Vol. 38 (Nº 02) Año 2017. Pág. 5
Evandro LA MACCHIA 1; Julio Cesar WASSERMAN 2; Jacob BINSZTOK 3
Recibido: 28/07/16 • Aprobado: 13/08/2016
RESUMO: Este estudo é uma pesquisa sobre o intervencionismo do estado versus o liberalismo político e concluirá que: i) agendas regulatórias do Brasil ao longo da história ou proíbem, ou restringem ou não criam condições a uma participação privada mais ampla na indústria de petróleo, ii) o lugar econômico tem sido majoritariamente ocupado pelo estado ou por empresa por ele controlada, iii) a empresa estatal tem tido sucesso histórico no desenvolvimento e atendimento às necessidades do setor energético, iv) tensões entre estado e iniciativa privada, nacional e estrangeiro, monopólio e livre competição são notados. |
ABSTRACT: This study is a survey of the interventionism of the state versus political liberalism and conclude that: i) regulatory agendas of Brazil throughout history or prohibit, or restrict or do not create conditions for a wider private participation in the oil industry, ii) the economic place has been mostly occupied by the state or by a company controlled by him, iii) the state company has had historical success in developing and meeting the needs of the energy sector, iv) tensions between state and private, domestic and foreign, monopoly and free competition are noticed. |
Ao analisarmos as previsões contidas no Relatório World Energy Outlook 2013, da Agencia Internacional de Energia (Iea, 2013), ressalta que o petróleo na sua forma de óleo e gás, ainda será o responsável pelo suprimento de 50,5% de toda a oferta primária de energia do globo. Impactos de mudanças tecnológicas podem mudar tais previsões de consumo e fontes de energia.
Segundo informações contidas no Relatório BP Statistical Review (Bp, 2015), óleo e gás foram os responsáveis por 56% da oferta primária de energia mundial em 2014. O fato mostra a relevância do setor e a dependência de manter sustentável a necessária e requisitada oferta energética mundial.
No caso brasileiro, onde a matriz de energia se destaca pela participação de fontes renováveis, representando 39,4% da oferta interna em 2014 (Epe, 2015), na tabela 1, observarmos o óleo e o gás natural com a participação de 52,9% em 2014, fazendo do energético o principal e mais importante elemento de sua matriz.
Segundo a Agência Internacional de Energia (Iea, 2013), em 2035 é projetado o petróleo como responsável por 50,4% do suprimento total da demanda de energia primária brasileira, situação similar às previsões da Agência para o mundo. No Brasil, ainda segundo a Iea (2013), o crescimento do consumo de energia primária até 2035 deverá situar-se entre 56% e 88%, dependendo do cenário adotado pela Agência.
Em relação à importância da produção de óleo no país, a fonte destaca que a produção de 2,2 milhões de barris/dia em 2012, tem potencial de atingir a marca de 4,1 milhões de barris/dia em 2020 e podendo chegar a 6 milhões de barris/dia em 2035 (Iea, 2013). Em função de problemas internos, sofridos principalmente pela quase dominante empresa Petrobras, tais previsões, adotadas por instituições oficiais de fomento brasileiras, estão sendo revisadas e adequadas à atual conjuntura da cadeia de produção de óleo e gás. A queda dos preços internacionais do óleo, também colocaram em risco o atingimento destas projeções.
Tabela 1. Oferta Interna de Energia Primária Brasileira.
Fonte EPE – Empresa de Planejamento Energético. BEN – Balanço Energético Nacional 2014. Organizada: Evandro La Macchia.
Este potencial de crescimento está fundamentado nas recentes descobertas jazidas de hidrocarbonetos nos reservatórios do pré-sal situadas em aguas brasileiras. A localização profunda das rochas reservatórios do pré-sal, e sua localização distante do litoral e em águas oceânicas profundas, impõem uma grande complexidade tecnológica e logística para o desenvolvimento das descobertas, bem como a sua alta necessidade de investimentos (Iea, 2013). Este cenário de produção não se confirmará, se não forem atendidos requisitos como: disponibilidade de recursos financeiros, de tecnologia, capacidade de suprimento da indústria nacional, capacidade da principal operadora destes desenvolvimentos, a Petrobras, e a oferta e desenvolvimento de capacitação técnica e gerencial de mão obra qualificada para a cadeia produtiva (Iea, 2013).
Segundo o Zoneamento Nacional de Recursos de Óleo e Gás (Epe, 2012), das 67 bacias sedimentares brasileiras, do ponto de vista da maturidade exploratória (Mme, 2007), 59 são definidas como Novas Fronteiras. A Resolução do CNPE n.2 (Mme, 2007), define como bacias sedimentares de Novas Fronteiras as regiões ainda pouco conhecidas geologicamente ou com barreiras tecnológicas a serem vencidas. Com a indicação da Anp (2015a) de que 95% de nossas bacias ainda estão inexploradas, conclui-se que em termos de exploração de petróleo, muito ainda existe a ser realizado no país.
Este artigo é um estudo de caso, onde analisamos a posição da indústria de petróleo brasileira através de pesquisa de informações governamentais, coletadas nos sites do Congresso Nacional, Ministério de Minas Energia, Empresa Brasileira de Pesquisa Energética e Agencia Nacional de Petróleo e da Petrobras. A análise é feita principalmente sob o ponto de vista da regulação do estado sobre a indústria. Pesquisamos informações da Agência Internacional de Energia e outros relatórios empresariais. Realizada pesquisa bibliográfica nacional e internacional visando a apurar referenciais teóricos sobre a organização industrial e regulamentações governamentais. A análise da pesquisa é realizada através da crítica das narrativas do Estado, referentes a sua forma de intervir nas atividades da indústria de óleo e gás.
