ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 04) Año 2017. Pág. 1

Sistemas de memória em organizações intensivas em conhecimento: um estudo de caso

Memory systems in knowledge-intensive organizations: a case study

Paula Kaneoya ARASAKI 1; Andrea Valéria STEIL 2; Neri dos SANTOS 3

Recibido: 09/08/16 • Aprobado: 10/09/2016


Conteúdo

1. Introdução

2 Memória organizacional

3 Procedimentos metodológicos

4 Resultados

5 Considerações finais

Referências

Apêndice A - Roteiro de entrevista semi-estruturado


RESUMO:

Os sistemas de memória organizacional (SMOs) são os meios pelos quais o conhecimento é acessado. O artigo identifica e caracteriza os SMOs utilizados para acessar o conhecimento derivado de experiência, que suporta a tomada de decisão em uma organização intensiva em conhecimento (OIC). Foram desenvolvidos uma revisão de literatura e um estudo de caso, cujos dados foram coletados em entrevistas semi-estruturadas, realizadas com gerentes intermediários de uma OIC, multi-unidades, do Brasil. Como resultado, os sistemas de memória mais utilizados para recuperar esses conhecimentos são: base de dados compartilhados (rede), rede social (pessoas), e-mail, sistemas de informação e mídia social corporativa.
Palavras-chave: Sistema de memória organizacional; Memória organizacional; Organização intensiva em conhecimento.

ABSTRACT:

Organizational memory systems (OMS) are the means by which the knowledge is accessed. The article identifies and characterize OMS used to access knowledge derived from experience, which supports the decision making in a knowledge-intensive organization. A literature review and a case study were developed, and the data were collected through individual’s semi-structured interview, with managers from a knowledge-intensive organization, multi-units, in Brazil. As result, the most used OMS: shared database, social network, e-mail, information systems and corporative social media.
Keywords: Organizational memory system; Organizational memory; Knowledge-intensive organization.

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1. Introdução

O conhecimento está relacionado com a geração de vantagem competitiva (Perez e Ramos, 2013) a partir da associação com a resolução de problemas e atividades nas organizações (Chan, Kim e Kwahk, 2007). O conhecimento também suporta a tomada de decisão, a memória organizacional, que segundo Walsh e Ungson (1991, p. 61), consiste em “informações armazenadas na história da organização que podem suportar tomadas de decisões presentes”.

A memória organizacional registra experiências e o conhecimento delas contribui para a competitividade organizacional. Dentre as contribuições destacam-se: assegura e facilita a aprendizagem organizacional (Ochoa, Herskovic, Pineda e Pino, 2009); fortalece a identidade organizacional (Stein, 1995); suporta a coordenação dos trabalhos (Nevo e Wand, 2005); e está relacionada à efetividade e desempenho das organizações (Perez e Ramos, 2013).

Ao longo dos anos, uma organização participa de diversos projetos e negócios, que geram conhecimentos relevantes para o seu desenvolvimento. Colaboradores vivenciam experiências nos projetos e desempenho de atividades que são relevantes de serem registrados para construir a memória organizacional, evitando a repetição de erros, o dispêndio de recursos como o tempo na curva de aprendizagem dos colaboradores, e maximiza resultados a partir do uso do conhecimento.

A memória organizacional consiste no amplo conceito de lembrança, registro. Já os sistemas de memória são desenvolvidos para recuperar a memória, sendo trabalhados pelas organizações.

Há duas perspectivas nos estudos sobre memória organizacional: memória como processo e memória como produto (Rowlinson, Booth, Clark, Delahaye e Procter, 2010). A primeira busca compreender a forma como o conhecimento se torna parte da memória de uma organização e é utilizado nas atividades cotidianas (memória dinâmica) (Nissley e Casey, 2002). Já a memória como produto (estática), aos repositórios de memória, ou soma dos conhecimentos existentes em um coletivo (Steil e Santos, 2012). Walsh e Ungson (1991) tratam da memória como produto, e para eles, ela reside em cinco componentes de armazenamento: indivíduos, cultura organizacional, transformações, estruturas e ecologia. Já Olivera (2000) identificou aspectos que o framework de Walsh e Ungson (1991) não engloba, desenvolvendo o seu próprio framework relacionado aos sistemas de memória organizacional. Esses sistemas são conjuntos de dispositivos de retenção de conhecimento que coletam, armazenam e proveem acesso à experiência organizacional. O presente artigo reconhece a memória como processo, porém trata a memória como produto.

Dentre os sistemas de memória organizacional, os repositórios de conhecimento foram os sistemas de memória organizacional mais estudados, com trabalhos empíricos e teóricos. Blogs, sistemas de informação, rotinas e redes sociais também são considerados repositórios de conhecimento na literatura, sendo comumentemente estudados. Mariano (2010) estudou a relação entre blogs e processos de conhecimento, Durcikova e Fadel (2016) exploram as características de repositórios de conhecimento que influenciam na propensão dos trabalhadores do conhecimento em utilizar esse sistema. As pessoas, por meio de comunidades de prática virtuais, foi tema estudado por Gammelgaard (2010), que verificou que o compartilhamento em comunidades de práticas estabelece uma confiança que viabiliza o contato ao autor da informação ou do conhecimento.

Olivera (2000) estudou Walsh e Ungson (1991), e desenvolveu pesquisa empírica em uma organização multinacional e multi-unidades, para identificar e caracterizar os sistemas de memória organizacional utilizados na tomada de decisão, além de avaliar as suas efetividades. Em sua pesquisa, ele trata da importância da realização de estudos em diferentes contextos organizacionais.

Com base na literatura, foi identificado um hiato nas pesquisas sobre sistemas de memória utilizados em organizações brasileiras, que deu origem aos questionamentos: “Como o conhecimento originado de experiências organizacionais é recuperado em organizações brasileiras? Onde ele é registrado ou retido?” Com base nestas questões, o estudo tem o objetivo de mapear os sistemas de memória mais utilizados, suas características e aspectos relacionados à efetividade na recuperação dos conhecimentos experienciais. O artigo contribui com estudos de sistemas de memória organizacional, pois complementa a literatura, ao apresentar novos tipos de sistemas, como a mídia social corporativa. A contribuição empírica do estudo está relacionada às organizações, que podem ter conhecimento dos sistemas de memória mais efetivos para recuperar conhecimentos experienciais, e também das principais dificuldades associadas a eles.

