Vol. 38 (Nº 12) Año 2017. Pág. 17
Nelson Russo de MORAES 1; Alexandre de Castro CAMPOS 2; Neuza de Moraes MÜLLER 3; Fábio Brega GAMBA 4; Maria Fernanda Dantas Di Flora GAMBA 5
Recibido:18/09/16 • Aprobado: 15/10/2016
2 Comunidades: da formação à complexidade
RESUMO: O desenvolvimento de uma sociedade passa pela articulação de trilhas que conduzam à sustentabilidade de suas comunidades, neste interim os traços tradicionais interferem na caracterização de grupos sociais, trazendo à baila novos temas que se tornam transversais aos debates contemporâneos de desenvolvimento de comunidades, em especial tradicionais. Assim, o território extrapola as definições nacionalistas e mesmo geográficas para uma amplitude de correlações humanas, históricas e culturais. Este artigo científico, no desdobramento da pesquisa “análise do terceiro setor como caminho para o desenvolvimento de comunidades”, institucionalizada pela UNESP e contando com parcerias de pesquisadores externos, comunica cientificamente a pesquisa exploratória de base teórica que antecedeu os trabalhos de campo, especialmente na busca da cunhagem contemporânea ao termo “território”. |
ABSTRACT: The development of a society goes through the articulation of trails that lead to the sustainability of their communities, in the interim the traditional features interfere with the characterization of social groups, bringing up new issues that become cross to contemporary debates development communities, especially traditional. Thus, the territory goes beyond the nationalist and even geographical definitions for a range of human, historical and cultural correlations. This scientific article, in the unfolding of the research "Analysis of the third sector as a way to develop communities, "institutionalized by UNESP and relying on external research partnerships, scientifically announces exploratory research theoretical basis that preceded the field work, especially in search contemporary coinage of the term " territory ". |
O Brasil, país de dimensões continentais, riquíssima biodiversidade e aspectos multiculturais ímpares, onde as diferenças ou riquezas culturais constituem-se em uma das suas, talvez sua maior riqueza. A própria história do Brasil, de conquistas armadas, de criminosas reduções culturais indígenas e de subordinação de escravos africanos, bem como da chegada de tantos imigrantes originários de todas as partes do mundo, foi cunhando o seu perfil cultural a partir das características de povos tão distintos.
A origem cultural brasileira fica imprecisa neste contexto, por tratar-se de elementos abstratos que compõem a cultura, mas certamente ao introduzir à discussão o termo “território” as primeiras referencias seriam os indígenas encontrados no Brasil, quando da chegada de portugueses, espanhóis e holandeses ao continente. Os indígenas mantinham seus valores e sua tradição, ligadas ao seu território, onde cultuavam sua(s) divindade(s) e onde construíam suas habitações e seus utensílios (armas e ferramentas), teciam suas vestimentas e por extensão marcavam sua cultura.
Assim, em todo o planeta dominado diretamente ou impactados pela presença dos seres humanos foram sendo estabelecidas relações com a natureza de maneira geral e suas expressões concretas em específico. Nesta seara, a terra, o céu, a lua, os rios, a vegetação e os animais passavam a serem trilhas sagradas de contato com o místico, com o Divino. Por outro lado, a evolução da espécie humana mostra o quanto suas necessidades cresceram acompanhando suas populações e o quanto isso tem alterado as relações entre o homem e a natureza, impactando diretamente o meio ambiente.
Estudos sociológicos mostram que a organização do homem em simples tribos e comunidades rurais passou a complexidade da vida em sociedades organizadas por regulamentos, leis e contratos arbitrários (BRANCALEONE, 2008; COSTA, 2010), como os bairros, as escolas, as empresas e as nações. Nesta esteira, a organização em sociedades trouxe a imposição de fatos sociais e de suas coerções, dentro da perspectiva positivista funcionalista estudada por Èmile Durkhéim (ARAÚJO, BRIDI, MOTIM, 2013). Assim, no interior das sociedades os grupos majoritários são mais fortes, sendo melhor representados na defesa de seus interesses, cabendo a todos individualmente o cumprimento das regulações estabelecidas(ARAÚJO; BRIDI e MOTIM, 2013).
