ISSN 0798 1015

logo

Vol. 38 (Nº 01) Año 2017. Pág. 7

As políticas públicas para as mulheres do campo e da floresta no Brasil: um olhar a partir da perspectiva da economia feminista e do empoderamento

Public policies for rural women and forest in Brazil: a view from the perspective of feminist economics and empowerment

Katianny Gomes Santana ESTIVAL 1; Solange Rodrigues Santos CORRÊA 2; Elcio Gustavo BENINI 3

Recibido: 20/07/16 • Aprobado: 15/10/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. A economia feminista e a ideia de justiça

3. A importância do empoderamento das mulheres do campo e da floresta

4. O contexto das mulheres do campo e da floresta no Brasil: os desafios e as oportunidades

5. Análise das políticas públicas para as mulheres do campo e da floresta sob as perspectivas da economia feminista e do empoderamento

6. Considerações finais

Referências bibliográficas


RESUMO:

O objetivo deste trabalho foi realizar uma análise do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM) do Brasil, proposto para o biênio 2013-2015, com foco no estudo das políticas direcionadas para as mulheres que atuam no campo e na floresta, sob a perspectiva da discussão da economia feminista e do empoderamento. O campo empírico investigado constituiu-se da produção bibliográfica e documental sobre economia feminista, ideia de justiça e das políticas públicas para as mulheres do campo e da floresta vigentes no ano de 2015. Para o exame das informações levantadas foi utilizada a metodologia da análise de conteúdo, por meio da identificação de categorias e estruturas de significação inseridas nas discussões teóricas e, principalmente, nos documentos norteadores da política em tela. Os resultados apontaram que o PNPM 2013-2015 contempla os conceitos da economia feminista e o fomento ao empoderamento, mas é necessária maior consideração das especificidades existentes entre as mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais para a proposição e execução de políticas públicas e sociais que resultem em maior visibilidade ao trabalho, que contribuam para o empoderamento socioambiental, cultural, tecnológico, econômico e político, e consequentemente para o desenvolvimento sustentável da agricultura familiar brasileira e das comunidades tradicionais (indígenas, quilombolas, terreiro e ribeirinhas) com a efetiva superação das privações de liberdade e justiça ocasionadas pelas desigualdades nas relações de gênero.
Palavras-chaves: Economia feminista. Políticas públicas. Comunidades tradicionais. Empoderamento.

ABSTRACT:

The aim of this study was an analysis of the National Plan of Policies for Women (PNPM) of Brazil, proposed for the biennium 2013-2015, focusing on the study of targeted policies for women working in the field and in the forest, under the perspective of the discussion of feminist economy and empowerment. The empirical field investigation consisted of bibliographical and documentary production on feminist economics, the idea of justice and public policies for rural women and the existing forest in 2015. For the examination of the information gathered was used to analyze the methodology content by identifying categories and structures of meaning embedded in theoretical discussions and particularly the guiding documents of the screen in politics. The results showed that the PNPM 2013-2015 includes the concepts of feminist economy and fostering empowerment, but it requires greater consideration of the specific situation of rural women, forest and traditional communities for the proposal and implementation of public policies and social that resulting in greater visibility to the work, that contribute to the environmental, cultural, technological, economic and political empowerment, and consequently for the sustainable development of the Brazilian family farming and traditional communities (indigenous, yard and river) with the actual overcoming of freedom and justice privations caused by inequalities in gender relations.
Keywords: feminist economics. Public policy. Communities. Empowerment.

1. Introdução

O crescimento da participação da mulher na economia não representou a solução definitiva nas discussões e conflitos sobre gênero. Concomitantemente ao movimento de “libertação das mulheres” e os decorrentes ganhos materiais e sociais, a segregação e a divisão sexual do trabalho persistem enquanto problemas contemporâneos (CÁLAS, SMIRCICH, 1998).    

De fato, apesar da ampla inserção das mulheres em diferentes segmentos sociais, o trabalho doméstico e informal, essencial para a vida humana, como o cuidado com os filhos, com o lar, ainda é considerado como de “responsabilidade das mulheres” e invisível sob o olhar da economia clássica e neoclássica (CARRASCO, 1991; ADLER, IZRAELI, 1988).

No Brasil, as desigualdades de gênero entre homens e mulheres ainda tem um longo caminho a percorrer para a construção de um cenário de equidade e justiça social seja no contexto urbano ou rural. No contexto rural o cenário da desigualdade, exclusão e invisibilidade das mulheres do campo, florestas, comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas e ribeirinhas é ainda mais acentuado quando comparado à realidade urbana (OIT, 2012).

O acesso aos direitos humanos básicos como saúde, educação, segurança, saneamento é precário e até mesmo inexistente na realidade das mulheres do campo e da floresta na maioria das regiões brasileiras, principalmente nas regiões Norte e Nordeste do país onde essas mulheres não possuem documentos civis e jurídicos e sofrem condições de extrema vulnerabilidade social, econômica e ambiental no enfrentamento de problemas como: altos índices de violência doméstica, altas taxas de fecundidade, gravidez na adolescência, inacessibilidade à educação e acesso às creches, invisibilidade do trabalho doméstico (HIRATA, 2001).