O primeiro ato referente a mineração do Governo Vargas foi revogar a decisão da Constituição, trazendo para o Estado, a decisão de autorizar a mineração em todo o território nacional. Sendo assim, os proprietários de terra perderam o direito de decidir sobre as atividades de mineração. O Presidente promulga nova Constituição em 1934, onde confirma a posse do Governo Federal sobre o subsolo brasileiro (Campos, 2014; Vaitsman, Vaitsman, Vaitsman, & Vaitsman, 2001). Segundo Ross (2012), esta posição de propriedade dos minerais pelos estados é notada desde o império Romano e permanece na maioria dos países até os dias de hoje. Daí surge o termo “royalty”, pagamentos devidos às monarquias, pela exploração de algo que lhes pertenciam.
Outras discussões que já se apresentavam na época, eram se as atividades da indústria de petróleo deveriam ser realizadas por empresas ou estado, estrangeiros ou brasileiros. Já no centenário da independência, 1922, era forte a inclinação do governo de excluir empresas estrangeiras da atividade, dado ao receio da atuação de grandes empresas internacionais (Campos, 2014).
Em 1937, o Estado Novo promulga nova Constituição, de caráter ainda mais estatizante. Nela e nas Leis Complementares, por exemplo o Código de Minas, o Governo Federal, só cederia direitos exploratórios a brasileiros ou a empresas formadas por acionistas brasileiros, além de confirmar a distinção do solo e subsolo. O CNP (Conselho Nacional do Petróleo) é criado em 1938, passa a controlar e administrar as jazidas de petróleo além da formulação da política nacional para a indústria, onde decide sobre a outorga pela União de direitos de exploração e produção de petróleo, sobre a execução para a União de trabalhos de pesquisa e lavra, autorização de instalação de novas refinarias, fixação de preços de combustíveis nos postos de todo o país (Quintas & Quintans, 2010; Tolmasquim & Júnior, 2011).
Em 1946 é promulgada nova Constituição, onde determinou-se que apenas brasileiros ou empresas organizadas no país deveriam ter o direito de exercícios das atividades da indústria de petróleo. Foi mantida a distinção de posse entre solo e subsolo, ficando este último em poder do Estado. Em 1947, o Clube Militar é sede dos principais debates estatizantes sobre a indústria do petróleo, e tem como principal porta voz da tese “O Petróleo é nosso”, o ex-presidente do CNP, General Horta Barbosa (Campos, 2014).
Vemos aqui, que a agenda dos governos do Brasil no período da Era Vargas e Estado Novo até 1953, ou proibiu, ou restringiu ou não criou condições a uma participação da iniciativa privada na indústria de petróleo, fosse esta de capital nacional ou estrangeiro.
Em 1953, o Presidente Getúlio Vargas, via a Lei 2004.53, cria o monopólio estatal e a empresa Petrobras, responsável por exercê-lo. A nova empresa entra em operação em 10 de maio de 1954. No seu lançamento o monopólio estatal se referia à exploração e produção, refino, transporte marítimo de petróleo e derivados e transporte através de dutos. Em 1963 o monopólio da Petrobras foi estendido as atividades de importação de petróleo e derivados.
Segundo Ross (Ross, 2012), o comportamento de criação de empresas estatais de petróleo, foi uma tendência adotada por nações em desenvolvimento e produtoras do mineral, notadamente a partir dos anos 1950s, quando, apesar de possuir a propriedade do subsolo, uma menor parte das rendas da produção era capturada pelos estados. Os primeiros estados a nacionalizar a produção do óleo foram a Argentina (1910), União soviética (1918), Bolívia (1937) e México (1938). No caso do Oriente Médio e África, além de empresas estatais, destaca-se em 1960 a criação da OPEP, onde estados produtores se reúnem para discussão de política de produção e principalmente de preços de venda do óleo.
Cabe citar que a recém-criada empresa, Petrobras, não possuía a primária competência em geologia exploratória. Sob fortes críticas, Juracy Magalhães, primeiro presidente da empresa, contratou então o geólogo americano Walter Link, eis geólogo chefe da Standard Oil New Jersey (Exxon), para estruturação e direção do departamento. Junto com 14 peritos em exploração de Petróleo, 6 brasileiros e 8 estrangeiros, foi realizado o primeiro diagnóstico dos potenciais de produção no Brasil, o chamado Relatório Link (Campos, 2014; Petrobras, 2007).
O presidente João Gular, assina em 1964 dois decretos que estatizam refinarias privadas e a distribuição de derivados, decretos estes revogados pelo governo militar de 1964 (Campos, 2014). Sendo assim, salvo episódicas ocasiões, como pequenas refinarias e a oferta de contratos de serviço à risco na década de 70, entre os anos de 1954 e 1995, as atividades da indústria de petróleo foram, conforme Lei, exercidas em monopólio estatal através da Petrobras (Campos, 2014; Quintas & Quintans, 2010).