2. Memória organizacional

A memória coletiva – que se relaciona à organizacional – possui dois focos de análise (Rowlinson, Booth, Clark, Delahaye e Procter, 2010): de produto (estática), no qual a memória é composta pelo conjunto de conhecimentos existentes em uma organização; ou de processo (dinâmica), que se relaciona com os processos de criação, codificação, armazenamento e uso do conhecimento por um coletivo. A memória de processo visa compreender a forma como o conhecimento é incorporado, enquanto que de produto se relaciona com repositórios de memória.

A memória organizacional consiste em um tipo de memória coletiva, ao se relacionar com um determinado coletivo (organização). Walsh e Ungson (1991, p. 61) definem esse tipo de memória como: “informações armazenadas na história da organização que podem suportar tomadas de decisões presentes”. Para os autores, a memória pode ser retida em bins, ou componentes de armazenamentos: os indivíduos, que retêm conhecimentos a partir de suas próprias experiências e observações, crenças e valores; a cultura organizacional, que armazena as experiências a partir de linguagem, framework compartilhado, histórias e crenças (Anderson e Sun, 2010); as transformações, que estão relacionadas à lógica pela qual as informações são incorporadas nas organizações e transformadas em saídas (output); as estruturas, que implicam no comportamento do indivíduo e sua conexão com o ambiente, estando relacionadas aos papeis (ou funções) dos mesmos nas organizações; e a ecologia, no qual a composição física e o ambiente revelam informações acerca da organização (Lehner e Maier, 2000).

Stein (1995) complementa o estudo dos componentes de armazenamento de memória e conhecimento organizacional, ao apresentar como mecanismos de retenção: esquemas, que consistem em estruturas cognitivas individuais que auxiliam as pessoas a processarem informações; scripts, que descrevem a sequência de eventos em situações convencionais; ou sistemas, compostos por elementos relacionados, conectados diretamente ou indiretamente, como redes sociais e estruturas formais da organização. Outro conceito é o de sistemas de memória, abordado por Olivera (2000) e Lehner e Maier (2000). Trata-se de um conjunto de dispositivos de retenção de conhecimento que coletam, armazenam e proveem acesso à experiência organizacional.

2.1 Sistemas de memória

Os sistemas de memória são entidades com que os indivíduos interagem para acessar a experiência organizacional. O desenvolvimento desses sistemas é mais complexo que um sistema de informação convencional, pela existência de modelos e métodos de planejamento e o relacionamento com aplicações de gestão que devem ser desenvolvidos (Lehner e Maier, 2000).

São diversos os tipos de sistemas de memória existentes, sendo alguns deles: pessoas, cultura organizacional, estrutura organizacional, estrutura física do local de trabalho (Walsh e Ungson, 1991), sistemas de informação, redes sociais (Olivera, 2000), arquivos, produtos e rotinas e procedimentos (Ochoa, Herskovic, Pineda e Pino, 2009). As pessoas como sistema de memória organizacional se relaciona com o conceito de memória transativa, no qual ocorre combinação entre os sistemas de memória individual e a comunicação entre os indivíduos para gerar o conhecimento de “quem sabe o quê” na organização (Jackson e Klobas, 2008; Miller, Pentland e Choi, 2012).

Os sistemas de memória organizacional podem ser caracterizados por (Olivera, 2000):

- Conteúdo: relacionado ao tipo de conhecimento que retêm. Por exemplo: explícito e tácito (Nonaka e Takeuchi, 1997), declarativo e procedural (Miller, Pentland e Choi, 2012) etc;

- Estrutura: organização do conhecimento, definida pelo índice e localização. Esta, por sua vez, pode ser centralizada, e todos os indivíduos de uma organização acessarem, ou dispersa, quando o conhecimento está em múltiplas localizações. O índice revela onde o conhecimento está. Por exemplo: diretórios e catálogos (Olivera, 2000; Walsh e Ungson, 1991);

- Processos operativos: coleta, manutenção e acesso. A coleta se refere à utilização de filtros de conhecimentos em uma organização, como a atuação de um intermediário; a manutenção, como a própria palavra revela, consiste na manutenção e atualização nos sistemas de memória organizacional; e o acesso está relacionado à forma como o conhecimento é acessado, seja por meio das pessoas ou pela tecnologia (Olivera, 2000; Walsh e Ungson, 1991).

3. Procedimentos metodológicos

Em seu artigo, Olivera (2000) apresenta a importância de desenvolver o estudo de sistemas de memória em diferentes tipos de organizações. Sendo assim, a partir de uma realidade diferente da retratada pelo autor, optou-se por desenvolver um estudo de caso em uma organização brasileira, cujas características estão relacionadas no Quadro 1, abaixo:

Quadro 1 - Caracterização do objeto de estudo

OLIVERA (2000)

ESTA PESQUISA

  • Organização multi unidades
  • Organização estrangeira
  • Presente em diferentes continentes: Europa, Estados Unidos
  • Área de atuação: Consultoria de negócios
  • Organização intensiva em conhecimento
  • Organização multi unidades
  • Organização brasileira
  • Presente em diferentes estados: SP, RJ, SC, MG e DF
  • Área de atuação: Negócios digitais
  • Organização intensiva em conhecimento

Fonte: dos autores (2016)

A organização brasileira, objeto do estudo, atua na área de negócios digitais, com o desenvolvimento de soluções entregues por meio da tecnologia. É uma organização intensiva em conhecimento, composta por cerca de 200 colaboradores, que são os seus principais ativos.

Enquanto Olivera (2000) estudou os sistemas de memória organizacional, a partir da visão dos consultores da organização, o presente artigo traz as percepções dos gerentes intermediários. A gerência intermediária possui papel central em sistemas de conhecimento em organizações, estando entre a linha de frente e a alta gestão. São os responsáveis pela conversão de informações e tecnologias em novos produtos e negócios, sendo os indivíduos mais importantes para a criação de conhecimento (Nonaka, 1994; Nonaka, Toyama e Konno, 2000). Alguns estudos na área de gestão do conhecimento focam nesse estrato, como Eaves (2014) e Nonaka, Toyama e Konno (2000). 

