferente ou agressiva, tudo isso devido a insegurança frente a reação dos outros, que pode ser de aceitação ou não.
A chegada de um filho é um dos acontecimentos que o ser humano mais espera, considera mais emocionante, gerando neste, ilusões e medos, assim como, a idealização de um futuro para seu filho. Quando há a descoberta de uma deformidade, cada família tem uma forma de defesa diferente para enfrentar o problema e idear um novo futuro (FERREIRA, 2015).
A complexidade dos cuidados com uma criança portadora de FL/P exige dos familiares e profissionais envolvidos na assistência desta, paciência, entendimento, determinação e conhecimento, para que possa ser garantido que ele seja um indivíduo saudável e incorporado a sociedade (ARARUNA; VENDRUSCOLO, 2000).
A alimentação e o ganho de peso, sem dúvida, estão entre as maiores dificuldades no cuidado com bebes que apresentam esta deformidade (SÃO PAULO, 2012). Mesmo com orientações alimentares, ainda na maternidade não se pode garantir um ganho de peso efetivo da criança com FL/P, resultando em alguns casos no atraso da correção cirúrgica, já que a alimentação destas crianças é dita de alta complexidade (GOBBY L; LÚCIA, 2006).
A maioria das dúvidas encontradas nas falas a seguir foram em relação a alimentação e medo de afogamento, seguidos de medo da criança ficar fanha ou não falar, perda de peso, problemas pós cirúrgico e apresentar outros problemas de saúde associados já que a FL/P pode estar associada a outras deformidades crânio faciais.
Seguem as falas relacionadas às dúvidas dos cuidadores:
F1: Se ele ia ficar fanho, por que assim, depois que eu comecei a vim aqui né eu vi que tinha muita criança que tinha cirurgia e ficou fanho, tudo, o cirurgião disse que né pode ser que não então ele esclareceu minha dúvida, porque o dele como é uma fenda pode ser que não afete as cordas vocais dele era isso que eu fiquei mais preocupada né o resto, e em questão da alimentação né, que ele só vai poder se alimentar mesmo com pedaços assim só depois da cirurgia né, por enquanto é só coisas liquidas.
F3:As primeiras (risos). A primeira que surgiu que eu fiquei com medo de ela não falar ou ficar fanha, só que dai eu vim aqui e eles me explicaram tudo direitinho e eu fiquei mais tranquila.
F4: Como no ultrassom morfológica a gente descobriu, ai a gente demorou mais quatro semanas pra fazer em 3D pra ver se conseguia ver o céu da boca, como ela disse que o céu da boca era aberto a nossa preocupação maior era com a alimentação, porque a gente tinha lido a respeito, que era difícil a criança se alimentar, mamar no peito era muito raro e o ganho de peso, ai a gente já sabia, já procuramos na verdade, como meu marido já falo pela internet e pelas famílias a gente já foi se informando.
F5: Ah! Se ele ia fala, se ele ia fala, se ele ia fica fanho.
F6:A primeira dúvida foi saber da onde surgiu, o motivo dela nascer assim.
F7: Quando recebi a notícia? Eu tinha medo de ela se afoga, se ela ia fala direitinho ou não.
F8:A minha primeira dúvida foi na hora que eu fui da mama pra ela né e eu tinha medo de afoga ela.
F9:Tipo assim, antes de ter ido na AFIM, eu tinha medo da formação dela, se ela poderia realmente ter alguma coisa, ela falo que ela podia ter sopro no coração pra mim.
F10: A gente tinha preocupação pra ele mama, a gente achou que ele ia ter muita dificuldade de alimentação, o que não acontece sabe, ele mama muito bem, agora ta tudo certo.
F11:Eu tinha medo que fosse no céu da boca, tipo tudo aberto.
F12:Medo de dá mama, nossa, eu fiquei doida, eu chorava a noite, mais ele não vai consegui mama dai eu pensava né, quando eu via eu tava meio apavorada e o meu marido chorava junto ainda e falava não, não tem problema menina é só...
