ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 23) Año 2017. Pág. 38

Integração de fornecedores na indústria automobilística brasileira: uma abordagem de múltiplos casos

Integration of suppliers in the brazilian automotive industry: a multi-case approach

Hamilton POZO 1; Takeshy TACHIZAWA 2

Recibido: 13/10/2016 • Aprobado: 05/12/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Revisão bibliográfica

3. Método

4. Análise e Resultados

5. Conclusões

Referências


RESUMO:

O objetivo desta pesquisa é apresentar os fatores capazes de fortalecer a integração de fornecedores na cadeia de fornecimento do setor automotivo e contribuir para a construção de teoria da integração nesse setor brasileiro, identificando os fatores que facilitam e inibem a integração dos fornecedores no contexto da indústria automotiva nacional. É uma abordagem qualitativa com entrevistas estruturadas, visando à redução de vieses e facilitando a compreensão para coleta e a análise dos dados. Os resultados indicam que a liderança de fornecimento pelo lado do comprador é um antecedente importante para a construção de confiança, motivação e compromisso entre os fornecedores.
Palavras-chave: integração de fornecedores, relacionamento colaborativo, cadeia produtiva, setor automotivo.

ABSTRACT:

The objective of this research is to present the factors capable of strengthening the integration of suppliers in the supply chain of the automotive sector and contribute to the building integration of theory of this Brazilian sector, identifying the factors that facilitate and inhibit integration of suppliers in the industry context national automotive. It is a qualitative approach with structured interviews, in order to reduce bias and facilitating understanding for the collection and analysis of data. The results indicate that the leadership of supply by the buyer side is an important precedent for building confidence, motivation and commitment among suppliers.
Keywords: integration of suppliers, collaborative relationship, supply chain, automotive sector.

1. Introdução

Apesar do rápido crescimento da indústria automobilística brasileira, a capacidade de colaboração entre fornecedores domésticos ainda é limitada. Além da falta de competências básicas de gestão de processos (Eberhardt, da McLaren, Millington e Wilkinson, 2004), os problemas que podem ser encontrados estão precedidos de um antecedente histórico da potencialidade em pesquisas. Em consequência, os principais componentes ainda são projetados nas matrizes ou nos centros de excelência do setor automotivo mundial e, portanto, importados ou adquiridos de fornecedores globais.  A indústria automobilística, portanto, necessita de parceiros fortes, pois fica muito difícil para qualquer empresa possuir todas as competências técnicas e capacidades necessárias para desenvolver e produzir produtos complexos.

Esta pesquisa visa contribuir para a construção de um modelo teórico sobre a integração dos fornecedores das micro e pequenas empresa (MPEs) que compõem a cadeia de suprimento da indústria automotiva brasileira, utilizando dados recolhidos de múltiplos casos, empresas da região de Jundiaí-SP. Sendo assim, esta pesquisa responde como se caracteriza a integração da cadeia de fornecedores de peças automotivas as montadoras de veículos brasileiras, bem como as MPEs realizam suas compras de insumos e componentes e que papel a liderança dos compradores exerce sobre a integração dos fornecedores, indicando os pontos portes e onde deve ser observado como sendo oportunidade de melhoria, dentro deste contexto este modelo vem completando a lacuna existente na cadeia de fornecimento que pesquisas anteriores não abordaram.

O objetivo desta pesquisa é apresentar os fatores capazes de fortalecer a integração de fornecedores na cadeia de fornecimento do setor automotivo e contribuir para a construção de teoria da integração dos fornecedores nesse setor brasileiro, identificando os fatores que facilitam e inibem a integração dos fornecedores no contexto da indústria automobilística brasileira e contribuir para a construção de teoria da integração dos fornecedores do setor automotivo brasileiro por meio da análise de dados empíricos recolhidos a partir de uma série de casos exemplares.

Conforme Figueiredo et. al. (2003) que apresenta um novo conceito entre os estudiosos que a função de compra dentro de uma empresa deve ter um destaque estratégico visando uma gestão competitiva.  Encontrando-se as ações e as interações intrinsicamente unidas no cotidiano interno das empresas; que devem ser passíveis de pesquisa, e dessa forma, a escolha do tema deste projeto foi motivada com a pretensão da realização de uma busca capaz de elencar fatores que possam dificultar e facilitar a integração, dentro do universo dos fornecedores que atuam nos ambientes empresariais, mais especificamente nos ambientes internos às Micro e Pequenas Empresas.

E, com base em tais aspectos relevantes esta são tratados e levantando problemas voltados à questionamentos sobre quais seriam as caracterizações no tocante à integração da cadeia de fornecedores de peças automotivas às montadoras de veículos brasileiros e a forma como as micro e pequenas empresas realizam suas compras de insumos e componentes, levando-se em consideração o papel que a liderança dos compradores exerce sobre a integração dos fornecedores dentro desse contexto. A medida projetada trará como benefício uma minimização dos problemas, por intermédio do desenvolvimento de competências em pesquisa e dos fornecedores, consolidando-se assim, parcerias na rede de fornecimento, apresentando como finalidade primeira, a contribuição para a construção teórica de um modelo sobre a integração dos fornecedores no ramo automotivo brasileiro entre as MPEs, comparando-as com o modelo utilizado pelas grandes empresas fornecedoras do mesmo ramo, confrontando as técnicas aplicadas na indústria automobilística nacional, através da análise de dados empíricos colhidos a partir de uma série de entrevistas e aplicação de questionários, a fim de gerar um modelo global para esta cadeia de fornecimento.

Assim, o trabalho visa a responder às questões de investigação: Como a integração de fornecedores é caracterizada na indústria automotiva brasileira? Quais são os antecedentes para a integração dos fornecedores na indústria automotiva brasileira? Qual o papel da liderança para a integração dos fornecedores na indústria automotiva brasileira?

Neste contexto, o presente artigo tem como objetivo analisar por meio da caracterização do conteúdo da estratégia da cadeia de fornecimento nas empresas de autopeças, a busca pelo alinhamento estratégico que ocorre pela influência das montadoras em outros agentes da cadeia automotiva relativas aos fornecedores. Trata-se de um estudo multicasos realizado em vinte e duas empresas de autopeças do estado de São Paulo. A escolha pelo setor de autopeças se deu pela sua relevância na região em que a pesquisa se desenvolveu e pela grande importância também no cenário nacional.

