Vol. 38 (Nº 14) Año 2017. Pág. 30
Gutemberg RIBEIRO 1; Ana Paula Mussi Szabo CHEROBIM 2
Recibido: 26/09/16 • Aprobado: 18/10/2016
2 O contexto ambiental no estudo da inovação
4 A pesquisa de inovação no Brasil
6. Apresentação e discussão dos resultados de pesquisa
RESUMO: Este artigo objetiva explorar a configuração ambiental com vista a preencher a lacuna entre teoria e prática nos estudos sobre inovação, com destaque para as pesquisas de inovação realizadas no Brasil. Observa-se na literatura evidenciada preocupação com o ambiente na abordagem da inovação, mas isso permanece apenas no campo teórico, pois os resultados empíricos de pesquisas não evidenciam esta consideração, principalmente no processo de seleção de indicadores e mensuração da inovação. Apresenta-se a configuração ambiental como instrumento para reduzir a lacuna entre teoria e prática, objetivando resultados mais efetivos para a inovação. |
ABSTRACT: The purpose of this article is to explore the environmental context to fill the gap between theory and practice in the study of innovation, highlighting the innovation research held in Brazil. It is observed in the literature a sharp concern with the environment at innovation approach, but it is remaining only in theory, because the empirical research results do not show this consideration, especially in the selection of indicators and measurement of innovation. The environmental configuration it is presented as a tool for reduce the gap between theory and practice in order to obtain more effective results for innovation. |
Diversos autores têm destacado o aumento da importância da inovação para os estudos organizacionais (Anthony, Johnson, Sinfield & Altman, 2008; Santos, Vasconcelos & Luca, 2013), principalmente pelo fato deste fenômeno estar intimamente relacionado à competitividade (Adams, Bessant & Phelps, 2006; Brito, Brito & Morganti, 2009; Porter, 1998) e a vantagem competitiva ser objeto de desejo das organizações (Hernández, Jiménez & Martín, 2008). Todavia, observa-se grande dificuldade de se tratar com a inovação, pois ainda não se sabe a melhor forma para promove-la, bem como não se tem clareza de quais variáveis devem ser exploradas para estimulá-la (Machado, 2007).
Apesar de a inovação ser um fenômeno antigo (Fagerberg, 2004), um estudo mais aprofundado sobre o tema é observado a partir de Schumpeter (1939), mas mesmo assim o conhecimento mostra-se ainda incipiente. E um dos motivos para isso reside no fato de a inovação apresentar diversidade de caracterizações, apesar de Calia, Guerini e Moura (2007) afirmarem que o tema está bem definido na literatura.
Das várias abordagens sobre inovação, destaca-se a de DeTiene e Koberg (2002) que indica os fatores gerencial, organizacional e ambiental como de grande impacto sobre o processo inovativo, mas que são pouco explorados, principalmente o fator ambiental. Estas autoras afirmam ainda que a negligência com estes fatores propicia a falta de conhecimentos sólidos para se explorar com efetividade a inovação. Existem fortes evidências de que o ambiente influencia a inovação organizacional (Damanpour, 1996), sendo por este motivo uma necessidade considerar o contexto ambiental em sua abordagem. No entanto, este pressuposto não é observado na prática, apesar de muitos estudos asseverarem a importância do ambiente para a inovação.
Assim, constata-se que existe uma lacuna entre o que se encontra nos estudos teóricos sobre inovação e os resultados de pesquisa empírica, que não considera o ambiente ou a combinação de suas variáveis (configuração ambiental) na escolha de indicadores para mensurar a inovação, que é condição básica para bem explorar este fenômeno (Oslo Manual, 2005).
Isto posto, este artigo objetiva explorar o contexto ambiental como forma de reduzir a lacuna entre teoria e prática nos estudos sobre inovação, com destaque para as pesquisas de inovação realizadas no Brasil em 2000, 2003, 2005, 2008 e 2011 (Pintec, 2016). Busca-se, por meio da revisão de literatura e análise bibliométrica, evidenciar os estudos caracterizando o ambiente como fator chave no estudo da inovação e, em contradição, resultados práticos de pesquisa que não inserem o ambiente no contexto de mensuração e análise da inovação.
Neste estudo, o ambiente é tratado em relação à organização, que é abordada como sistema. Assim, tem-se que o ambiente é tudo aquilo que não esta inserido no interior de uma organização; que está além dos limites organizacionais, ou seja, tudo o que está fora do sistema (Bertalanfy, 1968). Tsjua e Mariño (2013) definem ambiente como um conjunto de fatores externos, caracterizados pela incerteza e complexidade, que se alteram e provocam reflexos na organização.
Com a teoria de sistemas, preconizada por Bertalanfy (1968), o ambiente passou a ter maior relevância no estudo das organizações, principalmente considerando a necessidade de importar insumos do ambiente para combater o processo de entropia, proporcionando condições para que a organização consiga sobreviver – homeostase dinâmica. Entretanto, foi a teoria contingencial (Emery & Trist, 1965; Lawrence & Lorsch, 1967) que elevou o status do ambiente a fator elementar na perenidade das organizações, pois todas as ações organizacionais dependiam dos recursos contingenciados pelo ambiente para serem efetivadas. A partir da necessidade de alinhar a estratégia da organização ao ambiente, várias características ambientais se despontam como obstáculos a serem transpostos. Dentre estas características, as mais desafiadoras são: a incerteza e a complexidade (Tsuja & Mariño, 2013; Robbins & Coulter; 2005), a volatilidade (Duncan, 1972), a dinamicidade (Robbins & Coulter, 2005), a imprevisibilidade (Buchko, 1994) e a competitividade (Porter, 1998; Barney, 1991).
