Vol. 38 (Nº 11) Año 2017. Pág. 2
Caroline Orlandi BRILINGER 1; Daihene COLE 2; Eduardo Concepción BATIZ 3; Marco Aurélio de OLIVEIRA 4
Recibido: 02/09/16 • Aprobado: 10/10/2016
3 Características produtivas da sociedade do conhecimento
4 Contribuições da ergonomia para a sociedade do conhecimento
RESUMO: A sociedade do conhecimento é determinada pela inovação tecnológica numa velocidade até então desconhecida. Tais inovações têm transformado os ambientes organizacionais especialmente por meio da automatização e da informatização o que, consequentemente, gera impactos na saúde e segurança dos trabalhadores. O objetivo deste artigo de natureza teórica é compreender o papel da ergonomia na era do conhecimento. Para isso, realizou-se um levantamento bibliográfico para conhecer as características produtivas da sociedade do conhecimento com posterior análise das contribuições que a ergonomia pode oferecer. Deste modo, observa-se que a ergonomia continua a estudar as relações entre o homem e os sistemas produtivos, mas que para atender às necessidades atuais tem se comportado de maneira prospectiva e avançando progressivamente no campo das ciências cognitivas. Considerando a importância do homem para as organizações atuais, a ergonomia torna-se cada vez mais um elemento primordial para o sucesso organizacional. Nos estudos deste artigo é possível verificar a redução das demandas físicas aos trabalhadores nos mais diversos sistemas produtivos, porém a ocorrência de distúrbios ocupacionais não reduziu na mesma proporção, pois o aumento da carga mental de trabalho é um potencial fator de prejuízo para o bem-estar dos trabalhadores. Dada à complexidade do entendimento da cognição humana, apesar da evolução alcançada ainda se tem muito a caminhar. Espera-se também que a ergonomia, amplie os seus domínios de atuação, melhorando o ambiente organizacional e criando novos cenários futuros. |
ABSTRACT: The knowledge society is determined by the technological innovation at a speed previously unknown. Such innovations have transformed the organizational environments, especially by means of automation and computerization which consequently generates impacts on health and safety of workers. The purpose of this article is theoretical in nature to understand the role of ergonomics in the era of knowledge. For this, a bibliographic survey to know the productive characteristics of the knowledge society with further analysis of the contributions that ergonomics can offer. Thus, it appears that the ergonomics continues to study the relationship between the man and the productive systems, but that to meet the current needs has been acting steadily advancing foresight and in the field of cognitive science. Considering the importance for current organizations, ergonomics becomes increasingly an element critical to organizational success. In studies of this article it is possible to check the reduction of physical demands on workers in the most diverse production systems, but the occurrence of occupational disorders not reduced in the same proportion, because the increase of mental work load is a potential injury factor for the well-being of workers. Given the complexity of understanding human cognition, despite the developments achieved still has much to walk. It is expected that the ergonomics, extend their domains of expertise, improving the organizational environment and creating new future scenarios. |
A globalização e o desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação transformaram a sociedade contemporânea (MACEDO et al.,2010; ALBAGLI, 2005). Em todos os mercados a competitividade é crescente, destacando-se as organizações com maior flexibilidade, capacidade de inovação e que oferecem produtos ou serviços com elevado padrão de qualidade e bom atendimento ao cliente (STEFANO et al., 2014). Trata-se de um período no qual a gestão dos ativos intangíveis é mais relevante do que a gestão dos ativos físicos para o sucesso de um sistema produtivo (ALVAREZ; CILLERUELO; ZAMANILLO, 2015; QUINN; ANDERSON; FINKELSTEIN, 2000). As organizações por muito tempo se dedicaram apenas aos ativos tangíveis, pautados em dados, estatísticas para desenvolver valor ao seu produto e aos processos, porém ao se aprofundar nos processos de gestão, passou a perceber um novo ativo relacionado “as pessoas”. Os ativos intangíveis incluem bens ou direitos não materiais de uma organização que possuem valor agregado nos processos por ela desenvolvidos e que podem ser fonte de benefícios econômicos futuros (STEFANO et al, 2014). O rol de ativos intangíveis inclui marca, reputação, imagem, relacionamento com fornecedores e o conhecimento organizacional. Nesse cenário destacamos o capital humano, um dos ativos intangíveis essenciais nas organizações. Capital humano não é a gestão de recursos humanos, mas sim as pessoas, que nela somam seus conhecimentos, compartilham e transformam a organização em um ambiente de aprendizagem contínuo.