Para o desenvolvimento do estudo de caso, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os gerentes intermediários. A coleta de dados foi realizada por meio de informantes, seguida pela análise dos dados. A pesquisa relaciona-se ao artigo seminal de Olivera (2000), no qual estudou-se como os indivíduos acessam a memória organizacional em atividades de tomada de decisão e resolução de problemas. Não trata de como o conhecimento é incorporado na memória organizacional, mas sim como o conhecimento é acessado na memória organizacional.

3.1 Procedimentos de coleta e análise de dados

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas com roteiro semi-estruturado, em acordo com a Resolução n. 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde. Um e-mail foi enviado aos gerentes, para verificar o interesse e disponibilidade de participar do estudo, dos quais obtivemos 12 respostas. Destas, apenas duas foram inviáveis por questão de agenda no período da coleta de dados, totalizando 10 entrevistas realizadas, sendo sete realizadas na sede e três em filial via Skype.

A todos os gerentes foi solicitada a permissão para gravar a entrevista e foi entregue um Termo de Consentimento, assinados por todos os gerentes entrevistados. Os dados coletados foram transcritos e foi realizada uma análise de seu conteúdo. Os dados foram classificados em categorias de análise descritas na literatura (Quadro 2), ou em categorias emergentes que surgiram no estudo.

Quadro 2 – Principais meios para armazenamento e retenção de conhecimento

Meios

Autores

Rotinas e procedimentos

Nelson e Winter (1982); Walsh e Ungson (1991); Starbuck (1992); Levitt e March (1996); Ackerman (1996); Moorman e Miner (1997); Miller, Pentland e Choi (2012)

Pessoas

Simon (1991); Starbuck (1992); Levitt e March (1996); Cross, Parker, Prusak e Borgatti (2001); Su e Contractor (2011)

Cultura organizacional

Walsh e Ungson (1991); Starbuck (1992); Cook e Yanov (1993); Levitt e March (1996); Moorman e Miner (1997)

Estrutura organizacional

Walsh e Ungson (1991); Levitt e March (1996); Moorman e Miner (1997)

Estrutura física do local de trabalho

Walsh e Ungson (1991); Levitt e March (1996); Moorman e Miner (1997)

Produtos

Hargadon e Sutton (1997); Argote (1999); Oliveira (2000)

Arquivos

Yates (1990); Campbell-Kelly (1996); Nilakanta, Miller e Zhu (2006)

Sistemas de informação

Huber (1991); Starbuck (1992); Stein e Zwass (1995); Ackerman (1996); Oliveira (2000); Su e Contractor (2011)

Redes sociais organizacionais

Oliveira (2000)

Fonte: adaptado de Steil e Santos (2012)

Além das categorias de análise, definidas a partir dos sistemas de memória, os dados coletados foram analisados sob diferentes aspectos relacionados aos sistemas, como: efetividade, dificuldade de encontrar a informação, dentre outros aspectos.

4. Resultados

A gerência intermediária revelou que recupera o histórico e a experiências da organização com diversos objetivos, os quais são apresentados no Quadro 3. Observa-se que na coluna da esquerda é possível verificar quantos gerentes mencionaram o objetivo da direita como razão para a busca da memória organizacional derivada da experiência.

Quadro 3 – Objetivos da recuperação da memória organizacional

Número de  que gerentes mencionaram

Objetivos de recuperação de memória organizacional derivada da experiência

4

Contribuir no desenvolvimento de orçamentos e novas propostas para clientes, a partir de projetos passados como parâmetro

3

Conhecer erros e acertos de projetos e lições aprendidas para desenvolver melhorias na organização, a partir de modificação de processos e rotinas

3

Economizar recursos a partir do aproveitamento de conhecimentos, experiências e documentações de projetos passados para aplicação em novos

3

Retomar decisões tomadas em projetos e atividades

2

Conhecer erros de abordagem, feedback de clientes e propostas que não resultaram em negócio para avaliar abordagem mas assertiva

2

Conhecer o histórico dos clientes para agregar valor ao relacionamento

1

Dar continuidade a atividades e projetos, a partir de tomada de decisão baseada nos conhecimentos recuperados

1

Atender a solicitações internas para participação em oportunidades de negócios

1

Conhecer as competências da organização, a partir da recuperação de expertises e histórico de colaboradores

1

Conhecer processos e forma de trabalho, no caso de gerentes que estão há pouco tempo na organização.

Fonte: dos autores (2016)

A recuperação de feedback de clientes visando uma melhoria contínua (De La Hoz Freyle, Carrillo Rincón e Gomez Florez, 2014); a recuperação de decisões e diretrizes para dar continuidade ao trabalho (Stein, 1995; Nevo e Wand, 2005); a busca de informações na organização para aproveitar conhecimentos e experiências, para facilitar o desenvolvimento de novas propostas (Stein, 1995), são algumas das razões relacionadas com a literatura da área.

Os sistemas de memória foram identificados na organização, com base na fala dos gestores (Quadro 4). Na coluna da esquerda está a categoria de análise, ou sistema de memória identificado; na coluna do meio quantos entrevistados mencionaram o sistema como meio para recuperar conhecimentos experienciais; e a coluna da direita, uma citação sobre a categoria em questão.

Quadro 4 – Categorias de análise

Categoria de análise

Número de entrevistados

Citação

Base de dados compartilhados

 

9

“[...] falta um pouco de disciplina para atualizar sempre, por conta do nosso ritmo de trabalho. Mas a proposta é que esteja tudo na rede da empresa. Isso é um conhecimento da empresa. Fica para a empresa”. (Entrevistado 2)

Redes sociais

7

“Se eu pergunto para as pessoas? Sim. Eu vejo que é mais fácil para mim, porque eu já estou aqui faz tempo. Então, eu sei exatamente quais são as pessoas que podem me dar aquela informação”. (Entrevistado 7)

E-mail

 

3

“Eu recorro ao meu e-mail. Como gestor, eu costumo ser copiado em praticamente todas as áreas que eu gerencio, então eu organizo meu e-mail por cliente e por projeto [...]” (Entrevistado 10)

Sistemas de informação

 