O ambiente influencia a dinâmica e a estratégia organizacional (Damanpour, 1996; Tidd, 2001). Assim, é elementar conhecer e entender o ambiente e suas características para a sobrevivência da organização (Moysés, Kestelman, Beecker & Torres, 2010). Para identificar e compreender o que ocorre no ambiente alguns autores recomendam a realização do mapeamento ambiental (environment scanning) como o melhor método (Daft & Weick, 1984; Hambrick, 1982; Zhang, Majid & Foo, 2011). Apesar da inter-relação entre ambiente e inovação evidenciada na literatura, Tidd (2001) afirma ser muito difícil caracterizar, medir e explicar os fatores desta inter-relação.
Como forma de superar tal desafio, o ambiente deve ser caracterizado em termos de sua dimensão. Basicamente são duas as dimensões: o macroambiente ou ambiente remoto – que se encontra mais distante da organização, por isso suas variáveis não sofrem ingerência desta, o que alavanca a dificuldade de se tratar pelo fato de ser genérico – e o microambiente, ou ambiente das tarefas, que está mais próximo da organização e suas variáveis sofrem intervenção desta, mostrando-se às vezes muito particular, pois podem existir distintos microambientes dependendo da área ou setor de atuação.
As principais variáveis do macroambiente são as econômicas, educacionais, socioculturais, políticas, tecnológicas e legais. Já as variáveis mais importantes do microambiente são os consumidores, fornecedores, competidores e outros stakeholders (Oslo Manual, 2005; Moysés et al., 2010; Myburgh, 2004; Sawyerr, 1993; Zhang et al., 2011). A caracterização destes ambientes constam da figura 1.
Figura 1 – Dimensões e variáveis ambientais
Fonte: Adaptado de Moysés et al. (2011) e Zhang et al. (2011).
Pelo fato de o ambiente fomentar a inovação e estar em constante processo de mudança, Tsuja e Mariño (2013) apontam-no como o principal fator no processo inovativo. Todavia, o ambiente deve ser tratado a partir de suas variáveis. E como o macroambiente mostra-se mais independente pelo fato de não sofrer ingerência da organização, este mostra-se mais importante no estudo das configurações do ambiente e sua influência sobre a inovação. Assim, abordagem das configurações busca aprofundar o conhecimento sobre a forma de o ambiente influenciar a organização (Mintzberg, Ahlstrand & Lampel, 1998). De acordo com estes autores, esta abordagem evidencia que certos atributos se alinham e, de modo interagente, complementam-se de forma a propiciar a organização determinada estrutura que a permite enfrentar momentos de instabilidade e de transformação.
Desta forma, o contexto ambiental induz a organização a se moldar para se adaptar à conformação do ambiente. E considerando as variáveis macroambientais, tratadas a partir de agora por variáveis ambientais, pelo fato de serem desconsideradas as microambientais neste estudo, constata-se que diversas configurações podem ser evidenciadas para induzir as organizações a se moldarem. Estas configurações são entendidas pela possibilidade de combinação das diversas variáveis que compõem o ambiente.
A partir da constatação de sua importância para as organizações e para o capitalismo (Schumpeter, 1939), a inovação sempre foi tratada sob o enfoque sistêmico, onde diversos modelos de abordagens foram sendo elaborados de forma a tentar explicar como se processa o fluxo da inovação. Estes modelos constam do Quadro 1.
Quadro 1 – Modelos sistêmicos de inovação
Sequência |
Modelo de inovação |
Autores |
1 |
Modelo Linear de Inovação – Pipe-Line Model |
Bush (1945) |
2 |
Modelo Ligação em Cadeia – Chain-Linked Model |
Kline e Rosenberg (1986) |
3 |
Modelo Sistema de Pesquisa em Transição |
Cozzens, Healey, Rip e Ziman (1990) |
4 |
Modelo Modo 2 de produção de conhecimento |
Gibbsons et al. (1994) |
5 |
Modelo Hélice Tripla – Triple Helix Model |
Etzkowitz e Leydesdorff (1995) |
6 |
Modelo Sistema de Pesquisas Pós-Moderna |
Rip e Meulen (1996) |
7 |
Modelo Hélice Quádrupla – Quadruple Helix Model |
Carayannis e Campbell (2012) |
8 |
Modelo Hélice Quíntupla – Quintuple Helix Model |
Carayannis, Barth e Campbell (2012) |
Fonte: Os autores (2016), com base na revisão de literatura.
Além destes modelos mais comuns na literatura, outras formas de abordagem da inovação também são descritas, como os modelos diamante da inovação, combustível para a inovação, cadeia de valor para a inovação e o manual de Oslo (Borocki, Orcik e Cjivic, 2013). No entanto, apesar das inúmeras correlações entre o ambiente e a inovação, percebe-se que essa importância permanece apenas no campo teórico, pois os resultados práticos de pesquisa não consideram o contexto ambiental no trato com a inovação, principalmente para mensurá-la.
Entretanto, deve ser ressaltado que o ambiente deve ser observado na abordagem da inovação. A melhor constatação teórica da necessidade de se considerar o ambiente no sistema de inovação materializa-se na elaboração do Manual de Bogotá (2001), onde a comunidade latino-americana verificou a necessidade de se adotar um conjunto de indicadores e variáveis regionais que captam melhor as especificidades que caracterizam o ambiente tecnológico das empresas da américa-latina.
A inovação pode ser definida como a aplicação de novas ideias ao produto, processo ou outro aspecto da atividade de uma empresa de forma a aumentar seu valor (Greenhagh e Rogers, 2010). Para Schumpeter (1939), a inovação é uma função baseada no pensamento criativo e ação, onde produtos e hábitos de consumo são substituídos por novos; é tudo que diferencia e cria valor em um negócio. Já a introdução no mercado, de forma bem sucedida, de produtos, serviços, processos, métodos e sistemas que não existiam previamente ou que passaram a ter alguma especificidade nova e diferente da que vigorava até então é a definição de inovação no Manual de Frascati (2002). Este manual tem o foco precípuo voltado para a pesquisa e desenvolvimento (P&D). Com a adoção do Manual de Oslo (2005), o conceito de inovação foi ampliado, abarcando ainda um novo método de marketing, a implantação de um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas. Migrou-se da visão linear para uma visão sistêmica da inovação.
