Vol. 38 (Nº 29) Año 2017. Pág. 19
LEANDRO, José Augusto 1; PEDROSO, Bruno 2; LOPES, Bruna Alves 3; SANTOS, Francieli Lunelli 4
Recibido: 11/01/2017 • Aprobado: 22/02/2017
RESUMO: Esta pesquisa objetiva apresentar um perfil da produção recente sobre a temática da deficiência, relacionada às políticas sociais, em Programas de Pós-Graduação stricto sensu no Brasil . O levantamento privilegiou teses e dissertações defendidas no país entre 2004 e 2014, com sistematização de informações a partir de coleta realizada na biblioteca digital do Instituto Brasileiro de Inovação, Ciência e Tecnologia (IBICT). Constatou-se, neste arco temporal, que a escolha do tema da deficiência teve um curso crescente em todo o período, especialmente a partir de 2010. Os estudos vêm sendo abordado por pesquisadores de múltiplas áreas do conhecimento e os trabalhos produzidos versam, especialmente, sobre temas relacionados à inclusão de pessoas com deficiência no âmbito educacional e no mercado de trabalho. Por fim, constatou-se um aspecto de gênero em relação às pesquisas com deficiência, uma vez que a temática tem sido trabalhada principalmente por mulheres. |
ABSTRACT: This research presents a profile of recent academic works concerning disabilities as they relate to social policies in the Masters and Doctorate programs in Brazil. The survey focused on theses and dissertations that were defended in Brazil between 2004 and 2014 and the systematization of information obtained from data collected in the digital library of the Brazilian Institute of Innovation, Science and Technology (IBICT). We found that the choice of disability as a subject increased throughout the period, especially from 2010 forward. Researchers from multiple areas of knowledge have performed the studies and the theses and dissertations produced focused particularly on issues related to the inclusion of people with disabilities in the education sector and the labor market. Finally, there was a gender aspect related to disability research: mainly women have studied it. Keywords: Disability. Social politics. Theses and dissertations. IBICT. |
A trajetória de luta, reivindicação e ampliação da cidadania das pessoas com deficiência no Brasil ampliou-se decorrer das décadas de 1970 e 1980. Processo que ocorreu tanto de forma individual ou por meio de ações coletivas e mobilizações, através dos movimentos sociais. Tal situação colaborou para dar a visibilidade às pessoas com deficiência e suas demandas em diversos espaços: na educação, na saúde, na formação profissional, no acesso ao mundo do trabalho, no lazer, nos espaços de cultura, entre outros.
Cabe ressaltar que a década de 1980 é marcada no Brasil pelo processo de redemocratização, após 21 anos marcados por um regime ditatorial. Neste decênio, observou-se a organização de diversos setores da sociedade civil no sentido de colocar em evidência questões e temáticas marginalizadas até aquele momento. As pessoas com deficiência surgem enquanto atores políticos, criticando os modelos caritativos imperantes e reivindicando o direito de falarem por si mesmos (LANNA JR., 2010). A principal pauta que emergiu, no período, dizia respeito à incorporação dos princípios de autonomia e cidadania para as pessoas com deficiência na nova Constituição que estava sendo desenhada a partir de 1987.
Na década de 1990, a pauta de luta foi voltada pela aplicabilidade dos direitos constitucionalmente conquistados. Buscava-se a implementação de não apenas do que preconizava o texto constitucional, mas também a implementação marcos legais e pactos internacionais[5], assinados pelo Brasil, como a Declaração de Salamanca, de 1994. Como conquistas na agenda pública, para além da década de 1990, pode-se citar a Lei de Acessibilidade (n. 10.098/2000), a Declaração Internacional de Montreal sobre Inclusão, de 2001, o Decreto nº 3.956 de 2001 (que teve por objetivo promulgar a Convenção Interamericana, visando eliminar todas as formas e ações discriminatórias contra pessoas com deficiência).
Os anos 2000 apresentaram fatos importantes em relação ao tema da deficiência. Em 2003, o Senador Paulo Paim propôs a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), demanda de diferentes movimentos sociais, que inspirou a criação do Estatuto da Pessoa Com Deficiência, sancionado em 2015. Entre a proposição da LBI e sanção do Estatuto houve, é perceptível a incorporação da temática da deficiência nos espaços de produção do conhecimento científico.