Frente ao contexto apresentado, o objetivo deste trabalho foi realizar uma análise do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres do Brasil (PNPM), proposto para o biênio 2013-2015, com foco no estudo das políticas direcionadas para as mulheres que atuam no campo e na floresta, sob as perspectivas das discussões da economia feminista e do empoderamento.

Como pesquisa social aplicada, esta pesquisa pode ser compreendida como exploratória, uma vez que foi construída com a finalidade de proporcionar uma visão ampla sobre o objeto estudado (GIL, 2010), considerando, portanto, as informações e a produção insuficiente no campo sobre o debate e a prática da economia feminista no Brasil.

A formação do campo empírico constituiu-se produção bibliográfica e documental sobre economia feminista, ideia de justiça e das políticas públicas para as mulheres do campo e da floresta vigentes no ano de 2015, a partir da análise do PNPM 2013-2015, com foco no estudo dos capítulos que abordam as questões relativas às mulheres do campo e da floresta.

Face ao campo empírico abordado, o procedimento analítico utilizado pautou-se pela identificação de categorias e estruturas de significação inseridas nas discussões teóricas e, principalmente, nos documentos norteadores da política observada, considerando assim, o sentido e o significado do conteúdo expresso (BARDIN, 1994).

            Dando sequência a esta introdução, a exposição do texto encontra-se estruturada da seguinte forma: primeiramente realiza-se uma discussão sobre o desenvolvimento ontológico do campo da economia feminista e da ideia implícita de justiça; na sequência, o texto aborda a questão do empoderamento feminino, destacando principalmente a particularidade do campo e da floresta; por fim, o texto apresenta as principais definições e diretrizes que constituem a política pública em tela auscultada.   

2. A economia feminista e a ideia de justiça

A sociologia econômica não foi a única a propor novas visões e discussões dos processos econômicos. De acordo com Zelizer (2008, p. 378):

No seio da própria economia, correntes como a economia comportamental, a economia feminista, a economia organizacional, a economia institucional, a dinâmica das famílias e, mais recentemente, a neuroeconomia, produziram suas próprias críticas aos modelos neoclássicos.

De fato, é possível observar visões alternativas dos processos econômicos, entre as quais, a gama das relações interpessoais. Especialistas do campo do direito, das organizações, das desigualdades e do feminismo, também contribuíram para o conhecimento sobre o funcionamento real dos processos econômicos e sociais. Enfatizando-se dimensões como o estudo do poder, a negociação e as transações interpessoais, verificou-se a abertura das fronteiras entre a economia e a sociologia, emergindo novas disciplinas e novas versões dos processos econômicos, entre as quais, a “sócio-economia”, a “economia comunitária” e a análise dos sistemas mundiais, bem como a “economia social e solidária” francesa (ZELIZER, 2008).

Neste contexto, os primórdios da discussão científica sobre a economia feminista – que surgiu impulsionada pela crítica e ponderação aos paradigmas da economia neoclássica e marxista – são identificados no século XIX, período o qual diversas autoras escreveram sobre o direito das mulheres a terem acesso ao mercado de trabalho e denunciaram as desigualdades nas condições trabalhistas e salariais entre os sexos (CARRASCO, 1991).

O centro principal do debate é o comportamento androcêntrico da economia, a qual se omite e exclui as mulheres as atividades fundamentais que estas realizam. Com efeito, “a economia tem desenvolvido uma metodologia que não consegue ver o comportamento econômico das mulheres” (PUJOL, 1992, p.3).

A autora Michèle Pujol é a mais destacada na crítica feminista ao pensamento econômico. Sua obra principal Feminism and Anti-Feminism in Early Economic Thought é uma referência clássica sobre o tema. No trabalho ela discute com profundidade e argumentação o tratamento tradicional das mulheres no pensamento clássico e neoclássico.

A economia feminista foi reconhecida no ano de 1990 como um campo de estudo da economia. O marco teórico das discussões sobre a economia feminista é obra de Marilyn Waring, publicada no ano de 1988, intitulada: If Women Counted: A New Feminist Economics.

Nesta obra, Marilyn Waring – que foi ativista dos direitos feministas, pesquisadora e escritora – apresenta uma crítica considerada inovadora na década de 1980 sobre o sistema de contas nacionais e o padrão internacional utilizado para medir o crescimento econômico, que desconsiderava o trabalho não remunerado das mulheres, bem como o valor da natureza, excluídos das contas na economia convencional (WARING, 1988).

A economia feminista é um campo de estudo crítico da economia que engloba a tentativa de superação da visão androcêntrica do masculino e os preconceitos patriarcais para a construção de uma economia mais inclusiva. Concentra-se em temas relevantes para as mulheres, tais como o trabalho assistencial e a segregação ocupacional – exclusão das mulheres e das minorias de certos campos. Busca, portanto, por meio de novas construções teóricas e proposições aplicadas, suprir as deficiências dos modelos econômicos convencionais nas análises dos relacionamentos de gênero (BENERIA et al, 2011).