F13:Foi, pra mim eu achei que ele não ia fica gordinho, ele ia fica magrinho né, peso, a eu sei lá, assim, complicado o cuidado dele né, mais ossa! Eu tirei de letra.
F14:Tudo... tipo assim, como que eu ia amamenta, tipo assim, se ele ia pegar o peito, se não, tinha medo dele engasga, porque eu sabia que ia ser uma abertura né, mais não sabia o grau que ia ser né, tudo quanto que é duvida que você imagina, nossa tudo.
F15: Assim eu...se a cirurgia ia deixa marca, ia fica algum problema, assim sério.
A maioria das famílias apresenta dificuldades para encontrar um bico de mamadeira que a criança se identifique, sabendo que a maioria das mães não consegue dar início ao aleitamento materno por dificuldades mecânicas, causada pela deformidade, pois o reflexo de deglutição, mesmo que presente, pode ser ineficaz devido a pressão labial inadequada (TRINDADE; FILHO, 2007).
Caso seja necessária a introdução de alimentação artificial existem técnicas que permitem facilitar a introdução desta, como: posição da criança afim de evitar que os alimentos refluam para o nariz e a utilização de bico ortodôntico de látex (TRINDADE; FILHO, 2007). E é nesse processo que encontramos relatos das maiores dificuldades no cuidado com a criança:
F1: Pra ele pegar o bico das mamadeiras, porque dai ele não tem aquela força né, então dependendo do bico ele não pega. Assim, ai tem a parte que ele tem que mamar um pouquinho em pé, porque se ele mamar deitado escorre no narizinho dele, então tem que ser mais levantadinho pra mamar.
F3:Antes foi complicado, porque ela.. eu ia amamentar ela escorria no narizinho e eu fiquei muito assustada com isso, eu não dormia direito porque eu tinha medo dela engasgar e dai eu levava ela no medico e ninguém me falava nada, eles falavam a principio ate os três meses ela acontecia isso, eu ia amamentar e escoria no nariz eu levava ela no medico e a medica falava que ela tinha refluxo ou se não bem no comecinho ela falou que poderia ser agua da bolsa que ela tivesse engolido, por isso que ela engasgava, por isso que escorria pelo nariz, só que ninguém me explicou nada, dai quando ela tinha três meses dai que foi diagnosticada, eles encaminhavam, olhavam e falavam que ela tinha refluxo, dai eu dava remédio para refluxo e não melhorava.
F4: A amamentação porque o lado que ela tinha fissura o narizinho era mais baixinho, então era mais difícil pra ela mama, e era justamente no peito que o seio que tinha bico plano, então levou bastante tempo para adaptar, não sei, mais foi a amamentação mesmo, e mama até hoje, tem 11 meses e mama no peito ainda.
F5: Ai a questão de ele engasgava, a gente ficava com muito medo dele engasgar, ele se afogava, bastante.
F6:No inicio foi o mama, dai então eu perguntei pro doutor como que nasce uma criança assim, de que maneira, se é tratamento, se é... o qual motivo, dai ele explicou né que é genético, tinha um tiu meu, irmão do meu pai, ele que era igualzinho ela, aberto dos dois lado, só que ele nunca fez cirurgia né, então jamais, então quando ele foi falando que era genética dai eu fiquei raciocinando e lembrei.
F7: Eu acho que de amamenta, eu tinha muito medo de amamenta ela, na mamadeira mesmo.
F8:Alimentação.
F9:Foi mais a amamentação e ela tinha refluxo, tipo assim, as vezes eu acabava de dar mama eu ia ergue ela pra faze rota, ela já se lavava de lava, voltava muito, só que graças a Deus, dai junto com isso ela teve muita cólica, teve... também ela teve, era uma criança ressecada até acerta bem o leite, foi meio complicado.