Existem inúmeras formas de se classificar a inovação. Cada uma atendo-se a determinada característica ou especificidade do processo inovativo. A despeito das inúmeras formas de nominar a inovação, observa-se na literatura que ainda predominam os tipos clássicos propostos por Schumpeter (1939): 1) inovação radical – entendida como a criação de um produto ou procedimento totalmente novo, sem nenhuma característica relacionada com o anterior – e 2) inovação incremental – advinda de melhorias realizadas em cima de uma inovação já existente, alterando, substituindo ou adicionando partes ou outras características (Gallouj & Weinstein (2007).
Apesar da diversidade de classificação da inovação, de forma geral, os tipos ou graus de novidade podem ser agrupados de acordo com alguns aspectos específicos, conforme se observa no Quadro 2.
Quadro 2 – Tipos de inovação
Aspecto específico |
Tipo de inovação |
Dimensão |
Inovação local (nível da organização), regional, nacional e internacional. |
Foco |
Inovação incremental, semi-radical e radical. |
Forma |
Inovação tecnológica e inovação organizacional. |
Localização na empresa |
Inovação localizada e sistêmica. |
Objeto |
Inovação de produto, inovação de processo, inovação de marketing, inovação de negócio e inovação de serviço. |
Propósito |
Inovação ocasional e intencional. |
Temporalidade |
Inovação de longo, médio e curto prazo. |
Fonte: Elaborado pelos autores (2016), a partir da revisão de literatura.
Classificar a inovação e nominá-la de acordo com alguma especificidade não implica conhecer o processo inovativo. Uma das formas para se compreender um processo, é planejá-lo, executá-lo e mensurar seus resultados para que se tenha condições de comparar a situação ideal – estabelecida no planejamento – com a situação real – resultado obtido com o processo. Indiferentemente, o processo de inovação, quer seja voltado ao produto ou à área de serviço, carece de mensuração para sua gestão. Assim, é fundamental identificar uma forma confiável e válida de mensurar os resultados da inovação e para isso as métricas são ferramentas elementares.
Na construção de uma métrica é necessário estabelecer duas dimensões de comparação. E para comparar as dimensões, estas precisam estar representadas em base comum, quer dizer, devem ser caracterizadas com indicadores que podem ser comparados para que possam ser medidos pela mesma régua.
De acordo com Ashton e Klavans (1997), indicador é um dado estatístico, validado estatisticamente, usado para mensurar algo intangível, permitindo medir resultados comparáveis. Para Freeman & Soete (2007), o problema reside na definição, classificação e mensuração dos indicadores. Para medir a inovação, fatores e indicadores que sejam validados para assegurar confiabilidade à mensuração devem ser identificados.
Pelo fato de nem sempre se conhecer com propriedade os indicadores que serão utilizados no processo de mensuração, medir fenômenos tem se mostrado um grande desafio para os pesquisadores, principalmente quando se busca mensurar a inovação, que é um fenômeno volátil e dinâmico. Assim, quando se trata de inovação é um desafio identificar o que deve ser medido e como medir (Kirchhoff, Linton, & Walsh, 2013).
Além das questões relativas ao “o que” e “como” medir na inovação, soma-se a questão da confiabilidade das informações obtidas, em especial as que não são de domínio público, pois as organizações podem ocultar ou manipular os dados e informações em função do receio de informar algum segredo à concorrência ou para não revelar alguma prática heterodoxa com relação a legalidade (Nelson, Earle, Howard-Grenville, Haack & Young, 2014).
Edison, Ali e Torkar (2013), revisando a literatura constataram a existência de 232 métricas para medir inovação. Verificaram que apenas 85 tinham validade estatística e que só doze delas são citadas frequentemente em estudos.
De acordo com Adams et al. (2006), existem erros comuns que aumentam a dificuldade de mensuração da inovação. Estes erros, relacionados à construção de instrumentos de medida, são: 1) lacuna de validade – onde não se tem evidência de que a métrica utilizada realmente mensura o que se deseja medir; e 2) lacuna de omissão, onde aspectos relacionados à inovação são identificados, mas não se tem métricas para medi-los. Para Anthony et al. (2008), os erros mais comuns são: usar um conjunto pequeno de métricas, concentrar-se na mensuração de atividades de baixo risco e deter-se mais nos fatores de entrada do que nos de saída e processo.
Matesco (1994) identificou indicadores agrupados em três tipos básicos de mensuração: entrada (inputs); processamento (throughput); e saída (output). Notou ainda que grande parte das propostas para medir a inovação nas organizações concentra-se nas medidas de output, apesar da existência de alguns estudos abordando as de input (Adams et al., 2006). Todavia, poucas métricas se utilizam das medidas de throughput (Brito, Brito & Morganti, 2009).
Milberg e Vonorta (2005) em extensa revisão de literatura identificaram e classificaram os indicadores de inovação em três gerações de indicadores de inovação. A primeira geração que contém indicadores de entrada no processo de inovação tem como período as décadas de 1950 e 1960. Os principais indicadores são: gastos em P&D, pessoal alocados em P&D, capital e intensidade técnica. Os indicadores de segunda geração (de saída do processo de inovação), compreendida entre as décadas de 1970 a 1980, têm como principais indicadores: registro de patentes, publicações científicas, produtos e mudança de qualidade. A terceira geração, da década de 1990, nominada indicadores de inovação tratam do número de pesquisas de inovação e capacidade de inovar por benchmarking. Por último, segue-se a quarta geração que comporta os indicadores de processo, destacando-se conhecimento, intangibilidade, redes de trabalho, cluster de inovação, técnicas de gestão, sistemas dinâmicos e retorno e risco.