2. Revisão bibliográfica

A integração da cadeia de fornecimento foi identificada como um meio eficaz para aumentar o desempenho operacional das indústrias manufatureiras (Malhotra, Saeed e Jayaram, 2008). Além disso, o grau de integração vertical entre empresas de manufatura é um decréscimo contínuo através da terceirização de processos de negócios (Quesada, Syamil, e Doll, 2006; Tiemann, Scholz, e Thies, 2000), também na indústria automobilística (Eisenbarth, 2003). Isto levou a uma crescente dependência de fornecedores (Wagner et al., 2008). Os fabricantes têm respondido a esta situação através da construção de relações mais colaborativas com seus fornecedores, por exemplo, fornecedores de primeiro nível assumir um crescente nível de responsabilidade de desenvolver e produzir componentes em vez de peças simples. (Holweg e Frits, 2008).

  Um novo paradigma evoluiu entre os estudiosos de várias posições, cuja função de compra de uma empresa em um cenário mais estratégico, enfatizou a importância da gestão e integração de fornecedores para a geração de vantagem competitiva (Möller e Törrönnen, 2003; Ballou, 2006). A complexidade das tarefas nas indústrias do setor automotivo para a divisão do trabalho permite sugerir a aplicação de conceitos de colaboração e de abordagens em uma rede de negócios (Tang e Qian, 2007; Vonderembse, Uppal, Huang, e Dismukes, 2006). Conforme apresentam Sukati et al. (2012), para alcançar uma vantagem competitiva e um melhor desempenho, a estratégia de gestão da cadeia de suprimentos necessita dar sustentação à estratégia de negócios. Entretanto Joshi et al. (2013), ressaltam que essa configuração pode conduzir a uma decisão gerencial não positiva se olhar sob a ótica de uma perspectiva individualizada, tomando como referencial somente a montadora. Alguns autores ressaltam a maneira como as decisões da montadora influenciam as decisões dos fornecedores, enquanto outros, como Choi et al.,(2012), analisam o processo de parceria fornecedores/montadoras adequados ao sistema da cadeia de suprimentos.

  Percebe-se que as relações entre montadora e fornecedor na indústria automotiva nacional têm trabalhado para exibir características mais próximas ao modelo cooperativo, muito bem praticado nos Estados Unidos e Europa, em estabelecer relações fortes de longo prazo e com relação e dependência mútua. Nesse sentido, Roh et al. (2014) apresentam que os resultados obtidos indicam que as integrações fornecedores/montadoras representam uma das características mais importantes da relação entre as estratégias cooperativa de clientes e fornecedores. Segundo os mesmos autores exemplificam que, em ambientes de negócios globais centrados no cliente, a estratégia de fornecimento tradicional, que preconiza tão somente o custo-eficiência e estabilidade, passam por novos desafios que necessitam e devem ser superados (ROH et al., 2014).

 Apoiado por uma vasta quantidade de provas de abordagens colaborativas pode resultar em um produto de melhor qualidade, com menor tempo de espera e uma maior capacidade de resposta da cadeia de suprimento, menor custo e maior satisfação dos clientes (Bennett e O'Kane, 2006; Humphreys, Huang, Caddena e McIvor, 2007).

 Por este meio, verificou-se também que a ordenação da cadeia de fornecimento reforça a necessidade de uma maior sincronização dos processos de planejamento e de produção (Holweg e Pil, 2007, Salvador, Forza e Rungtusanatham, 2002). Além também do planejamento de produção colaborativo (Bennett e O'Kane, 2006) o desenvolvimento colaborativo de produtos pode ser identificado como principal forma de melhorar o relacionamento colaborativo.

De um modo geral, para produção dos veículos automotivos, que requerem processos eficientes e produtos inovadores necessitam de processos reativos para que sempre consiga atender a demanda do cliente com segurança e atendendo ao equilíbrio da produção e o comakership que segundo Merli apud Martins e Laugeni (2006), mostra que à abordagem no relacionamento fornecedor/cliente evoluiu conforme a necessidade do cliente atingir com eficiência seu objetivo final.

Bowersox e Closs (2006) argumentam que combinada, o postponement de logística e o postponement de produção, é possível reduzir a natureza antecipatória dos negócios, entretanto é mister a cooperação e o compartilhamento de informações entre os membros constitutivos da cadeia de suprimento. Os dois tipos de postergação reduzem os riscos, mas de maneira diferente. O postponement de produção concentra-se na forma do produto, movendo itens inacabados para frente no sistema logístico para modificação antes da entrega.

A qualidade de serviço fornecido pelas montadoras de veículos automotores aos clientes tem sido uma variável de desempenho atualmente apontada como medida-chave de competitividade de uma companhia, Greenberg (2009). Pela clareza com que as funções em cada processo da cadeia são definidas, torna-se mais simples tomar decisões operacionais, principalmente àquelas voltadas à sincronização e ajuste fino entre operações internas. Na maioria das vezes, estes ajustes consistem em padronização de formatos de dados para uso nos sistemas de informação ou de procedimentos operacionais internos que visam à execução de tarefas de modo homogêneo (LAUDON, 2005). De acordo com Pozo, (2014) quando afirma que a estrutura da Cadeia de Suprimentos é um sistema composto de potenciais fornecedores, fabricantes, distribuidores, varejistas e consumidores. Estas unidades se conectam umas com as outras através de fluxos bidirecionais de materiais, financeiros e de informação.

Embora o gerenciamento da cadeia de suprimentos (GCS) tem sido estudado com relativa intensidade (Bowersox, 2006; Frohlich e Westbrook, 2001; Stank, Keller e Closs, 2001; Pozo, 2010) a investigação específica sobre GCS no setor automotivo brasileiro é de certo modo escasso. No entanto, a integração dos fornecedores e a colaboração na cadeia de suprimentos dentro da indústria automobilística têm sido amplamente investigadas não especificamente no ambiente americano no passado (Holweg e Pil, 2007), sendo apenas alguns autores sobre o assunto.

3. Método

As pesquisas sobre a integração e a colaboratividade dos fornecedores na indústria automobilística brasileira ainda estão em uma fase de desenvolvimento, exploratória, o que se manifesta pela grande quantidade de teoria da investigação construtiva (Eberhardt et al., 2004; Trent e Monczka, 2003). Embora haja certa quantidade de pesquisa sobre a gestão de compras no Brasil, há uma aparente lacuna na literatura existente sobre esses temas na indústria automobilística brasileira. A maioria dos estudos existentes versa sobre a metodologia de estudo de caso. Por essa razão, uma abordagem exploratória e indutiva baseada na grounded theory foi escolhida para este estudo (Glaser e Strauss, 2006).