7

“[...] tem algumas informações, documentos vindos de clientes que ficam lá ou links de alguns artefatos que utilizamos e geralmente está centralizado” (Entrevistado 9)

Mídia social corporativa

2

“[...] por afinidade, eu tenho mais facilidade de encontrar as informações”. (Entrevistado 8)

Fonte: dos autores (2016)

A base de dados compartilhados consiste em uma rede corporativa com diretórios e arquivos da organização, acessíveis por meio de computadores no ambiente de trabalho, ou à distância, por meio de virtual private network (VPN) (acesso privado à rede). As redes sociais consistem nas relações interpessoais, ou seja, as pessoas como fonte de conhecimento experiencial da organização. O e-mail é o correio eletrônico organizacional, que envolve as comunicações internas, externas, de sistemas, e ainda pode envolver a utilização de recursos como o Google Drive. Os sistemas de informação são programas de computador de outras empresas que são utilizados na organização para suportar as atividades dos setores. Por exemplo, sistema para alimentação de dados comerciais – ou customer relationship management (CRM). Por fim, a mídia social corporativa é uma ferramenta para comunicação interna, que possibilita que os colaboradores interajam entre si por meio dela. Ela se assemelha ao Facebook, porém destinado ao público de uma organização, que pode envolver colaboradores, gestores, parceiros, fornecedores, entre outros.

4.2 Sistemas de memória organizacional

Foram identificados cinco tipos de sistemas de memória no estudo de caso, dos quais apenas as redes sociais coincidem com as de Olivera (2000), conforme o Quadro 5:

Quadro 5 - Sistemas de memória organizacional

OLIVERA (2000)

ESTA PESQUISA

  • Redes sociais
  • Intranet de conhecimento
  • Boletins eletrônicos
  • Centros de conhecimentos
  • Base de dados compartilhados
  • Redes sociais
  • E-mail
  • Sistemas de informação
  • Mídia social corporativa

Fonte: dos autores (2016)

Cada sistema de memória identificado pode ser caracterizado e diferenciado por meio de seu conteúdo, estrutura e processos operativos. O conteúdo pode estar relacionado ao conhecimento explícito (fácil externalização, como um documento) ou tácito (difícil externalização, como o conhecimento intrínseco). Com relação à estrutura, o sistema de memória pode ser centralizado ou disperso, no qual o primeiro significa que o conteúdo está disponível a todos da organização, e o segundo que o conhecimento está em diversos locais. Quanto aos processos operativos, os sistemas de memória podem ser caracterizados por sua coleta (se o conteúdo sofreu algum filtro na organização), manutenção (se há um processo formal ou não de manutenção do sistema) e acesso (qual a principal forma de acesso ao conteúdo: pessoas ou tecnologia). O Quadro 6 apresenta as características dos sistemas de memória identificados, baseado em Olivera (2000).

Quadro 6 - Características dos sistemas de memória organizacional da organização pesquisada

SMO

Conteúdo

Estrutura

Processos operativos

Localização

Índice

Coleta

Manutenção

Acesso

Base de dados compartilhados

Explícito

Centralizado / Disperso

Diretório

Não filtrado

Processo formal

Tecnologia

Redes sociais (pessoas)

Tácito

Disperso

-

Não filtrado

Sem processo formal

Pessoas e tecnologia

E-mail

Explícito

Centralizado / Disperso

Busca

Filtrado

Sem processo formal

Tecnologia

Sistemas de informação

Explícito

Centralizado

Busca

Filtrado

Processo formal

Tecnologia

Mídia social corporativa

Explícito

Disperso

-

Não filtrado

Sem processo formal

Tecnologia

Fonte: dos autores (2016)

A seguir, cada um dos sistemas de memória organizacional será explorado, com relação a suas características e uso pela organização.

4.2.1 Base de dados compartilhados

Dos 10 entrevistados, nove citaram a base de dados compartilhados como sendo fonte de busca de conhecimentos derivados de experiência na organização. Esse sistema de memória consiste em uma rede, que reúne diretórios e arquivos da organização, acessíveis por meio de computadores no ambiente de trabalho ou a distância, via virtual private network (VPN). Todos os colaboradores possuem acesso aos conteúdos que lhes são habilitados, geralmente sob o critério de área de atuação e atividades realizadas. Não há diretriz organizacional explícita sobre sua utilização.

No que condiz à estrutura, trata-se de um sistema centralizado e, ao mesmo tempo, disperso. Isto pois os colaboradores têm acesso ao mesmo tipo de conteúdo, porém se habilitados a visualizar e acessar os diretórios remotamente, ou se situados fisicamente no escritório central da organização. A estrutura dispersa, devido à localização geográfica, ocorre por uma questão técnica, no qual o uso do VPN dificulta o compartilhamento de informação pelos estados em que a organização está presente. A demora no acesso às informações impacta, por exemplo, na criação de base de dados compartilhados para cada estado, o que torna o conhecimento disperso, conforme um dos gerente:

“O conhecimento era isolado em cada espaço geográfico da empresa, o que é ruim para uma empresa de abrangência nacional”. (Entrevistado 10)

O conhecimento na base de dados compartilhados é organizado por meio de diretórios. São criadas pastas, que englobam os documentos, planilhas, apresentações e demais arquivos, por meio de uma estrutura estabelecida pelo colaborador. Essa característica impacta na recuperação de conhecimentos nesse tipo de sistema, evidenciados por alguns gerentes:

“é difícil de achar, porque depende de quem cuidava [da área] na época, a maneira como a pessoa guardava”. (Entrevistado 1)

“a recuperação é péssima, do ponto de vista de estrutura, porque tenho que entrar, buscar por palavra-chave, tenho que navegar demais. Não tem padrão de estrutura para balizar” (Entrevistado 2)

A falta de orientações formais sobre padronização para estruturar o sistema impacta na recuperação dos conhecimentos experienciais da organização, ao depender de:

- Lógica e organização estabelecida por colaborador que já não integra o quadro de funcionários, impactando no tempo e na recuperação das informações;

- Orientações de pessoas que estão há mais tempo na organização para orientar como buscar o conhecimento, devido ao histórico, necessário para compreender a lógica da estruturação;

- Adequação de rotina para buscar esses conhecimentos, que pela dificuldade de recuperação consome tempo e faz com que buscas sejam feitas fora do horário e ambiente de trabalho.