Ressalta-se que a quarta geração contempla os indicadores de inovação considerados contemporâneos e que se mostram mais indicados para as métricas que proporcionam mais validade e confiabilidade. No entanto, estes indicadores ainda se encontram em fase embrionária, necessitando de estudos mais aprofundados (Milberg & Vonortas, 2005).
Observa-se, de modo geral, que os indicadores utilizados para mensurar a inovação estão inseridos em dois grupos: 1) indicadores básicos – caracterizados como fator de mensuração direta; e 2) indicadores avançados – que utilizam fatores combinados para representar uma dimensão, caracterizados por “modelo por índice composto”. Estes são os mais comuns para tratar de variáveis complexas (Manual de Oslo, 2005).
A despeito de vários estudos tratando da seleção de indicadores, um fator importante de influência efetivamente não é considerado, qual seja, o ambiente. Nota-se que os diversos estudos contemplam apenas apresentação dos indicadores, mas não se detém na análise do contexto ambiental para a seleção destes indicadores, tão pouco explicam as razões da escolha de um ou outro indicador em função do contexto ambiental.
Assim, apesar do escopo da inovação ter sido expandido nas décadas recentes, englobando fatores outros que não só os de P&D, ressalta-se que os indicadores em sua maioria ainda recaem basicamente nos idealizados para a P&D. Este fato levou a comunidade europeia a buscar uma nova geração de indicadores para medir o desempenho em inovação, isso já em 1995 (OCDE, 1995).
Pode ser observado que os indicadores de inovação usados atualmente, além de ser das gerações iniciais, se valem de vários indicadores utilizados para medir competitividade – a demonstração está no tópico 6 deste trabalho. A despeito da inovação e a competividade serem fenômenos imbricados, não foi observado nenhum estudo justificando a utilização dos mesmos indicadores. Ressalta-se que nos estudos de ambos os fenômenos é lugar comum exaltar a importância do ambiente na teoria, mas que não se refletem nos resultados empíricos de pesquisa; nem tão pouco observam-se estudos correlacionando o contexto ambiental a seleção de indicadores, quer seja para a inovação, quer seja para a competitividade.
Revisando a literatura é possível encontrar estudos sobre a inovação no Brasil. Todavia, o marco inicial de uma pesquisa ampla de inovação no segmento industrial pode ser estabelecido com a primeira pesquisa de inovação tecnológica – Pintec, realizada no Brasil no ano 2000, abarcando o triênio 1998-2000 (Pintec, 2002). Esta pesquisa, que tem por objetivo a construção de indicadores setoriais nos âmbitos nacional e regional das atividades de inovação tecnológica nas empresas industriais brasileiras, é realizada periodicamente e já contemplou os triênios 2001-2003, 2003-2005, 2006-2008 e 2009-2011; o triênio 2012-2014 encontra-se em fase de operacionalização (Pintec, 2016).
Nos quatro primeiros triênios, a pesquisa foi nominada Pesquisa de Inovação Tecnológica; a partir do quinto passou a ser chamada apenas de Pesquisa de Inovação. O termo “tecnológica” foi excluído para dar maior abrangência e abarcar outros aspectos, como criatividade, capacidade gerencial e motivação para a inovação. Também foi inserido na metodologia tecnologias emergentes como a biotecnologia e a nanotecnologia (Pintec, 2013).
A estruturação da pesquisa Pintec prende-se a padrões internacionais, tendo-se como referência o Manual de Oslo (2005). Todavia, isso não assegura total validade e confiabilidade aos resultados de pesquisa, pois a inovação é tratada pela perspectiva do sujeito, ou seja, pela ótica da organização. O próprio Manual de Oslo (2005) chama a atenção para o fato de que nem todas as mudanças introduzidas pelas empresas nos produtos ou processos para fazê-los novos ou aprimorados são consideradas inovações. Assim, tem-se que se a perspectiva da empresa sobre a inovação for falha, corre-se o risco de mensurá-la de forma enviesada, com desvios consistentes.
Sabe-se que é fundamental ter métricas para gerir um determinado processo (Melnyk, Stewart & Swingk (2004). No entanto, a seleção dos indicadores para a construção da métrica deve ser pautada por evidências científicas para que seja alavancada a validade e confiabilidade da medida. E pelo fato de o processo de mensuração da inovação ainda ser incipiente, estudos tratando do processo de escolha de indicadores mostra-se necessário.
A despeito de algumas mudanças, observa-se que o formato da pesquisa Pintec praticamente é o mesmo desde que foi realizada no triênio inicial. As variáveis selecionadas para a pesquisa são recomendações internacionais (Manual de Oslo, 2005) e não foram observados estudos prévios no sentido de verificar se estas se aplicam com efetividade à realidade brasileira. Deve ser destacada a grande diversidade em termos de variáveis macroambientais ao se considerar as regiões ou estados brasileiros, principalmente em se comparando as regiões mais desenvolvidas do centro-sul com as mais carentes da região norte-nordeste do país.
É incontestável a contribuição das pesquisas Pintec (2016), todavia são necessárias atualizações e adequações para que seus resultados possam contribuir com o desenvolvimento das organizações nacionais e do Brasil. No entanto, um aspecto que chama a atenção é o fato de o Manual de Oslo (2005) ter ampliado o conceito de inovação, extrapolando o foco em P&D que era atribuído pelo Manual de Frascati, mas as pesquisas brasileiras ainda tem por cerne explorar as inovações de produto e processo como foco em P&D (Pintec, 2016); e os indicadores ainda são vinculados a P&D, realidade que precisa mudar.
