ISSN 0798 1015

logo

Vol. 38 (Nº 22) Año 2017. Pág. 1

Coordenação e gestão da produção suinícola: um estudo de caso

Coordination and management of the pig production: a case study

Júlia Elisabete BARDEN 1; Fernanda Cristina W. SINDELAR 2; Adalberto SCHONORRENBERGER 3; Samuel de CONTO 4

Recibido: 11/11/16 • Aprobado: 12/12/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Modelos de Produção e Gestão da Suinocultura

3. Materiais e Métodos

4. Resultados e Discussões

5. Considerações Finais

Referências


RESUMO:

/Brasil, a fim de compreender a coordenação e a gestão da sua produção. A abordagem de pesquisa foi qualitativa e o método utilizado o estudo de caso que contemplou entrevistas com produtores rurais e gestores das indústrias de transformação. Os resultados indicam que prevalece na região a suinocultura desenvolvida através do modelo de agricultura familiar e o sistema de produção integrada. Por outro lado, observou-se que a produção tem sido coordenada e gerenciada pelas agroindústrias, estratégia que torna os produtores rurais dependentes das ações por elas adotadas.
Palavras chave: produção suinícola; sistema de integração; gestão e coordenação

ABSTRACT:

This study analized the pig activity developed in the Vale do Taquari/RS/Brazil in order to understand the coordination and management of production in the region. This is a case study and it has a qualitative approach and the study included interviews with farmers and managers of manufacturing industries. The results indicate that in the region prevails the pig husbandry developed through the family farming model and integrated production system. On the other hand, it was observed that the chain has been coordinated and managed by agribusinesses, a strategy that makes farmers dependent of the actions taken by them.
Keywords: pig production; integration system; management and coordination

1. Introdução

Historicamente a agricultura possui um papel de destaque na economia do Rio Grande do Sul, tanto em virtude do valor da produção e do número de pessoas ocupadas, como também devido os seus encadeamentos com o setor industrial e de serviços, os quais são dependentes do desempenho do setor agrícola. Sob um contexto geral, desde meados da década de 1960, a atividade tem passado por transformações, decorrentes das mudanças na base tecnológica e mais recentemente do processo de abertura econômica e comercial. Por outro lado, também contribui para esse processo “o esgotamento do modelo de financiamento agrícola com subsídios públicos e a internacionalização dos mercados de commodities agrícolas” os quais estabeleceram novas restrições legais e padrões concorrenciais às cadeias produtivas (Mieli & Miranda, 2013, p. 202).

O conjunto destas transformações pode ser observado tanto em termos de reconfigurações na atividade produtiva devido à busca de melhoria de eficiência, como nas relações da indústria com seus fornecedores, neste caso, os produtores rurais (Waquil & Souza, 2014; Viana et al., 2010).

Por outro lado, sob o ponto de vista da indústria, a partir da década de 1970 é possível observar o desenvolvimento das cadeias agroalimentares de produção de carnes suínas, aves e leite, implantadas pelos respectivos elos industriais, refletindo em altas taxas de crescimento da produção animal. “O dinamismo da pequena produção de animais e de leite foi a resposta aos problemas da exploração de grãos em pequena escala no novo ambiente competitivo e veio acompanhado da estruturação e da reestruturação das respectivas cadeias de produção” (Benetti, 2010, p. 73).

De maneira complementar para Mieli & Waquil (2007), as mudanças na produção podem ser observadas com aumento de escala, especialização e tecnificação das atividades produtivas, com crescente integração entre estrutura industrial de abate e processamento. Assim, as reconfigurações produtivas têm se tornado um mecanismo adotado pelas empresas com vistas à melhoria da sua produtividade, e em consequência, da sua competitividade. A maior integração das atividades produtivas tem possibilitado às empresas integradoras vantagens competitivas advindas da constante interação dos elos pertencentes às cadeias produtivas.

Para o Vale do Taquari, região localizada na parte central do Rio Grande do Sul (RS), constituído por 36 pequenos municípios, a produção agrícola representa um importante mecanismo de geração de renda, pois impacta na composição do PIB regional e na composição do Valor Adicionado Bruto (VAB). A indústria representa 30,71% do VAB e uma parcela significativa da indústria de transformação é formada por agroindústrias, cujas atividades se desenvolvem a partir da matéria-prima oriunda do setor primário, a transformação de alimentos representa 17,79% (FEE, 2016).

O setor primário da região está alicerçado na pequena produção rural. Conforme o Censo Agropecuário, em 2006, 57,51% dos estabelecimentos agropecuários da região desenvolviam alguma atividade primária ligada à suinocultura e detinham 9,42% do rebanho de suínos do RS (IBGE, 2006). Diante disso, percebe-se a importância da atividade primária suinícola na geração de renda e emprego para os produtores rurais do VT; e para a indústria local, importante fonte de matéria prima para a transformação e conquista de vantagem competitiva resultante pela proximidade geográfica com os produtores rurais.

Sob este contexto, este artigo analisa a atividade suinícola desenvolvida no Vale do Taquari, a fim de compreender a coordenação e gestão da produção na região. Para isso, o estudo está estruturado em cinco partes, além desta introdução. A seguir faz-se uma revisão teórica sobre os diferentes modelos de produção suinícola, apresentando vantagens e desvantagens de cada um. Após são apresentados os procedimentos metodológicos utilizados, uma breve contextualização do setor suinícola na região em estudo, a análise dos resultados da pesquisa, e finalizando, são apresentadas as considerações finais.

2. Modelos de Produção e Gestão da Suinocultura

As transações econômicas têm sido frequentemente explicadas a partir da teoria desenvolvida por Williamson (1979) sobre a economia dos custos de transação. Para o autor, a principal razão pela escolha da coordenação vertical está associada ao fato que minimiza os custos de transação, tanto relativos a despesas de produção como de economias nos custos das transações.

Isso pode ser observado quando,

atores econômicos (agindo sob incerteza, racionalidade limitada e oportunismo) de­cidem estrategicamente pela governança mais eficiente, pautada nas especificidades dos ativos, nas frequências das negociações e nas administrações das assimetrias de informações (todas presentes na rede em que estes em­presários atuam) (Pinotti & Paulillo, 2006, p. 168).