Neste contexto social complexo, as comunidades de maneira geral e as tradicionais em específico vieram, ao longo dos séculos perdendo seus espaços geográficos e observando a dissolução de seus traços culturais diante da força dos elementos advindos da sociedade, por sua vez (de maneira geral) pautada no individualismo e no consumo. O desafio estabelecido então é ampliar a base teórica trazendo aportes significativos para que possam ser constituídas pilastras legítimas de sustentação de planos locais de desenvolvimento sustentável que prime, para além da delimitação de espaços físico-geográficos, que também sustente a identidade e a preservação cultural dos povos e comunidades tradicionais.
Esta comunicação científica é parte integrante da pesquisa intitulada “análise do terceiro setor como caminho para o desenvolvimento de comunidades”, institucionalizada pela UNESP, que busca identificar os modelos organizacionais existentes e experimentados por estas comunidades para o seu desenvolvimento e, em específico com este artigo científico, contribuir para a cunhagem contemporânea ao termo “território”.
Diversas partes do planeta são indicadas como marcos arqueológico e antropológico do desenvolvimento da sociedade humana, alguns remontam a mais de 3.500 a.C. quanto a formação de tribos, passando a mais de 10.000 anos quando se tratando de grupos nômades que circundavam determinadas regiões (HALL e YKENBERRY, 1990; MORAES, 2005). Nas américas, os povos Maia, Inca e Asteca são significativamente importantes nessas demarcações temporais das civilizações, como destaca Favre (2004):
Há mais de 14 mil anos, pequenos grupos nômades percorriam a costa central do Peru, em busca de frutas, raízes e caça [...]. Após o recuo das grandes geleiras andinas e consequente desertificação litoral, esses caçadores e coletores fixaram-se na embocadura dos rios que desciam do flanco ocidental da cordilheira. O esgotamento dos recursos vegetais e animais do meio natural, atingido pela aridez, levou-os a explorar os produtos oceânicos e a dedicar às primeiras experiências agrícolas. Por volta de 3.500 a.C., nas primeiras aldeias de pescadores, como Chilcas e Paracas especialmente, plantavam abóbora, vagem e algodão. (FAVRE, 2004, 6-7)
No mesmo sentido de que a vida nas tribos fora se tornando crescentemente complexa, entre os rios Tigre e Eufrates, no golfo Pérsico, entre 3250 e 2800 a.C., os sumérios seriam o povo que primeiro teriam experimentado a organização tribal mais complexa, com vida social organizada inclusive sobre a divisão do trabalho e a definição de um líder (MORAES, 2005, p.45; HALL e YKEMBERRY, 1990, p.42-43).
Por decorrência da evolução de sua vida social (que se tornava mais complexa) e de seu conhecimento (por sua vez mais racional e articulado), buscando esclarecimentos sobre sua existência e natureza, o ser humano assumiu posicionamentos de investigação, de conflito, de alianças e notadamente estratégicos. Neste interim, Ferdinand Tönnies (BRANCALEONE, 2008; TÖNNIES, 1947) e Costa (2010) estabelecem que o grupamento humano mais primitivo era pautado pela existência de relações sociais firmadas em vontades naturais e de forte cunhagem afetiva, sendo denominadas comunidades (onde, segundo definição, não há intermédio de estamentos sociais ou de plataformas tecnológicas entre as pessoas, sendo constituídas por uma quantidade limitada de integrantes, que por sua vez conhecem os limites de seu espaço, de seu território.
Ainda na perspectiva de Tönnies (BRANCALEONE, 2008), importante destacar as diferenças angulares entre comunidade e sociedade, sendo que na primeira, imperam hábitos e costumes, na segunda, a convenção, a política e a opinião pública; na primeira os princípios gerais que orientam a ação do grupo, enquanto na segunda são norteadores os princípios relativos às ações de membros individuais.
Na aproximação de comunidades tradicionais, Brandão (2010) continua esclarece que as comunidades indígenas são grupamentos humanos que ocupam territórios, restringindo o uso de recursos naturais, continua ao tratar que se relacionam com outros grupos tribais, mantendo-se à margem da sociedade de valores artificiais e de sua melhor expressão: a cidade (BRANDÃO, 2010, p. 347).