Com o objetivo de estudar, analisar e tornar visível o trabalho considerado como “tipicamente feminino”, o conceito de economia feminista também pode ser definido como um campo das ciências econômicas que busca a compreensão científica do pensamento econômico a partir da invisibilidade das mulheres identificada no pensamento neoclássico e marxista (FARIAS, NOBRE, 2002; SPECHT, 2009).

Também tem como objetivo consolidar-se como um campo de estudos atuante na ressignificação do trabalho de forma mais abrangente, com a consideração do mercado informal, do trabalho doméstico, da divisão sexual do trabalho na família e com a agregação da esfera reprodutiva como essencial a existência humana (FARIAS, NOBRE, 2002; SPECHT, 2009).

A economia feminista também propõe novas formas de coleta e análise de dados sobre o desenvolvimento econômico dos países, como a utilização do Índice de Desigualdade de Gênero (IDG), proposto pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e teorias como a abordagem das capacidades com base no desenvolvimento como liberdade (SEN, 2000).

O Brasil ocupa a posição 79º no ranking global do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), com pontuação média de 0,441, enquanto no IDG ocupa a 85º posição, entre os 152 países com dados disponíveis na pesquisa do PNUD. Os piores resultados do país estão relacionados a participação econômica das mulheres, empoderamento político e a saúde (BIANCHINI, 2014).

É importante ressaltar que o IDG pode ser caracterizado como um indicador quantitativo para o estudo do desenvolvimento dos países, com a inclusão das perspectivas de gênero. Nesse sentido, considerando as possíveis relações entre economia feminista e desenvolvimento econômico, faz-se mister considerar o engajamento das pessoas nos processos de construção e mobilização social, não somente para o cumprimento das leis vigentes, mas para a construção das mudanças sociais necessárias ao exercício da influência direta sobre a formulação e execução de políticas públicas, e assim, sobre o próprio desenvolvimento econômico e social.

É neste contexto que o conceito de liberdade como direito tem sua ressignificação construída a partir da necessidade da sua relação com a capacidade/possibilidade real para fazer e ser do indivíduo, este inserido no seu real contexto coletivo e nos espaços que atua como ator social. Como desdobramento lógico, a equidade social apresenta-se como igualdade de oportunidades, sendo que esta só pode ser concretizada quando existe o espaço para o exercício da liberdade em suas múltiplas dimensões: políticas, facilidades econômicas, oportunidades sociais, garantia de transparência e segurança protetora (SEN, 2000).

Amartya Sen (1987, 2000) apresenta como diferencial em seu discurso o debate do conceito de pobreza como privação das capacidades, contexto que é influenciado por fatores como idade, gênero, papéis sociais, limites geográficos e localização dos indivíduos, condições epidemiológicas e outras variáveis as quais a pessoa não pode exercer controle direto.

Neste contexto de desvantagens – que aumenta o grau de vulnerabilidade das populações –, a associação à fatores como baixa renda pode reduzir ainda mais o potencial do indivíduo para que se desenvolva de forma plena, com exercício da cidadania e capacidade de agir e influenciar a realidade em que vive, logo, de ser agente do próprio desenvolvimento social.

De fato, tendo como mote o conceito de desenvolvimento como liberdade, é possível também construir ponderações sobre os conceitos de capital humano e de capital social, até então aprisionados na ideia limitadora de fator de produtividade, para então, lança-los a partir do imperativo de referência à capacidade de engajamento significativo no mundo, com a possibilidade de exercer poder de decisão e ação em questões além das ações para superação da condição de pobreza material.

Na abordagem da ideia de justiça, Amartya Sen (2011) apresenta a proposição de uma teoria que seja capaz de orientar uma reflexão racional com estímulo ao engajamento efetivo das pessoas, não apenas no cumprimento das leis, mas na transformação da sociedade. A transformação da sociedade envolveria a ação para a exclusão das injustiças sentidas em um determinado momento como inaceitáveis.

A ideia de justiça parte do pressuposto que:

A escolha e a ponderação podem ser difíceis, mas não há nenhuma impossibilidade geral de fazer escolhas arrazoadas baseadas em combinações de objetos diversos (SEN, 2011, p. 275).

De acordo ainda com Sen (2011), há, neste processo, a necessidade de ampliação da atuação das pessoas envolvidas no campo da responsabilidade moral – relação com a abordagem das capacidades – e, como consequência, uma conexão entre a ideia de justiça e as teorias contemporâneas que apresentam a democracia como um “governo por meio do debate” (SEN, 2011, p. 358).

Com efeito, a economia feminista e a ideia de justiça colocam possibilidades de análises convergentes quando a questão do desenvolvimento humano é considerada como o centro dos debates sobre o desenvolvimento econômico, social, ambiental, político e tecnológico de um País, estado ou comunidade.

Reconhecer o trabalho e a visibilidade das mulheres sob as perspectivas da economia feminista em diálogo com a ideia de justiça visa principalmente evitar os fundamentalismos no processo de construção de propostas que envolvam a soluções ou minimização de problemas globais e fomentar os espaços e os processos para as críticas e construções coletivas, com a participação de diversos grupos sociais.