A organização e coordenação dos sistemas produtivos dependem diretamente das características das transações e do ambiente institucional onde estas ocorrem. Nos sistemas agro-alimentares, as transações ocorrem através de diferentes mecanismos que vão desde mercados abertos, com baixa intensidade de coordenação vertical até formas de coordenação mais intensas através de contratos e alianças estratégicas, por exemplo (Peterson et al., 2001).

Ao estudar a estrutura de governança de mercados agroalimentares em diferentes países, Raynaud et al. (2005) identificaram seis diferentes estruturas, as quais variam desde a coordenação baseada no mercado até formas hierárquicas de coordenação (Figura 01): a) contratos à vista, onde trocas ocorrem baseadas em preços correntes; b) contratos de relacionamento (implícitos), estabelecidos com base em laços de reputação, mas onde a identidade das não importa; c) contratos de relacionamento entre parceiros, os quais são escolhidos a partir de um conjunto produtores certificados; d) contratos formais, estabelecidos através de documentos escritos, com estabelecimentos de funções e prazo de duração; e) contratos baseados em capitais (joint-ventures), através dos quais uma empresa torna-se acionista da parceira; e, f) integração vertical, no qual se estabelecem as etapas de produção, distribuição e gestão comum das atividades. Assim, quanto mais próximo da integração vertical, maior será o grau de coordenação dessa cadeia.

Figura 01 – Estruturas de governança de mercados agroalimentares
Fonte: Elaborado pelos autores a partir de Raynaud et al. (2005).

Em virtude da complexidade das relações, o estabelecimento de contratos entre os diferentes atores dos sistemas agroindustriais configuram-se como estruturas de apoio às transações, contribuindo para o estabelecimento de relações de confiança, normas de produção, redução dos riscos da atividade e dos custos de transação (Zylbersztanj, 2005; Schulze et al., 2007).

A busca de maior competitividade e eficiência nas cadeias produtivas também motiva a formação de alianças estratégicas. Para Batalha (2008), a formação dessas alianças ocorre quando existem acordos cooperativos entre dois ou mais participantes da cadeia produtiva que visem objetivos em comum. Estas alianças podem ser formais ou informais através de associações ou órgãos representativos da cadeia produtiva.

Na economia mundial é possível observar a coexistência de dois modelos de produção de carne suína. Enquanto que em muitos países da Europa Ocidental prevalecem sistemas menos integrados de produção, em outros países como os EUA e a Dinamarca, é possível observar sistemas coordenados de forma mais rígida através de contratos e integração vertical, os quais têm auxiliado na gestão e competitividade da cadeia de fornecimento de carne suína (Schulze et al., 2007).

De acordo com Han et al. (2009), para melhorar o seu desempenho, as empresas precisam cuidar não somente da gestão interna, associada à qualidade de seus produtos, melhorias e capacitação de funcionários, mas também construir relações estratégicas com clientes na gestão de processos. Essa conclusão é decorrente do estudo desenvolvido pelos autores que analisaram a influência dos processos de integração de tecnologias de informação e logística no desempenho da indústria processadora de carne suína na China. Para os autores, as empresas que adotaram esses sistemas de integração apresentaram maior qualidade, serviço ao cliente e rentabilidade, em comparação a empresas não integradas (Han et al., 2009).

Segundo Trienekens & Wognum (2013), que estudaram a cadeia de abastecimento da carne suína na Europa, as mudanças recentes nas exigências dos consumidores e da sociedade no que se refere à produção da carne suína (qualidade, segurança, rastreabilidade dos produtos, gestão dos resíduos, legislação, entre outros), têm exigido dos atores pertencentes a essa cadeia o desenvolvimento de processos mais eficientes. Por isso, os autores destacam que há uma tendência nesse mercado de maior colaboração entre os diferentes elos da cadeia através da adoção de sistemas de gestão da qualidade e de informação integrados, com o uso de novas tecnologias associadas a qualidade e logística.

No Brasil, até a década de 1980, de forma geral, a produção suinícola era organizada e administrada diretamente pelo agricultor, proprietário dos meios de produção, sendo esse modelo conhecido como ciclo completo. Neste modelo, o produtor rural é responsável pela gestão e desenvolvimento de todas as fases de produção do suíno (cobertura, gestação, maternidade, creche e terminação). E, para tanto, mantém relações comerciais com as empresas agroindustriais para a aquisição de medicamentos e insumos e a venda dos suínos prontos para o abate (Coletti & Lins, 2011).

A partir de então, intensificou-se o movimento de integração entre produtores e agroindústrias, embora já seja possível observar alguns exemplos desse modelo desde o final da década de 1960. Inicialmente, o processo de integração baseava-se em contratos que estipulavam, para as empresas, a responsabilidade pelo fornecimento de insumos, medicamentos e assistência técnica e também pela compra da produção. Por outro lado, os agricultores eram responsáveis por seguir as orientações técnicas e pelo pagamento dos insumos e medicamentos quando da entrega dos suínos às empresas. Esse novo modelo resultou em um processo de concentração da produção e seleção dos suinocultores, mas também em pressões para o aumento da produtividade das propriedades, ocasionando alterações frequentes nas instalações, equipamentos e relações com o mercado e as empresas agroindustriais. E, em contrapartida, observa-se uma significativa redução do sistema de produção em ciclo completo a partir dos anos 1990 (Coletti & Lins, 2011).

Por essa razão, Mieli & Miranda (2013) ressaltam que essas mudanças organizacionais e tecnológicas ocorreram de forma desigual e diferenciada entre os atores que compõem a cadeia produtiva, embora estreitamente interligadas. Segundo os autores, desde o início do processo, as agroindústrias assumiram o papel de coordenação e de definição das estratégias da atividade, contribuindo para a competitividade da cadeia produtiva. Já para os produtores rurais, que conseguiram realizar investimentos aumentando a sua escala de produção e especialização com a adoção novas tecnologias, esse processo contribuiu para o aumento da geração de renda e de emprego. Contudo, o mesmo processo também foi responsável pela saída de produtores da atividade e pela crescente concentração geográfica dos rebanhos e pressões ambientais, pois embora essas alterações tenham ocorrido em todo o país, elas foram mais intensas na região Sul.