Na construção deste artigo foram utilizadas as pesquisas bibliográficas, com vista a revisão de literatura abordando os temas ambiente, inovação e indicadores de inovação, e a análise bibliométrica e de dados secundários (Bhattacherjee, 2012) para identificar e caracterizar os indicadores de inovação e evidenciar a não interação entre o contexto ambiental e a inovação.
As bases de dados utilizadas foram a da EBSCO host e o portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. O total de artigos encontrados foram 135. Na pesquisa aos bancos de dados foi utilizada a opção “AB Resumo” para que fossem disponibilizados apenas os resumos dos artigos para uma seleção dos que apresentavam indicadores voltados à inovação e métricas da inovação.
Pelo fato de o número de publicações ser elevado, foi estabelecido como ponto de corte o período compreendido entre 2000 e 2015 como o de relevância para análise. Este período coincide com o de realização das pesquisas de inovação no Brasil que efetivamente começaram no ano de 2000 – triênio 1998-2000 (Pintec, 2002).
Realizada a aplicação de filtros, foi totalizado 57 artigos na base EBSCO host. Aplicando o mesmo procedimento na plataforma CAPES, tendo-se o cuidado de eliminar os artigos já listados na EBSCO, foram encontrados 50; os resultados encontram-se no Tabela 1.
Tabela 1 – Total de artigos por base de dados e termo pesquisado
Base de dados |
Termo pesquisado |
Período |
Total |
EBSCO |
Inovação |
2000 – 2015 |
57 |
Inovação/mensuração |
|||
CAPEs |
Inovação |
2000 – 2015 |
50 |
Inovação/mensuração |
|||
Total |
107 |
Fonte: Elaborado pelos autores (2016), com base nas plataformas CAPES e EBSCO.
Com relação aos dados secundários analisados neste artigo, estes foram coletados nos relatórios de pesquisa sobre inovação da Pintec (2016), e no banco de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2016). Buscou-se identificar os indicadores de inovação utilizados nas pesquisas empíricas, com especial atenção para as pesquisas da Pintec, bem como se há alguma relação entre estes indicadores e os resultados de pesquisas teóricas, que evidenciam a importância do ambiente. Procurou-se, por meio da comparação dos critérios de escolha dos indicadores utilizados, identificar se as variáveis ambientais foram consideradas na seleção dos indicadores usados para mensurar a inovação.
Diversos modelos tratando de inovação são mencionados na literatura. No entanto, nenhum deles trata especificamente dos indicadores para mensurar a inovação. O que se observa é que na abordagem de cada um dos modelos, as dimensões, objeto de pesquisa, são descritas e caracterizadas, mas os indicadores para serem utilizados na mensuração destas dimensões são emprestados de outras áreas sem a devida adaptação, pois não foi verificado estudo específico tratando da seleção de indicadores. E, de acordo com Ashton e Klavas (1997), um indicador para mensurar algo intangível, deve ser estudado e validado estatisticamente para a obtenção de resultados comparáveis; e a inovação é um fenômeno intangível.
Assim, dimensões como governo, política, universidade, legislação, instituições de pesquisa, sociedade, educação e tecnologia, entre outras, são tratadas nos modelos Pipe-line Model (Bush, 1954), Chain-linked Model (Kline & Rosenber, 1986), Pesquisa em Transição (Cozzens et al., 1990), Modo 2 (Gibbsons et al., 1994), Tiple Helix Model (Etzkowitz & Leydesdorff, 1995), Pesquisa Pós-Moderna (Rip & Meulen, 1996), Quadruple Helix Model (Carayannis & Campbell, 2012) e Quintuple Helix Model (Carayannis, Barth & Campbell, 2012), sem a devida preocupação de abordar indicadores que permitam mensurar os resultados do processo inovativo para posterior comparação ou mesmo para a gestão da inovação. A correlação dos indicadores como o ambiente inexiste.
Outros modelos mais genéricos tratando de inovação também são citados na literatura, como os modelos diamante da inovação, combustível para a inovação, cadeia de valor para a inovação e o manual de Oslo (Borocki, Orcik e Cjivic, 2013), porém tal qual os modelos mais específicos do processo inovativo, não se preocupam com os indicadores de mensuração.
Evidencia-se que diversos estudos consideram o ambiente de forma macro, evidenciando características como instabilidade, dinamicidade, complexidade, volatilidade e incerteza, mas não vinculam estas especificidades às variáveis ambientais, como as econômicas, educacionais, políticas, socioculturais, tecnológicas e legais (Manual de Oslo, 2005; Moysés et al., 2010; Myburgh, 2004; Sawyerr, 1993; Zhang et al., 2011).
Associando as características ambientais às especificidades das variáveis que compõem o ambiente tem-se como resultado contextos de ambiente diversificados. Desta forma, as características do ambiente combinadas a cada variável fazem com que esta assuma dimensões diferentes. Tem-se que o contexto de um ambiente econômico volátil possui características muito distintas ao de um ambiente estável. O mesmo se aplica as outras variáveis ambientais como educação, social e política. Se o ambiente é o resultado da interação das variáveis que o compõem, a forma como estas se configuram impactam diretamente no comportamento de um determinado indicador.
Os indicadores de inovação mais utilizados nas pesquisas foram identificados com a análise bibliométrica. Inicialmente foi constatado o grande número de citações de indicadores, confirmando o que disseram Edison, Ali e Torkar (2013). Como a lista de indicadores era extensa, foi adotado o critério de se considerar o indicador que foi citado por mais de um autor. Assim, chegou-se ao total de 23 indicadores de inovação.