Destaca-se que os contratos de risco foram ofertados em 1976, 1977 e 1978 e vigoraram até 1988. Nestes foi dada às empresas a possibilidade de prestação de serviços técnicos operacionais e financeiros à Petrobras. Em caso de descobertas comerciais, a produção era transferida para a Petrobras (Ribeiro, 1997, Campos, 2014). Estes contratos de serviço não se configuraram como cessão de direitos de exploração e produção, estas, por força de lei, só permitidas à Petrobras. A única real exceção que permitiu a participação da iniciativa privada, se deu no segmento de distribuição, onde foi permitida a presença de empresas de capital nacional e estrangeiro, em todo o território nacional, sempre sob autorização e controle do CNP (Tolmasquim & Júnior, 2011).
A agenda dos governos do Brasil entre 1953 e 1995, majoritariamente proibiu a participação privada nos segmentos de exploração, produção, refino, transporte via dutos e importação de petróleo e derivados, fosse esta empresa de capital nacional ou estrangeiro. O lugar econômico desta indústria foi ocupado pelo estado através de empresa por ele controlada.
A Constituição de 1988, manteve o monopólio da União sobre as atividades na indústria de petróleo, a exploração e produção, refinação, importação e exportação e transporte marítimo e por dutos de óleo, gás e derivados.
Dada a forte presença do Estado na economia brasileira, mais de 500 empresas públicas no país, e as fortes demandas por segurança, saúde, educação e previdência social, a Constituição de 1988, determinou que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só seria permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo (Quintas & Quintans, 2010).
Em 1995, via a Emenda Constitucional, foi mantido o monopólio da União, flexibilizando-o, porém, quando facultou à União o direito de contratar com as empresas estatais ou privadas, as atividades da indústria de petróleo. Finda aqui, legalmente, o exercício do monopólio da União pela Petrobras. É promulgada pelo Congresso Nacional em agosto de 1997, a Lei 9.478, chamada Lei do Petróleo, em complemento ao marco Constitucional. Esta Lei firmou condições para o exercício das atividades econômicas do monopólio da União na exploração e produção de petróleo, importação e exportação de petróleo e derivados, refino, processamento de gás natural e transporte de petróleo e derivados. Nela a União criou a ANP, Agencia Nacional de Petróleo, instituição responsável por elaborar os Editais de Licitação e a assinatura dos Contratos de Concessão de Direitos de Exploração e Produção de Petróleo, refino e outras atividades da indústria. Coube também a Agencia, os exercícios de regulamentação e fiscalização da indústria.
Cabe ressaltar que, segundo a Lei, foi determinado que a União só poderia ceder os direitos às empresas nacionais, não havendo restrição as mesmas por terem como acionistas estrangeiros. Neste quesito, é necessário que a empresa seja registrada no Brasil, para que tenha caráter de empresa brasileira.
A partir de 1999 a ANP realizaria cessão de Direitos de Exploração e Lavra via leilões abertos de licitação, onde tais direitos seriam dados via contratos de Concessão. A exceção a este procedimento foi a chamada Rodada Zero, realizada em 1998, onde foi facultado pela União à Petrobras o direito de escolha de áreas exploratórias ou em avaliação até aquela data. Os direitos de monopólio das áreas foram transformados em Contratos de Concessão com duração de 03 anos para o período exploratório e 27 anos para a produção. (Anp, 2015a; Tolmasquim & Júnior, 2011).
Os Contratos de Concessão cedidos pela União, têm como características principais a cessão de direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, sob custo e risco da empresa a quem foram outorgados tais direitos, sendo seu controle e fiscalização da ANP. Em caso de produção, caberá à empresa a posse do petróleo produzido e o pagamento de compromissos ficais estabelecidos pelo estado, a saber: bônus de assinatura dos contratos, royalties, participações especiais e taxa de ocupação de terra (Tolmasquim & Júnior, 2011).
Como citado pelo Ministério de Minas e Energia, o contrato de Concessão, guardadas diferenças regulatórias de cada país, é o instrumento usado por países produtores de petróleo como os Estados Unidos, Canada, Escócia, Inglaterra, Noruega e Austrália citados como referência para o governo brasileiro (Mme, 2014). Foi nestes países que o estado brasileiro buscou modelo para a implementação desta regulação. Dos países aqui citados, a Noruega foi talvez o modelo mais representativo para o governo brasileiro, pois alia o regime de concessão à presença da empresa estatal Statoil. Cabe ressaltar que segundo Tolmasquim and Júnior (2011) as leis norueguesas dão ao dono do solo o direito sobre o subsolo. O Estado mantem o direito sobre o subsolo nas áreas marinhas.
Concluímos que entre 1995 e 2010, foi mantido o monopólio da União e flexibilizado seu exercício. Como demonstraremos adiante, permaneceu a predominância da empresa de controle estatal sobre os principais segmentos da indústria, salvo a distribuição de combustíveis. O lugar econômico desta indústria continuou majoritariamente ocupado pelo estado através de empresa por ele controlada.