Com relação aos processos operativos de coleta, manutenção e acesso aos conhecimentos experienciais, a base de dados compartilhados armazena conteúdos não filtrados. Colaboradores podem criar e inserir arquivos na base, sem qualquer intermediação ou filtragem de conteúdo, o que gera impactos, como a criação excessiva de documentos e versões e o armazenamento incorreto.

A manutenção é um processo formal, relacionado à concessão de acesso aos diretórios das diferentes áreas de negócio. No momento de entrada do colaborador, há a configuração de acesso aos diretórios relacionados às atividades e áreas de negócio que o profissional irá atuar. A manutenção também tem relação com a configuração da VPN para colaboradores situados em escritórios remotos. O acesso aos conhecimentos da base é feito por meio da tecnologia.

4.2.2 Redes sociais (pessoas)

Dos 10 entrevistados, sete citaram as pessoas como sendo fonte de busca de conhecimentos derivados de experiência na organização. Muitas das experiências e histórico organizacional estão armazenadas na cabeça das pessoas, sendo frequente as pessoas recorrerem umas às outras para obter acesso aos conhecimentos ou para receber orientações de como acessar, seja por meio da verificação de outros sistemas de memória ou a consulta a outros profissionais.

As redes sociais trabalham, principalmente, com o conhecimento tácito. Com base nos dados obtidos, verificou-se que a busca por conhecimento por meio das pessoas pode resultar em: (1) indicação de profissionais que detêm o conhecimento buscado; a (2) compreensão da lógica e indicação do caminho a percorrer por entre os diretórios para acessar o conteúdo; ou (3) acesso direto ao conhecimento experiencial por meio da explanação do indivíduo.

Esse sistema de memória se caracteriza por estrutura dispersa, no qual os indivíduos não têm acesso ao mesmo conhecimento. Dentre os fatores que influenciam esse acesso está a confiança, elemento fundamental para o compartilhamento de conhecimentos, tanto para crer que a fonte recomendada é confiável, quanto para de fato compartilhar com outrem (Asleigh e Prichard, 2012).

A busca pelo conhecimento nas redes sociais pode ocorrer em dois níveis: gerencial e operacional. O primeiro caso consiste em um gerente buscando outro gerente, que domine um tema. Este caso é mais simples, pois cada gerente representa uma área de negócio ou departamento, bastando que se busque o responsável da área. No caso da busca feita pela gerência entre os colaboradores operacionais, um gerente questiona outro, e este busca em sua equipe, por meio de:

- Sistemas de memória: os outros SMO possuem informações sobre as pessoas que fizeram parte do projeto ou atividade, podendo ser este o meio de acesso aos nomes dos colaboradores que podem deter o conhecimento ou indicar outros profissionais;

- Gestão de pessoas: o núcleo possui uma planilha atualizada sobre as expertises de cada colaborador, sendo este um recurso muito utilizado, principalmente, quando a alta gerência ou mesmo outros gerentes solicitam perfis de expertises para oportunidades de negócios.

“Sempre que alguém entra na empresa, eu já cadastro [na planilha]. O nome, qual a formação, se tem pós-graduação, mestrado, isso já está lá. Então, no momento que eles me solicitam um perfil, eu busco nessa planilha quem seriam as pessoas possíveis (...)” (Entrevistado 7)

O conhecimento coletado por meio desse sistema de memória consiste na experiência dos indivíduos. É possível indicar profissionais, atender a necessidade de conhecimento ou de apontamento do sistema de memória que armazena o conhecimento. Trata-se de um processo não filtrado, pois não há qualquer intermediação para seleção do conhecimento que será repassado.        O acesso ao conhecimento pode ser feito por meio dos indivíduos e das tecnologias. Skype, e-mail e mídia social corporativa são alguns dos meios de comunicação.

A manutenção é subdividida em dois níveis. O nível entre gerência intermediária é realizada por meio de situações que proporcionem o contato e que estimula a manutenção do relacionamento. É realizado sem processo formal, por meio do qual os gerentes estabelecem contato via ferramentas de comunicação, como a mídia social corporativa e Skype, ou por meio de reuniões de projetos ou áreas de negócios. Já no nível gerencial-operacional, a manutenção ocorre no dia a dia, em reuniões de feedback e avaliação de desempenho, e demais situações. No caso do núcleo de gestão de pessoas, existem processos formais estabelecidos para a avaliação de desempenho, competências e feedback que contribuem para a memória transativa e a manutenção desse sistema de memória.

Estão associados a esse sistema de memória algumas dificuldades, como o turnover (taxa média de desligamentos e admissões), que com base na fala dos entrevistados, impactam em:

- Perda de conhecimento, a partir da saída de colaboradores;

- Perda de diretórios com conhecimentos, devido à saída de colaboradores em iniciativas de armazenamento no Google Drive, cujos diretórios não tiveram autoria compartilhada;

- Perda do conhecimento da estruturação de diretórios na base de dados compartilhados, impactando nos apontamentos no sistema de memória;

- Perda de tempo na recriação de modelos e atividades de projetos;

- Prospecção de clientes, a partir da perda do conhecimento das experiências que contribuem para elaboração de novas propostas; entre outros.

Verificou-se impactos da localização geográfica das unidades em relação ao acesso aos conhecimentos de redes sociais e memória transativa. Para Jackson e Klobas (2008), a distância dificulta a atualização da memória transativa da equipe remota em relação aos colaboradores da organização e vice-versa. Tais impactos poderiam ser minimizados a partir de tecnologia que unificasse os colaboradores e seus conhecimentos em plataforma única.

4.2.3 E-mail

Dos 10 entrevistados, três citaram o e-mail como sendo fonte de busca. É uma forma de acessar conhecimentos referentes a projetos antigos e, em alguns casos, serve como um hub que concentra os conhecimentos organizacionais ou remete a caminhos em outros sistemas de memória.