Outra tendência das últimas décadas segundo Rocha Júnior et al. (2008),  foi o maior estreitamento dos relacionamentos e das negociações entre os agentes envolvidos nas diversas etapas de transformação e de consumo através do estabelecimento de contratos, em virtude das crescentes demandas por qualidade, variedade e segurança dos alimentos e garantia do seu fornecimento entre os vários agentes participantes do sistema agroindustrial até o mercado de consumidor (tanto doméstico como internacional). A formalização das relações por meio de contratos de integração visa definir sobre as responsabilidades técnicas e financeiras de cada ator, assim como, sobre aos direitos de propriedade de insumos e o valor da produção (Mieli & Miranda, 2013). Por este motivo, os sistemas produtivos passaram a apresentar uma constante atualização tecnológica, padronização e uniformidade de oferta em qualquer nível de processamento industrial envolvido. Para Rocha Júnior et al. (2008), coordenar esses sistemas e os fatores que os influenciam torna-se um desafio da atividade.

Segundo Mieli & Waquil (2007, p. 01), “as estratégias dominantes das principais empresas e cooperativas agroindustriais que abatem suínos e processam sua carne no Brasil baseiam-se na garantia de fornecimento de matéria-prima nas quantidades e qualidade desejadas, bem como na busca de eficiência logística”. A coordenação da cadeia produtiva por meio dos contratos e de programas de fomento pecuário pode garantir que essas estratégias sejam alcançadas, pois estabelecem compromissos entre as partes, viabilizam maior padronização e estabilidade da matéria-prima e permitem a transferência de riscos e margens entre os diversos segmentos.

Recentemente, a suinocultura tem se desenvolvido através de uma multiplicidade de formas organizacionais, que regulam e coordenam a transferência de produtos ao longo da cadeia produtiva, embora o modelo de produção predominante na região Sul do Brasil, e que tem se difundido em outras regiões geográficas do país, seja a integração. Através desse modelo, o suinocultor se insere na cadeia produtiva, vinculado a uma agroindústria de abate e processamento que, geralmente, também coordena os elos a montante da produção primária, sobretudo na fabricação de ração (Mieli & Waquil, 2007).  No entanto, ainda coexistem com esse modelo, um número expressivo de suinocultores não integrados, denominados independentes, que também acompanham a evolução tecnológica e integram a suinocultura industrial (Mieli & Waquil, 2006).

 Para os autores, a suinocultura industrial é formada pelo conjunto de produtores que incorporam os avanços tecnológicos em genética, nutrição, sanidade e outros aspectos produtivos. Estes suinocultores podem ser integrados, quando as transações são formalizadas por contratos ou por acordos tácitos (sem contrato), mas amparadas no cooperativismo, em programas de fomento pecuário ou em mini-integradores, ou podem ser suinocultores independentes, que também abrange um leque de opções, podendo em alguns casos, sobrepor-se a algumas características da integração. Incluem-se neste grupo,

[...] as transações do mercado de spot, sem contrato, entre agroindústrias, terceiros e mini-integradores, passando pelas transações sem contrato, mas amparadas pelo cooperativismo ou pelos programas de fomento agropecuário, até os suinocultores que têm contratos de fornecimentos com empresas de genética e nutrição (Mieli & Waquil, 2006, p. 6).

Embora a suinocultura independente possa permitir à obtenção de maior remuneração, em comparação a suinocultura integrada, principalmente em períodos de mercado aquecido (Mieli & Waquil, 2007), pois o produtor tem liberdade para negociar com diferentes compradores e fornecedores, sem a necessidade de atender a exigências de uma agroindústria (Mieli & Miranda, 2013).

Nesta modalidade, o suinocultor é responsável pelas decisões técnicas, tanto em termos de instalações, equipamentos e reprodutores, como também, pelo capital de giro necessário para à aquisição de ração, leitões (quando for o caso), demais insumos e despesas. Em consequência, a produção independente pode representar maior risco para o suinocultor, principalmente pela falta de garantia de escoamento da produção (Mieli & Waquil, 2007). Ainda assim, os produtores independentes também podem estabelecer acordos (formais ou informais) com seus fornecedores ou clientes, para tratar sobre aspectos relacionados à qualidade e sanidade dos animais e à programação de entrega (Mieli & Miranda, 2013).

Além disso, outros fatores também têm influenciado os produtores rurais e as empresas na adoção da produção integrada. As justificativas são relacionadas em assegurar o abastecimento e a redução de custos, auxiliando na qualidade e na melhoria do conhecimento em outras atividades, assim como, garantir o fornecimento de insumos e produtos, reduzir os conflitos nas relações, evitar compras inadequadas, concentrar as relações em um único fornecedor, entre outros. Para Batalha (2008), as vantagens da integração jusante e montante estão fundamentalmente associadas à apropriação dos lucros dos mercados situados a montante (agricultura) e a jusante (agroindústria) da atividade original da empresa ao controle destes mercados com o objetivo de valorizar sua atividade original. A indústria que se integra a montante tem a garantia de que suas matérias-primas sejam fornecidas em quantidade e com qualidade de acordo com suas necessidades.

Conforme Porter (1996), a produção integrada é aquela em que há a combinação de processos de produção, distribuição, vendas e/ou outros processos econômicos tecnologicamente distintos sob o controle de uma mesma empresa. Ressalta também, a necessidade de significativo volume de capital para a manutenção dos elos produtivos, uma vez que, a empresa é responsável por todos os elos. A empresa integradora irá internalizar o maior número de atividades produtivas, de modo que as atividades produzidas no âmbito da firma sejam de forma mais eficiente do que se fossem produzidas e adquiridas no mercado. Além disso, ocorrem também ganhos para as empresas integradoras quando fixam preços e insumos adquiridos junto aos produtores rurais.

De maneira complementar, Callado (2009) menciona que o padrão de qualidade elevado exigido pelo mercado tem forçado profundas mudanças na estrutura produtiva das empresas do agronegócio, implicando em arranjos complexos nos quais os diversos agentes tornam-se cada vez mais interdependentes. Estas iniciativas de agregar competências para proporcionar maior competitividade podem ser originadas de diversas maneiras. Dentre as diversas possibilidades exploradas, as integrações entre empresas e produtores têm se destacado pelos resultados obtidos.