Neste sentido, a gestão de pessoas vem adquirindo movimento, não apenas de novas ferramentas ou fortalecimento de boas práticas, mas de disseminação do conhecimento, afinal as pessoas são fontes de conhecimento. Nonaka (2000) acredita que alcançarão o sucesso as organizações que conscientemente criarem novos conhecimentos e os incorporarem aos seus produtos. Por isso, a denominação da época e da sociedade atual: era do conhecimento, sociedade do conhecimento, sendo assim conhecimento se transforma por meio das pessoas.
A busca pela construção e disseminação do conhecimento tem causado um remodelamento das tradicionais estruturas organizacionais e das dinâmicas do trabalho (COSTAÑEDA; 2015; MACEDO et al., 2010). Por consequência, surgem novas demandas quanto à saúde, segurança e bem-estar dos trabalhadores. As organizações passaram a incorporar a saúde e segurança das pessoas como parte estratégica no processo de gestão, sendo assim, a ergonomia vem como forma de contribuição neste novo cenário, de maior competitividade nos produtos, melhorias nos processos, mas de forma a adequar as máquinas as pessoas e não mais as pessoas as máquinas, gerando um novo olhar ergonômico que vai além do processo. Segundo (NONAKA, 2000), acrescenta-se o fato da criação do conhecimento envolver ideias e, portanto, depender de pessoas o que torna ainda mais relevante a posição dos trabalhadores nesta nova realidade produtiva.
Considerando que a ergonomia estuda a interação entre trabalhadores e os sistemas produtivos de modo a garantir que o trabalho seja exercido nas melhores condições possíveis, a sociedade do conhecimento no processo, vem buscando maior saúde, segurança e qualidade no ambiente de trabalho, se voltando para as práticas ergonômicas de forma comprometida e participativa, através do conhecimento.
A ergonomia na saúde do trabalhador tem um papel fundamental, que ao longo dos anos foram sendo adaptadas as realidades de trabalho, porém na sociedade do conhecimento, da qual norteia as estratégias das organizações através do conhecimento das pessoas, praticar ergonomia atualmente, significa abordar novos cenários futuros.
O artigo em questão vem abordar pela pesquisa de abordagem qualitativa, exploratória através de levantamento bibliográfico, detalhado no item 2 do método, estudar a sociedade na era do conhecimento. Na terceira seção descrevemos as características produtivas dessa nova sociedade de conexões rápidas, ambiente em constante mudança e um nível de trabalho onde a força é substituída aos poucos pelo esforço mental. Por fim, qual a contribuição da ergonomia neste novo cenário, como é possível a sociedade do conhecimento, conciliar processos, pessoas, desenvolvimento cognitivo e ambiente saudável no trabalho.
Para alcançar os objetivos propostos delineou-se uma pesquisa de abordagem qualitativa, exploratória, desenvolvida por meio de levantamento bibliográfico. Foram selecionados como fonte de coleta de dados artigos, dissertações, teses e livros disponíveis em bases de dados nacionais e internacionais – Scielo, Science Direct, Scopus, Web of Science, Google Acadêmico – com data de publicação a partir de 2012; escritos nas línguas portuguesa, inglesa ou espanhola. Para realizar as buscas pelas fontes foram utilizadas as palavras-chave apresentadas no quadro 01, e seus correspondentes na língua inlgesa, sendo selecionados os materiais que contivessem os referidos termos no seu título, corpo textual, resumo e/ou palavras-chave.
Quadro 01 Palavras-chave utilizadas para coleta de dados.