Segundo Moraes (2005); Hall e Ykemberry (1990); Favre (2004), que coadunam as perspectivas sociológicas de Ferdinand Tönnies (BRANCALEONE, 2008) e de Costa (2010) é importante destacar a centralidade de componentes religiosos na vida em comunidade. Assim como os sumérios e os povos primitivos americanos adoravam deuses ligados à natureza e aos sentimentos, outras comunidades tradicionais relacionam aspectos divinos aos elementos da natureza, elevando sua relação com o espaço territorial, em especial com a natureza como divina e de extrema responsabilidade.
O ser humano, por sua natureza comunicativo e social é (por extensão ou por pressuposto) um ser cultural, neste sentido não é possível imaginar ou conceber nenhum homem (desde os mais primitivos aos mais cosmopolitas) como ser sem cultura. Segundo Rabuske (2001), a cultura possibilita ao ser humano o seu encontro e interpretação do mundo e do meio onde vive, interpretando-se a si mesmo e ao mundo, no nível das representações e de sinais das experiências vividas. Assim, estabelece que é mediante a cultura, que o ser humano confere finalidade e sentido às realidades (RABUSKE, 2001). Neste sentido, segundo Azevedo (1996):
Cultura é o conjunto de sentidos e significações, de valores e padrões, incorporados e subjacentes aos fenômenos perceptíveis da vida de um grupo social concreto, conjunto que consciente ou inconscientemente, é vivido e assumido pelo grupo como expressão própria de sua realidade humana e passa de geração em geração, conservado assim como foi recebido ou transformado efetiva ou pretensamente pelo próprio grupo. (AZEVEDO, 1996, p.336)
Azevedo (1996) destaca que a cultura é formada por elementos explícitos e implícitos, sendo explícitos: a linguagem, os símbolos e rituais, os objetos, os gestos, o modo de trabalhar e mesmo de descansar, entre outros. Por outro lado são elementos implícitos da cultura: as crenças, os valores, os medos, a visão de mundo, a concepção ética da vida, dentre outros.
Nota-se, coadunando com a perspectiva antropológica de Edward Burnett Tylor (LARAIA, 2006), que a diferenciação de identidade social de um grupo para com outro, é que se estabelece a cultura como uma estrutura abstrata complexa que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade.
Neste ponto, a tratativa sobre a relação de uma comunidade com suas tradições e a necessidade de serem diferenciadas as abordagens e as análises para o seu desenvolvimento levaram o Brasil ao estabelecimento da legislação sobre o desenvolvimento sustentável de povos e comunidades tradicionais (Decreto Federal nº6040, de 07/02/2007), que trouxe a definição prévia de comunidades tradicionais como sendo:
Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição. (BRASIL, Decreto 6040, art.3,1).
Para além desta definição legal, para Moraes et al (2015), Silva (2007) e Diegues et al (2000) as comunidades tradicionais têm a característica de serem autossustentáveis, mas dependentes dos recursos oriundos da terra, assim suas áreas de moradia não podem ser tocadas ou utilizadas, o que gera uma consequência ambiental positiva à preservação, aspecto extremamente conflitante com as características agrárias e de experimentação cientifica do Brasil, contexto que faz firmar a necessidade constante da interferência governamental para a preservação dessas comunidades.
Com a aproximação e com as relações estabelecidas entre interesses e grupos tão distintos (comunidades tradicionais, ambientalistas, produtores rurais e mesmo por parte da comunidade científica) observam-se situações onde povos e comunidades são obrigados a recuarem em seus espaços e em suas tradições extrativistas e de subsistência, alterando profundamente a essência das relações entre o homem e a natureza, como destacado por Viera (2014):
A fronteira étnico-cultural surge quando a comunicação entre grupos, por exemplo, de comunidades tradicionais do tipo extrativistas, não conseguem estabelecer trocas inteligíveis de valores, sentimentos e práticas com os grandes industriais que querem utilizar seus conhecimentos para uso comercial, ou quando um fiscal do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA tenta fazer um ribeirinho entender que não pode construir à beira de um rio em que sempre morou por ser área de preservação permanente ou quando a constituição de uma unidade de conservação de proteção integral impede uma comunidade tradicional de extrair seu sustento em sua produção da floresta, conforme suas práticas tradicionais. (VIEIRA, 2014, p.23).