Na cadeia suinícola, o sistema de integração contribui para o progresso tecnológico através de contratos das agroindústrias com empresas detentoras de genética animal, compostos de genética animal, equipamentos de inovações e de sistemas logísticos eficientes (Viana et al., 2010). Além disso, facilita a comercialização junto a mercados de exportação e repassa para a empresa integradora grande parte dos riscos associados a mudanças nos preços de commodities agrícolas (Mieli & Miranda, 2013).

Porém, alguns inconvenientes podem surgir nesta opção para os agricultores. O investimento necessário para proceder à integração pode ser elevado, comprometendo a alocação de recursos para a atividade principal da empresa (integradora) ou da propriedade (produtor integrado). Outra desvantagem decorrente da integração é a transformação do agricultor em um prestador de serviços de reprodução e engorda, já que o mesmo perde o controle sobre alojamento de animais e o planejamento e gestão da atividade. A remuneração baseia-se em critérios não associados somente aos esforços do produtor (como genética e logística). Também é possível observar a quebra de contratos e ações de abuso de poder por parte das agroindústrias (Mieli & Miranda, 2013).

Por outro lado, para a empresa integradora, as vantagens estariam associadas a disponibilidade de matéria prima regularmente, possibilitando com isso uma programação de abates, qualidade e especificidade de matéria-prima, economia de escala, menor investimento em ativos imobilizados, maior eficiência logística. Como desvantagens, haveria uma maior necessidade de capital de giro por parte da empresa, que se responsabilizaria integralmente pelos riscos de mercado. Harrigan (1985) reforça os benefícios internos para a empresa ao reduzir despesas duplicadas e eliminação de etapas como a negociação.

Outra visão a respeito da produção integrada é de que a empresa externaliza seus custos de transação, ou seja, os produtores integrados assumem custos - como, por exemplo, os trabalhistas - que em outros sistemas produtivos seriam desembolsados pela empresa (Vieira, 2008). Neste sentido, a empresa estaria obtendo ganhos com a redução de alguns custos, e estes sendo internalizados pelos produtores integrados.

Em síntese, independente do modo de produção escolhido pelos produtores rurais e pelas indústrias de transformação, se independente ou integrada, ambas podem trazer vantagens e desvantagens aos agentes envolvidos na cadeia, apesar de, na prática, observar-se que a preferência tem sido pela produção integrada.

3. Materiais e Métodos

A pesquisa foi desenvolvida a partir de um estudo de caso que se utilizou da técnica de entrevistas junto a atores da cadeia suinícola para a coleta dos dados e teve abordagem qualitativa, com caráter exploratória e descritiva.

A população deste estudo constituiu-se das propriedades rurais produtoras de suínos e das indústrias de transformação localizadas na Região do Vale do Taquari/RS. A partir desse universo e tendo em vista a precisão de informações a respeito da quantidade de produtores, do tipo de produção e dos vínculos entre os integrantes da cadeia produtiva, estabeleceram-se os seguintes critérios para a definição dos sujeitos: a) as propriedades rurais deveriam adotar diferentes modelos de produção suinícola (Unidade Produtiva de Leitões (UPL), Crecheiro, Unidade de Terminação (UT) e Ciclo Completo); b) tipos de vínculos com as indústrias de transformação; c) tempo de atuação na atividade.

Assim, a amostra foi escolhida diretamente pelos pesquisadores a partir de contatos prévios e de indicações de produtores sugeridos pelas indústrias de transformação por tipo de vínculos. O público entrevistado foi formado por dez produtores rurais divididos da seguinte forma (Quadro 1): três unidades produtoras de leitões (UPL), sendo uma integrada a uma empresa privada e duas integradas através de sistema cooperativo; três propriedades crecheiras, das quais uma é integrada a indústria privada e duas integradas através de sistema cooperativo; duas unidades de terminação (UT), sendo uma vinculada a empresa privada e outra, a cooperativa; e, duas propriedades desenvolvem a atividade através de ciclo completo sem integração com nenhuma empresa, ou seja, desenvolvem a atividade de maneira independente, não possuindo vínculo formal com nenhuma indústria de transformação. Além disso, também integraram a amostra duas empresas integradoras, sendo uma cooperativa e a outra empresa privada.

Tipo de produção suína

Atividade Integrada

Atividade Independente

Empresa Privada

Cooperativa

UPL

1

2

-

Crecheiro

1

2

-

UT

1

1

-

Ciclo Completo

-

-

2

Quadro 1 – Distribuição dos produtores rurais conforme o tipo de produção suína
Fonte: elaborado pelos autores.

Sob este critério, foram entrevistados dez produtores rurais suinícolas e dois gestores de empresas agroindustriais responsáveis pelo abate e processamento da matéria prima. As entrevistas foram realizadas durante os meses de outubro de 2012 a fevereiro de 2013 e método utilizado foi a a análise de conteúdo.

A estrutura e formato do roteiro utilizado nas entrevistas com os produtores rurais encontram-se no Quadro 2. As entrevistas buscaram identificar as características da atividade a partir de três dimensões: uma histórica, onde os produtores puderam descrever as características da atividade, os desafios iniciais e a necessidade de introdução de inovações tecnológicas; outro conjunto de questões direcionou-se para compreender a situação sobre a gestão da propriedade, a relação com a integradora, o mecanismo de formação de preços e de questões ambientais; além disso, os produtores manifestaram-se sobre as perspectivas sobre o futuro da atividade e a necessidade de sucessão familiar.

Dimensão

Aspecto

Histórica

Características da atividade – processo de produção e vínculos com o mercado

Desafios iniciais – evolução da atividade, dificuldades, instabilidade, recursos financeiros, com períodos históricos

Inovações tecnológicas – modo e tempo que ocorreram as inovações tecnológicas

Situação

Gestão da propriedade – uso de métodos de trabalho, definição de funções e uso de controle informatizado

Preços – quem define, como oscila o preço e o seu gerenciamento

Relação com a integradora – relação, assistência técnica e parcerias

Questões ambientais – atendimento ou dificuldades para cumprir com as exigências ambientais

Perspectivas

Futuro da suinocultura – aumento ou redução de investimentos na atividade

Planos para o futuro – aumento ou redução da produção

Sucessão – definição, indefinição da sucessão, sucessão pelos filhos

Quadro 2 – Itens considerados nas entrevistas com os produtores (UPL, Creche, Terminação e Ciclo completo)
Fonte: elaborado pelos autores

No Quadro 3 constam os itens utilizados nas entrevistas com os gestores das integradoras. Essas questões foram similares as questões anteriores, também divididas em três dimensões, mas neste caso, buscou-se analisar as características históricas, situação da gestão da cadeia e perspectivas da indústria com relação à atividade suinícola e seus vínculos com os produtores integrados.