Palavra-chave em Português |
Palavra-chave em Inglês |
Ergonomia |
Ergonomics/human factors |
Gestão do conhecimento |
Knowledge management |
Era do conhecimento |
Knowledge era |
Sociedade do conhecimento |
Knowledge society |
Organizações que aprendem |
Learning organization” |
Século 21 |
21st century |
Futuro |
Future |
Fonte: autores.
Foi encontrado um total de 1226 artigos nas bases de dados pesquisadas. Destes, 640 foram excluídos por estarem duplicados Os 586 documentos resultantes foram analisados quanto à congruência dos seus títulos e resumos com a temática proposta por esta pesquisa. Neste processo, houve a eliminação de 585 artigos por não abordarem a relação entre a ergonomia e a gestão do conhecimento. Como resultado foram selecionados 20 artigos para leitura na totalidade dos quais 07 foram utilizados neste artigo. A referida metodologia é apresentada na figura 01.
Figura 01: Método para a coleta de dados.
Fonte: Autores
A Era do Conhecimento nasce no final da década de 1980, como fruto da globalização e do avanço tecnológico, é marcada por uma economia na qual o conhecimento é a nova fonte de riqueza com predomínio das atividades que utilizam tecnologias de vanguarda, mão de obra qualificada e investimentos maciços em pesquisa e desenvolvimento (MACEDO et al., 2010; ALBAGLI, 2005).
Para uma organização ser bem-sucedida neste cenário, é preciso abandonar certos hábitos da era industrial, tais como produção em escala, mão de obra especializada, desenvolvimento de produtos tangíveis, e desenvolver uma nova postura baseada em um modelo de produção flexível focado nos produtos intangíveis, com a utilização de mão de obra polivalente e empreendedora capaz de gerar respostas em tempo real (MACEDO et al., 2010; CAVALCANTI; GOMES; PEREIRA NETO, 2001).
Por conseguinte, as organizações precisam se preocupar em valorizar projetos e processos e não tarefas e procedimentos especializados, fazer uso de tecnologias de informação e comunicação, possuir trabalhadores mais autônomos sem tarefas rigidamente estabelecidas (ROSSINI; PALMISANO, 2008).
Conforme Assmann (2015), a gestão do conhecimento é uma ferramenta capaz de auxiliar os gestores atuais a obter sucesso na dinâmica da sociedade do conhecimento. Isto porque a gestão do conhecimento não atua somente sobre os ativos intelectuais da organização, mas também sobre todos os processos que os permeiam como, por exemplo, o planejamento estratégico, as tomadas de decisão, e a identificação de gargalos (MACEDO et al.,2010). Rossini e Palmisano (2008) indicam que é preciso criar um ambiente organizacional adequado para a inserção da gestão do conhecimento por meio da revisão dos processos desenvolvidos (gestão por processos); da revisão do perfil dos colaboradores na empresa e no mercado de trabalho; e da máxima automatização das atividades repetitivas para que as pessoas atentem-se nas atividades intelectuais.
Terra (2008) apresenta alguns aspectos importantes da prática gerencial baseada nos conceitos de gestão do conhecimento: a alta administração define a estratégia da organização e as metas, destaca os conhecimentos a serem adquiridos e propicia o desenvolvimento de uma cultura organizacional baseada na inovação, experimentação e aprendizado contínuo; a estrututa organizacional é baseada em equipes multidisciplinares com alto grau de autonomia; as políticas de recursos humanos visam a aquisição de competências e a avaliação do desempenho; uso de ferramentas para a mensuração de resultados e retroalimentação; desenvolvimento de alianças com outras organizações e estreitamento das relações com os clientes.
Ao analisarmos o conhecimento no processo da cultura organizacional, é importante destacar o envolvimento da ergonomia neste processo, como forma de contribuir para uma melhor qualidade de trabalho das pessoas nesta sociedade do conhecimento, seja ele tácito ou explícito. O conhecimento tácito advém da prática, para Medeiros (2010) o conhecimento tácito envolve fatores intangíveis como perspectivas e sistemas de valores do ser humano. Ao contrário do conhecimento tácito, o explicíto é pautado na racionalidade, que segundo Medeiros (2010) e mais facilmente adquirido e transferido do que tácito, pois é adquirido pela educação formal, pela informação.