3. A importância do empoderamento das mulheres do campo e da floresta

Numa sociedade ainda caracterizada pelo poder hierárquico e tomada de decisões centralizadas, o conceito de empoderamento deve ser retomado para que as discussões e projetos políticos sejam delineados visando o desenvolvimento, considerando que:

O desenvolvimento consiste na eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das pessoas para exercerem ponderadamente a sua condição de agente (SEN, 2000, p. 10).

A possibilidade do desenvolvimento e de desenvolver-se envolve o aumento da capacidade de ação dos atores, além da promoção de um questionamento aberto sobre em que consistem as privações destes. Outros questionamentos giram em torno das possibilidades de eliminar as privações, e como as políticas públicas, programas e projetos criam oportunidades e ajudam a eliminar as privações.

É preciso retomar a análise sobre conceito de empoderamento de uma forma crítica, para além da perspectiva reducionista do transformismo, aonde muitas organizações adotam este novo nome para legitimação de práticas de cunho assistencialista, que sempre fizeram parte do escopo de suas ações (ROMANO, 2003).

O planejamento, organização e execução dos programas e projetos devem evitar a condução dos processos de “cima para baixo”, que visam à adoção da estratégia do empoderamento neutro e sem conflitos. O que, de acordo, com Romano (2003, p. 11) apresenta uma incongruência de ações com os princípios de emancipação:

Procura-se tecnicizar os conflitos, tirando deles suas dimensões ideológicas e políticas, de forma a domesticá-los. Os conflitos perturbam o resultado esperado. A mudança procurada seria o fruto do progresso das relações sociais, do desenvolvimento das instituições e da superação das falhas do mercado. O empoderamento, nessa visão, seria um acelerador ponderado desse progresso. Uma técnica de administração e neutralização de conflitos. Busca-se reduzir os efeitos do empoderamento, no melhor dos casos, aos de uma progressão aritmética e não potencializar as suas possibilidades enquanto desencadeador de progressões geométricas. Com essa pasteurização do empoderamento, tem-se procurado eliminar o seu caráter de fermento social (ROMANO, 2003, p.11).

Os processos de fomento ao empoderamento das comunidades e grupos devem buscar promover o caráter de “fermento social”, com a proposta da visão crítica e reflexiva no contexto das sociedades nas quais o processo é conduzido.

As críticas apresentadas no processo de construção e implementação dos programas e projetos de empoderamento não devem ser desprezadas ou excluídas, mas sim estimuladas em busca do diálogo, como propõe Delgado (2002: 1), ao apresentar a necessidade de reflexão a partir de pelo menos três dimensões:

  1. Empoderamento das comunidades e dos atores sociais locais em sua relação com o Estado, os mercados e outros segmentos da sociedade civil;
  2. O desenho de formas de institucionalização adequadas à criação de sinergias positivas nessa complexa relação;
  3. A obtenção de alternativas econômicas concretas que viabilizem, de forma sustentável, a melhoria dos níveis de renda e das condições de vida das comunidades de agricultores familiares e de pescadores artesanais.

Sobre equidade social e desenvolvimento, Maluf (2000) ressalta que se faz importante conhecer e valorizar a diversidade cultural, institucional, humana e natural, como uma forma de identificar o que regiões nos países têm especificamente de melhor em cada uma dessas esferas e replicar as políticas e/ou práticas de excelências em outras regiões ou setores econômicos, resultando em uma maior probabilidade de “sucesso” e continuidade das políticas públicas, pois se constituem em políticas e práticas reconhecidas e próximas da população e movimentos sociais, ou seja, soluções construídas pelos próprios atores envolvido.

 Assim, ainda que seja importante sistemas de referência, constitui-se em um grande risco a tentativa de generalizar padrões considerados como “corretos” para o desenvolvimento, como consumo, estilo de vida, sexualidades e relações de gênero na tentativa de levar o desenvolvimento a países e suas comunidades. O grande desafio apresentado seria como suprir as necessidades materiais (alimentação, educação, saúde) dos povos, conservando a diversidade cultural (MALUF, 2000).

Destaca-se a importância do fator cultural, não como um “mero enfeite”, mas sim como um fator determinante para que os indivíduos consigam ampliar as suas capacidades e exercem a liberdade de escolha para tomada de decisões sobre o que realmente pode ser positivo, e não somente o crescimento econômico das comunidades, mas sim para um pleno desenvolvimento, que se caracterize pela valorização e reconhecimento da importância que pode existir na identificação de diferentes práticas culturais, humanas, naturais e institucionais como potencializadoras da distribuição da riqueza e geração de trabalho e renda.

Face ao exposto, faz-se mister considerar as perspectivas das políticas, programas e projetos governamentais, na consideração e na valorização e criação de oportunidades para que as mulheres que atuam no contexto das comunidades do campo e floresta – objeto deste estudo – possam deixar de ser indivíduos “invisíveis” e sejam incluídas como atores importantes para o crescimento e desenvolvimento da agricultura no país, principalmente para o enfrentamento dos problemas atuais como o êxodo da mão de obra, a violência, a expansão do tráfico e dependência das drogas no meio rural, a necessidade de profissionalização, de diversificação das atividades produtivas e da mediação de conflitos socioambientais e intergeracionais, com foco no reconhecimento da interdependência existente entre os agentes econômicos e sociais.