Dimensão

Aspecto

Histórica

Características da atividade – evolução da produção e atuação no mercado

Desafios iniciais – dificuldades iniciais, custos de matérias-primas e preços

Inovações tecnológicas – tecnologia utilizada, qualidade, valor agregado e mão-de-obra

Situação

Gestão da cadeia produtiva – controle sobre a cadeia e custos com distribuição

Preços – tipos de produtos, preços, valor agregado, produção em escala, matéria-prima

Relação com os integrados – fidelização, transparência, remuneração, produtividade

Questões ambientais – atendimento ou não às exigências ambientais

Perspectivas

Futuro da suinocultura – aumento ou redução da atividade, oscilações, ações da indústria

Planos para o futuro – oscilações, campanhas promocionais, crescimento do mercado

Sucessão dos integrados – educação e seminários com a família, envelhecimento dos integrados, motivação

Quadro 3 – Itens considerados nas entrevistas com as integradoras
Fonte: elaborado pelos autores.

Além disso, também foi realizado um levantamento de dados sobre a importância da produção suinícola regional, com base em dados secundários provenientes de bancos de dados oficiais, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Ministério do Trabalho, a Fundação de Economia e Estatística (FEE), os quais são apresentados a seguir. E após, são descritos os resultados e discussões decorrentes da pesquisa qualitativa.

 

4. Resultados e Discussões

Conforme definido, a amostra selecionada contemplou diferentes tipos de produção de suíno, no entanto, conforme constatado na pesquisa nem todas as propriedades iniciaram as suas atividades com estas características. Algumas propriedades começaram a atividade suinícola de forma independente, com ciclo completo e em pequena escala. Porém, conforme já destacado por autores anteriormente (Mieli & Waquil, 2007; Viana et al., 2010; Coletti & Lins, 2011; Mieli & Miranda, 2013; Waquil & Souza, 2014), alguns fatores influenciaram a maioria dos produtores a se especializar em uma etapa da produção e se integrar a uma indústria de transformação devido à garantia de entrega da produção e a assistência técnica recebida. Dentre os fatores identificados estão o aumento da competitividade, dificuldades para a comercialização e as novas exigências do mercado para o setor produtor. Essas relações de integração são estabelecidas em contratos individuais entre os produtores e as agroindústrias, os quais em sua maioria são contratos de longo prazo.

Em relação à produção, a escala tem sido distinta entre os produtores pesquisados. Enquanto algumas propriedades trabalham com 170 animais, outras trabalham com mais de 4.000, mas isso geralmente dependente da característica produtiva (UPL’s operam com matrizes e menos animais, já propriedades com terminação têm mais animais). Os critérios de produção e produtividade geralmente estão definidos também nos contratos firmados com as agroindústrias integradoras, sendo que o produtor não pode alterar o número de animais alojados sem o consentimento e autorização destas.

Outra característica identificada da atividade suinícola na região é que ela é desenvolvida através da agricultura familiar (conforme definido pela Lei nº 11.326/2006). Algumas propriedades especializaram-se exclusivamente na produção de suínos devido ao tamanho das propriedades e dificuldades vinculadas a disponibilidade de mão de obra, assim como ocorre no oeste do estado de Santa Catarina/BR, onde “predomina a participação dos pequenos produtores especializados, com restrição de área, mão de obra familiar e integrados a uma empresa ou cooperativa agroindustrial” (Mieli & Miranda, 2013, p. 204).  Contudo, também existem propriedades que desenvolvem outras atividades em paralelo a suinocultura, como por exemplo, produção de leite, frango, cereais, entre outros, diversificando a produção e as fontes de renda, fato que contribui para a estabilidade da propriedade.

Em relação ao início da atividade, os produtores mencionaram a falta de conhecimento na área, e neste caso, foi importante o auxílio recebido da integradora para superar as dificuldades, assim como destacado por Mieli & Miranda (2013), pois esta instrui sobre as práticas de manejo e controle, além de fornecer modelos de gestão para a propriedade. Por outro lado, ao longo do tempo, o desenvolvimento da atividade apresentou dificuldades devido a necessidade de superação de diversas e periódicas crises que afetaram o setor e as integradoras, e a realização de investimentos em inovações tecnológicas necessários para atender às exigências da integradora ou do mercado, em especial no início da década de 1990 devido ao processo de abertura comercial, conforme citado anteriormente (Waquil & Souza, 2014; Coletti & Lins, 2011). Para superar essas dificuldades,  em alguns casos, os agricultores mencionaram a realização de financiamentos bancários.

No que tange às inovações tecnológicas, foi possível observar que a maior parte das propriedades realiza constantes modificações no processo produtivo para acompanhar os avanços tecnológicos e adequar-se tanto a questões ambientais como para introduzir facilidades de manejo da atividade, o que lhes garante melhoria da produtividade e redução do uso de mão de obra, consoante ao abordado por Viana et al. (2010). Dentre as principais inovações tecnológicas incorporadas ao processo, foram citadas: inseminação artificial, automatização dos comedouros, climatização e aquecimento com termostato, cortina dupla, avanços em medicamentos e vacinas, sistema de dejetos gradeado, piso térmico e piso vazado, sistemas de controles de gestão, entre outros.

Por outro lado, nas duas propriedades de ciclo completo, as inovações são possíveis através do desenvolvimento de parcerias com outras instituições que visam o desenvolvimento tecnológico da atividade produtiva, como por exemplo, uma delas citou a parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) para melhorar a genética.

Em relação à situação atual, verifica-se que a gestão das propriedades é realizada pela mão de obra familiar, mesmo naquelas em que há mão de obra contratada para a realização de atividades. Além disso, a maior parte das propriedades também mencionou realizar um planejamento de investimentos futuros e manter reservas financeiras para eventuais dificuldades, assim como, adotar políticas de divisão dos resultados quando diferentes gerações são envolvidas na atividade.