Com base em Pereira (2013) pode-se dizer que dentro das Ciências Humanas e Sociais os estudos sobre deficiência é um debate recente. Para Barnes et al. (2008), paulatinamente,
Over recent years there has been an unprecedented upsurge of interest in the general area of disability amongst social scientist in universities and colleges across the world […] This has been accompanied by an increasingly expansive literature from a variety of perspectives. Recent examples include cultural studies (Mitchell and Snyder 2001), development studies (Stone 1999), geography (Gleenson 1999), history (Longmore and Umansky, 2001), philosophy (Wendell 1996), social policy (Drake 1999), social psychology (Marks, 1999) and sociology (Barnes et al., 1999). Perhaps inevitably, with this heightened interest a number of important challenges and debates have emerged which raise a number of important questions for all those interested in this newly emergent and increasingly important field of enquiry (BARNES et al. 2008, p. 1).[6]
O presente artigo tem como proposta apresentar um perfil das pesquisas sobre deficiência e políticas sociais no Brasil, a partir de levantamento realizado na base de dados Instituto Brasileiro de Inovação, Ciência e Tecnologia (IBICT) entre 2004 e 2014, a partir de trabalhos que articularam o tema da deficiência com o tema políticas públicas sociais.
Considerando a viabilização da pesquisa, optou-se neste trabalho por realizar a coleta de dados utilizando a plataforma digital IBICT, na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). A justificativa para tal escolha deveu-se aos seguintes fatores: em consulta às principais bases de teses e dissertações nacionais, a busca por meio dos unitermos “deficiência e políticas sociais” em exame no período selecionado, comparativamente com o IBICT, retornaram um número inferior de resultados; em sua maioria as bases de teses e dissertações no Brasil são institucionais, acopladas a sites de diversos programas de pós-graduação e muitas não disponibilizam na íntegra todos os trabalhos defendidos. Assim, a pesquisa através da plataforma BDTB plataforma tornou-se uma alternativa considerada válida, já que
O IBICT hoje é referência em projetos voltados ao movimento do acesso livre ao conhecimento. Exemplo desse compromisso é a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), lançada em 2002, que utiliza as mais modernas tecnologias de arquivos abertos e integra sistemas de informação de teses e dissertações de instituições de ensino e pesquisa brasileiras. A BDTD possui um acervo de mais de 126 mil teses e dissertações de 90 instituições de ensino. Isso faz dela a maior biblioteca dessa natureza, no mundo, em número de registros de teses e dissertações de um só país. (INSTITUTO BRASILEIRO DE INOVAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA, 2016, p.1).
Para consecução dos objetivos desse artigo a coleta de dados privilegiou os seguintes indicadores: ano de defesa, título, autor, orientador, programa de pós-graduação e instituição. Adicionalmente, a partir da leitura dos resumos, construíram-se as categorias: tipo de deficiência estudada, enfoque temático, natureza da pesquisa e abordagem metodológica.
Como um estudo de levantamento de produção contemporânea sobre deficiência, esta pesquisa tem caráter quantitativo. Foram encontrados resultados para os descritores em Língua Portuguesa elencados na pesquisa - deficiência e políticas sociais - que resultaram em um total de 264 trabalhos. Foram excluídos 115 trabalhos que versavam sobre deficiência a partir de outras concepções semânticas, por exemplo, as expressões “deficiência de ferro”, “deficiência de iodo”, “deficiência de leitura” etc. Desta feita, a pesquisa concentrou-se nas 149 teses e dissertações que discorreram sobre o tema deficiência, conforme critério estabelecido nesta pesquisa. A coleta de dados na base IBICIT ocorreu no período de outubro de 2015 a março de 2016.
O primeiro dado que chama atenção diz respeito ao crescimento vertiginoso da produção do conhecimento relacionada à temática da deficiência. A produção de teses e dissertações cresceu de maneira exponencial no período entre 2004 a 2014, com 45 teses e 122 dissertações.