São com estas considerações que a contribuição para a visibilidade do trabalho feminino no cenário da agricultura familiar poderá promover a atuação das mulheres como agentes impulsionadoras do desenvolvimento sustentável no contexto político, gerando, assim, impactos éticos, de equidade ambiental, prudência social e intrageracional e conservação e respeito pela diversidade cultural e biodiversidade (MATA, CAVALCANTI, 2002).

Portanto, a possibilidade do desenvolvimento e de desenvolver-se envolve o aumento da capacidade de ação das mulheres, além da promoção de um questionamento aberto sobre em que consistem as privações reais destas. Outros questionamentos giram em torno das possibilidades de eliminação das privações, e como as políticas públicas, programas e projetos criam oportunidades e ajudam a eliminar as privações sofridas pelas mulheres brasileiras na sociedade em que vivem.

4. O contexto das mulheres do campo e da floresta no Brasil: os desafios e as oportunidades

Os dados sobre a divisão do trabalho entre homens e mulheres no Brasil do relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2012), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que 90,7% das mulheres que estão no mercado de trabalho também realizam atividades domésticas – percentual que cai para 49,7% entre os homens.

No trabalho, elas gastam, em média, 36 horas por semana; eles, 43,4 horas. Em casa, por outro lado, elas gastam 22 horas semanais. Os homens, 9,5 horas (OIT, 2012).

O relatório da OIT (2012) também concluiu que:

A massiva incorporação das mulheres ao mercado de trabalho não vem sendo acompanhada de um satisfatório processo de redefinição das relações de gênero com relação à divisão sexual do trabalho, tanto no âmbito da vida privada, quanto no processo de formulação de políticas públicas (...). A incorporação das mulheres ao mercado de trabalho vem ocorrendo de forma expressiva sem que tenha ocorrido uma nova pactuação em relação à responsabilidade pelo trabalho de reprodução social, que continua sendo assumida, exclusiva ou principalmente, pelas mulheres (AGÊNCIABRASIL, 2013).

A divisão sexual do trabalho não tem efeito somente no emprego e na participação diferenciada de homens e mulheres no mercado, mas também afetam a forma como essas relações se difundem na sociedade. A responsabilização da afetividade e do trabalho não remunerado para as mulheres se traduz na perpetuação das desigualdades de tratamento entre os gêneros (HIRATA, 2001).

O cenário da desigualdade na divisão do trabalho entre homens e mulheres também é confirmada no ambiente rural brasileiro através dos dados de pesquisas realizadas pela OIT (2012), que indicaram que 70% da força de trabalho em algumas economias são baseadas fundamentalmente na agricultura e que as mulheres constituem cerca de 43% da mão de obra agrícola nos países em desenvolvimento.

As mulheres rurais além de trabalharem nas atividades agrícolas também assumem, de maneira desproporcional, a responsabilidade do cuidado das crianças e dos idosos. As jornadas de trabalho das mulheres rurais são maiores do que os dos homens e em grande parte do trabalho que realizam continuam sem reconhecimento, porque o trabalho não é pago e se circunscreve ao âmbito doméstico (OIT, 2013).

De acordo com o relatório publicado pela organização OXFAM (2013) as mulheres que trabalham em fazendas de cacau geralmente recebem menos do que os homens e raramente possuem a terra que elas cultivam – mesmo trabalhando na atividade durante a vida toda. Também foi identificada a prática da discriminação e assédio no trabalho.

Barrientos et al (2010) destaca que as mulheres apresentam um papel fundamental na execução de atividades da produção e processamento primário em cadeias produtivas agrícolas, como no caso do cacau, para a garantia da qualidade das amêndoas, característica cada vez mais valorizada para a produção dos chocolates finos e cosméticos. Mas as mulheres no contexto dessa cadeia produtiva, por exemplo, não possuem reconhecimento formal do trabalho executado, que é contabilizado quase sempre como um trabalho familiar e não remunerado. Portanto, o resultado do trabalho não reconhecido são salários desiguais e a renda inferior das mulheres que atuam na atividade.

De acordo com os dados do Sistema Nacional de Informações de Gênero (SNIG), IBGE (2015), que reúne dados dos censos demográficos 2000 e 2010, a participação das mulheres rurais como responsáveis pelos domicílios aumentou, assim como nas áreas urbanas. No ano 2000, as proporções de domicílios com responsabilidade masculina e feminina nas áreas urbanas eram de 72,7% e 27,3%; na área rural, 87,6% os responsáveis eram homens e 12,4%, as mulheres. Os dados de 2010 apontaram o aumento da participação das mulheres como responsáveis pelos domicílios nas áreas rurais – 74,9% a 25,1% para homens e mulheres, respectivamente –, um acréscimo de 12,7 pontos percentuais (IBGE, 2015). Situação que pode ser associada ao aumento da renda na área rural por meio do acesso das mulheres aos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, que representa aproximadamente 10% do total da renda dos agricultores familiares (SCHNEIDER, 2006, p.242).