O acompanhamento dos resultados é feito por meio de planilhas eletrônicas de controle e registro das informações, com exceção de um produtor que mencionou fazer registros apenas de “cabeça”. Em alguns casos, esses registros são mais detalhados e em outros mais simplificados, mas não são observadas diferenças por tipo de produção. Nas propriedades integradas os métodos de controle, na maior parte das vezes, são fornecidos pela própria empresa integradora. Já nas propriedades que possuem ciclo completo, a gestão e o controle produtivo são realizados por mecanismos particulares, adaptados à realidade da propriedade.

Em relação aos preços, os produtores que trabalham com ciclo completo possuem um maior domínio sobre a fixação dos preços, conseguindo administrar melhor as oscilações do mercado, haja vista não serem integrados e com isso não terem a necessidade de entregarem a produção de suínos a um preço baixo, ou mesmo, reduzirem a atividade até que os preços voltem a melhorar e neste período dedicar-se a outras atividades produtivas, assim como já afirmado anteriormente por Mieli & Waquil (2007) e Mieli & Miranda (2013).

Por outro lado, as propriedades integradas atuam no mercado com um preço pré-estabelecido pela integradora e que está diretamente vinculado com o mercado consumidor, mas a remuneração pode oscilar conforme a produtividade. Os crecheiros detalharam que a produtividade é medida pela conversão e mortalidade, ou seja, quanto menor for a alimentação e maior o peso, melhor são os resultados obtidos. Esse mecanismo também é adotado no oeste de Santa Catarina, onde a remuneração dos suinocultores depende de fórmulas que contabilizam critérios de eficiência e compara o desempenho individual do suinocultor em relação aos demais integrados, desenvolvendo um ambiente de competição entre os produtores (Mieli & Miranda, 2013).

Todos os produtores integrados ainda afirmaram que a relação com a integradora é boa, tendo em vista, além da garantia de compra da produção, o fornecimento de insumos, a assistência e visitas técnicas permanentes, embora hajam pontos a serem melhorados e a necessidade de seguir as regras da empresa integradora. Segundo Mieli & Miranda (2013), embora a integração proporcione vantagens ao produtor rural como: o escoamento da produção, acesso à assistência técnica, novas tecnologias e reduz os riscos, os quais são transferidos em grande parte para a agroindústria; este também perde o controle sobre a tomada de decisão quanto ao planejamento e controle do alojamento, transformando-se em um prestador de serviços.

Já as duas propriedades independentes não mantêm vínculo, ou seja, a produção é entregue em agroindústrias, mas sem obrigação formal, pré-acordada anteriormente. Segundo classificação proposta por Raynaud et al. (2005), esses produtores seguem a estrutura de governança baseada em contratos de relacionamento implícitos. No entanto, destacam a necessidade de manter parcerias com algumas empresas, pois observaram que isso pode ocasionar em ganhos financeiros, ao mesmo tempo estão expostos a um risco de mercado, conforme já abordado no texto. 

No que se refere às questões ambientais, as quais costumam representar uma dificuldade para os pequenos produtores (Mieli & Miranda, 2013; Meneghello et al., 1999), estas são atendidas conforme as exigências dos órgãos governamentais, com exceção de uma propriedade de ciclo completo. Entretanto, conforme as opiniões dos entrevistados ainda existem ajustes necessários a serem realizados para melhoria ambiental e diminuição dos impactos na natureza com os dejetos do processo produtivo, em especial em duas propriedades com produção integrada, que manifestaram ter uma geração de resíduos superior a capacidade do território. Por outro lado, a maioria dos produtores acredita que a legislação poderá tornar-se mais rígida, e caso vierem a aumentar a produção, serão necessárias mais adaptações.

Quanto ao futuro, para a maioria dos entrevistados a perspectiva de continuar na atividade é positiva, apesar de reconhecerem que as oscilações de mercado sempre ocorrerão e levarão a busca pelo aumento da produtividade (escala). No entanto, reconhecem que o aumento da rentabilidade está condicionado ao aumento de produtividade e que pequenos produtores com produção em baixa escala tenderão a deixar o mercado.

Diante disso, a maioria dos gestores das propriedades integradas manifestou a intenção de realizar investimentos na propriedade e ampliar a produção. Apenas os produtores que produzem através de ciclo completo não pretendem expandir, mantendo o patamar atual. Além disso, os produtores destacaram a necessidade do enfrentamento de desafios para a sua permanência na atividade como a redução da oferta de mão-de-obra e o aumento das restrições e exigências ambientais e do próprio mercado consumidor.

A sucessão também é um problema crescente nas propriedades rurais da região do Vale do Taquari. A maioria dos entrevistados ainda não sabe se haverá sucessão na propriedade, pois alguns produtores possuem filhos menores de idade e em outras propriedades, os filhos mais velhos estão procurando outras oportunidades (estudo e trabalho), ocasionando a diminuição da população rural e em consequência, o comprometimento da sucessão na propriedade.

Em síntese, a maior parte dos produtores relataram a existência de uma série de vantagens decorrentes do processo de integração, as quais justificam a escolha pelo modo de produção, embora também destaquem limitações e desafios associados a questões econômicas, sociais, ambientais que necessitam ser superados para o desenvolvimento da atividade suinícola na região. Contudo, esses aspectos também são evidenciados por produtores do oeste de Santa Catarina (Mieli & Miranda, 2013), assim como, são próximos aos resultados encontrados em uma pesquisa realizada por Lawrence et al. (1997) em meados da década de 1990 com produtores de suínos nos Estados Unidos.

Conforme esse estudo, os acordos e contratos de integração vertical contribuem para o aumento dos investimentos e da especialização em instalações de produção e processamento, aumentando a capacidade e a qualidade da carne produzida, além de reduzir o risco de mercado e os custos de transações. Os produtores rurais analisados nessa região também eram remunerados com base nos preços de mercado e fórmulas envolvendo critérios de eficiência. Os autores ainda destacaram que, embora fosse difícil prever o grau de crescimento e desenvolvimento do mercado de carne suína, sua hipótese era que a maior coordenação entre os diferentes segmentos da indústria poderia contribuir para o aumento da produção, comercialização, reduzindo o preço do produto final e, incentivando assim, um aumento da demanda (Lawrence et al., 1997). 