 O projeto de pesquisa do presente trabalho é baseado em informações recolhidas por meio de relatos e entrevistas com dezenas de compradores e com profissionais da área de qualidade e da cadeia de fornecimento durante um período de tempo próximo a dois anos, realizado entre março/2014 a novembro/2015. Como a validade e a confiabilidade dos quadros desenvolvidos com base em estudos empíricos realizados nos Estados Unidos e Europa não podem ser tomadas como fator de igualdade (Hoskisson, Eden, Lau e Wright, 2000; Wright, Filatotchev, Hoskisson e Peng, 2005), combinado com a falta total do conhecimento, neste contexto específico de investigação, uma abordagem exploratória, sem suposições prévias ou proposições foi escolhida. Além disso, a fim de fornecer um alto nível de exatidão e confiabilidade do estudo empírico, fontes primárias foram utilizadas, principalmente, para analisar as questões da pesquisa. A fim de permitir a triangulação dos dados dos questionários auxiliares e dos dados existentes, estes também foram utilizados (Yin, 2003).

3.1. Amostragem

Como o objetivo da pesquisa é captar as circunstâncias e as condições de uma situação cotidiana e normal, um processo representativo de estudo de caso que implica em uma abordagem holística e um estudo de caso múltiplo foi projetado (Yin, 2003). A razão principal foi ganhar a introspecção nas experiências dos profissionais diretamente envolvidos no processo de compras e de terceirização. Como o objetivo do estudo foi construir a teoria, e não a validação da teoria, um método de amostragem teórica foi implantado.
Como primeiro passo, uma lista de montadoras e de fornecedores de primeira linha no setor automotivo, sediado no Estado de São Paulo, foi criada. A fim de esclarecer quais os fatores que potencialmente influenciam a integração dos fornecedores, introduziu-se um número de variáveis discriminativas. Em primeiro lugar, o país de origem da empresa fornecedora foi considerado, uma vez que certos fatores como cultura nacional, têm-se revelado influente sobre a eficácia da liderança (Javidan, Dorfman, de Luque e House, 2006), nas negociações da forma como são realizadas e como as relações interpessoais são construídas e alimentadas (Zhao et al., 2007).

Em segundo lugar, os requisitos de produto e o processo como elemento capaz de afetar fortemente a capacidade de adquirir insumos no mercado fornecedor local e criado uma diferenciação entre a primeira e segunda linha de fornecedores foi feita.  Em terceiro lugar, a diferenciação entre fornecedores de produtos originais fornecedores qualificados e não qualificados (de segunda linha).

Foi elaborado um protocolo de pesquisa para melhor interpretar os resultados obtidos por meio das entrevistas, utilizou-se como fonte de evidência também a observação direta, realizada em visitas ao ambiente de produção das empresas estudadas, conforme Quadro 1, abaixo.

CONTEXTO

FATOR

DESCRIÇÃO             

ENTREVISTADO

Decisão de compras

MONT

Competência de decisão, Conhecimento técnico,

GC; GQ

Desenvolvimento do Produto

MONT FORN

Parceria em desenvolver projetos, competência intelectual, Influência dos parceiros

GC; GQ; GE; DE

Recursos Humanos

FORN

Treinamento, Rotatividade, Escolaridade, Especialização

DE; GQ; DE

Relacionamento empresarial

MONT

FORN

Planejamento, Sistema de PCP, Estoques, Ressuprimento

GC; GQ; GE; DE

Qualidade

MONT

FORN

Métodos e técnicas de certificação,

Auditorias, Discrepâncias

GC; GQ; DE

Quadro 1. Protocolo de pesquisa
Fonte. Autores
Dados: MONT = Montadora; FORN = Fornecedor; GC = Gerente de Compras;
GQ = Gerente de Qualidade; GE = Gerente de Engenharia; DE = Dono da Empresa.

O resultado obtido dos dados da amostra teórica, composto de vinte e duas empresas apresentado na Tabela 1, abaixo.

Tabela 1. Descrição da amostra empírica das empresas

Tipo de

País de

Faturamento

Atuação

Localização

Entrevistado

Empresa

Origem

USD/anual

Mercado

Estado

1

PO

USA

188 M

PO/MR

SP

GC

2

PO

USA

135 M

PO/MR

SP

GQ

3

PO

RDA

110 M

PO/MR

SP

GC/GQ

4

PO

RDA

75 M

PO/MR

SP

     GQ/GE

5

PO

FR

105 M

PO/MR

SP

     GC/GQ

6

PO

IT

70 M

PO/MR

SP

     GC/GQ

7

PO

BR

65 M

PO/MR

SP

     GC/GE

8

PO

BR

45 M

PO/MR

SP

GC

9

FQ

BR

77 M

PO/MR

SP

GC

10

FQ

BR

43 M

PO/MR

SP

      GC/GQ

11

FQ

BR

35 M

MR

SP

     GC/GQ

12

FQ

BR

35 M

MR

SP

GC

13

FQ

BR

30 M

MR

SP

      GC/GE

14

FQ

BR

26 M

MR

SP

GC

15

FQ

BR

22 M

MR

SP

GC

16

F2L

BR

31 M

M2L

SP

GC

17

F2L

BR

25 M

M2L

SP

GQ

18

F2L

BR

15 M

M2L

SP

        GC/GE

19

F2L

BR

9 M

M2L

SP

GC

21

F2L

BR

8 M

M2L

SP

DE

22

F2L

BR

5 M

M2L

SP

DE

Fonte. Dados da pesquisa
Dados: PO = Produto Original; FQ = Fornecedor Qualificado; F2L = Fornecedor de segunda linha;
MR = Mercado de Reposição; M2L = Mercado de Segunda Linha; GC = Gerente de Compras;
GQ = Gerente de Qualidade; GE = Gerente de Engenharia; DE = Dono da Empresa.