Ao observar a figura abaixo, é possível compreender o ciclo do conhecimento nas organizações:
Figura 02: Ciclo do conhecimento.
Fonte: Autores
Considerando o capital humano, o processo e os sistemas que cada organização obtem, bem como, sua cultura organizacional, o conhecimento se transforma através do envolvimento de todos, porém nessa era do conhecimento, incluir a ergonomia no processo, é contribuir para alavancar melhorias no ambiente de trabalho e consequentemente na qualidade de trabalho das pessoas. Indiferente dos processos, os conhecimentos tácitos e explicítos são agentes de compartilhamento do conhecimento ativo nas organizações.
Neste contexto, destaca-se que os ambientes de trabalho impõem exigências cada vez mais cognitivas a seus colaboradores enquanto as exigências físicas diminuem (YOUNG et al., 2015; BALFE; SHARPLES; WILSON, 2015). A ergonomia sendo o elo entre os processos descritos na figura acima, contribui de forma significativa na sociedade do conhecimento.
Observando que a automação tem obtido muitos êxitos em sitemas produtivos fechados, tais como em linhas de produção, principalmente no sentido do aumento da qualidade e da redução dos custos (BALFE; SHARPLES; WILSON, 2015). Contudo, estes mesmos autores acrescentam que a automação não tem sido tão bem sucedida em sistemas produtivos abertos, por exemplo os serviços de saúde e de controle de tráfego, dada a imprescindibilidade dos seres humanos em pensar e antecipar situações de forma a manter o controle sobre elas gerando alta carga mental.
Considerando a alta carga mental no capital intelectual nas empresas, a ergonomia contribui sendo a chave para trabalhar as questões até então intangíveis de problemas relacionados às questões psicológicas, cognitivas de saúde do trabalhador no seu ambiente de trabalho. Facilitando entendimento dessas questões, utilizando como exemplo um cargo de enfermagem na área de saúde, levando em consideração sua carga horária conforme regimento da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) utiliza os equipamentos de proteção individual e trabalha as questões ergonomicas adequadas. Entende-se que o mesmo está dentro das normas de segurança. Levando em consideração as questões da carga mental diária, é percebível que sua atividade vai além de esforço fisico, há um desgaste mental, com riscos que vão além de um ambiente ergonomicamente adequado. É preciso observar e trabalhar as questões psicológicas que este profisssional passa ao longo do seu trabalho diário, por mais que a tecnologia neste momento esteja presente em seu convívio.
Maguire (2014) e Singleton (2012) acrescentam que uma grande parte das comunicações e tarefas pode ser realizada empregando tecnologias que dispensam o contato pessoal ou a presença física no ambiente de trabalho. Isso não necessariamente significa benefíco para saúde e segurança para o trabalhador, pois o trabalho remoto exige uma série de cuidados quando ao manejo correto da ferramenta tecnológica, controle da jornada de trabalho e das metas a serem alcanças para que não envolva sobrecarga física, mental ou diminuição dos limites entre a vida doméstica, laboral e o lazer (KLEIN, 2015; ALBAGLI, 2005). O desafio da ergonomia na sociedade do conhecimento está criar ferramentas para acompanhar, medir e disseminar a sua importância nas questões de alta carga mental, além do limite desse profissional.
Na era industrial, a ergonomia foi essencialmete corretiva, concentrando os seus esforços na análise e correção das condições inadequadas de trabalho já instaladas (VALE, 2015), treinamentos, formulação de procedimentos e indicadores de segurança (ASSMANN, 2015). Entre 1980 e o fim da década de 1990, os temas dos estudos na área de ergonomia refletiam primordialmente usabilidade, eficiência e acessibilidade das tecnologias (ROBERT; BRANGIER, 2012).
A ergonomia tem sofrido pressões internas e externas. Apresentando algumas dificuldades e traz alguns desafios. Segundo Dwyer (1990) são elas: na política, pois não tem influência concreta sobre o governo, indústrias e sindicatos; nos diferentes pressupostos e metodologias; na recomposição dos quadros de análise antes separados das disciplinas; cultural: nos diferentes processos industriais em cada país; tecnológica: necessidade de inovações no campo da ergonomia; interdisciplinar: as fronteiras estão sendo rompidas.