Tal crescimento não está descolado da criação de novos cursos de pós-graduação no Brasil, que dentro desse recorte temporal teve ampliação da oferta de cursos, bem como a quantidade de vagas para alunos de mestrado e doutorado. Segundo Alves e Oliveira, no Brasil,
em maio de 2004, havia 2.993 cursos de mestrado e doutorado, em 2014 este número saltou para 5.670, sendo 3.157 mestrados acadêmicos, 1.941 doutorados e 572 mestrados profissionais (ALVES; OLIVEIRA, 2014, p. 369).
Vale observar que alguns programas já existiam desde a década de 1970 como se percebe no Quadro 1.
Quadro 1 – Evolução das Pós-Graduações, 1976 e 2012.
Fonte: A expansão da pós-graduação no Brasil sob a lógica da intensificação do trabalho docente (FERREIRA, 2014, p. 5).
Contudo, grande parte dos programas stricto sensu foi criada ao longo da primeira década dos anos 2000. Assim, foram identificadas as seguintes teses e dissertações que contemplassem os descritores selecionados já apresentados:
Gráfico 1 – Quantidade de teses e dissertações produzidas entre 2004 a 2014
Fonte: Biblioteca Digital IBICT
A deficiência como tema transversal dos estudos não esteve restrita a determinadas áreas do conhecimento mais afeitas a esta discussão, como a Educação e o Serviço Social, embora o número de trabalhos defendidos nestas áreas seja superior às demais. Percebeu-se que o tema está sendo apropriado como objeto de estudo nas mais variadas áreas do conhecimento.
Na pesquisa aqui empreendida, os programas de pós-graduação foram identificados, dentre esses, 25 são em nível de doutorado, conforme a Tabela 1, a seguir:
CURSOS DE DOUTORADO |
Instituição |
Quantidade de produções |
Educação Especial |
UFSCAR |
7 |
Educação |
UFRS |
3 |
Educação |
UNESP |
3 |
Educação Física |
UNICAMP |
3 |
Educação |
UERJ |
2 |
Educação |
UFU |
2 |
Ciência da Informação |
UNB |
1 |
Ciências da Reabilitação |
USP |
1 |
Ciência Política |
UFRS |
1 |
Ciências Sociais |
UFRN |
1 |
Distúrbio do Desenvolvimento |
UPM |
1 |
Educação |
UFPB |
1 |
Educação |
UFMG |
1 |
Educação |
UFBA |
1 |
Educação |
UFRN |
1 |
Educação |
UNB |
1 |
Educação |
UFPE |
1 |
Educação |
UFAM |
1 |
Educação |
UNICAMP |
1 |
Educação Física |
UCB |
1 |
Engenharia de Produção |
UFPE |
1 |
Geografia |
UNESP |
1 |
Linguística |
UNB |
1 |
Políticas Públicas e Formação Humana |
UERJ |
1 |
UFG |
1 |
|
TOTAL |
25 |
|
Tabela 1 - Relação de Programas de Pós-graduação e instituições – teses
Fonte: IBICT/ pesquisa de campo
Já com relação aos cursos de mestrado foram identificadas 67 variações, conforme a Tabela 2:
CURSOS DE MESTRADO |
Instituição |
Quantidade de produções |
Educação Especial |
UFSCAR |
7 |
Educação |
UFMA |
6 |
Distúrbios do Desenvolvimento |
UPM |
5 |
Educação |
USP |
5 |
Educação |
UFPB |
4 |
Educação |
UFRGS |
4 |
Serviço Social |
UNESP |
3 |
Serviço Social |
PUC RJ |
3 |
Família na Sociedade Contemporânea |
UCA BA |
2 |
Política Social |
UNB |
2 |
Serviço Social |
UFRN |
2 |
Serviço Social |
UFPB |
2 |
Serviço Social |
PUC RS |
2 |
Terapia Ocupacional |
UFSCAR |
2 |
Administração de Empresas |
FGV |
1 |
Administração Pública |
Fundação João Pinheiro |
1 |
Análise do Comportamento |
UEL |
1 |
Arquitetura e Urbanismo |
UFRN |
1 |
Arquitetura e Urbanismo |
UFBA |
1 |
Arquitetura e Urbanismo |
UPM |
1 |
Ciência da Informação |
UFPB |
1 |
Ciências Sociais |
PUC RS |
1 |
Ciência Política |
UNB |
1 |
Comunicação |
UNESP |
1 |
Dança |
UFBA |
1 |
Direito |
PUC RJ |
1 |
Direito |
UFSE |
1 |
Direito |