F10: Na verdade nos primeiros dias foi na amamentação que dai ele não conseguia suga e dai a gente não sabia direito o que fazer sabe, que ele não suga, dai tipo, lá no hospital eles levavam a chuquinha do mama pra ele, dai ele não conseguia mama e ficava com fome, a gente não conseguia da de mama, dali a pouco ele tava chorando de fome sabe, então as dificuldades foi na amamentação, mais só bem no inicio assim, até a gente descobri.
F11:Nenhuma, ele mamo normal.
F12:Ai! Eu nessa parte não tive dificuldade não, a gente tava tanto esperando ele que a dificuldade nem impacto em nada. Assim no peito ele não pego, mais dai eu ordenhei bastante pra ele, dei bastante colostro do mama do peito pra ele até os três meses, depois acostumo com o NAN, ai não quis mais o leite do peito.
F13:Ai foi ama mais ele, só com a alimentação, fora, o resto eu cuidei muito bem dele.
F14:Porque quando ele nasceu foi direto pra UTI, ai tipo assim eu visitava ele só de meia em meia hora, então faz vinte e seis dias que eu to com ele, assim comigo entendeu, a dificuldade no começo que eu fiquei foio de amamenta por que eu demorava uma hora e meia pra da trinta ml de mama pra ele, ele cansava, dai teve um dia que quis engasga, a dificuldade maior mesmo foi na amamentação, agora ta suer bem, ele ta na chuquinha
F15: Com alimentação bastante, até achar o bico certo dele pegar né, foi difícil, bastante, até ele pegar no bico certo foi no copinho.
Para São Paulo (2010) e Rafacho, et al (2015), há uma constante preocupação tanto dos profissionais de saúde quanto dos familiares desde o nascimento, período pré e pós-operatório e na recuperação da criança. Os principais questionamentos incluem sobre os riscos de afogamento, posterior fala fanhosa, perda de peso, alimentação e dificuldades em encontrar o bico de mamadeira correto quando necessário.
A descoberta de uma deformidade em um filho elabora diferentes formas de lidar com o problema dependendo de como cada um enfrenta a noticia. As reações e sentimentos gerados são diversos, e as tendências são geradas conforme as percepções de vida, trazendo maiores ou menores dificuldades em aceitar a situação e planejar para um novo futuro, diferente do anteriormente idealizado ou qual se imaginava um filho perfeito.
O cuidado adequado a portadores de FL/P é essencial para uma melhor qualidade de vida a criança e seus familiares, garantido que essa cresça feliz e saudável.
Pode-se observar que os pais de crianças com FL/P encontram muita dificuldade em cuidados básicos, como aleitamento materno ou quando necessária alimentação artificial. Assim, podemos ressaltar a importância da equipe de saúde que é a responsável por realizar orientações pertinentes e sanar todas as duvidas dos cuidadores dessas crianças, para que a família possa passar com êxito pelas dificuldades encontradas ao longo desse processo.
Observou-se durante a pesquisa que muitos pais não receberam orientações importantes corretamente, dificultando e gerando mais insegurança no cuidado com a criança portadora de FL/P, sabendo que esse cuidado gera muito medo na maioria dos pais por ser um processo complexo e com inúmeras particularidades.
Com as orientações corretas o cuidado com a criança se torna mais fácil para a família, por esse motivo a equipe deve sempre se manter atualizada com as novas tecnologias, adaptando-se a novos recursos.
A pesquisa apresentou limitações importantes, uma vez que encontramos pouco material de referencia na literatura, denotando a importância de investigar o tema referido.
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1. Academica de Enfermagem na Faculdade Campo Real. E-mail: thyssa.10@hotmail.com
2. Docente da Faculdade Campo Real, Coordenador da Clínica Escola da Faculdade Campo Real – RealClin, Mestre pelo Programa de Pós Graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Comunitário - Unicentro
3. Docente do Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual do Centro-oeste (UNICENTRO), Mestre em Enferagem.