5. Análise das políticas públicas para as mulheres do campo e da floresta sob as perspectivas da economia feminista e do empoderamento

De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM, 2015), as mulheres do campo e da floresta são as trabalhadoras rurais, agricultoras familiares, camponesas, extrativistas, quebradoras de coco babaçu, pescadoras, seringueiras, quilombolas, indígenas e ribeirinhas.

No presente artigo foi utilizado como base para a análise das políticas públicas para as mulheres do campo e da floresta, o documento do governo federal brasileiro referente ao Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM) vigente para o período de 2013 à 2015.

O processo de construção do PNPM 2013 -2015 foi realizado por meio das chamadas Conferências de Mulheres nos municípios e Estados do Brasil, com a participação de representações da sociedade civil, movimento de mulheres rurais e urbanas, feministas e organismos estaduais e municipais de políticas para as mulheres. Foi consolidado em dezembro de 2011 na III Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (3ª CNPM), com 200 mil participantes em todo o país e 2.125 delegadas na etapa nacional (BRASIL, 2013).

O PNPM 2013-2015 contribuiu para a institucionalização da Política Nacional para as Mulheres que foi aprovada no ano de 2004, referendada em 2007 e 2011, através das conferências nacionais de políticas para as mulheres. Tem como princípios orientadores:

De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres do Governo Federal Brasileiro (SPM, 2015), promover a igualdade entre os homens e as mulheres rurais é uma das estratégias prioritárias das políticas e ações da secretaria.

No campo e nas florestas residem mais de 14 milhões de mulheres brasileiras, a maioria em condições precárias, situação que é reforçada pelos entraves logísticos de transporte – vias de acesso sem infraestrutura básica para deslocamento de veículos, ausência de disponibilidade regular de transporte, entre outros – e acesso as áreas urbanas e serviços públicos como educação, saúde e saneamento (SPM, 2015).

No processo de escuta do Governo às reivindicações dos movimentos sociais, realizado através das conferências de mulheres nos municípios, Estados e nacional, foram identificados três grupos de problemas que representam demandas prioritárias para as políticas e projetos direcionados as mulheres do campo e da floresta no Brasil:

(a) Enfrentamento à violência contra a mulher: combate aos altíssimos índices de violência contra as mulheres, estimulada pela impunidade dos agressores.

(b) Desenvolvimento rural sustentável com igualdade de gênero: autonomia econômica, com acesso a financiamentos em geral; melhor divisão sexual do trabalho, sem imposição de sobrecarga de atividades à mulher.

(c) Direito à terra: acesso à posse e ao título da terra por parte das mulheres. (SPM, 2015).

Com objetivo de gestão e monitoramento das ações propostas no PNPM, na SPM foi criada uma assessoria voltada às questões das mulheres do campo e da floresta para que as demandas prioritárias tenham acompanhamento contínuo.

As perspectivas do PNPM 2013-2015 contempla as mulheres do campo e da floresta nos princípios orientadores gerais (BRASIL, 2013, p.9 e 10) e dedica um capítulo específico para discussão de linhas de ação sobre o direito à terra com igualdade para as mulheres do campo e da floresta com foco na garantia do acesso a terra, bens, equipamentos e serviços públicos.

O capítulo 1, que trata da igualdade no mundo do trabalho e autonomia econômica, ressalta a importância do fomento às ações que visam o fortalecimento das organizações produtivas e o empreendedorismo das mulheres rurais para garantia da autonomia econômica, acesso à terra, assistência técnica e valorização dos saberes (BRASIL, 2013, p.14). No plano de ação do capítulo contempla o apoio a cooperação bilateral sobre políticas públicas para as mulheres do campo e da cidade entre os países do Mercosul sob a responsabilidade de execução da SPM e a ampliação das inscrições no sistema previdenciário, emissões de documentação civil e jurídica (BRASIL, 2013, p.19).

O capítulo 2, que versa sobre educação para igualdade e cidadania, não apresenta o uso dos termos específicos mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais nas proposições das linhas de ação, mas inclui na promoção de políticas educacionais a ênfase na educação das mulheres jovens e adultas nas áreas científicas e tecnológicas, nos meios urbano e rural, para redução da desigualdade de gênero nas carreiras e profissões (BRASIL, 2013, p. 24)

Quando o tema é saúde integral das mulheres, direitos sexuais e reprodutivos, nas linhas de ação especifica é nítido a importância da atenção à saúde mental das mulheres do campo, floresta, quilombos e comunidades tradicionais. O plano de ação da tema contempla a promoção de estratégias de educação permanente em saúde, através do Programa Saúde da Família, sob a responsabilidade de execução do Ministério da Saúde. Inclui também entre as ações propostas a demanda para pesquisa sobre a incidência de câncer por exposição ao sol, aos agrotóxicos e outras substâncias, com foco no estudo da incidência sobre as mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais, sob responsabilidade de execução do Ministério da Saúde (BRASIL, 2013, p. 30-38).