No início dos anos 2000, a Petrobras testou um novo modelo geológico, que previa chances de se encontrar acumulações de petróleo sob camada de sal localizada abaixo dos reservatórios em produção nas bacias de Santos, Campos e Espírito Santo. Os primeiros indícios de petróleo nos reservatórios do pré-sal acontecem em 2005, no Campo de Parati, Bacia de Santos. Seguiram estudos sob o novo modelo geológico, que tem sua confirmação e notificação de descoberta em julho de 2006. Nesta data são feitas as notificações legais e submetido à ANP o plano de avaliação da descoberta (Campos, 2014; Lima, 2011; Tolmasquim & Júnior, 2011). Os direitos exploratórios haviam sido dados ao consórcio formado pela Petrobras, BG e Petrogal, no ano de 2000, bloco BM-S-11, na segunda rodada de licitação da ANP, sob a forma de Contrato de Concessão (Anp, 2015a)
Em novembro de 2007 o Conselho Nacional de Política Energética, faz o anuncio oficial da descoberta do Pré-Sal e decide iniciar estudos com o objetivo de revisão do modelo de concessão (Quintas & Quintans, 2010). O Poder Executivo encaminha ao Congresso em agosto de 2009, quatro Projetos de Lei que seriam a base do novo marco legal para a indústria de petróleo no Brasil. Estes projetos foram em 2010 transformados em três novas leis:
No conjunto de Leis o estado passa a ter o direito de apropriação de parte do óleo produzido em Áreas Especiais. As Áreas Especiais, são definidas em Lei, como áreas de baixo risco exploratório e elevado potencial de produção, por isto, de interesse para o desenvolvimento nacional. Estas áreas são delimitadas em ato do Poder Executivo.
O operador destas áreas será sempre a empresa Petrobras, que como operador será a responsável pela condução e execução das atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento, produção e abandono das instalações de exploração e produção. Fica também a Petrobras, obrigada a uma participação mínima de 30% nos consórcios formados para participação de leilões destas áreas. Sendo assim, os consórcios de empresas, são obrigados por lei, a receber a Petrobras como operadora e sócia (Lei 12.351).
Segundo o conjunto de Leis, caberá ao Ministério de Minas e Energia a celebração dos contratos de partilha de produção diretamente com a Petrobras, neste caso dispensada a licitação, ou com consórcio de empresas vencedoras dos leilões de áreas. Esta lei determinou ainda que os contratos de concessão continuariam a ser celebrados via licitação. Os de áreas especiais via licitação ou não, a critério do poder executivo. A empresa estatal Pré-Sal S.A. é a representante da União nos contratos de partilha, sendo a sua principal gestora, uma vez que é de sua indicação a metade do comitê operacional, o seu presidente, com poder de veto e voto de qualidade (Leis 12.304 e 12.351).
A Pré-Sal S.A., empresa pública, não poderá comercializar diretamente o petróleo pertencente a União nos contratos de partilha. Ela será a responsável pela administração dos contratos de venda de petróleo, realizada por agentes privados ou estatais por ela contratados. À empresa Pré-Sal cabe monitorar e auditar as operações e os custos da exploração e produção bem como os contratos de venda de óleo e de gás natural (Lei 12.304).
O governo brasileiro, via Lei 12.276, decidiu também ceder direitos exploratórios diretamente à Petrobras, sem a realização de processo licitatório, em um terceiro regime chamado de Cessão Onerosa, onde caso confirmadas descobertas comerciais, a empresa terá direito de produção de até 5.0 bilhões de barris de óleo equivalente. Neste caso específico, a captura da renda petrolífera se dará principalmente pela cobrança de royalties.
Na decisão de implantação do novo marco regulatório da partilha de produção, o governo brasileiro se inspirou em países produtores de petróleo como os destacados pelo Ministério de Minas e Energia, a saber: Angola, Rússia, Indonésia, Líbia, Nigéria e Cazaquistão (Mme, 2014).
Com a implantação do Regime de Partilha de Produção em 2010, o estado brasileiro volta a exercer domínio sobre a operação de exploração e produção de petróleo via a Petrobras. Nestas áreas de alto potencial de produção, às empresas são permitidas apenas participações financeiras. O estado também, aprofunda sua participação na comercialização do petróleo produzido (Campos, 2014; Lima, 2011; Tolmasquim & Júnior, 2011).
Sendo assim, mais uma vez, aumenta a participação do estado no lugar econômico desta indústria, diminuindo desta forma, a possibilidade de ampliação de participação da iniciativa privada, seja nacional ou estrangeira. Como exposto até aqui, este tem sido o comportamento histórico dos governos brasileiros.
Extensas discussões sobre o equilíbrio entre forças de mercado e regulações têm sido feitas pela academia. Destacou-se em 2014 com o prêmio Nobel, o professor Jean Tirole, por seus estudos sobre a matéria. A pergunta inicial realizada é qual a extensão necessária das intervenções de estado no mercado de maneira a se obter uma ótima regulação aliada as forças de mercado (Tirole, 2014). Dadas imperfeições do mercado, existem intervenções que podem trazer benefícios a todos os seus participantes, porém é sabido que a própria intervenção de governo lida com as fraquezas referentes a assimetria de informações (Stiglitz, 2001). Segundo Krugman (1979), economia de escala entre empresas também é causa da imperfeição de mercado. O autor Krugman (2008) destaca que a ausência de modelos para a análise das imperfeições da competição torna mais difíceis propostas equilibradas de solução.