Dejours (1992:51) acredita que “a produção também é uma função social, além de econômica e política.” As condições de trabalho, segundo Wisner (1987), não envolvem apenas o posto e o ambiente de trabalho, mas diversos fatores como: relações entre produção e salário, duração da jornada, férias, aposentadoria, horários de trabalho (em turno, pausas...), repouso e alimentação, serviço médico, social, escolar, cultural, modalidade de transporte, entre outras necessidades.
O processo produtivo, portanto, não é isolado da totalidade das relações sociais, não se limita à empresa, podendo contribuir para solucionar inúmeros problemas sociais, tais como: saúde, segurança, conforto e eficiência.
Se o século XX referenciou as máquinas, o século XXI aponta para o ser humano, aquele que detém conhecimento. O futuro da ergonomia demanda por novas pesquisas, há muito para se realizar: aparecem novas áreas de interesse para ergonomia, trabalhadores mais informados e organizados, consumidores mais exigentes e sofisticados, competição industrial tendo requisitos ergonômicos como vantagens, aumentando a qualidade; investimento interno na empresa, qualificação dos trabalhadores considerados patrimônio importante da empresa.
A tecnologia tem exigido revisar critérios ergonômicos. Esses profissionais tem família, amigos, outras atividades, crenças, sentimentos, valores. Não é uma máquina, apesar de muitas vezes o trabalho repetitivo e alienante levá-lo a crer que sim com jornadas exaustantes. Um trabalho de ergonomia levando em consideração esses pontos pode ser aplicado em várias situações, seja com a qualidade de vida do trabalhador, envelhecimento funcional precoce relacionado a estressores ambientais e organizacionais. Outro ponto é a transferência de tecnologia, pois é preciso repensá-la para nossa realidade (os custos, benefícios na quantidade e na qualidade da produção, aceitação, manutenção, situações climáticas, sociais, culturais, de trabalho e outros fatores).
Todavia, as transformações socias vivenciadas nas últimas décadas suscitam um novo posicionamento da ergonomia para que a segurança e o bem-estar dos trabalhadores e dos usuários dos produtos ou serviços sejam preservados e promovidos. Conforme Boatca e Cirjaliu (2015), o bem-estar no local de trabalho é uma preocupação crescente na sociedade do conhecimento e a ergonomia apresenta-se como a única ciência que congrega uma série de saberes imprescindíveis para projetar e implementar soluções para sistemas, processos, máquinas e produtos, sendo um fator-chave para uma organização saudável e próspera no ambiente sócio-econômico de hoje.
Assim, vislumbra-se que a ergonomia deve ter uma abordagem prospectiva. Robert e Brangier (2012) explicam que a ergonomia prospectiva é caracterizada pela capacidade de identificar necessidades atuais e prever as futuras de modo a construir algo novo que supra estas necessidades, o que demanda proatividade, pesquisa e desenvolvimento. Logo, a dinâmica da ergonomia prospectiva vai ao encontro da gestão do conhecimento.
Verifica-se, a nível global, uma valorização do ser humano sendo a sua posição no mercado de trabalho condicionada ao bem-estar físico e mental, elementos beneficiados por intervenções ergonômicas (BOATCA; CIRJALIU, 2015). O que corrobora os achados de Robert e Brangier (2012), os quais aferiram que a partir dos anos 2000 o interesse da ergonomia passou a ser a experiência do usuário com as tecnologias no sentido de analisar o atendimento das suas necessidades e expectativas, ou seja, há um maior envolvimento das ciências cognitivas.
A ergonomia cognitiva ou engenharia psicológica assim pode descrever, está ligada com os aspectos emocionais do ser humano, ou seja, os processos mentais, entre eles a percepção, atenção, cognição, controle motor, sentidos, armazenamento e recuperação de memória. A ergonomia cognitiva analisa o impacto que esses processos realizam na interação do ser humano e dentro de uma organização, e porque não em um ciclo de conhecimento. Algumas áreas específicas são: carga mental de trabalho, vigilância, tomada de decisão, desempenho de habilidades, erro humano, interação humano-computador e treinamento.