3.2. Coleta de Dados

 Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas, a fim de se obter certo grau de comparação, o que assegura um fluxo continuo de informações (Bryman, 2004). Os entrevistados envolvidos no estudo (30 pessoas) são compradores, gestores de qualidade e gestores da cadeia de suprimentos. Cada entrevista durou em média uma hora e meia. Cada entrevista foi conduzida pessoalmente e gravada (a não ser que o entrevistado não aprovasse) e finalmente transcrita. As entrevistas foram realizadas, de forma sequencial, até um estado de saturação de informações (Glaser e Strauss, 2006), resultando em um total de 22 entrevistas com empresas do setor automotivo, que é considerado um número razoável quando o fenômeno de interesse é claramente observável.

Após o término de cada entrevista, as gravações de voz foram transcritas em um formato de texto, resultando em 477 páginas. A fim de garantir a validade, quatro técnicas propostas por Maxwell (2006) foram implantadas. Em primeiro lugar, foram feitas as transcrições literais de cada entrevista, o que permitiu criar várias explicações sobre as questões. Em segundo lugar, os casos discrepantes foram analisados de modo a ter em consideração as teorias que se rivalizam. Em terceiro lugar, os entrevistados foram convidados a dar realimentação sobre os resultados das análises para verificar a adequação das conclusões feitas. Finalmente, os resultados foram comparados com estudos similares existentes para reforçar ainda mais a adequação de conceitos e relações causais.

Os dados coletados foram então importados para uma ferramenta de análise qualitativa, o software QSR NVivo 7,0. A análise individual foi realizada de acordo com a abordagem hierarquizada que envolve a codificação aberta, codificação axial e seletiva (Corbin e Strauss, 1990). Na etapa de codificação aberta, a transcrição da entrevista foi analisada linha por linha com intersecção de dados em partes discretas (isto é, palavras, frases e parágrafos), tendo 953 códigos inicialmente. Sete categorias analíticas e nove relações causais surgiram depois de condensação e agregação dos códigos inicial. A visão geral dessas categorias e de suas relações está descrita a seguir na Tabela 2.

Tabela 2 Ocorrências dos constructos conceituais e suas interrelações    

        Item

Categoria conceitual

1

2

23

44

55

66

77

   1

Integração dos fornecedores

  CC

 

RC  

   2

Competência colaborativa dos fornecedores

  RC 

CC

 

 

 

 

 

   3

Presteza na colaboração dos fornecedores

 

RC

CC

 

 

 

 

   4

Liderança em compras

 

 

RC 

CC

 

 

 

   5

Restrições internas

 

RN 

 

PM 

CC

 

 

   6

Desenvolvimento contínuo dos fornecedores

 

PM 

 

 

 

CC

 

   7

Fator cultural

 

 

 

     RN 

RN 

 

CC

Fonte. Dados da pesquisa
Dados: CC = Categoria conceitual (construto); RC = Relacionamento Colaborativo;
RN = Relacionamento  negativo; PM = Posicionamento Moderado

4. Análise e Resultados

A primeira base de informação que se obteve a partir da análise das entrevistas foi a integração do fornecedor na cadeia de suprimentos. O conceito geral acabou por ser semelhante à definição que se encontra na literatura, em que os compradores de produtos originais, os fornecedores qualificados, os fornecedores secundários e os seus fornecedores trabalham para melhorar o desempenho desta cadeia por meio de atividades conjuntas, como intercâmbio de informações, aumento da transparência dos dados, planejamento de produção etc. (Malhotra, 2008, Zhao et al. 2007).

Esta é a primeira dimensão do GCS para construir e envolver o planejamento e execução de uma cadeia de fornecimento que se integre com o plano mestre de produção (Pibernik e Sucky, 2006). Além disso, ele contém um plano táctico e um plano de curto prazo para as atividades necessárias a fim de garantir a oportuna entrega de materiais diretos de produção, tais como o desenvolvimento e a partilha dos planos diretores de produção, ou níveis de inventário e de soluções possíveis sobre atrasos que possam ocorrer na entrega dos pedidos. Estas atividades necessárias à existência e à transparência das informações precisas no GCS são relevantes no processo de planejamento dentro das empresas e da troca sincronizada entre escalões da cadeia de fornecimento.

Também, revelou-se que a logística e conceitos avançados da cadeia de fornecimento, tais como just-in-time (JIT), estoques gerenciados (WMS- Warehouse Management System), respostas eficientes aos consumidores (ECR) etc., foram possíveis em apenas alguns casos. Contínuo processo de melhoria foi implementado, em mais da metade dos fornecedores nacionais.

Com relação ao processo de desenvolvimento de produto em conjunto, esta dimensão da categoria da integração dos fornecedores demonstrou envolver atividades de colaboração entre os fornecedores originais e as montadoras. Isto ocorre quando necessário para desenvolver novos modelos de carros para o mercado com o menor custo e o mais rápido possível.  O envolvimento antecipado do fornecedor (ESI) e a análise de valor (VA) foram as principais atividades percebidas nesta categoria. A real atividade mostrada no processo de desenvolvimento conjunto de produtos caracterizou-se por três níveis distintos, a saber:

A análise mostrou que a real atividade no processo de desenvolvimento conjunto do produto ocorreu em apenas quatro das vinte e duas empresas analisadas. Na maioria dos casos, o lado do comprador tomou as iniciativas e a grande responsabilidade de envolver fornecedores em atividades de desenvolvimento de produto. Os fornecedores nacionais mostraram ser mais reativo do que pró-ativo neste processo. Porém, as empresas multinacionais do setor têm maior capacidade de desenvolver conjuntamente produtos e são comparados aos padrões internacionais, seguindo os preceitos da matriz. Entretanto, não em muitos casos. Um gerente de compra expressa o desafio de encontrar nos fornecedores capacidade em Informação e Desenvolvimento (I&D): Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) ainda é um ponto fraco nos nossos fornecedores. Falta capacidade para integração e desenvolvimento em conjunto (SE). Sua capacidade é em processos internos. Por essas razões, a maioria das empresas automotivas estrangeiras desenvolve a maioria das tecnologias de base dos seus produtos em seus países de origem.

Com relação a TI, a pesquisa mostrou que a dimensão de integração dos fornecedores ocorre em uma base quase diária pela comunicação entre compradores e fornecedores. As empresas automotivas nos Estados Unidos e na Europa dependem de um elevado nível de intercâmbio eletrônico para troca de informações entre compradores e fornecedores através da utilização de portais de fornecedores em linha, ferramentas de e-sourcing, EDI, etc. Na indústria automotiva nacional, esta troca de informações encontra-se em um nível mais básico, com uso frequente do telefone, fax e e-mail, conforme declaração de um dos entrevistados:

- Principalmente eu acho que é a telefone o mais prático e confiável. Pego o telefone e falo com os fornecedores. Outro bom elemento é o e-mail. E-mail de comunicação é outra maneira prática de comunicação e às vezes também usamos fax.