“Como gestor, costumo ser copiado em praticamente todas as áreas que eu gerencio, então eu organizo meu e-mail por cliente e por projeto e tenho mais ou menos ali essa memória do projeto. Quando eu preciso de uma informação (...) uso palavras-chave e vejo no e-mail (...), às vezes acontece de aparecer um link para a rede mesmo, ou então um link para o Drive (...)” (Entrevistado 10)

O conhecimento explícito predomina nesse sistema de memória, que se caracteriza como centralizado e disperso. Centralizado, pois algumas comunicações são compartilhadas com toda a organização, possibilitando todos os colaboradores a acessarem o mesmo conteúdo. No entanto, disperso, pois muitas das comunicações são compartilhadas apenas com determinados indivíduos, podendo ser para uma equipe, um projeto, somente gerentes, líderes ou uma pessoa apenas, fazendo com que o conhecimento fique disperso pelos e-mails e demais sistemas de memória.

O conhecimento experiencial nesse sistema de memória pode ser recuperado por meio de palavras-chave na plataforma do e-mail. Um dos gerentes comentou da ausência de indexadores, o que inviabilizaria a sua recuperação, sendo esta uma desvantagem. Porém, sua fragilidade vai além. A saída de colaboradores e desativação de e-mails faz com que comunicações sejam perdidas, e dependendo da taxa de turnover, pode impactar na perda de conhecimentos (Muller, 2013).

“Já aconteceu de colaborador que era proprietário de uma pasta [no Drive] sair da empresa e essa autoria não ter sido outorgada a outro colaborador. Acabava que a informação se perdia com a saída desse colaborador” (Entrevistado 10)

O conhecimento contido nesse sistema não é filtrado no que tange ao recebimento de comunicações. Porém, pode ser filtrado pelo usuário do e-mail, ao eliminar comunicações irrelevantes, além de categorizar e criar pastas para organizar os conteúdos recebidos, facilitando a posterior recuperação de conhecimentos. De acordo com Ji e Salvendy (2002), a utilização de filtros de metadados corrobora com a melhoria do desempenho de identificação de objetos em 36%.

Os conhecimentos são acessíveis por meio da tecnologia, e sua manutenção consiste na criação e no encerramento de contas para os colaboradores. Em termos de organização da informação, a manutenção é realizada periodicamente pelo próprio usuário. Apesar de utilizado na organização, há o reconhecimento de que se trata de um sistema de memória frágil e não adequado para a memória organizacional, embora adequado para o cotidiano dos gerentes, que necessitam recuperar conhecimentos rapidamente para a tomada de decisão. É um sistema utilizado, primariamente como hub (ponto central) que concentra os conhecimentos ou seus apontamentos e norteia as próximas buscas, que pode ser nos outros sistemas de memória da organização.

4.2.4 Sistema de informação

Dos 10 entrevistados, sete citaram a base de dados compartilhados como sendo fonte de busca de conhecimentos. Além da base de dados compartilhados, das redes sociais e do e-mail, são utilizados alguns sistemas de informação, que armazenam informações e conhecimentos da organização, como movimentações de colaboradores, informações do setor comercial, de processos, entre outros. Foram identificados seis sistemas utilizados e outro cuja implementação não foi possível pela cultura organizacional. Os sistemas são utilizados para:

- Visualização e controle interno do fluxo de trabalho de uma das áreas de negócio;

- Gerenciamento de relacionamento com cliente (customer relationship management - CRM);

- Dimensionamento de atividades, relacionando com projetos das áreas de negócios;

- Provimento de informações acerca de recursos humanos;

- Gerenciamento de projetos, utilizado em um dos setores, que prioriza tarefas e emite relatórios;

- Desenvolvimento de base de conhecimentos da organização.

Alguns dos sistemas de informação estão em fase de implementação ou incorporação à cultura organizacional. Isso significa que um sistema possibilita a estruturação dos conhecimentos, porém não os recupera devido ao pouco uso, causado por recente implantação, por exemplo.

“Estamos usando o sistema a pouquíssimo tempo. Eu acho que, efetivamente, há três ou quatro meses. Então, ainda não existe essa base de conhecimento, mas ele está aí para isso.” (Entrevistado 8)

Esses sistemas de informação lidam com conhecimento explícito, cuja estrutura é centralizada e dispersa. Disperso, pois nem todos possuem acesso ao conhecimento, como por exemplo o sistema do setor de gestão de pessoas. No entanto, é centralizado pois as pessoas que fazem parte dessa área de negócio têm acesso ao sistema e os conhecimentos nele contidos. A busca pelos conhecimentos experienciais varia conforme o sistema utilizado, porém em alguns deles – como o CRM – podem ser por palavras-chave, como o nome da empresa ou do cliente.

Com relação aos processos operativos, os conhecimentos são filtrados, pois ocorre filtragem dos conteúdos a serem inseridos. A manutenção depende do sistema de informação, sendo um processo comum à habilitação e desabilitação de acesso. Os conhecimentos experienciais são acessíveis por meio da tecnologia. Dois desses sistemas estão em fase de incorporação à cultura organizacional. Foram implementados, no entanto, espera-se que os colaboradores criem rotinas para adequar o uso desses sistemas no desempenho de suas atividades.

4.2.5 Mídia social corporativa

Dos 10 entrevistados, dois citaram a mídia social corporativa como sendo fonte de busca de memória experiencial. É uttilizada como sistema de memória organizacional por uma pequena minoria. Consiste em uma plataforma de mídia social que reúne colaboradores, parceiros e gerentes da organização, que compartilham conhecimentos e interagem entre si. É um Facebook corporativo.

Uma das propostas da ferramenta é de servir como base de conhecimento, no entanto, a organização do estudo de caso a considera como ferramenta para comunicação interna. Ela possui potencial como um sistema de memória organizacional efetivo, de acordo com um dos gerentes:

“É uma ferramenta excelente, se usada. Acho que tem um potencial muito grande, [...] e poderia ter uma conotação ainda mais corporativa, com a ideia de substituir a intranet” (Entrevistado 2)

Dentre as dificuldades associadas a este sistema de memória estão:

- Impossibilidade de realizar busca por palavras-chave;

- Disponibilização das informações por data recente, dificultando o acesso a informações antigas;

- Informações temporais e que não necessariamente estão associadas ao desempenho das atividades da organização, o que impacta na percepção que os colaboradores têm do sistema;

- Ferramenta identificada na organização como sendo para comunicação.