A ergonomia organizacional, conhecida como macroergonomia, inclui a estrutura das empresas, suas políticas, processos e sistemas. Partindo do pressuposto que o trabalho ocorre neste ambito organizacional, neste sentido a ergonomia tem como objetivo potencializar os sistemas e subsistemas nas organizações. Podemos buscar como exemplos específicos nas áreas de gestão pessoas os trabalhos em turnos, programação de trabalho no fluxo produtivo, satisfação no trabalho, teoria motivacional, supervisão, trabalho à distância ou em equipe e ética no trabalho.
A ergonomia organizacional, quanto cognitiva, faz parte do ambiente de trabalho seja ele, produtivo ou administrativo. Paralelamente, Young et al. (2015) expõem o crecente interesse sobre desempenho dos trabalhadores e, por consequência, na análise das cargas mentais de trabalho a que estão submetidos. A carga mental de trabalho é fruto de uma combinação de fatores objetivos e subjetivos relativos à tarefa, ao trabalhador e ao contexto ambiental sendo que ainda há muito a se descobrir sobre as suas influências no trabalhador: não se pode garantir que a redução da carga mental de trabalho melhora a performance do trabalhador quando o oposto também pode ser uma verdade (YOUNG et al. 2015).
Consequentemente, Baotca e Cirjaliu (2015) acreditam que a melhor maneira de melhorar a performance dos trabalhadores é promovendo um adequado sistema de feedback, pois os próprios trabalhadores são os únicos que podem sinalizar as inconveniências e dificuldades enfrentadas durante o trabalho.
Partindo do pressuposto que o trabalhador é o sujeito que pode corrijir e orientar o processo de melhorias, o que o leva a executar tal ação? Nossa sociedade do conhecimento está a cada dia mais exigindo das organizações, sejam elas, privadas ou publicas, maior discussões sobre a saúde humana no trabalho. Essa exigência acontece por meio da participação dos trabalhadores e da relevância do assunto nos dias atuais. Não basta apenas um ambiente seguro, ou harmonisado, esse ambiente precisa fazer sentido ao trabalhador, ter significado, assim como o seu trabalho. Quanto mais próximo a organização se aproximar dessas questões, melhor será o resultado ergonomico cognitivo dos trabalhadores nesse sentido.
Outra questão a ser considerada é a velocidade com que as inovações surgem, em geral, superiores aos estudos a respeito dos seus efeitos sobre a saúde e segurança dos seres humanos o que demanda uma permanente vigilância dos ergonomistas sobre os novos sistemas, novos ambientes e as novas exigências (BOATCA; CIRJALIU, 2015). Karwowisk (2012) indica que o desenvolvimento tecnológico pode ainda criar novos domínios para a ergonomia, levando-a a inferir sobre a interação entre os seres humanos e a evolução da genética, das ciências cognitivas, da medicina, das fontes renováveis de energia, dos meios de transporte e comunicação, da nanotecnologia, dentre outras áreas.
Por fim, Grotre (2014) aponta que um grande desafio da ergonomia neste século talvez ainda seja a disseminação e aceitação dos seus conhecimentos, especialmente nas hierarquias mais altas. Para a autora, comumente, o valor da ergonomia é mais aparente aos trabalhadores com pouco poder decisório dificultanto a sua inserção como um objetivo estratégico para a organização. Porém, a importância dada à gestão de riscos organizacionais pode ser uma boa oportunidade para demonstrar as vantangens que a ergonomia tem a oferecer e fortalecê-la dentro das organizações (GROTRE, 2014).
Na medida em que as pessoas nas organizações tomam consciência da importância da ergonomia no ambiente de trabalho, bem como, participam do processo de mudança pelo conhecimento, os ativos intangiveis passam a ser notados nos resultados das organizações. Se por um lado os esforços fisicos diminuiram consideravelmente pelas melhorias e investimentos em tecnologia e inovações, encontrapartida ainda há muito que caminhar para diminuição dos disturbios ocupacionais, ainda contamos com alta carga mental no trabalho, prejudicando o bem estar dos trabalhadores.