Como não foi observado na literatura estudos específicos tratando dos indicadores de inovação contextualizados ao ambiente, e pelo fato de a inovação e a competitividade estarem imbricados, foi realizada uma análise bibliométrica do uso dos indicadores de competitividade com o único objetivo de se comparar com os indicadores de inovação. A coleta dos dados sobre a competitividade seguiu os mesmos parâmetros da realizada na identificação dos indicadores de inovação.
Do resultado da análise, constatou-se que nove indicadores são indistintamente utilizados para mensurar tanto a inovação quanto a competitividade, o que comprova a inter-relação entre estes fenômenos. Os resultados são apresentados na tabela 2.
Analisando os indicadores usados para medir inovação e considerando os agrupamentos de indicadores caracterizados por Matesco (1994) e Adams et al. (2006), constata-se que os mais utilizados em pesquisas são os que estão associados aos grupos de input e output do sistema inovação. Poucos são os indicadores classificados como de throughput. Ressalta-se ainda que os indicadores de throughput são relegados a segundo plano, pois são poucos os achados de pesquisa sobre este tipo de indicador, confirmando o que disseram Brito et al. (2009). Isso ocorre pelo fato destes indicadores serem mais complexos e exigirem um “modelo por índice composto”, combinando um grupo de indicadores para representar uma dimensão (Milberg & Vonorta, 2005). Estes modelos são os mais comuns para tratar de variáveis complexas, segundo o Manual de Oslo (2005).
Tabela 2 – Principais indicadores de inovação e os utilizados para mensurar competividade
Indicador de inovação |
Frequência |
(%) |
Competitividade |
Investimento (gasto) em P&D |
58 |
15,85 |
x |
Receita com vendas |
41 |
11,20 |
x |
Número de patentes |
36 |
9,84 |
x |
Pessoal alocado à P&D |
31 |
8,47 |
x |
Lançamento de novos produtos |
31 |
8,47 |
|
Lucro |
21 |
5,74 |
x |
Publicações científicas |
18 |
4,92 |
|
Número de doutores, mestres e especialistas |
17 |
4,64 |
|
Número de projetos de inovação |
20 |
5,46 |
|
Capacidade de inovação |
11 |
3,00 |
|
Participação no mercado |
11 |
3,00 |
x |
Número de marcas |
10 |
2,73 |
x |
Capacidade gerencial |
9 |
2,46 |
|
Crescimento no mercado |
8 |
2,19 |
|
Produtividade |
7 |
1,91 |
x |
Exportação |
6 |
1,64 |
x |
Número de empregos gerados |
6 |
1,64 |
|
Número de novos clientes |
6 |
1,64 |
|
Ferramentas de gestão da informação |
6 |
1,64 |
|
Aquisição de máquinas e equipamentos |
5 |
1,37 |
|
Balança de pagamentos |
3 |
0,82 |
|
Medidas financeiras |
3 |
0,82 |
|
Análise de mercado |
2 |
0,55 |
|
Total |
366 |
100 |
|
Fonte: Os autores (2016).
Analisando os indicadores usados para medir inovação e considerando os agrupamento de indicadores caracterizados por Matesco (1994) e Adams et al. (2006), constata-se que os mais utilizados em pesquisas são os que estão associados aos grupos de input e output do sistema inovação. Poucos são os indicadores classificados como de throughput. Ressalta-se ainda que os indicadores de throughput são relegados a segundo plano, pois são poucos os achados de pesquisa sobre este tipo de indicador, confirmando o que disseram Brito et al. (2009). Isso ocorre pelo fato destes indicadores serem mais complexos e exigirem um “modelo por índice composto”, combinando um grupo de indicadores para representar uma dimensão (Milberg & Vonorta, 2005). Estes modelos são os mais comuns para tratar de variáveis complexas, segundo o Manual de Oslo (2005).
Apesar dos indicadores de input e output, os mais utilizados nos estudos sobre inovação, estarem intimamente vinculados aos fatores ambientais, não existem estudos relacionando-os, pois não foram observadas pesquisas que levam em consideração o ambiente na seleção e uso dos indicadores tanto para mensurar a inovação.
Diversas são as possiblidades das variáveis ambientais se interagirem e se conformarem, resultando configurações diferenciadas de ambiente que têm impacto direto na abordagem da inovação. As variáveis ambientais (macroambientais, que são as de interesse neste estudo) mostram-se mais incertas e complexas pelo fato de estarem mais distantes da organização, sem receberem a ingerência desta; por esse motivo têm maior poder de influência (Zhang, et al., 2011) e têm maior importância no estudo das configurações ambientais. Destacam-se como preponderantes no macroambiente as variáveis econômica, educacional (que engloba a tecnológica), social e política (que abarca a legal) (Manual de Oslo, 2005; Moysés et al., 2010; Zhang et al., 2011). Assim, admitindo-se duas possibilidades extremas para cada uma das variáveis ambientais tratada neste artigo, uma positiva (++++) e outra negativa (----), como por exemplo, variável econômica: desenvolvida ou estagnada; variável educacional: avançada ou ultrapassada, podem ser caracterizadas 16 Configurações Ambientais (CA => 24 = 16; quatro variáveis com duas possibilidades cada uma). Estas configurações podem variar de uma configuração totalmente positiva à outra totalmente negativa, conforme demonstrado o Quadro 3.