Segundo Tirole (2014), economistas geralmente consideram que a competição por mercado é elemento de interesse público. Chama a atenção que o autor indica que ações regulatórias do estado, devem ocorrer com o objetivo de criar ambientes competitivo. Stiglitz (2002) destaca, porém, que embora a liberalização comercial seja desejável e benéfica às sociedades no longo prazo, estas devem ser realizadas em um contexto que considere seus impactos sociais e promoção do desenvolvimento local, o que não ocorre pelo simples fato de se liberalizar mercados. Devido a isto, a crença na imperfeição de mercados competitivos, dado sua ausência, desequilíbrio de informação e formação por empresas disfuncionais, tem levado à consequentes intervenções dos governos. A matéria tem sido um dos objetos centrais dos debates políticos nas últimas décadas (Stiglitz, 2001).
Outro ponto estudado por Paul Krugman (Krugman, 2008; Krugman, 2009), é que oligopólios ou mesmo monopólios podem chegar a níveis de economia de escala, custos de transportes e especialização que resultem em benefícios a consumidores de determinadas áreas. Cabe às sociedades a mensuração do quanto benéfico lhes é a manutenção de privilégios oligopolistas ou mesmo monopolistas. Segundo os autores, em regra, nas sociedades democráticas, estados lançam mão de legislações e instituições de proteção a concorrência, antimonopólio e oligopólio, como no caso do CADE, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, autarquia vinculada ao Ministério da Justiça do Brasil.
Segundo Tirole (2014), esta discussão do nível de intervenção dos estados nas atividades econômicas tem sido objeto de estudos profundos, com a tendência de se indicar que quanto menor esta intervenção se der melhor será para as sociedades. Embora acredita-se que a busca por lucro faça com que as empresas ofereçam produtos mais baratos e com qualidades mais altas, em mercados onde exista predominância de determinadas organizações, e onde se caracterizam competições imperfeitas, isto nem sempre acontecerá. O autor chama a atenção que o livre praticar de preços por monopolistas ou oligopolistas tende a promover a elevação destes. Empresas nesta condição, tendo informação precisa do consumidor, são inclinadas a tentar extrair o máximo dos seus clientes (Stiglitz, 2001). Este domínio pode se refletir tanto em preços mais altos quanto na qualidade mais baixa dos produtos ofertados.
Neste caso surgem as discussões sobre competição imperfeita, regulações e políticas governamentais em prol da competição. Muitos países durante os anos de 1980 e 1990 implementaram reformas regulatórias simultâneas a liberações de mercado pró-competitividade e políticas de privatizações. As principais teorias necessitam uma combinação de estudos sobre oligopólios com estudos de economia industrial e economia pública (Stiglitz, 2002; Tirole, 2014).
Diferente do que propõe Tirole (2014), no caso brasileiro, o estado tendeu a estabelecer concentração, principalmente em favor de empresa por ele controlada, e consequente não ambiente competitivo, sendo que a preocupação maior dos estudos, é como deve o estado lidar com ambientes de competição imperfeita, onde determinado agente possui prevalência de poder sobre determinada indústria. Estes estudos se dão principalmente sobre os monopólios naturais, como a distribuição de energia elétrica, gás natural, agua, onde uma má regulação pode resultar em aumento de custos, baixa produtividade e consequentes subsídios. Stiglitz (2001), ressalta que apesar do forte movimento de privatizações nos anos 1980, em áreas inclusive de monopólios naturais, onde empresas estatais foram substituídas por regulações governamentais, motivadas por problemas de gestão das estatais, a imperfeição de informações tem trazido também imperfeições na operação destes novos sistemas regulatórios. Tais privatizações, embora sejam base para criação de riquezas, podem não produzir ganhos sociais esperados.
Stigler (1971) já alertava que quando a firma tem poder sobre o mercado isto afeta fornecedores, clientes, consumidores e competidores e que a instituição de regulação deve ser feita primariamente para proteção e benefício do público em geral e não da empresa ou grupos empresariais. Quando a regulação prejudica a população e os cofres da nação, ao invés de protege-la e abastece-los, trazendo custos sociais ao invés de benefícios, a regulação deve ser questionada.
O autor Stigler (1971) destaca que outra razão para proteger mercados com regulações é a razão política. Estas são imponderáveis e imprevisíveis misturas de forças que podem tanto beneficiar quanto prejudicar sociedades. Segundo o autor, o mote da intervenção regulatória por motivos políticos pode variar da legítima preocupação social à perversão do pensamento regulatório agindo este de forma venal. Chama a atenção também que o estado tem poder tanto para desenvolver quanto para ameaçar as indústrias de uma nação. É da sua natureza um poder particular, o de coagir. Como o estado pode tanto proibir como desenvolver determinadas empresas, fica, porém, a pergunta no que isto beneficia os cidadãos. Neste caso, segundo o autor, as sociedades devem estar atentas para descobrir quando e porque uma indústria ou grupo de pessoas são capazes de utilizar o estado para sua proteção e seus propósitos.
Stigler (1971) chama a atenção que o poder do estado nos mercados se concretiza principalmente por quatro fatores. O primeiro é ligado ao dinheiro: a cobrança de impostos ou descontos nos mesmos para determinados agentes econômicos, os subsídios, ou os empréstimos subsidiados. Apesar da vertiginosa queda de preço do óleo a partir de meados de 2014, o consumidor brasileiro teve série de aumentos nos combustíveis, subsidiando assim o refinador do país. Em período anterior de preços internacionais altos, o estado interviu não permitindo à Petrobras aumento de preços ao consumidor.