Tal conflito de interesses entre povos tradicionais e outros diferentes grupos levam a ampliação dos valores imateriais ou intangíveis do homem com o seu espaço, que para além de geográfico, passa ao campo do termo “território”, onde coadunam, sob diferentes perspectivas, valores relacionados à cultura, ao hábito e a relação com o que há de divino na crença de seu povo.
A tradição da língua portuguesa ainda atrela o termo “território” a noção decorrente da geografia e da delimitação física de uma nação, contudo o desenvolvimento dos estudos e do campo do “desenvolvimento de comunidades” levou ao transbordamento do mesmo à amplitude da convergência entre os aspectos geográficos e culturais, especialmente tradicionais. Assim, segundo Little (2002), territorialidade pode ser definida como o esforço coletivo de um grupo social para ocupar, usar e controlar um ambiente físico, se identificando culturalmente com o mesmo. Neste sentido, ao se analisar o território de qualquer grupo será necessário considerar e avaliar o contexto especifico em que o mesmo surgiu, foi defendido ou reafirmado (LITTLE, 2002).
O Decreto Federal nº6040 (2007), buscando contribuir com a delimitação do campo onde trata sobre o desenvolvimento sustentável de povos e comunidades tradicionais, traz em sua redação a definição de territórios tradicionais:
Espaços necessários à reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem o art. 231 da Constituição e art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações. (BRASIL, Decreto 6040, art.3,2).
Ao mesmo ano da edição da lei federal brasileira, foi publicada importante contribuição ao entendimento do termo “território”, já transbordando a definição tradicionalmente mais geográfica. Esta abordagem que contribui à cunhagem do termo, embora não atrelada diretamente ao debate sobre comunidades tradicionais, traz forte conexão e aplicação aos contextos tratados neste campo. Assim, Abramavoy (2007, pag. 21) define o conceito como sendo:
Territórios são resultados da maneira como as sociedades se organizam para usar os sistemas naturais em que se apoia sua reprodução, o que se abre um interessante campo de cooperação entre ciências sociais e naturais do conhecimento desta relação. (ABRAMOVAY, 2007, p.21)
Abramovay (2007) destaca que o fortalecimento das relações sociais nos territórios é capaz de valorizar o ambiente em que atuam certos atores sociais, transformando os atributos e vantagens naturais em oportunidades competitivas para a promoção do crescimento e desenvolvimento, sobre suas peculiaridades, acrescentando:
Territórios não são, simplesmente, um conjunto neutro de fatores naturais e de dotações humanas capazes de determinar as opções de localização das empresas e dos trabalhadores: eles se constituem por laços informais, por modalidades não mercantis de interação construídas ao longo do tempo e que moldam uma certa personalidade e, portanto, uma das fontes da própria identidade dos indivíduos e dos grupos sociais (Abramovay, 2003, p.34).
Para se analisar a gestão e o desenvolvimento territorial, observa-se a diversidade de situações que são apresentadas pelos povos tradicionais nas quais reflete suas limitações e sua história. Ainda neste interim, nota-se a necessidade de um grande esforço de povos e comunidades tradicionais para a definição e defesa de seu território, muitas vezes com a colaboração de associações, universidades e do poder público, em especial do sistema jurídico de Defensorias Públicas e do próprio Ministério Público.
Segundo (PEREIRA, 2010), territórios pela sua objetividade, são definidos pelas situações que se organizam. Quando não existem recursos para deslocamento e comunicação entre as pessoas que compõem as comunidades tradicionais, os mesmos não conseguem assegurar a subsistência de sua família e de seus parentes que se dispõem a reconhecê-las como liderança. Neste sentido, dada as dificuldades de sustentação, os líderes e seus povos ficam expostos aos conflitos e violências que surgem nos processos de disputas territoriais no Brasil. Neste sentido, destaca que diversos povos tradicionais de maneira geral, mas indígenas e quilombolas em específico, ainda lutam pelas demarcações territoriais ou possuem seus territórios extremamente reduzidos.
Nota-se ainda a falta de apoio do Estado em reconhecer os processos de educação própria dos povos e comunidades tradicionais e da importância da proteção e revitalização de sua cultura, observando-se, contudo avanços específicos quanto à educação indígena, com a manutenção de disciplinas e professores de cultura indígena em boa parte das escolas indígenas brasileiras.