O eixo que trata do enfrentamento de todas as formas de violência contra as mulheres – capítulo 4, nos seus objetivos específicos visa ampliar e fortalecer os serviços especializados, integração e articulação dos serviços e instituições que atendem mulheres em situação de violência, com a consideração das especificidades no contexto das mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais. No plano de ação do eixo é feito a proposição da implementação das diretrizes de enfrentamento à violência contra as mulheres do campo e da floresta sob a responsabilidade de execução do Ministério da Justiça (MJ), Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ministério da Saúde (MS), Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ministério da Pecuária, Agricultura e Abastecimento (MAPA), Ministério da Educação (MEC), Secretaria de Direitos Humanos (SDH), Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Secretaria Geral (SG) e Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR). (BRASIL, 2013, p. 42).

Quando o assunto é o fortalecimento e participação das mulheres nos espaços de poder e decisão, propõe-se uma linha de ação com foco no estímulo e ampliação da participação das mulheres indígenas, negras e jovens na formulação, implementação e avaliação de políticas públicas sob responsabilidade para execução da SPM, Seppir e SG (BRASIL, 2013, p.56).

Com a abordagem do desenvolvimento sustentável com igualdade econômica e social, o capítulo 6 enfatiza a demanda por ações para o desenvolvimento sustentável com foco na proteção e justiça ambiental no Brasil, com a consideração da relevância da participação das mulheres do campo, floresta e cidades no processo de construção de uma nova sustentabilidade sob as dimensões sociais e ambientais. Apresenta a discussão sobre a necessidade do combate a invisibilidade do trabalho das mulheres do campo e da floresta com a valorização da participação no processo produtivo e fortalecimento para a inserção econômica, através de programas de fomento a organização produtiva das mulheres rurais (BRASIL, 2013, p.61).

Entre as linhas de ação propostas no capítulo 6 do PNPM 2013-2015, destaca-se o apoio e ampliação das políticas de melhoria das condições de moradia e acesso para as mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais, inclusive ribeirinhos (BRASIL, 2013, p.63), sob a responsabilidade do MMA e Mcid – Ministério das Cidades, é apresentada também proposta de ações de melhorias, como acesso a infraestrutura produtiva adequada, sob a responsabilidade de execução do MDA (BRASIL 2013, p.64).

O capítulo 7 é o único dedicado especificamente as demandas consideradas como prioritárias para as mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais, intitulado: direito à terra com igualdade. Tem como objetivo geral promover o fortalecimento econômico e direito à qualidade de vida das mulheres com respeitos as suas especificidades, garantia no direito do acesso à terra, bens, equipamentos e serviços públicos. Destaca-se a importância dos movimentos sociais das mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais para a construção das propostas do PNPM 2013-2015 através da participação nas conferências de mulheres para o reconhecimento, articulação e acesso aos direitos legítimos como cidadãs.

O acesso à terra é um dos pontos mais críticos que está em pauta desde 1988, ano em que a Constituição Brasileira garantiu o direito à posse da terra às mulheres assentadas através do Programa Nacional de Reforma Agrária. Apesar da “garantia” expressa na Constituição Brasileira de 1988, o direito foi concretizado somente no ano de 2007, via instrução normativa número 38 do INCRA – Instituto Nacional de Reforma Agrária (BRASIL, 2013, p.66).

O acesso à terra é um direito fundamental, mas para que se traduza em igualdade e empoderamento para as mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais, é necessária a garantia e prática de outros direitos básicos como a documentação civil e jurídica.

Os movimentos sociais das mulheres tem exercido fundamental importância neste contexto com base em princípios da economia feminista e solidária (BRASIL, 2013, p.67).

O capítulo 7 destaca também o papel fundamental que as mulheres exercem nos processos de decisão sobre questões socioambientais do Brasil. O plano de ação inclui sete linhas (BRASIL, 2013, p. 69-71):

  1. Fortalecimento do reconhecimento do trabalho produtivo das mulheres do campo, da floresta e das comunidades tradicionais, com a promoção do acesso ao crédito, à assistência e assessoria técnica socioambiental e apoio à comercialização, à transição agroecológica e à agricultura familiar.
  2. Organização das mulheres do campo, da floresta e das comunidades tradicionais, para inserção de sua produção nos mercados e nas cadeias produtivas de energias renováveis.
  3. Promoção da reforma agrária e do desenvolvimento de assentamentos, garantindo assistência e assessoria técnica, fortalecimento da organização produtiva das mulheres assentadas e ampliação do conhecimento sobre direitos de acesso à terra.
  4. Promoção do acesso das mulheres às políticas de regularização fundiária, reordenamento agrário e crédito fundiário, com prioridade de atendimento às famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar.
  5. Promoção da demarcação de terras indígenas e do processo de titulação das terras de comunidades remanescentes de quilombos, favorecendo também o acesso das mulheres beneficiadas às políticas públicas e equipamentos sociais.
  6. Apoio aos processos de organização das mulheres do campo, da floresta e das comunidades tradicionais, fortalecendo sua participação na elaboração de políticas públicas.
  7.  Fortalecimento das políticas voltadas para as mulheres indígenas, de povos e comunidades tradicionais, de terreiros e ribeirinhas.