A falta de conhecimento e de experiências entre os fornecedores nacionais e ainda, a pouca confiabilidade e o baixo desempenho das infraestruturas de TI contribuíram para os atuais padrões de comunicação. Portanto, as tecnologias de comunicação e infraestrutura que deveriam estar em prática também revelaram diferenças significativas em relação aos países desenvolvidos. Globalmente, o uso de tecnologias de comunicação (TI) padronizadas mostrou-se muito baixo, conforme explicado por um entrevistado:

- Nós não usamos o EDI tipo de tecnologia, porque os fornecedores não têm estas tecnologias implantadas, ou raramente as têm. Temos investido em tecnologia de TI, mas alguns fornecedores têm problemas com o elevado investimento. Eles querem entender plenamente o sistema para saber se eles são competentes o suficiente para usá-lo.

Além disso, a troca de dados em termos de respostas correspondentes,
especificações, desenhos, etc., ou foram transferidos via Internet, através do File Transfer Protocol (FTP), ou simplesmente em um CD enviado por correio convencional.   

 A dimensão da integração fornecedora com relação ao planejamento estratégico (PE) envolveu todos os tipos de planejamento de longo prazo como a capacidade, a demanda ou planejamento de produto, bem como a partilha de idéias novas e alinhamento de objetivos de longo prazo. Com base na análise, o fator decisivo é a maturidade do relacionamento do comprador-fornecedor. As montadoras que fizeram negócios com fornecedores domésticos por um longo período também tenderam a envolvê-los com mais frequência em planejamento em longo prazo (PE).

 No entanto, ficou evidente que o parceiro mais forte da cadeia de suprimentos (o comprador estrangeiro) geralmente impõe as atividades principais, conforme explicou um entrevistado:

- Nós ditamos as decisões para os fornecedores. Então, é formada uma equipe de trabalho para implementar as decisões. Finalmente, temos uma realimentação por parte do fornecedor para ver se é preciso modificar as nossas decisões estratégicas.

No constructo da integração organizacional, a dimensão que envolveu todos os tipos de investimentos conjuntos (financeiros e não financeiros) em infraestrutura comum (física e não física) mostrou que este tipo de integração parece servir como alicerce para atividades de integração de outros fornecedores. De acordo com os resultados obtidos, as principais atividades incluíram o desenvolvimento de processos e a melhoria contínua, a fim de aperfeiçoar a interface organizacional entre o comprador e o fornecedor.       

Outra atividade importante que foi identificada: Programas de Desenvolvimento de Fornecedores (PDF), em que equipes multifuncionais compostas por compradores, especialistas em logística, qualidade de engenheiros e gerentes de produção Engenharia Simultânea (ES) foram enviados para uma empresa fornecedora para melhorar os processos de produção e o nível do pessoal operacional, como também, o nível gerencial. Também foi revelado que a maioria dos compradores tem algum tipo de plano de contingência em paralelo como parte do contrato com um fornecedor, em caso de imprevistos ou problemas que possam ocorrer. Poucas empresas possuem sistemas de avaliação explícita dos seus fornecedores. Um entrevistado resumiu da seguinte forma:

- Para fazer negócios conosco, eu quero que o fornecedor seja muito animado sobre seu negócio [...] em primeiro lugar, têm que ter experiência e crescimento em seus negócios que possa atrair ainda mais clientes. Em segundo lugar, tem que obter um lucro muito razoável.   

Portanto, pode-se concluir que a maioria dos compradores busca uma atitude cooperativista em relação aos seus principais fornecedores. No entanto, existem muitos comportamentos contraditórios em que as informações assimétricas desempenham um papel importante, o que torna muito difícil uma integração total.

4.1. Capacidade colaborativa dos fornecedores

Após examinar o conceito de integração do fornecedor dentro da indústria automobilística, os entrevistados foram convidados a apresentar quais eram os fatores que facilitavam essa integração e transformá-los em uma unidade confiável de fornecedores. Constatou-se que o elemento-chave por trás das medidas em que os sistemas de informações (TI) podem ter lugar preponderante depende de um conjunto de atividades e da competência dos fornecedores em se interagem no processo colaborativo entre o comprador e o fornecedor. As competências de colaboração dos fornecedores apontados como as mais críticas para facilitar essa integração foram: as de processo e as de gerenciamento de desempenho, as de comunicação, as de soluções problemas autônomos, as de planejamento, bem como as de engenharia e de inovação.

 A competência na gestão de processos, a primeira dimensão do processo colaborativo mostrou ser um dos mais importantes fatores, conforme foi expresso pela maioria dos entrevistados, o que permitirá aos produtores efetivamente atingir altos níveis de qualidade e de produtividade, e também, posteriormente, altos níveis de custo. Segundo os entrevistados, esse recurso deve ser basicamente mostrado em qualquer atividade do fornecimento, desenvolvimento, produção e do processo de entrega. Consequentemente, o processo de confiabilidade parece ser um pré-requisito para a integração dos fornecedores na indústria automotiva. Um gerente de compras de um fornecedor europeu de primeira linha fez a seguinte declaração:  

- Você tem os melhores custos e melhor qualidade de um processo estável. Não importa se é uma gestão de negócio ou processo de fabricação.  

Desempenho da competência de gestão. Outro elemento importante no direcionamento das informações destacado em nove empresas foi a dificuldade frequente de cumprimento do programa de produção e no desempenho de entrega (Kaplan & Norton, 1992). Apesar de uma grande predisponibilidade para aprender, verificado em onze empresas, e de investimento em atividades de melhoria operacional, a falta de metas, a falta de indicadores de desempenho e a falta de planos de ação conduzem a resultados instáveis e, gradualmente, afastam-se de níveis pré-definidos.   