UCA PE |
1 |
Educação |
UCB |
1 |
Educação |
PUC RS |
1 |
Educação |
UFSCAR |
1 |
Educação |
UFPE |
1 |
Educação |
UFSE |
1 |
Educação |
UFU |
1 |
Educação |
UFAM |
1 |
Educação |
UMSP |
1 |
Educação |
UFG |
1 |
Educação |
UNICAMP |
1 |
Educação |
UEL |
1 |
Educação |
UNB |
1 |
Educação |
UFBA |
1 |
Educação |
UNESP |
1 |
Políticas Públicas |
UFMA |
1 |
Sociedade e Cultura na Amazônia |
UFA |
1 |
Sociologia |
UNB |
1 |
Medicina |
USP |
1 |
Enfermagem |
USP |
1 |
Ciências Médicas |
UNICAMP |
1 |
Psicologia |
UFRN |
1 |
Psicologia |
UFPB |
1 |
Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem |
UNESP |
1 |
Saúde Coletiva |
UFFor |
1 |
Saúde Coletiva |
UERJ |
1 |
Saúde Coletiva |
UNICAMP |
1 |
Saúde Pública |
CPAMPE |
1 |
Ciências da Saúde (Bioética) |
UNB |
1 |
Letras |
PUC RS |
1 |
Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde |
UNB |
1 |
Ciências Jurídicas |
UFCG |
1 |
Arquitetura, Artes e Comunicação |
UNESP |
1 |
Geografia |
UFU |
1 |
Direito Constitucional |
UFFor |
1 |
História Social |
UFU |
1 |
Direito Político e Econômico |
UPM |
1 |
Memória Social e Bens Culturais |
UNILASALLE |
1 |
Biometria e Estatística Aplicada |
UFRPE |
1 |
Ciências da Motricidade |
UNESP |
1 |
Tabela 2 - Relação de Programas de Pós-graduação e instituições – dissertações
Fonte: IBICT/ pesquisa de campo
Quando observada a distribuição por região no Brasil, é possível afirmar que todas as regiões sem exceção estão representadas no mapeamento dos estudos sobre o tema da deficiência, embora a distribuição não ocorra de maneira equivalente.
Nos programas de pós-graduação em nível de doutorado, constatou-se a presença de apenas um trabalho defendido na região Norte, no estado do Amazonas. No Centro-oeste as pesquisas restringem-se ao Distrito Federal e ao estado de Goiás, com defesas em três universidades - Universidade de Brasília (UNB), Universidade Católica de Brasília (UCB) e Universidade Federal de Goiás (UFG). Na região Nordeste, seis trabalhos foram defendidos, sendo um na Bahia (UFBA), dois em Pernambuco (UFPE) e dois no Rio Grande do Norte (UFRN). A região Sul contou com dois trabalhos, ambos defendidos na UFRS.
A região sudeste foi a que mais se destacou em termos quantitativos e a temática da deficiência foi discutida em dez instituições, sendo seis delas paulistas, duas do Rio de Janeiro e duas de Minas Gerais. Além disso, o destaque da região se mantém quando observamos o número de trabalhos publicados - 16 teses ao todo, como pode ser verificado na Tabela 3:
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO |
IES |
REGIÃO/ESTADO |
Doutorado em Ciência da Informação |
UNB |
CENTRO-OESTE/ BRASÍLIA |
Doutorado em Ciência Política |
UFRS |
SUL/ RIO GRANDE DO SUL |
Doutorado em Ciências da Reabilitação |
USP |
SUDESTE/ SÃO PAULO |
Doutorado em Ciências Sociais |
UFRN |
NORDESTE/ RIO GRANDE DO NORTE |
Doutorado em Distúrbio do Desenvolvimento |
UPM |
SUDESTE/ SÃO PAULO |
Doutorado em Educação |
UERJ |
SUDESTE/ RIO DE JANEIRO |
Doutorado em Educação |
UFAM |
NORTE/ AMAZONAS |
Doutorado em Educação |
UFBA |
NORDESTE/ BAHIA |
Doutorado em Educação |
UFMG |
SUDESTE/ MINAS GERAIS |
Doutorado em Educação |
UFPB |
NORDESTE/ PERNAMBUCO |
Doutorado em Educação |
UFPE |
NORDESTE/ PERNAMBUCO |
Doutorado em Educação |
UFRN |
NORDESTE/ RIO GRANDE DO NORTE |
Doutorado em Educação |
UFRS |
SUL/ RIO GRANDE DO SUL |
Doutorado em Educação |
UFU |
SUDESTE/ MINAS GERAIS |
Doutorado em Educação |
UNB |
CENTRO-OESTE/ BRASÍLIA |