Na mídia social corporativa, o conhecimento trabalhado é o explícito e a estrutura é dispersa. Isto porque os colaboradores não têm acesso ao mesmo conhecimento, ao envolver relacionamentos, e pelo conhecimento experiencial estar disperso entre os colaboradores. Ela não possibilita a busca pelos conhecimentos, apenas pelo nome dos colaboradores e setores que possuem perfis na plataforma. A partir disso, os resultados são listados por data, da mais recente a mais antiga, demandando tempo e disposição do usuário para encontrar conhecimentos, sendo portanto, pouco utilizada pelos gerentes.

“Ela não organiza as informações no perfil. Ele mistura com o perfil de outras pessoas que postaram outras coisas. Então, eu não consigo entrar só em um perfil e encontrar o que foi postado. Para mim é uma dificuldade (...). A gente passa bastante tempo procurando (...)” (Entrevistado 7)

O conhecimento não perpassa por intermediários, sendo o conteúdo não filtrado. Para inserção de arquivos, basta o usuário logar na mídia, buscar o grupo de trabalho ou publicar o documento para a disponibilização temporal para toda a organização. A manutenção engloba a etapa de habilitação e desabilitação de usuários. Vale destacar que com a saída dos colaboradores, a busca por conteúdos publicados não é viável. No entanto, interações realizadas por eles são visíveis nos conteúdos publicados. O acesso aos conhecimentos é viabilizado pela tecnologia. Embora reconhecida por um dos gestores como sendo importante como ferramenta para a gestão do conhecimento, a mídia social corporativa é um sistema de memória pouco utilizado e reconhecido.

4.3 Efetividade dos sistemas de memória

A efetividade dos sistemas de memória para a recuperação de conhecimentos experienciais da organização está relacionada a alguns aspectos, como o conteúdo que o sistema de memória comporta, a estrutura e os processos a ele relacionados. Foi analisada a efetividade dos sistemas de memória identificados na organização, conforme percebida pelos gestores. O Quadro 7 apresenta essas informações. A primeira coluna do quadro mostra os sistemas de memória identificados, a segunda o número de entrevistados que mencionaram o sistema como sendo efetivo e a terceira coluna, uma breve citação relacionada à efetividade daquele sistema.

Quadro 7 – Avaliação da efetividade dos sistemas de memória

Sistema de memória

Número de entrevistados

Citação

Base de dados compartilhados

5

“A equipe é muito redonda nisso. Sempre que alguém posta ou arquiva algo na rede, informa a equipe. Então, normalmente quando a gente pede alguma informação, elas falam que está na rede, em uma determinada pasta” (Entrevistado 7)

Redes sociais (pessoas)

1

“Vou ali conversar com X e ele me conta todo um case sobre o cliente (...), pois ele conhece bem e está na cabeça dele. (...) é melhor eu sentar com ele e conversar do que pegar um documento e começar a ler uma proposta antiga” (Entrevistado 8)

E-mail

2

“É um dos primeiros lugares que eu consulto pelo histórico da empresa. Tem muita informação armazenada” (Entrevistado 4)

Sistemas de informação

1

“As empresas continuam, mas as pessoas mudam. (...) eu tenho que ter um histórico da empresa (...) para não vender a mesma coisa que um colega tentou (...). Eu tenho muita informação dentro do CRM” (Entrevistado 3)

Mídia social corporativa

0

--

Fonte: dos autores (2016)

 Os gestores consideram os seguintes aspectos para avaliar se um sistema de memória é efetivo ou não quando:

- A informação é recuperada;

- A informação é atualizada;

- A infomação é organizada;

- A informação permanece na organização, mesmo que as pessoas deixem de fazer parte dela;

- A informação é facilmente recuperada;

- O sistema de memória é seguro e qualquer pessoa pode ter acesso a ele, em qualquer momento;

- O tempo destinado à recuperação da informação é baixo.

4.3.1 Conteúdo

A avaliação da efetividade dos sistemas de memória organizacional está associada ao tipo de conteúdo que é necessário e o que é contido em cada sistema, que de forma genérica, consiste em:

- Base de dados compartilhados: reúne arquivos de diversas tipologias, formatos e tamanhos sobre projetos, experiências e a organização;

- Redes sociais: conhecimentos experienciais não registrados ou para obter apontamentos para a recuperação do conhecimento ou para indicação de profissionais (memória transativa);

- E-mail: hub de conhecimentos, que resulta em apontamentos para a recuperação ou o acesso ao conhecimento em si;

- Sistemas de informação: geralmente, dados, informações e conhecimentos mais objetivos, pontuais e específicos de cada área de negócio ou setor;

- Mídia social corporativa: informação divulgada internamente, informação temporal ou repositório de arquivos com número limitado, devido à ausência de busca.

4.3.2 Estrutura

Os gerentes intermediários apresentaram preocupações com determinados critérios para avaliar a efetividade dos sistemas de memória, no que concerne sua estrutura:

- Indexação: indexação ou taggeamento de conteúdos, a fim de facilitar a recuperação;

- Normatização, padronização: na nomeação de arquivos, estruturação de diretórios e organização dos conhecimentos.

Esses critérios se relacionam principalmente com o e-mail (indexação), a fim de recuperar os conhecimentos nesse sistema, e à base de dados compartilhados (normatização), a partir da estruturação dos arquivos e diretórios.

4.3.3 Processos

Com relação a processos operativos, os gerentes intermediários apresentaram preocupações relacionadas aos aspectos:

- Coleta: sistema de filtragem eficiente de conteúdos;

- Manutenção: execução de rotinas de registro e atualização de conteúdo;

- Acesso: facilidade de acesso e disponibilização imediata de conteúdo, além de baixa taxa de turnover para reter o conhecimento experiencial.

Esses critérios para a avaliação da efetividade se relacionam, principalmente, com a mídia social corporativa, os sistemas de informação, como o CRM e as redes sociais. O sistema de filtragem é um dos entraves para a recuperação de conhecimentos na mídia social, sendo portanto um aspecto a ser melhorado para torná-lo um sistema de memória mais efetivo. Já o CRM requer a execução de rotinas de registros dos conhecimentos, a fim de contribuir para abordagem assertiva ao cliente, sendo essa manutenção aspecto importante para a sua efetividade. A disponibilização imediata de conteúdo e facilidade de acesso se relaciona com as redes sociais, no qual os gerentes necessitam saber quem sabe o quê na organização, a fim de solucionar problemas rapidamente, a partir da disponibilização imediata do conhecimento necessário.