Tomando-se então o território como campo de interlocução cultural com o ambiente, existem ainda os riscos do etnocentrismo para o desenvolvimento e para a cultura, sobre esta tratativa à diversidade cultural estabelecem-se cuidados quanto a análise evolucionista, pois quando um grupamento humano se coloca como mais evoluido (e ou melhor) que outro, subalternizando-o, podem haver diferentes posicionamentos de conflito, sendo que o resultado entre diferentes culturas pode levar a três situações bem próprias de conflitos: a destruição dos grupos; o surgimento de um outro grupo a partir da destruição dos grupos anteriores e por fim a desorganização de ambos os grupos. Na perspectiva desta última opção surge a ideia da assimilação da cultura minoritária pela majoritária, onde observa-se a imposição coercitiva a partir do poder que hegemoniza a relação crítica em tela (VIEIRA, 2014).
Dentro da perspectiva ambiental de território, com a evolução produtiva e mecanização de processos agrícolas, há o aceleramento da ruptura do homem com seu entorno, armando-o de novos mecanismos para a dominação do planeta (SANTOS, 1992). Estes mecanismos de dominação são estabelecidos pelo homem ao longo de sua história impondo aos ambientes naturais, condições de insustentabilidade, pura e simplesmente com a intenção de satisfazer suas necessidades por materiais (CUNHA & HOLANDA, 2006).
Outro ponto a ser discutido no âmbito das interações homem-natureza, como resultado de sua presença, enquanto local de movimentação e de vivência, é a ocupação de um determinado espaço, a paisagem, que cria situações que contribuem com a retirada e utilização de recursos de determinado território, gerando conflitos entre a maneira de viver e de ocupar e produzir um determinado espaço (TRES et. al., 2011). Com esta produção do espaço há o aparecimento de problemas ambientais, que são acarretados pela forma como o homem produziu tal local, e isto com os objetivos que garantam sua sobrevivência (PEREIRA, 2001).
Conforme Gonçalves (2008), a intervenção humana sobre o que é natural, foi resultado da mudança de visão sobre o mundo pelo homem no decorrer da história, o que resultou neste novo comportamento das suas ações sobre o meio, uma vez que a natureza não está separada da humanidade. Neste interim, Oliveira (2002) destaca que a sociedade vivencia vários problemas que envolvem o modo do homem se relacionar com a natureza, quando este coloca em evidência o conceito de natureza no processo de produzir e reproduzir o seu espaço geográfico. Porém, este conceito ultrapassa os conceitos de como esta sociedade vive, as suas sensações, os seus pensamentos e suas ações.
Os estudos realizados nesta parcela da pesquisa (análise do terceiro setor como caminho para o desenvolvimento de comunidades), em especial sobre termos necessários à tratativa do desenvolvimento em comunidades tradicionais levaram ao aprofundamento sobre a cunhagem do termo “território”, que neste contexto, claramente, transborda às definições clássicas concernentes à geografia e a delimitação física de uma nação.
Observa-se que os pesquisadores e estudiosos sobre o assunto ainda buscam maneiras textuais de expressar tão rica face dos povos e comunidades tradicionais. A convergência estabelecida pelas relações entre elementos concretos da natureza como a terra, a água, os astros e os seres vivos e elementos abstratos da cultura e da tradição, da afetividade e da mística, fazem com que este campo seja muito complexo.
Ao Brasil, que possui mais de trezentas etnias indígenas, mais de uma centena de grupos quilombolas, centenas de comunidades geraizeiras, remanescentes de garimpos, seringais, manguezais, sertões ou descendentes de grupos imigrantes, o desafio se torna bastante desafiador. Mas a necessidade de se avançar com a temática e construir definições que possam subsidiar, para além da aproximação da universidade com as demandas postas pela sociedade, trazer maior profundidade teórica e fomentar novos estudos, que por fim contribuam para o desenvolvimento sustentável de povos e comunidades tradicionais.
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1. Prof. Dr., UNESP, nelsonrusso@tupa.unesp.br
2. Pesquisador GEDGS/UNESP, alexandregeo@hotmail.com
3. Pesquisadora GEDGS/UNESP, neuzammuller@hotmail.com
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5. Secretaria de Estado da Saúde do Tocantins, flora.mfd@gmail.com