Quadro 3 – Possibilidades de Configurações Ambientais
Configuração |
Macrovariáveis ambientais |
|||||||
Econômica |
Educacional |
Social |
Política |
|||||
Positiva |
Negativa |
Positiva |
Negativa |
Positiva |
Negativa |
Positiva |
Negativa |
|
CA1 |
x |
|
x |
|
x |
|
x |
|
CA2 |
x |
|
x |
|
x |
|
|
x |
CA3 |
x |
|
x |
|
|
x |
x |
|
CA4 |
x |
|
x |
|
|
x |
|
x |
CA5 |
x |
|
|
x |
x |
|
x |
|
CA6 |
x |
|
|
x |
x |
|
|
x |
CA7 |
x |
|
|
x |
|
x |
x |
|
CA8 |
x |
|
|
x |
|
x |
|
x |
CA9 |
|
x |
x |
|
x |
|
x |
|
CA10 |
|
x |
x |
|
x |
|
|
x |
CA11 |
|
x |
x |
|
|
x |
x |
|
CA12 |
|
x |
x |
|
|
x |
|
x |
CA13 |
|
x |
|
x |
x |
|
x |
|
CA14 |
|
x |
|
x |
x |
|
|
x |
CA15 |
|
x |
|
x |
|
x |
x |
|
CA16 |
|
x |
|
x |
|
x |
|
x |
Fonte: Elaborado pelos autores (2016).
Desta forma, se as configurações ambientais são diferentes, impactando de forma distinta a inovação, tem-se que cada uma destas configurações demandam indicadores mais apropriados ao seu contexto para que se consiga validade e confiabilidade na mensuração da inovação. Medir a inovação em contextos tão distintos com os mesmos procedimentos e indicadores mostra-se um equívoco, pois, de acordo com Borocki et al. (2013), inexiste medida padronizada para mensurar a inovação.
Esta prudência, no entanto, não é observada na prática de pesquisa. Particularmente nos diversos estudos de inovação da Pintec (2016), por exemplo, dos 23 indicadores listados na Tabela 2 – os mais utilizados na pesquisa de inovação – dez deles são usados na composição da métrica de mensuração do processo inovativo no Brasil. E são utilizados sem nenhuma adequação, apesar da grande diversidade de contexto das variáveis econômicas, educacionais, sociais e políticas nas regiões e estados brasileiros. Os indicadores utilizados encontram-se na Tabela 3.
Tabela 3 – Indicadores de inovação utilizados pela Pintec
Ordem |
Indicador de inovação |
1 |
Investimento (gasto) em P&D |
2 |
Receita com vendas |
3 |
Número de patentes |
4 |
Pessoal alocado à P&D |
5 |
Lançamento de novos produtos |
6 |
Número de doutores, mestres e especialistas |
7 |
Número de projetos de inovação |
8 |
Capacidade de inovação |
9 |
Participação no mercado |
10 |
Análise de mercado |
Fonte: Os autores (2016), extraído da Pintec (2016).
A diversidade de contexto, principalmente dos estados brasileiros, pode ser evidenciada no ranking de competitividade elaborado em conjunto pelas consultorias britânica Economist Intelligence Unit (EIU) e brasileiras Centro de Liderança Púbica (CLP) e Tendências Consultoria (Exame, 2015). Dos oito estados brasileiros mais competitivos, sete deles são da região sul-sudeste. E os 16 últimos são todos da região norte-nordeste. Não há dúvida de que as variáveis ambientais (econômicas, educacionais, sociais e políticas) desses estados conduziram a este resultado tão discrepantes.
O ranking (Exame 2015), que tem como foco de pesquisa a infraestrutura, inovação, capital humano, educação e potencial de mercado, dentre outros, demostra de forma contundente a disparidade de contextos entre os estados brasileiros. Se a diferença de configuração ambiental é tão latente, os indicadores para compor métricas do sistema inovativo, na composição de um “modelo por índice composto”, conforme orientação do Manual de Oslo (2005), devem ser escolhidos conforme adequação entre indicadores e configuração ambiental, pois não se recomenda usar medidas padronizadas para atender a todas as necessidades de mensuração da inovação (Borocki et al., 2013).
Deve ser destacado também a utilização dos mesmos indicadores para pesquisas em épocas e regiões geográficas diferentes. Indicadores utilizados, como “taxa de inovação” e “dispêndio em P&D”, por exemplo, por ter uma inter-relação muito forte com o momento econômico vivido pela empresa por ocasião da pesquisa, podem ser influenciados. Paradoxos são observados analisando os dados publicados pela Pintec (2016), que tratam dos indicadores “taxa de inovação” e “dispêndio em P&D”, e indicadores diversos, conforme tabelas 4 e 5, respectivamente.
Tabela 4 – Taxa de inovação na indústria
Período |
Taxa de inovação (%) |
Taxa de inovação de produto (%) |
Taxa de inovação de processo (%) |
1998-2000 |
31,52 |
17,58 |
25,22 |
2001-2003 |
33,27 |
20,35 |
26,89 |
2003-2005 |
33,36 |
19,53 |
26,91 |
2006-2008 |
38,11 |
22,85 |
32,10 |
2009-2011 |
35,56 |
17,26 |
31,67 |
Fonte: Os autores (2016) [extraído das Pesquisas Pintec (2016)].
-----
Tabela 5 – Indicadores econômicos e de inovação no Brasil
Indicador |
2000 |
2003 |
2005 |
2008 |
2011 |
Dispêndio em P&D (milhões) |
3.742 |
5.099 |
10.387 |
15.229 |
19.955 |
PIB (milhões) |
1.179.482 |
1.699.948 |
2.147.239 |
3.032.203 |
4.143.013 |
Relação Dispêndio em P&D / PIB (%) |
0,32 |
0,30 |
0,48 |
0,50 |
0,48 |
Inflação (%) |
5,97 |
9,30 |
5,69 |
5,90 |
6,50 |
Juros – Taxa anualizada (%) |
15,76 |
16,32 |
18,00 |
13,66 |
10,90 |
Receita líquida com vendas (milhões) |
- |
- |
- |
1.718.740.676 |
2.149.773.927 |
Fonte: Os autores (2016) [com base nos dados do IBGE (2016)].