Doutorado em Educação |
UNESP |
SUDESTE/ SÃO PAULO |
Doutorado em Educação Especial |
UFSCAR |
SUDESTE/ SÃO PAULO |
Doutorado em Educação Física |
UCA |
CENTRO-OESTE/ BRASÍLIA |
Doutorado em Educação Física |
UNICAMP |
SUDESTE/ SÃO PAULO |
Doutorado em Engenharia de Produção |
UFPE |
NORDESTE/ PERNAMBUCO |
Doutorado em Geografia |
UNESP |
SUDESTE/ SÃO PAULO |
Doutorado em Linguística |
UNB |
CENTRO-OESTE/BRASÍLIA |
Doutorado em Políticas Públicas e Formação Humana |
UERJ |
SUDESTE/ RIO DE JANEIRO |
Tabela 3 - Programas de Pós-graduação por regiões brasileiras
Fonte: IBICT/ pesquisa de campo
A pesquisa indicou que o Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) concentra o maior número de teses defendidas; sete ao todo. De acordo com o histórico do Programa disponibilizado em sua homepage o programa funciona desde 1978 a nível de mestrado e desde 1999 a nível de doutorado. Ainda conforme o referido site,
O PPGEEs foi o primeiro Programa de Pós-Graduação em Educação Especial implantado no país, e desde então se constitui no único programa específico na área. Na atualidade existem vários outros programas de pós-graduação, particularmente na área de Educação, que constituíram eixos temáticos, núcleos ou linhas de pesquisas dedicados à Educação Especial (PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, s/d).
O enfoque específico do programa é condizente com o grande número de trabalhos defendidos na instituição.
Assim como nos programas de doutorado, observa-se que nos mestrados há maciça presença de estudantes vinculados à área de educação abordando a temática deficiência e políticas sociais. Neste caso, foram encontradas 39 dissertações defendidas em 11 anos. Entre os programas que mais apresentaram trabalhos estão o Programa de Pós-graduação em Educação Especial da UFSCAR (com sete dissertações) e o Programa de Mestrado em Educação da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), com seis trabalhos; e o Programa de Mestrado em Educação da Universidade de São Paulo (USP), com um total de cinco trabalhos.
Além dos programas de pós-graduação em educação, os programas em Serviço Social também têm produção significativa no campo da deficiência e políticas sociais. Ao todo, foram encontrados 12 trabalhos defendidos ao longo dos anos analisados. As duas instituições que apresentaram maior número de trabalhos foram a Universidade Estadual Paulista (UNESP) e a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).
No que diz respeito à autoria, é interessante ressaltar que quando analisamos o perfil dos 144 autores das teses e dissertações observamos que 110 foram produzidas por mulheres. Esta predominância feminina também se mantém para as orientações: em 101 casos a orientação foi realizada por docentes do sexo feminino.
Oito pesquisadores se destacam no trabalho de orientação na temática da deficiência, com mais de três orientações de teses e dissertações ao longo do período analisado.
Ao que diz respeito aos temas abordados nas teses e dissertações, pode-se observar que, das 149 teses e dissertações analisadas, 51 trabalhos apresentavam enquanto foco principal o tema da inclusão. Destes, 44 enfatizam a inclusão nos ambientes formais de ensino, principalmente a escola, havendo destaque para as discussões em torno da elaboração e efetivação das políticas públicas educacionais, práticas pedagógicas e relatos de casos e experiências, enquanto 14 relacionam a discussão inclusão e trabalho.