Além das entrevistas realizadas com os produtores, também foram realizadas entrevistas com gestores de duas empresas integradoras situadas na região que atuam no mercado nacional e internacional. As empresas, assim como os produtores integrados, também informaram que existe uma boa relação entre produtor rural e indústria de transformação, sendo que ambas exigem a fidelização dos seus produtores para o desenvolvimento da atividade e, em contrapartida, oferecem acompanhamento técnico.  

Em relação aos desafios na atividade, os gestores manifestaram os altos custos com a matéria prima e as oscilações nos preços dos produtos suínos, relatando dificuldades em diversas crises. Para eles, esses fatores são determinantes para a competitividade da atividade produtiva, assim como, o enfrentamento de barreiras comerciais e culturais em relação ao consumo da carne suína em diversas regiões.

O enfrentamento pelos gestores das empresas das oscilações nos preços ocorre com políticas de direcionamento para a produção de produtos que agregam maior valor, como por exemplo, embutidos e cortes especiais e a necessidade de ampliar sua participação no mercado, ou seja, ampliar a escala. Quanto a remuneração aos produtores, ambas informaram que esta ocorre por produtividade.

Os gestores também destacaram a necessidade do uso de novas tecnologias para melhorar a eficiência e a qualidade dos produtos e reduzir a dependência do fator humano na atividade produtiva, tanto nas indústrias de transformação como nas propriedades dos integrados. Para eles, as inovações são fatores permanentes para a busca de eficiência produtiva e de ganho de escala, confirmando o que já havia sido destacado por Han et al. (2009) anteriormente.

Quando questionados sobre questões ambientais, as empresas informaram cumprir a legislação vigente e exigir dos produtores integrados que estes também regularizem sua atividade perante os órgãos competentes. Algumas exigências ambientais nas propriedades são possíveis com acompanhamento técnico especializado da empresa integradora.

O controle dos elos da gestão da cadeia produtiva é apontado pelos gestores como sendo crucial para a manutenção e ampliação da produtividade, embora também tenham sido citados problemas relativos à distribuição dos produtos.

Em relação ao futuro da suinocultura, os gestores entrevistados demonstraram a perspectiva de aumentar a atividade suinícola, com desafios a serem superados em relação a outros produtos que são competidores, bem como as oscilações dos preços dos produtos provenientes da carne suína. Além disso, quanto às campanhas para promover a carne suína, os gestores manifestaram a preocupação em adotar estratégias mais agressivas de mercado. A sucessão nas propriedades dos integrados também é uma preocupação das empresas, fazendo com que as mesmas invistam em cursos de qualificação para os filhos dos produtores e incentivem a atividade por meio de linhas de crédito e de novos negócios.

Diante do exposto, a partir da análise das características e da interação entre atores da atividade suinícola na região do Vale do Taquari, pode-se observar que predominam as relações coordenadas por meio de contratos e a integração vertical da produção, assim como ocorre em outras regiões do Brasil (Mieli & Miranda, 2013) e países como os Estados Unidos e Dinamarca (Schulze et al., 2007), bem como fica evidente a relação de dependência que existe entre os produtores rurais e agroindústrias.

5. Considerações Finais

De maneira geral, observou-se que as atividades suinícolas são desenvolvidas através do modelo de integração vertical, através do qual as relações entre as empresas integradoras e os produtores rurais ocorrem de forma dependente, sendo a gestão da cadeia realizada pelas empresas integradoras, que tomam a maior parte das decisões. Em consequência, percebem-se momentos de incertezas e preocupações por parte dos produtores, especialmente por representarem o elo mais fraco da cadeia, carecem ainda de questões fundamentais, como aspectos pertinentes ao pensar e a construir o conhecimento e a gestão de um negócio.

No entanto, ainda assim, os produtores manifestaram que optaram por esse modelo devido a necessidade constante de atualização tecnológica, busca pela melhoria contínua de aumentos de produtividade e competitividade, das exigências do mercado consumidor e da legislação ambiental. E, mesmo nas propriedades não integradas, observou-se que o estabelecimento de parcerias, mesmo que informais, é fundamental para garantir a rentabilidade e o desenvolvimento da atividade.

Quanto aos desafios a serem superados pelos produtores destacam-se os relacionados principalmente à: a) sucessão da propriedade; b) questões legais e ambientais; c) aumento da escala produtiva; d) oscilações de mercado, quanto a preços, matéria-prima e comercialização; e) modernização tecnológica produtiva; f) utilização de mecanismos de controle e gestão; g) tamanho das propriedades; h) ampliação e conquista de novos mercados; e, i) superação das barreiras culturais em relação ao consumo da carne suína, quando comparados a outros setores. Os resultados também indicam dificuldades na cadeia, devido ao grau de concentração de conhecimento e poder das integradoras. Por este motivo, a superação desses aspectos que contribuiriam para maior aprendizagem e confiança entre os diversos elos da cadeia, especialmente na relação entre integrador e integradora.

Sintetizando, o desempenho da cadeia produtiva regional de suínos necessita da efetiva coordenação através da ação conjunta entre produtores rurais e indústrias de transformação, aspectos que favorecem o planejamento e a construção de políticas públicas de interesse comum.

Referências

Batalha, M. O. (2008). Gestão agroindustrial. GEPAI, Grupo de Estudos e Pesquisas Agroindustriais. São Paulo: Atlas.

Benetti, M. D. (2010). O agronegócio gaúcho entre os anos 1980 e 2008. In: Conceição et al. (org.). O movimento da produção (Três décadas de economia gaucha). Porto Alegre: FEE, 2010. Disponível em http://www.fee.rs.gov.br/3-decadas/downloads/volume2/3/maria-benetti.pdf.

Brasil (2006, 24 de julho). Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006. Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. Brasília, DF: Diário Oficial da República Federativa do Brasil.

_______. Ministério do Trabalho e Emprego – MTE (2016). Relação Anual de Informações Sociais. Dados do número de estabelecimentos e de empregados. http://portal.mte.gov.br/rais/.

Callado, A. A. C. (org) (2009). Agronegócio. São Paulo: Atlas, 2009.

Coletti, T. & Lins, H. N. (2011). A suinocultura no vértice das relações entre agroindústria e agricultura familiar no oeste de Santa Catarina. Ensaios FEE, 32(2), p.339-360. Disponível em http://revistas.fee.tche.br/index.php/ensaios/article/view/2464/2980.