Constata-se que mesmo apesar das condições econômicas turbulentas nos períodos considerados, onde as taxas de juros e inflação (variáveis econômicas) evidenciaram fortes altas e baixas, que influenciaram a disponibilidade de caixa e crédito para as organizações, o dispêndio em P&D foi crescente (Tabela 5), o que é um contrassenso. Uma possível explicação pode ser o fato de uma elevação na taxa de inovação implicar maior competitividade, refletindo em melhores resultados que possibilitam um gasto maior com P&D. No entanto, isso não se sustenta, pois no período de 2009-2011 (Tabela 4) a taxa de inovação sofreu uma redução e o dispêndio em P&D continuou sua trajetória de alta.
Destaca-se que apesar de o Brasil ter apresentado acentuados altos e baixos na economia no período de 2000 a 2013, os indicadores utilizados pela Pintec praticamente foram os mesmos (Tabela 3). Observa-se apenas uma mudança no décimo segundo indicador no relatório de 2006-2008 e a inclusão do “uso de biotecnologia e nanotecnologia” no relatório 2009-2011. (Pintec, 2016).
Deve ser destacado ainda que na escolha dos indicadores de inovação das pesquisas Pintec (2016) não foi observado nenhum estudo correlacionando-os ao ambiente. Tão pouco foi inserida qualquer menção sobre a influência do contexto ambiental sobre a mensuração do processo inovativo; no manual de instrução sobre a pesquisa e nas instruções de preenchimento do questionário não consta nenhuma menção. Evidencia-se que o Manual de Oslo chama a atenção para o fato de as pesquisas de inovação serem realizadas sob a perspectiva do sujeito que participa da pesquisa. Ressalta-se novamente que a recomendação sobre considerar o ambiente, e suas possíveis configurações, na mensuração da inovação manifesta-se em teoria; na prática a realidade é outra.
Apesar de ser repetitiva a caracterização da importância do contexto ambiental na abordagem da inovação nos vários estudos teóricos, constata-se que todos os indicadores usados pela Pintec (2016), tendo como referência o Manual de Oslo (2005), foram elaborados com base em outra realidade, evidenciando a distância entre a teoria e a prática nos estudos de inovação.
É incontestável a contribuição das pesquisas Pintec (2016) para a construção de indicadores setoriais nas atividades de inovação nas empresas brasileiras, todavia são necessários ajustes para que seus resultados possam contribuir com o desenvolvimento das organizações nacionais e do Brasil, principalmente buscando alinhar a prática às orientações teóricas. Neste sentido, a abordagem do contexto ambiental no trato da inovação mostra-se uma iniciativa muito positiva, possibilitando preencher a lacuna existente ente teoria e prática nos estudos de inovação.
A despeito de existir diversos modelos tratando de inovação que evidenciam o contexto ambiental como fator de influência para o processo inovativo, com particular atenção para os indicadores para as métricas de inovação, observa-se a inexistência desta abordagem nos resultados de pesquisa empírica. Destaca-se que diferentes variáveis ambientais possibilitam a conformação de várias configurações de ambientes, que podem demandar adequado indicador de mensuração, mas isso é desprezado nos resultados práticos de pesquisa.
Nos diversos modelos de inovação, indicadores são apresentados para sua mensuração, todavia, o contexto ambiental não é levado em conta na escolha dos indicadores adequados em relação à validade e confiabilidade. Observa-se que alguns indicadores, como receita com vendas, lucro, capacidade gerencial e produtividade, muito sensíveis ao contexto ambiental, em nenhum estudo explora-se a correlação destes fatores. Isso permite constatar que as afirmações da teoria são divergentes da prática de pesquisa. Decorre desta constatação a evidência da necessidade de estudos considerando o ambiente na seleção de indicadores mais adequados para uma determinada realidade com vista a mensurar de forma mais efetiva a inovação.
O estudo do contexto ambiental, com a consideração das possíveis configurações de ambiente, pode propiciar maior validade e confiabilidade na construção de métricas para a mensuração da inovação. Com indicadores mais adequados, as métricas podem ser compostas com base no “modelo por índice composto”, possibilitando tratar as variáveis mais complexas inerentes à inovação. A compreensão do impacto do ambiente ou da configuração ambiental na inovação pode facilitar o uso de indicadores contemporâneos (4a geração), com resultados mais efetivos no tratamento de variáveis complexas. Apesar da inovação mostrar-se uma variável intangível, de difícil mensuração, uma abordagem contextualizada a partir da configuração ambiental apresenta-se como possível solução para transpor tal desafio. Desta forma, as dificuldades e incertezas de se trabalhar com indicadores podem ser reduzidas, assegurando maior efetividade na mensuração da inovação.
Desse modo, o estudo da inovação a partir do contexto ambiental permitirá encontrar os indicadores mais adequados e alavancar a fidedignidade dos resultados. Com isso, o distanciamento entre a teoria e a prática nos estudos de inovação com este tipo de abordagem tende a ser, se não eliminado, reduzido. Assim, com o exposto neste artigo pode ser concluído que a configuração ambiental pode preencher a lacuna evidenciada entre teoria e prática nos estudos de inovação. Desta forma, apresenta-se como recomendação para novas pesquisas estudos correlacionando o desempenho dos mesmos indicadores de inovação em ambientes distintos.
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1. Doutorando em Administração pela Universidade Federal do Paraná - UFPR. Linha de pesquisa: Inovação e Tecnologia. Mestre em Administração pela Universidade de Brasília - UnB. Especialista em Planejamento e Administração de Recursos Humanos pela UDF. Especialista em Gestão Estratégica da Informação pela FGV.
2. Diretora do Setor de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Paraná - UFPR. Professora Associada do Departamento de Administração Geral e Aplicada e professora do Programa de Pós-Graduação em Administração da UFPR. Graduada em Administração e Ciências Econômicas pela UFPR. Especialista em Finanças pelo IAG/PUC. Mestre em Tecnologia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR. Doutora em Administração pela Universidade de São Paulo – USP.