Certamente esta preocupação dos pesquisadores com a inclusão escolar está relacionada com o fato de que uma boa parte das pesquisas é de programas de pós-graduação de educação. Além desses temas surgiram, em menor quantidade, reflexões sobre acessibilidade, Benefício de Prestação Continuada de Assistência Social (BPC), direitos das pessoas com deficiência, família, entre outros.
Com relação à tipologia das deficiências, vale destacar que em 86 trabalhos o tema foi abordado de maneira ampla, sem maiores especificações (totalizando 57,7% dos trabalhos) optaram por apresentar a temática de maneira ampla, sem realizar maiores especificações, conforme pode ser verificado na Tabela 4:
Tipologia |
Quantidade de produções |
Não específico/geral |
86 |
Deficiência auditiva |
7 |
Autismo |
6 |
Deficiência Física |
8 |
Múltiplas deficiências (termo utilizado na pesquisa) |
1 |
Anemia falciforme |
1 |
Deficiência intelectual |
|
Deficiência mental |
|
Síndrome de Down |
3 |
Deficiência visual |
11 |
Deficiência visual / surdez |
2 |
Deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação |
1 (2012) |
Deficiência física e visual |
1 |
Deficiência física, auditiva, visual e intelectual |
1 |
Deficiência física, visual e auditiva |
2 |
Tabela 4 - Relação de tipos de deficiências pesquisadas nas teses e dissertações
Fonte: IBICT/ pesquisa de campo
Entre os trabalhos que enfocaram determinados tipos de deficiências, 11 discutiram a deficiência visual (7,38%), seguido da deficiência intelectual [10] com dez incidências (6,71%). Importante salientar que entre os trabalhos que discutem a deficiência intelectual, três se dedicaram à Síndrome de Down. A deficiência física foi tema de oito pesquisas (5,36%) e a deficiência auditiva em sete, representando 4,69% das teses e dissertações coletadas. Além destes temas, o autismo apareceu em seis trabalhos, o que significa 4,02% dos trabalhos. Em seis trabalhos, os pesquisadores optaram analisar múltiplas deficiências, representando cerca de 4,02% do total. Nos termos da LBI, quando o indivíduo possui dois ou mais tipos de deficiência.
No que diz respeito à forma de abordagem do problema, observou-se que a maioria significativa dos pesquisadores optou por um tratamento qualitativo dos dados em suas pesquisas. Entre os 149 de trabalhos analisados, 128 utilizaram a abordagem qualitativa, dez optaram em usar uma abordagem mista e somente dois utilizaram métodos quantitativos. Nove destes não apresentaram, em seus resumos, a metodologia quanto à abordagem do problema.
Ao que diz respeito às ferramentas adotadas para a viabilização das pesquisas, 35 trabalhos recorreram à análise documental — seja a análise de leis, resoluções, pesquisa bibliográfica, etc.— e ao uso de entrevistas (com 36 teses e dissertações) fossem elas semiestruturadas ou não; sendo os principais instrumentos de pesquisa utilizados nos trabalhos analisados.
O uso de questionários esteve presente em dez pesquisas; além disso, observou-se que em 17 trabalhos optou-se pelo uso de técnicas de pesquisa de campo como, por exemplo, a observação (sistemática ou participante). Entre os resumos que explicitaram a metodologia adotada observou-se a prevalência do Estudo de Caso (17), também sendo recorrente outras metodologias como, por exemplo, a História Oral e de Vida, a Pesquisa Exploratória e a Pesquisa Ação.
Tendo em vista o número de pessoas com deficiência no Brasil e a escassez de medidas oriundas de políticas públicas e sociais, pode-se afirmar que a LBI representa um marco significativo na história recente dos direitos das pessoas com deficiência no Brasil. Vale lembrar que durante muito tempo tais sujeitos foram invisíveis ou esquecidos pelo Estado. Assim, num longo período da história brasileira suas necessidades e demandas eram sanadas dentro do grupo familiar ou em instituições asilares.
Observou-se que ao longo do intervalo de tempo analisado houve um crescente interesse pela temática da deficiência em âmbito acadêmico, principalmente nos programas de pós-graduação vinculados à Educação e ao Serviço Social. Percebe-se que a produção de teses e dissertações no país, dentro da temática em exame, tem acompanhado a tendência crescente de áreas distintas que se apropriaram do tema, como já apontado anteriormente.