Outros fatores apontados para esse fenômeno foram as altas taxas de rotatividade de pessoal, a falta de aprendizagem organizacional e a falta de realimentação.
A dificuldade de comunicação foi um dos elementos chave no processo de interligações e de diálogos eficazes com os fornecedores. Este foi o fator importante, especialmente em relação à identificação de problemas, em que a maioria dos fornecedores – dezoito das vinte e duas empresas - indicou este recurso de importância fundamental como fator inibidor para a integração dos fornecedores. Em geral, esse problema levou a situações em que os compradores tiveram de gastar recursos consideráveis no processo de controle e de fiscalização dos fornecedores em uma base contínua de ação, a fim de eliminá-lo de antemão. Como um gerente de compras declarou:

- Muitas vezes em face à harmonia social não agimos em relação ao pensamento racional para que os problemas sejam solucionados e, assim não os deixamos debaixo do tapete, em vez de solucioná-los rapidamente.

A capacidade de planejamento, parcialmente interligado com a competência de gestão de processos, faz com que o planejamento dentro de uma empresa e entre empresas fosse apontado como um pré-requisito para gerenciar os processos em toda a cadeia de fornecimento, de forma confiável e estável (indicada em treze das vinte e duas empresas). Muitos dos fornecedores afirmaram que a falta de experiência na produção colaborativa e engenharia simultânea como exemplificado por um entrevistado:

- Planejamento é fundamental. Você não pode atrasar planos de projeto sem metas planificadas são muitas vezes elementos geradores de problemas e tem que ser resolvido aleatoriamente.

Evidentemente, as informações precisas e relevantes de um planejamento sobre as ordens, inventários, capacidades, etc., eram frequentemente relatados como razões de atrasos e faltas de recursos. Na maioria dos casos, por falta de um sistema de informação com uma abordagem sistemática foram apresentados como possíveis razões para essa situação.

Engenharia simultânea e competência de inovação. Esta capacidade foi enfatizada como um dos principais condutores para implementar parcerias estratégicas com fornecedores em treze das vinte e duas empresas. Apesar de um elevado grau de abertura e vontade de aprender e desenvolver o nível de inovações, provenientes de parcerias entre os fornecedores domésticos ainda assim provou ser muito baixa essa integração. Os resultados da pesquisa não revelaram um único caso em que o desenvolvimento de um único produto genuíno tenha ocorrido. Os poucos casos em que as atividades de P&D conjunta aconteceram acabou por limitar-se a modificações de produtos, principalmente sobre a iniciativa e orientação do comprador. Como a maioria dos entrevistados indicou, a capacidade de desenvolver um componente com base nos requisitos funcionais como um pré-requisito para a integração do fornecedor mostrou-se um nível de dificuldade muito grande e aparente. A capacidade de inovação em consonância com a descoberta, conforme Möller e Törrönnen (2003), elemento esse que foi constatado em somente duas das empresas pesquisadas: quando o fornecedor prova ser um líder pró-ativo de novos produtos e inovações de processo para seus clientes.

Com a discussão acima em mente, fica evidente que a integração dos fornecedores no setor automotivo exige certo conjunto de competências inovadoras. Isto leva, portanto, a levantar cinco proposições:

Proposição 1. O nível agregado de competência colaborativa de fornecedores tem um impacto positivo na integração dos fornecedores.

Na sequência da discussão sobre a importância e o impacto da competência colaborativa no processo de integração de fornecedores, uma próxima pergunta e importante é, na verdade, tais como as competências dos fornecedores podem ser desenvolvidas e mantidas. Assim, pedimos aos entrevistados na elaboração das perguntas sobre as características dos fornecedores com os quais as atividades colaborativas foram estabelecidas com sucesso. Na análise dos dados revelaram-se as seguintes dimensões:

Dimensão 1: Mentalidade em qualidade e orientação ao cliente. Nos casos em que o binômio comprador-fornecedor foi bem-sucedido em integração, ficou evidente que uma mentalidade voltada para a qualidade e direcionada para o cliente conduziu a estratégia em todos os níveis. Exemplos de tais valores e crenças foram constatados com relação à importância da qualidade, à tolerância zero para os defeitos, à melhoria contínua e a um reconhecimento da importância do cliente para o negócio. Como explicou um entrevistado:

- Em nosso negócio a qualidade é fundamental. Se não conseguirmos entregar alta qualidade estaremos fora. A qualidade nunca deve ser comprometida. Nosso desafio é convencer os nossos fornecedores para prestar atenção detalhes e foco no cliente final.

 Segundo os dados obtidos, parece ser difícil construir e nutrir o mesmo tipo de pensamento por toda a organização a não ser se for fortemente apoiado pela alta direção. Juntos, esses valores e crenças podem ser resumidos como mentalidade de gestão da alta cúpula:  

- Até certo ponto, eles [dirigentes] vão ouvir você. E objetivando o benefício imediato que irá fazer isso. Porém, é em longo prazo que você realmente tem que mudar a mentalidade da alta administração dos fornecedores. [...] E qualquer alteração de mentalidade tem que vir de cima para baixo.

Dimensão 2: Alinhamento estratégico. Os resultados também mostraram que aqueles fornecedores que estavam envolvidos em bem-sucedidos projetos de colaboração com os seus clientes também foram altamente motivados. Esta motivação manifesta-se de várias maneiras, primeiro, os fornecedores altamente motivados acabaram por ter uma grande disponibilidade para acompanhar as mudanças e as adaptações necessárias à sua estratégia, processos e organização a fim de tornar os seus clientes uma forte relação de trabalho. Estes fornecedores, em particular os seus dirigentes, parecem ter decidido que o relacionamento com o cliente fora benéfico para suas empresas e, portanto, começaram a alinhar as operações de suas empresas em conformidade a isso.

Um paralelo importante como orientação estratégica para a vontade de aprender e de melhorar, entre o sucesso do fornecimento colaborativo e as relações comprador e fornecedores. A vontade de aprender e de melhorar também pareciam ser conjugadas com a mentalidade do fornecedor, no sentido de que os fornecedores devem ter reconhecido a necessidade de melhorar o desempenho, a fim de investir tempo e dinheiro em treinamento e em atividades de melhoria contínua. Um dos entrevistados se posicionou da seguinte forma:

- O relacionamento com o fornecedor irá durar enquanto o fornecedor puder aprender algo com isso.