A cultura organizacional está se adaptando ao novo estilo de qualidade de vida, a era do conhecimento, traz consigo a consciência da saúde e importância da sustentabilidade como melhoria de um mundo melhor, e principalmente da reflexão do ser humano a cerca da sua realidade de ambiente.
Podemos destacar no quadro 02 abaixo as contribuições da Ergonomia na sociedade do Conhecimento:
Quadro 02 – Contribuições da Ergonomia na era do Conhecimento.
Ambiente organizacional |
A Ergonomia através do estudo dos impactos nos processos consegue mapear os ativos tangíveis, e aproximar o Capital Humano dos ativos intangíveis, valorizando os aspectos cognitivos de cada indivíduo. |
Macroergonomia |
Potencializa os sistemas e subsistemas nas organizações, melhorando os processos, maquinários e produtos, consequentemente, melhorando o ambiente de trabalho de cada indivíduo. |
Sociedade do Conhecimento |
A Ergonomia consegue interagir atráves da sociedade do conhecimento, ainda que a passos pequenos, onde os indivíduos passam a dar maior atenção as questões de qualidade de vida no trabalho. |
Fonte: Autores
A sociedade do conhecimento é determinada pela inovação tecnológica numa velocidade até então desconhecida. Tais inovações têm transformado os ambientes organizacionais especialmente por meio da automatização e da informatização o que, consequentemente, gera impactos na saúde e segurança dos trabalhadores, na redução das demandas físicas aos trabalhadores nos mais diversos sistemas produtivos.
A ocorrência de distúrbios ocupacionais não reduziu na mesma proporção, pois o aumento da carga mental de trabalho é um potencial fator de prejuízo para o bem-estar dos trabalhadores. Deste modo, observa-se que a ergonomia continua a estudar as relações entre o homem e os sistemas produtivos, mas que para atender às necessidades atuais tem se comportado de maneira prospectiva e avançando progressivamente no campo das ciências cognitivas. Segundo Cardella (2010), as pessoas constituem um papel essencial nas organizações, indiferente das melhorias em processos, produtos, máquinas, até mesmo em layout ergonômicos, o fator principal no processo sempre serão as pessoas.
Considerando a importância do homem para as organizações atuais, a ergonomia torna-se cada vez mais um elemento primordial para o sucesso organizacional apesar de nem sempre os gestores assim conceberem. A ergonomia vem ao longo dos anos tomando seu espaço nas organizações. Para a sociedade do conhecimento, a mesma continua tendo sua importância, porém focada em novos cenários sociais, econômicos e organizacionais.
Nesse movimento o próprio homem passou a estudar a ergonomia em seu ambiente de trabalho, despertando seu olhar além de uma melhoria em layout, melhoria da parte física desse ou daquele indivíduo, mas da sua cognição mental. Dada à complexidade do entendimento da cognição humana, apesar da evolução alcançada ainda se tem muito a caminhar. A sociedade do conhecimento evolui a passos rápidos, com uma tecnologia que nos permite aprender e desaprender a todo instante. Sendo assim, uma ciência tem seus critérios, mas nunca será verdade absoluta, ou seja, a ergonomia até aqui pesquisada, abre muitos campos, mas sempre seu princípio será as pessoas.
Almeja-se também que a ergonomia, num futuro próximo amplie os seus domínios de atuação, que as melhorias possam ser implantadas com mais facilidade, fazendo parte necessária e indispensável nos ambientes organizacionais. Criar essa consciência na sociedade do conhecimento, talvez seja a maior dificuldade dessa ciência e de todo o futuro que está por vim.
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1. SOCIESC, Santa Catarina, Brasil. Email: caroline.brilinger@ifsc.edu.br
2. SOCIESC, Santa Catarina, Brasil. Email: daihenecole@hotmail.com
3. SOCIESC, Santa Catarina, Brasil. Email: eduardo.batiz@sociesc.org.br
4. SOCIESC, Santa Catarina, Brasil. Email: marco.oliveira@sociesc.org.br