O segundo fator, é a sua capacidade de controlar a entrada de novos competidores. Um exemplo é a simples proibição de determinada empresa exercer atividade de sua natureza. A proibição de outras empresas de petróleo atuarem como operadoras nas áreas de Pré Sal é uma restrição primária a sua entrada. Uma ação menos contundente da regulação quanto a possíveis entrantes, também citada pelo autor, é a sua capacidade de retardar o crescimento de novos competidores. Eles existem, mas o estado não cria condições de liberdades competitivas para crescerem, ou mesmo, restringem com regulações este potencial de crescimento. No Brasil, como demonstraremos, o mercado de petróleo não tem sido um ambiente propício ao crescimento das empresas. O convívio com integrações verticais de operações, como o exercido pela Petrobras em todo o território brasileiro, também pode ser elemento de barreira de entrada como destaca o autor. Tirole (2014) também alerta para os riscos deste tipo de competição.
O terceiro fator destacado por Stigler é a influencia na cadeia de fornecedores. A política de conteúdo local pode ser uma restrição a entrada e desenvolvimento de novos atores nesta indústria, dada a possível restrição do novo entrante lançar mão de sua estrutura própria de fornecedores. Finalmente o quarto ponto é o controle de preços pelo estado, como o que ocorre na indústria de refino brasileiro. Esta talvez seja a mais eficaz de todas as barreiras regulatórias.
Como exposto, houve a partir de 1995 esforço de flexibilização do monopólio do estado, exercido pela Petrobras entre os anos de 1953 e 1999, ano da primeira rodada de licitação, esforço este que destacamos seus resultados à partir deste ponto.
Ao analisarmos a evolução das descobertas em reservas provadas, vide tabela 2, vemos que nos últimos dez anos, as reservas brasileiras saltaram de 11.7 bilhões de barris de petróleo em 2004, na sua forma de óleo, para 16.2 bilhões de barris em 2014, ou seja um acréscimo de 44.6% no período. Quanto ao gás natural, houve também uma evolução significativa das reservas provadas que cresceram 53,7% no período. Segundo o relatório da Bp (2015), o Brasil em 2014, ocupava a décima quarta posição mundial em reservas provadas de óleo e a trigésima primeira posição de gás natural.
Tabela 2. Fonte ANP 2015. Reservas Provadas. Anuário Estatístico Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustível de 2015.
Apesar de ter inaugurado um marco regulatório que flexibilizou a exploração de petróleo no Brasil em 1995, ao final de 2014, 19 anos após a sua implantação, a Petrobras possuía aproximadamente 85% das reservas de petróleo do país (Anp, 2015a, 2015b; Petrobras, 2016). A empresa apresentou sucesso neste esforço, porém manteve alta concentração das reservas em seu poder.
A transformação de reservas em produção no período de 10 anos, também se deu de forma expressiva, tendo havido uma expansão de 38% na produção de óleo e 80.2% de gás natural, vide a tabela 3. Segundo a Bp (2015), o Brasil em final de 2014 ocupava a décima segunda posição mundial em produção de óleo e a trigésima primeira posição de gás natural.
Similar ao ocorrido com as reservas, em 2014 a Petrobras produziu em média 1.939 mil barris/dia de óleo e 71.687 milhões m3/dia de gás natural (Anp, 2015a, 2015b), um sucesso na transformação de reservas em produção. Destaca-se, porém, que manteve uma concentração de 86% da produção de óleo e 82% do gás natural produzido no Brasil. Do ponto de vista de produção, houve pouco surgimento de empresas e pouco efeito de flexibilização.
Tabela 3. Fonte ANP 2015. Produção de Petróleo. Anuário Estatístico Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustível de 2015.
Quando analisamos o papel da Petrobras como operador dos campos, vemos em 2014, que a empresa era responsável por 91% das operações de produção de óleo nacional e 92% da operação de gás natural. Hoje existem no país cerca de trinta empresas operadoras de campos de produção de petróleo em terra e mar, conforme a Anp (2015b) e Anp (2015a) e destaca-se que o décimo maior produtor brasileiro, a Partex, produziu em 2014, uma média de 298 barris de óleo por dia.
Tabela 4. Fonte ANP 2015. Produção por operador no Brasil em 2014.
Anuário Estatístico Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustível de 2014.
Do ponto de vista da operação de áreas exploratórias e dos campos produtores, houve pouca entrada de novas empresas e consequente pouco efeito de flexibilização do monopólio.
Quando observamos a atividade de refino no Brasil (Anp, 2015a, 2015b), vemos que da capacidade de 2.352.262 de barris/dia instalada no Brasil em 2014, a Petrobras era dona de 99%. Observa-se ainda que os dois novos empreendimentos em refino no Brasil, Refinaria Abreu e Lima e Comperj, são 100% da Petrobras (2016). Neste mercado, quase nada ocorreu em termos de flexibilização estando as atividades concentradas na Petrobras.
Sobre a distribuição de derivados, cabe ressaltar que o Anuário Estatístico da ANP, apresenta a BR distribuidora, braço varejista da Petrobras, com participação de mercado em 2014 de 38,5% (Anp, 2015a, 2015b). Considerando-se o número de aproximadamente 140 distribuidoras cadastradas na ANP, esta participação de mercado é alta. Aqui também se nota concentração da atividade no estado via a Petrobras.