Este fenômeno impõe uma exigência para a organização do setor de compras para maior apoio na formação, transferência de tecnologia e comunicação de visões entre as partes. O desenvolvimento de produto na indústria automobilística é um processo demorado e caro. Assim, não é nenhuma surpresa que também fornecedores integrados tenham adotado uma visão de longo prazo onde hoje as despesas foram percebidas como investimento em benefícios futuros, conforme aponta um entrevistado:

- Primeiro de tudo, é importante que o fornecedor tenha um produto, que é importante para nós no futuro. [...]em segundo lugar, é importante que o fornecedor esteja disposto a investir e acompanhar-nos em diferentes regiões onde temos negócios.

Este fato revelou-se um dos problemas mais comuns quando se trata de fornecedores domésticos. Eles tendem a priorizar o lucro de curto prazo sobre os objetivos de longo prazo
como a expansão no exterior, liderança em tecnologia, excelência no serviço ao cliente e excelência em qualidade.

A confiabilidade nas relações comprador-fornecedorécaracterizada por um elevado grau de integração dos fornecedores. Os dados mostram um alto nível de confiança por parte do fornecedor. Em contraste, nos casos em que o nível de confiança dos fornecedores foi baixo, eles não estavam dispostos a assumir o risco financeiro implícito de se envolver em novos projetos de desenvolvimento do setor automotivo, ou investimentos em novos equipamentos e máquinas e, principalmente, em atividades de treinamento de pessoal. Sem apoio da alta gerência na vontade de aprender e melhorar, na orientação estratégica correta e na confiança de uma relação não oportunistas, não é possível desenvolver e manter as competências necessárias para a integração dos fornecedores.

Proposição 2. A presteza de colaboração dos fornecedores tem um impacto positivo sobre o nível de competência colaborativa dos fornecedores.

Outro aspecto que emergiu da codificação das entrevistas transcritas foi o papel de liderança de compras. A maioria das pesquisas recentes sobre lideranças tem se concentrado em capacidade de influenciar um grupo de pessoas para atingir um objetivo comum, dentro da própria organização (Northouse, 1997, p.3), por força do poder e da autoridade formal. A análise dos dados deste estudo indica que a liderança poderia, de fato, atravessar também as fronteiras da empresa.

 Em um nível agregado, um número de fatores pôde ser identificado entre os entrevistados, líderes envolvidos em projetos colaborativos. Primeiro, eles pareciam ter uma atitude positiva para o seu trabalho em geral e em segundo lugar, eles mostraram uma forte crença de que realmente eram capazes de influenciar os seus fornecedores e fazê-los seguir. Em terceiro lugar, a maioria dos entrevistados que conduziu essas iniciativas, também, teve uma atitude positiva perante o seu trabalho, apesar das frequentes declarações sobre a necessidade de trabalhar simultaneamente, tanto a nível estratégico e operacional.

Os dados empíricos também sugerem que existe um conjunto de comportamentos relacionados à liderança. O aspecto relevante no estudo mostrou ser o comportamento de liderança um fator importante para o conjunto de fornecedores. Quase todos os tomadores de decisão de compra das organizações envolvidas em atividades colaborativas com os fornecedores tendem a aplicar uma espécie de estilo de liderança situacional, dependendo do ambiente de relacionamento e da urgência da questão: Descobriu-se que os líderes que supostamente tinha conseguido facilitar um elevado grau de disponibilidade de colaboração entre os fornecedores tinham tido uma abordagem sistemática. Eles não apenas focalizaram seus esforços em uma função, mas sim como alvo à alta gerência dos seus fornecedores e trabalharam ativamente em um nível muito pessoal para convencer os gestores a participar dos novos valores e crenças, em fazer adaptações estratégicas, a trabalhar para investimentos em novas máquinas e equipamentos etc., de acordo com a orientação estratégica da sua própria empresa.

Proposição 3. A eficácia da liderança do comprador tem um impacto positivo sobre a presteza de um fornecedor.

Outro construto que surgiu durante a codificação axial dos dados da entrevista foi o do contínuo desenvolvimento do fornecedor. Conceitualmente, esse construto envolve atividades da organização relevantes para o fornecedor nos mais diversos níveis, a saber: Failure Mode and Effect Analysis (FMEA), Just In time (JIT), Total Quality management (TQM), etc., atividades para controlar e avaliar as instalações do fornecedor.  O fato de o desenvolvimento de fornecedores serem uma prática comum e reconhecida na indústria automobilística não é novidade. No entanto, os resultados indicam um lado mais idiossincrático do conceito. Na verdade, parece que as atividades de desenvolvimento de fornecedores devem ter lugar numa base contínua. A maioria dos entrevistados concordou que era raro um investimento maior nessa atividade. Em muitos dos casos, o desempenho do fornecedor começou a tornar-se volátil e afastar-se de níveis-alvo, assim como atividades de desenvolvimento de fornecedores foram paradas. A gerente de compras de uma multinacional expressa o fenômeno da seguinte forma:

- Eu acho que o desafio com os fornecedores nacionais é que quando há uma grande pressão dos clientes, ele funciona. Mas uma vez que a pressão é tirada, não há um sistema que possa garantir a continuidade dos processos para atender a qualidade especificada.

Proposição 4. O nível de desenvolvimento contínuo do fornecedor tem um impacto positivo sobre nível da competência colaborativa com o fornecedor.

A normatização de dados também revelou que os desafios relativos à integração dos fornecedores no setor automotivo não estão relacionados apenas com os fornecedores nacionais como se poderia esperar. Em muitas das empresas ficou registrado que alguns dos maiores pontos de restrições foram relacionados às questões internas das empresas. Um dos desafios mais prementes que foi identificado relaciona-se com as ações provenientes das matrizes, gerando expectativas irrealistas. As compras das grandes corporações também parecem encontrar mais dificuldade em adaptar-se às condições locais:

- As grandes empresas têm muitas regras e normas regulamentativas, caso contrário fica difícil gerenciar uma grande empresa à nível mundial. Assim, pode-se ter uma extensão para mais de dois anos nos contratos, mas às vezes alguns mercados também precisam ser adaptados às regras locais. Essas corporações, também, precisam prestar forte atenção às características especiais do nosso mercado. Como respondeu um gerente à entrevista.

Finalmente, esse gerente também revelou que:

- Quanto maior a qualidade, maior dificuldade para conseguir a disponibilidade colaborativa do fornecedor.