5. Considerações finais

Entende-se que o objetivo de identificar e caracterizar os sistemas de memória utilizados por organizações para a tomada de decisão baseada em conhecimentos experienciais, a partir de um estudo de caso, foi respondido com a pesquisa desenvolvida. Na organização do estudo de caso foram encontrados diversos sistemas de memória utilizados para a recuperação de conhecimento experiencial e demais informações organizacionais. O conhecimento disperso em sistemas dificulta a recuperação, sendo necessário para isso conhecimento de: histórico de projetos e da organização, da localização nos sistemas e memória transativa. São sistemas de memória que se sobrepõem, ao conter partes de um mesmo conhecimento em diversos locais.

Os sistemas de memória mais utilizados são a base de dados compartilhados e as redes sociais, sendo esta um recurso utilizado muitas vezes, quando não se encontram os conhecimentos na base. A base pode não ser a primeira opção de busca, no entanto, é onde geralmente há mais conhecimentos e explícitos, ao contrário das redes sociais, que detêm conhecimentos, porém tácitos. A base ainda armazena arquivos robustos, que não são comportados por muitos dos sistemas de informação. Os e-mails foram considerados como hub (ponto central) dos conhecimentos, ao prover as indicações para acesso ao conhecimento desejado, sendo apresentado de forma explícita. As redes sociais também atuam como hub de conhecimentos, porém a partir da experiência organizacional vivida pelo detentor e por sua memória transativa, provendo usuários com indicações para o acesso ao conhecimento desejado, com base no conhecimento tácito.

A efetividade desses sistemas está relacionada a aspectos como: o tipo de conteúdo, a sua estrutura e seus processos. Cada sistema de memória detém um tipo de conhecimento organizacional, caracterizado por seu tamanho, formato e especificidade. Quanto à estrutura, os gerentes demonstraram preocupação e interesse em avaliar a efetividade a partir de critérios como a indexação e a normatização de arquivos. Com relação aos processos, a existência de um sistema de filtragem eficiente (coleta), o estabelecimento de rotinas e a disciplina para o registro (manutenção), bem como a disponibilização imediata dos conhecimentos (acesso), foram as preocupações relacionadas à avaliação de efetividade dos sistemas de memória.

Com relação aos gerentes intermediários, verificou-se diferença de perfis, no qual os mais recentes tendem a buscar outros gerentes para recuperar conhecimentos de experiências organizacionais. Já os mais antigos, acabam por ser a representação do sistema de memória das redes sociais, pois detêm conhecimentos experienciais acumulados ao longo dos anos na organização, sendo procurado por colaboradores e gerentes que visam recuperar conhecimentos. Por estarem a mais tempo na organização, seu repertório de memória transativa é maior do que o de colaboradores que estão há menos tempo, o que facilita a resolução de problemas e tomada de decisão rápida (Jackson e Klobas, 2008).

A recuperação de conhecimentos experienciais em organizações com multi-unidades é impactada pela distância geográfica do escritório central. Além de ter o acesso dificultado a alguns sistemas de memória – como a base de dados compartilhados via VPN, o que impacta no desenvolvimento de iniciativas de criação de núcleos de conhecimento por unidade em região geográfica –, a distância dificulta a atualização dos diretórios de memória transativa dos colaboradores. Tal aspeto impacta tanto na equipe remota quanto na situada no escritório central, que pelo não contato acaba por não saber que conhecimentos os colaboradores remotos possuem, e vice-versa (Jackson e Klobas, 2008).

O turnover e a falta de tempo foram identificados como empecilhos para a memória organizacional, sendo esta possivelmente uma realidade de outras instituições. A falta de tempo para o registro de conhecimentos está relacionada à cultura organizacional e a ausência de processos de registros na rotina dos colaboradores. O impacto negativo do turnover pode ser minimizado por meio de práticas de gestão do conhecimento que incentivem o compartilhamento e o registro de informações e conhecimentos.

A principal contribuição deste estudo foi o desenvolvimento de pesquisa sobre sistemas de memórias utilizados para a tomada de decisão em organizações intensivas em conhecimento, situadas no Brasil. Olivera (2000) já havia pontuado a importância da replicação de seu estudo em outros contextos.  

A partir do estudo realizado, foram identificadas algumas oportunidades para futuras pesquisas. Como abordar a mídia social corporativa para se tornar um sistema de memória efetivo, a partir do potencial identificado? Há diferenças entre a busca e os sistemas de memória utilizados por colaboradores de outros níveis hierárquivos, como operacionais e alta gerência?  Quais os impactos reais às organizações intensivas em conhecimento com a perda de apontamentos e memória transativa, devido ao turnover? As respostas a estas questões contribuirão para a compreensão sobre como o conhecimento baseado na experiência pode ser recuperado em organizações intensivas em conhecimento.

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Apêndice A - Roteiro de entrevista semi-estruturado

- No atual projeto que está trabalhando, ou em projetos passados, já precisou buscar alguma informação na [organização] para tomar uma decisão (para continuar o projeto ou realizar o seu trabalho)?

- Onde buscou inicialmente? Encontrou o que procurava? Ou teve que buscar em outro local? Qual (is)?  

- Quando enfrenta esse tipo de situação, em que necessita tomar uma decisão, e precisa de informações para isso. Onde geralmente busca?

- O que você acredita que está relacionado à efetividade desses meios? O que considera para avaliar se esse meio é uma boa forma para encontrar informações?

- Registra de alguma forma ou compartilha experiência (ou o conhecimento derivado da experiência) que teve em projetos? Onde geralmente compartilha? Com quem?

- Teria alguma consideração sobre o assunto?


1. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). phkaneoya@gmail.com

2. Professora dos Programas de Pós-graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento e de Psicologia na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Doutora em Engenharia de Produção pela UFSC. andreasteil@egc.ufsc.br

3. Decano da Escola Politécnica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR) e Professor Sênior do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pós-doutorado em Ingenierie Cognitive pela École Polytechnique de Montréal Canadá. neri.santos@pucpr.br


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 04) Año 2017

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