Como falado, o governo brasileiro, quando do lançamento do modelo de Partilha de Produção, decidiu também por ceder direitos de produção diretamente à Petrobras, sem a realização de processo licitatório, em um terceiro regime chamado de Cessão Onerosa. Este comportamento além de contrário à pratica adotada pelo governo de 1997 até então, também vai de encontro ao sugerido na literatura, onde em regra os estados, com o objetivo de criar competição, se utilizam de leilões para a sessão de direitos de operação e bens da nação (Demsetz, 1968; Laffont & Tirole, 1987; Mcafee & Mcmillan, 1986; Riordan & Sappington, 1987). Nesta operação, o estado brasileiro aumenta a sua participação no setor, diminuindo o impacto da flexibilização do monopólio prevista na Constituição.
Embora legalmente o estado tenha dado liberdade à entrada de novos participantes em todos os segmentos da indústria, isto ocorreu em pequena escala. Cabe ressaltar que o caminho entre o monopólio e a liberalização de um mercado é longo, não fácil de ser percorrido e de difícil atingimento conforme tratam Armstrong and Sappington (2006) no seu artigo sobre a complexidade do processo de estabelecimento de ambiente competitivo. Tirole (2014) indica que em mercados onde há possibilidade de mais de uma empresa operar, o estado deve intervir criando um ambiente competitivo, o que é, na sua interpretação, interesse público, porém de complexa implantação.
A razão para este não estabelecimento de ambiente competitivo, possivelmente esteja ligado a não existência de leis e regulamentações antitruste e antimonopólios, dirigidas a empresa antes monopolista, a Petrobras. Isto poderia ter sido feito, pelos menos, nos primeiros estágios da liberalização do mercado, como sugerem Armstrong and Sappington (2006).
Não vemos, como sugerem os autores, o estabelecimento na regulação brasileira de leis que diminuíssem, por exemplo, vantagens competitivas exercidas naturalmente pela Petrobras nos leilões de áreas exploratórias. Esta possui uma natural escala de operação no Brasil, resultado de mais de 45 anos de exercício de monopólio legal e sucesso no desenvolvimento tecnológico, o que lhe deu a melhor posição competitiva nos referidos leilões. Armstrong and Sappington (2006) alertam que empresas estatais, oligopolistas ou não, têm ainda, em regra, menos pressão para a realização de operações de menor custo que empresas privadas, sendo este posicionamento também fator decisivo na conquista de áreas exploratórias.
Outro diferencial competitivo também destacado por Armstrong and Sappington (2006) e Stiglitz (2001) é o desbalanceamento de informações entre o eis monopolista e os novos entrantes. Nas questões de conhecimento geológico e de mercado, Petrobras é a detentora das melhores informações. Segundo Stiglitz (2001) este talvez seja o principal fator gerador de imperfeições competitivas.
No caso do mercado brasileiro, a participação na indústria de petróleo é praticamente exercida por organização com operações verticalizadas e integradas, porém, quem exerce é a uma empresa de capital privado (51,2% das ações) e público (48,8% das ações), nacional e estrangeiro, e controlada pelo estado (60.2% das ações ordinárias) (Petrobras, 2015). Vive-se no país a dicotomia de um quase monopólio exercido por uma empresa controlada pelo Estado. Os autores Fudenberg and Tirole (1984) e Bulow, Geanakoplos, and Klemperer (1985) apontam em seus estudos quão sensíveis são os investimentos estratégicos aos ambientes de maior ou menor liberdade de mercado.
Os desafios de relacionamento e controle por parte da Agencia Reguladora, ANP, como previstos por Tirole, se multiplicam no caso brasileiro. Na exploração, produção, refino e logística primária brasileira, importação de petróleo e derivados, a Agencia existe para regular, praticamente uma só empresa, de capital misto, porém, de controle do estado. A Petrobras não só possui uma grande concentração do mercado, como o opera com sucesso, de forma integrada e verticalizada, o que praticamente anula, qualquer possibilidade de existência de ambiente competitivo. O esforço de se evitar tal quadro tem sido motivo de legislação em vários países (Tirole, 2014). Este posicionamento dominante da Petrobras, pode explicar a ausência de outros consórcios de empresas no leilão de 2013 da área exploratória de Libra.
Os desafios de lidar com este quadro aumentam quando, segundo Ross (2012), nas últimas três décadas, os chamados “oil states” não têm gerado para suas nações mais democracia, bem-estar social ou segurança. É o que tem sido chamado de a maldição dos recursos naturais, termo mais dirigido aos recursos minerais, principalmente ao petróleo. Segundo o autor, este fenômeno tem sido notado em países produtores e exportadores de petróleo no Oriente Médio, África, América Latina e Ásia. Além de estados mais democráticos, questões como equidade de gêneros, estabilidade econômica e financeira e implantação de políticas econômicas que destravam desenvolvimento, também não têm sido notadas. No Brasil, publicações de autores como Frédéric Monié, Jacob Binsztok, Thiago Periard e Luciano Losekann (Monie & Binsztok, 2012) também vão alertar para a complexidade das questões aqui abordadas.
Isto porém não é uma regra geral. Grandes produtores de petróleo como os Estados Unidos, Reino Unido, Canada, Noruega e Austrália, apresentam economias diversificas, democracias avançadas, alto nível de bem-estar social e segurança de suas sociedades (Ross, 2012). Talvez a melhor resposta para a questão esteja na relação dos estados com o mineral produzido e seu peso nas economias, como discutido neste artigo e amplamente por diversos outros autores (Dunning, 2008; Karl, 1997; Ross, 1999; Sachs & Warner, 1995; Sachs & Warner, 2001).