Os problemas foram mais agravados nos casos em que o mix de produtos era mais elevado e onde os volumes de compra eram relativamente baixos. A explicação para esse fato é simplesmente que o gap das competências entre o comprador e o fornecedor aumenta à medida que aumenta a complexidade devido às rigorosas exigências do produto. Isto foi destacado por um gerente de compras a partir de um fornecedor europeu de peças originais:

- Ao contrário de muitos de nossos concorrentes, nós usamos as mesmas especificações aplicadas aqui na matriz para a fabrica no Brasil. Além disso, nosso mix de produtos é elevado e os nossos volumes de produção são baixos que nos torna um cliente menos atraente do ponto de vista do fornecedor. [...] nós nos esforçamos para a perfeição, e tendo em conta as nossas exigências, algumas peças são muito específicas para o mercado brasileiro.

Com base na discussão acima, uma quinta proposição é definida como segue:

Proposição 5. O nível de restrições internas é negativamente moderado pela relação entre eficácia de liderança do comprador e a presteza do fornecedor.

Este estudo não busca investigar deliberadamente o impacto das especificidades culturais, tais como distância do poder, masculinidade, aversão à incerteza, individualismo, características locais, mentalidade religiosa etc., conforme Hofstede (1980); Javidan et al. (2006). Em vez disso, investiga as manifestações da cultura, considerando especificamente divergências e idiossincrasias em termos de valores, crenças e comportamentos a nível nacional entre o Brasil e os países do primeiro mundo. Os resultados sugerem que a codificação axial à importância da cultura para a integração colaborativa dos fornecedores por desempenhar um papel um tanto ambíguo. Por um lado, alguns entrevistados afirmaram que não existem diferenças culturais e que cultura não tem qualquer impacto: o negócio global, não importa onde você está. Por outro lado, alguns entrevistados afirmaram que a diferença cultural é significativa, o que limita severamente a chance de maior sucesso.

Independentemente de qualquer cultura, quadros conceituais elaborados na literatura, a distância cultural é quase sempre manifestada em diferenças na comunicação interpessoal como um entrevistado americano manifestou:

- Durante a reunião, o brasileiro não vai dizer não, mas para os nossos critérios de negócios um ok é um OK. Eu aprendi grandes lições no Brasil. Outro problema é que eu tenho feito planejamentos em longo prazo, mas eles (fornecedores) não confirmam se serão capazes de cumprir os planos dentro do prazo. Eles não confirmam quanto tempo isso irá ocorrer para concretizar um plano oficial, logo; e se eles não sabem com precisão...  Temos de perguntar: Você tem certeza que pode fazer isso Então se pode fazê-lo, mostre-me o plano. É necessário entrar neste tipo de detalhe para obter informações mais precisas deles.

Ficou evidente que dentre as restrições internas, o problema de cultura é um forte fator de influência. Descobriu-se que as diferenças culturais e a falta de compreensão cultural em muitos casos, impedem os gerentes de fornecedores de, efetivamente, fazer o seu melhor trabalho porque faz com que as ações e contra-ações dos compradores tornem-se mais difíceis. Fica também mais difícil prever estímulos adequados e proposições de valor para os fornecedores devido à diferença cultural inerente.

5. Conclusões

Coletivamente, as cinco proposições constituem um quadro de causalidade importante para identificar antecedentes à integração do fornecedor na indústria automobilística. Portanto, foi possível construir um modelo conceitual de antecedentes para a integração do fornecedor-comprador de acordo com as cinco proposições desenvolvida no estudo.

O quadro conceitual foi desenvolvido com base em uma extensa análise das recentes práticas de integração da cadeia de fornecimento no setor da indústria automobilística brasileira. Os elementos identificados por meio das entrevistas e os seus vínculos diretos e indiretos forneceram uma base sólida para pesquisas adicionais e acrescentam valor para o desenvolvimento de teorias nesta área específica (Westbrook & Frohlich, 2001). Os resultados do estudo contribuem especificamente pela adição de uma perspectiva específica sobre a integração da cadeia de fornecedores, por analisarem os antecedentes desta integração no setor automotivo.

Uma visão geral do desenvolvimento desse aspecto conceitual é representada na Figura 1, abaixo.

Figura 1. Modelo conceitual de antecedentes para a integração do fornecedor de acordo com as cinco proposições apresentadas
Fonte: Resultado da pesquisa (P1, P2, ...P5 = Proposições)

Elementos como a eficácia da liderança do comprador é um fator relevante neste contexto específico. Além disso, um líder, neste contexto não parece limitar-se à liderança formal, pois a análise dos dados de fato sugere que a liderança parecia existir em todos os níveis hierárquicos e em todas as funções envolvidas nas atividades de colaboração por parte dos compradores. Assim, embora as responsabilidades formais no ponto mais alto de autoridade fossem muitas vezes atuadas no lugar das negociações, a liderança não parece depender especificamente dos indivíduos na organização, mas sim sobre as atividades de liderança total das pessoas envolvidas, que poderia ser, finalmente, descrito como uma liderança organizacional. Os resultados do estudo contribuem para uma melhor compreensão dos elementos que podem ser necessários em um contexto para se alcançar um nível satisfatório de integração do fornecedor.

Além de critérios de desempenho clássico de medição, como custo, qualidade, entrega e flexibilidade, mais atenção deve ser dada aos procedimentos sobre critérios de: potencial de desenvolvimento da inovação, integração da alta cúpula com os gestores intermediários, desenvolvimento de processos, qualidade, mentalidade de gestão da cadeia de fornecimento, atuação colaborativa, competência em aprendizagem organizacional, bem como, elevação do nível de confiança entre compradores e fornecedores a fim de integrá-los à cadeia de fornecimento automotiva dentro do nível de desempenho exigido.

Como principais limitações da pesquisa, tem-se a heterogeneidade em relação ao tamanho das empresas, da quantidade de empresas analisadas e dentro de uma mesma da cadeia de fornecimento. Assim, trabalhos futuros podem incluir análises quantitativas envolvendo um maior número de empresas e, também, que foquem diferentes camadas da cadeia de fornecimento, ampliando e sendo mais abrangente para um resultado mais consistente.

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1. Professor Titular do Programa da FatecRL. Autor acadêmico (Editora GEN/Atlas).Email: hprbrazil@hotmail.com

2. Professor Titular do Programa de Mestrado Profissional em Administração da Faculdade Campo Limpo Paulista (Faccamp). Autor Acadêmico (Editora Atlas e FGV).Email: usptakes@uol.com.br


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 23) Año 2017

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