FEE. Fundação de Economia e Estatística (2016). Dados da economia gaúcha. Disponível em http://www.fee.tche.br.

Harrigan, K. R. (1985). Strategic flexibility: a management guide for changing times. New York: Lexington Books.

Han, J., Trienekens, J. H., Omta, S.W.F. (2009). Integrated information and logistics management, quality management and firm performance of pork processing industry in China. British Food Journal, 111, p.9 – 25. Disponível em http://www.emeraldinsight.com/doi/full/10.1108/00070700910924209.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2006).  Censo Agropecuário 2006. http://www.sidra.ibge.gov.br/.

_______ (2010). Censo Demográfico 2010. http://www.sidra.ibge.gov.br/.

_______ (2000). Pesquisa Pecuária Municipal 2000. http://www.sidra.ibge.gov.br/.

_______ (2014). Pesquisa Pecuária Municipal 2014. http://www.sidra.ibge.gov.br/.

Lawrence, J. D., Rhodes, V. J., Grimes, G. A., Hayenga, M. L (1997). Vertical coordination in the US pork industry: status, motivations, and expectations. Agribusiness, 13(1), 21–31. Disponível em http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/(SICI)1520-6297(199701/02)13:1%3C21::AID-AGR3%3E3.0.CO;2-P/epdf.

Meneghello, G., Kohls, V. K., Barum, A. O., Bezerra, A. J. A., Rigatto, P. (1999). Sistemas integrados de frangos e suíno: uma visão dos produtores. Revista Brasileira de Agrociência, 5(2), p.166-170. Disponível em https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/CAST/article/download/267/263.

Mieli, M., Miranda, C. R. de (2013). O desenvolvimento da agroindústria brasileira de carnes e as opções estratégicas dos pequenos produtores de suínos do Oeste Catarinense no início do século 21. In: A pequena produção rural e as tendências do desenvolvimento agrário brasileiro: ganhar tempo é possível? – Brasília: CGEE.

Mieli, M., Waquil, P. D. (2006). Comunicado Técnico: transação entre suinocultor e agroindústria em Santa Catarina. Concórdia: Embrapa. Disponível em http://www.cnpsa.embrapa.br/cias/index.php?view=article&catid=8%3Apublicacoes&id=41%3Atransacao-entre-suinocultor-e-agroindustria-em-santa-catarina&format=pdf&option=com_content&Itemid=27.

_______ (2007). Estrutura e dinâmica dos contratos na suinocultura de Santa Catarina: um estudo de casos múltiplos. Estudos Econômicos, 37(4), p.817-847. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-41612007000400005.

Peterson, H. C., Wysocki, A., Harsh, S. B. (2001). Strategic choice along the vertical coordination continuum. International Food and Agrobussiness Management Review, 4, p.149-166. Disponível em http://ageconsearch.umn.edu/bitstream/34469/1/04020149.pdf.

Pinotti, R. N., Paulillo, L. F. de O. (2006). A estruturação da rede de empresas processadoras de aves no Estado de Santa Catarina: governança contratual e dependência de recursos. Gestão & Produção, 13(1), p.167-177. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-530X2006000100015.

Porter, M.E. (1996). Estratégia competitiva: técnicas para análise da indústria e da concorrência. Rio de Janeiro: Campus.

Raynaud, E., Sauvee, L., Valceschini, E. (2005) Alignment between quality enforcement devices and governance structures in the agro-food vertical chains. Journal of Management and Governance, 9, p.47-77. Disponível em http://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10997-005-1571-1#page-1.

Rocha Júnior, W. F. da, Carvalheiro, E. M., Staduto, J. A., Opazo, M. A. U. (2008). Avaliação de contratos: uma abordagem utilizando a análise fatorial de correspondência. Revista de Economia e Sociologia Rural.  Piracicaba, 46 (2), p.455-480. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-20032008000200007.

Schulze, B., Spiller, A., Theuvsen, L. (2007). A broader view on vertical coordination: lessons from German pork production. Journal on Chain and Network Science, 7, p.35-53. Disponível em http://www.wageningenacademic.com/doi/abs/10.3920/JCNS2007.x076.

Trienekens, J., Wognum, N. (2013). Requirements of supply chain management in differentiating European pork chains. Meat Science, 95, p.719–726. Disponível em http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0309174013001137.

Viana, J. G. A., Padula, A. D., Waquil, P. D. (2010). Dinâmica e desempenho da suinocultura do Rio Grande do Sul sob a ótica da organização industrial. Teoria e Evidência Econômica, 16(34), p.9-29.  Disponível em http://www.upf.br/seer/index.php/rtee/article/viewFile/4258/2744.

Vieira, L. M. (2008). The applicability of transaction costs economics to vertical integration decision: evidences from a brazilian beef processor. Organizações Rurais e Agroindustriais, 3, p.317-327. Disponível em http://revista.dae.ufla.br/index.php/ora/article/view/68.

Zylbersztajn, D. (2005). Papel dos contratos na coordenação agro-industrial: um olhar além dos mercados. RER, Rio de Janeiro, 43(3), p.385-420. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/resr/v43n3/27739.pdf.

Waquil, P. D., Souza, M. de (2014). Novas dinâmicas da agricultura no RS: respostas a um novo cenário. In: Desenvolvimento Econômico no Rio Grande do Sul: Já não somos o que éramos? Porto Alegre: Edipucrs.

Williamson, O. E. (1979). Transaction-cost economics: the governance of contractual. Journal of Law and Economics, 22(2), p.233-261. Disponível em https://business.illinois.edu/josephm/BA549_Fall%202010/Session%203/Williamson%20(1979).pdf


1. Doutora em Economia. Professora do Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento. Centro Universitário UNIVATES – Brasil - jbarden@univates.br

2. Doutora em Ambiente e Desenvolvimento. Professora do Centro Universitário UNIVATES – Brasil – fernanda@univates.br

3. Doutor em Agronegócios. Professor do Centro Universitário UNIVATES – Brasil – betoschn@univates.br

4. Doutorando em Administração. Professor do Centro Universitário UNIVATES – Brasil – samuelc@univates.br


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 22) Año 2017

[Índice]

[En caso de encontrar algún error en este website favor enviar email a webmaster]

revistaespacios.com