Ao que se refere aos programas de Educação, foi possível observar que alguns destes possuem uma linha específica para a discussão da temática, sendo importante ressaltar a existência de um programa pós-graduação, em nível de mestrado e doutorado, voltado exclusivamente para a Educação Especial.
Quando analisados os temas abordados, constatou-se que os trabalhos privilegiam em sua grande maioria a temática da inclusão, dialogando principalmente com as questões referentes à inclusão da pessoa com deficiência nas instituições educacionais e no mundo do trabalho formal. Além disso, constatou-se que os pesquisadores da temática da deficiência têm optado, em sua grande maioria, por abordar a temática em termos gerais, sem delimitar ou especificar num determinado tipo de deficiência. Tal fato trás aspectos positivos, principalmente por proporcionar a abertura do debate e apontar a importância de estudos acadêmicos acerca da temática, entretanto a abordagem não proporciona a visualização das especificidades apresentadas por cada tipo de deficiência.
Destaca-se ainda que, embora a importância da LBI seja notável, no decorrer da pesquisa não foi possível constatar nenhuma pesquisa que analisasse a trajetória da construção do Estatuto da Pessoa com Deficiência no período indicado.
Conclui-se que o tema da deficiência é transversal, pois aparece como objeto de pesquisa em uma gama variada de programas de pós-graduações brasileiras, perpassando também uma multiplicidade de abordagens. Há predominância de programas na área de Educação e Serviço Social. O que está vinculado ao fato de que os cursos têm uma grande representatividade feminina (seja através da autoria dos trabalhos, seja através das orientações), o que permite uma aproximação com a questão de gênero ligada ao aspecto do cuidado e da educação.
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1. Doutor em História pela UFSC. Professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa no Departamento de História e no Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais Aplicadas. Ponta Grossa, Paraná, Brasil. Email: joseaugustoleandro@gmail.com
2. Doutor em Educação Física pela UNICAMP. Professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa no Departamento de Educação Física e no Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais Aplicadas. Ponta Grossa, Paraná, Brasil. Email: prof.brunopedroso@gmail.com
3. Doutoranda em Ciências Sociais Aplicadas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. Licenciada em História. Email: bruna.hist.uepg@gmail.com
4. Doutoranda em Ciências Sociais Aplicadas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. Licenciada em História. Email: francieli.lunelli@gmail.com
5. Pode ser citada a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (1975) e o estabelecimento de 1981 como Ano Internacional da Pessoa Deficiente (BONFIM, 2010, p. 259).
6. Nos últimos anos têm havido um aumento sem precedentes de interesse na área geral de deficiência entre cientistas sociais nas universidades e faculdades em todo o mundo. [...] Este [aumento] tem sido acompanhado por uma literatura cada vez mais expansiva de uma variedade de perspectivas. Exemplos recentes incluem estudos culturais (Mitchell e Snyder, 2001), estudos de desenvolvimento (Stone, 1999), geografia (Gleenson 1999), história (Longmore e Umansky, 2001), filosofia (Wendell 1996), política social (Drake, 1999), psicologia social (Marks 1999) e sociologia (Barnes et al., 1999). Talvez inevitavelmente, com este interesse elevado uma série de desafios e debates importantes surgiram que levantam uma série de questões importantes para todos os interessados neste campo recentemente emergente e cada vez mais importante da investigação (Tradução livre. BARNES et al. 2008, p. 1).
7. A referida tese de doutoramento traduz a inquietação do pesquisador quanto à educação especial ensino de química, no trabalho intitulado “Saberes profissionais para o exercício da docência em química voltado à educação inclusiva”.
8. Sendo que uma das pesquisas trata especificamente de “Deficiência intelectual de jovens e adolescentes” (n. 40)
9. Termo usado apenas em dissertações defendidas nos anos 2007 e 2008. Posteriormente não houve registros de seu uso. O que pode significar a substituição por “Deficiência intelectual”.
10. Cabe salientar que no decorrer ao longo do processo de pesquisa encontrou-se 5 trabalhos que traziam a nomenclatura “deficiência mental”. Como o termo foi usado em dissertações publicadas ao longo de 2007 e 2008, os trabalhos de anos posteriores podem ter optado por adotar o termo deficiência intelectual.