Ressalta-se também que a empresa estatal Brasileira segue uma escalada de endividamento que afeta a sua sustentabilidade econômica e financeira. Segundo os balanços da Petrobras, entre os anos de 2010 e 2014, o indicador da relação endividamento líquido e capitalização líquida da empresa, saltou de 16% para 48%. No que diz respeito ao indicador da relação endividamento líquido e EBITDA a variação foi de 1,09 vezes em 2010 para 4,77 vezes em 2014. No que tange a sua sustentabilidade econômica e financeira, a empresa busca a não ultrapassagem dos valores de limites de 35% e 2,5 vezes para estes indicadores, como sugerido pelas agências de classificação de risco (Petrobras, 2016). Nesta esteira, a estatal de petróleo brasileira também deu indicações de problemas no que tange a sua administração (Petrobras, 2015). Foram registradas baixas contábeis decorrentes de desvalorização de ativos novos na ordem de US$ 18 bilhões. Estas perdas contábeis relativas aos novos empreendimentos, também dão indicação de fragilidade de sustentabilidade.
Stiglitz (2001) destaca que a teoria da organização moderna se funda em três pilares: teoria das finanças corporativas, teoria da governança corporativa e a teoria do desenho organizacional. Em prol de sua sustentabilidade, Petrobras tem anunciado recentes e profundos esforços em redefinir simultaneamente suas finanças, sua governança e seu desenho organizacional (Petrobras, 2016). Os desafios da administração da empresa moderna são destacados também por Tirole (1988).
A Petrobras, dona em 2015, de reservas provadas de 13.278,7 MM boe de uma produção de óleo e gás natural de 2.786,3 Mboe por dia, 13 refinarias com capacidade aproximada de produção de 2.3 milhões de barris por dia, 36 unidades de geração elétrica com capacidade total de 6.885 megawatts e malha de dutos de mais de 30.000 km, se apresenta como uma das maiores organizações industriais do mundo (Petrobras, 2016). Não se questiona aqui a importante presença da empresa no mercado brasileiro, quinto maior mercado consumidor de combustíveis líquidos do mundo em 2014 (Bp, 2015), mas sim, se tamanha concentração das atividades e decisões na empresa, dá a sustentabilidade e desenvolvimento futuro necessário à indústria de petróleo no Brasil.
Dado o exposto neste artigo, cabe uma reflexão sob a sustentabilidade da manutenção ou não das agendas históricas de governos brasileiros no que tange à indústria petrolífera do país, assunto que, dada sua relevância e consequente profundos estudos pela academia internacional, merece maior atenção de pesquisas futuras. O tema concentração ou desconcentração da indústria, volta a ser discutido no Congresso Nacional.
i) as agendas legais dos governos do Brasil ao longo da história ou proíbem, ou restringem ou não criam condições a uma participação mais ampla de outras empresas na indústria de petróleo, logo, a ausência de outros empreendedores se dá por restrição de estado e não por falta de disposição de entrada dos mesmos no mercado Brasileiro. O lugar econômico desta indústria tem sido ocupado ao longo da história pelo estado diretamente ou por empresa por ele controlada.
iii) a concentração da empresa estatal aliada a uma operação integrada verticalmente, é elemento natural de restrição à novos investimentos privados, sejam eles de capital nacional ou estrangeiro. A despeito de uma regulação que dá liberdade de entrada a novos competidores, por forças de mercado estes podem estar sendo desestimulados à participação no país
iv) a concentração 52,1% da oferta de energia em petróleo, aliada a um quase único fornecedor, pode colocar em risco a sustentabilidade futura desta indústria e de sua cadeia de fornecedores.
v) uma desconcentração das atividades, via desconcentração da Petrobras, poderia atrair novos investidores, nacionais e estrangeiros dando mais sustentabilidade à indústria. Esta ação de desconcentração só se dará por intervenção do estado em favor de instalação de ambiente competitivo. Este é tema de profundas discussões atualmente no Congresso Nacional Brasileiro.
vi) ao longo da história a Petrobras se estruturou como um dos ícones da indústria de petróleo mundial. Em prol de sua sustentabilidade, tem anunciado recentes e profundos esforços em redefinir simultaneamente suas finanças, sua governança e seu desenho organizacional.
vii) finalmente a indústria de petróleo brasileira tem uma história de tensões entre a presença do estado ou iniciativa privada, participação do nacional ou estrangeiro, monopólio ou competição de mercado. O resultado histórico predominante tem sido uma indústria controlada pelo estado, pelo nacional e pelo quase monopólio.
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1. Engenheiro Mecânico, Doutorando em Sistemas de Gestão Sustentáveis - Universidade Federal Fluminense, Mestre em Engenharia da Produção - Universidade Federal de Santa Catarina. Consultor de Negócio de óleo e gás.
2. Oceanógrafo, Doutor em Oceanologia Química pela Université de Bordeaux I (França), Professor Titular do Departamento de Análise Geoambiental – Universidade Federal Fluminense. E-mail: geowass@vm.uff.br
3. Geógrafo, Doutor em Geografia Humana na Universidade de São Paulo e Professor Titular de Geografia Humana do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense. Email: jacob.binsztok@gmail.com