A cultura, esporte, comunicação e mídia, é o escopo do capítulo 8 do PNPM 2013-2015, que considera a diversidade entre as mulheres mas não apresenta nenhuma abordagem específica com relação as linhas de ação para o campo e floresta. O capítulo 9 que trata de questões como o racismo, sexismo e lesbofobia e o capítulo 10, o último, aborda as proposições para a igualdade entre as mulheres jovens, idosas e com deficiências apresentam o mesmo tipo de abordagem do capítulo 8 – sem considerações específicas direcionadas as mulheres do campo, florestas e comunidades tradicionais.

6. Considerações finais

Sob as perspectivas dos conceitos de economia feminista, empoderamento, desenvolvimento como liberdade e ideia de justiça (SEN, 2011) o PNPM 2013-2015 pode ser considerado como um documento de proposição de políticas públicas e ações que foi construído com base na busca da superação da visão androcêntrica do masculino e dos preconceitos patriarcais para a construção de uma economia mais inclusiva, através da participação ativa dos movimentos sociais no processo de elaboração das proposições de políticas públicas via conferências municipais, estaduais e Nacional de mulheres no Brasil.

Pode-se inferir, em vista da voz ativa dos movimentos sociais de mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais, por meio das conferências, que houve o exercício do empoderamento com base no desenvolvimento como liberdade e ideia de justiça, com a promoção de reflexões legais e o estímulo ao engajamento efetivo das pessoas, sendo este não apenas para cumprimento das regulamentações já formalizadas, mas para a transformação da sociedade, partindo da premissa de que por meio do ambiente propício e democrático das conferências os movimentos sociais expressarm as demandas e as injustiças sentidas e consideradas inaceitáveis.

É importante ressaltar que as demandas e as injustiças sentidas e consideradas inaceitáveis às vezes extrapolam o que as políticas públicas vigentes contemplam, situação que reforça a importância da utilização de informações qualitativas e análises em profundidade que considerem as especificidades existentes entre os diferentes grupos de mulheres dos contextos do campo e da floresta no Brasil.

Considerando o objeto e o objetivo deste trabalho, podemos afirmar que o documento auscultado contempla as discussões dos conceitos de economia feminista e empoderamento das mulheres no âmbito das proposições de linhas de ação. Contudo, ponderamos que para uma análise com maior confiabilidade é necessário ainda a disseminação das perspectivas que pautaram a análise, assim como o cruzamento das informações do PNPM 2013-2015 com as ações em andamento relacionadas à implementação das políticas para mulheres nos múltiplos setores que estão imbricadas.

A análise apresentada sinaliza a demanda para pesquisas exploratórias com maior profundidade, pois para que ocorra a avaliação crítica do PNPM 2013-2015 faz-se necessário o conhecimento do percentual de participação dos movimentos sociais das mulheres do campo, floresta e comunidades tradicionais frente aos demais movimentos sociais; é necessário ainda considerar que dentro da denominação mulheres do campo e da floresta existem subgrupos com diferenças significativas entre a composição, demandas e situação de vulnerabilidade, situação identificada na realidade das mulheres de comunidades tradicionais – indígenas, quilombolas, terreiros e ribeirinhas; além da consideração das dificuldades das condições de acesso e participação das mulheres nas conferências, por motivos de logística de transportes e exclusão social, política e digital; entre outros fatores.

Ressaltamos também que é necessário lançar avaliações sob as perspectivas diretas das mulheres do campo e da floresta a respeito de suas percepções, entendimento e demandas, para assim estabelecer se estão realmente alinhadas com aquelas expressas pelos movimentos sociais participantes das conferências municipais, estaduais e Nacional para elaboração do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, ponderando-se assim a própria burocratização da participação e alienação política.

Referências bibliográficas

ADLER, Nancy; IZRAELI, Dafna. Womam in Management Wordwide. New York: M. E. Sharpe, 1988.

AGÊNCIA BRASIL. Relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta que as mulheres trabalham 10 dias a mais por ano. Disponível em: http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2012-07-19/relatorio-da-oit-aponta-que-mulheres-trabalham-dez-dias-mais-por-ano . Acesso em 20 de setembro de 2013.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições Setenta, 1994.

BARRIENTOS, Stephanie; GEREFFI, Gary; ROSSI, Arianna. Sustentabilidade Social e Econômica: a Cadeia Global de Cacau-Chocolate. Disponível em: www.capturingthegains.org/publications/workingpapers/index.htm . Acesso em 12 de fevereiro de 2012.

BENERÍA, Lourdes; MAY, Ann Mari; STRASSMANN, Diana L (2011). Feminist economics. Cheltenham, UK Northampton, Massachusetts: Edward Elgar. ISBN 9781843765684.2011.

BIANCHINI, Alice. Instituto Avante Brasil (2014). Distribuição das realizações entre mulheres e homens: uma análise do índice de desigualdade de gênero – IDG. Disponível em: http://institutoavantebrasil.com.br/distribuicao-das-realizacoes-entre-mulheres-e-homens-uma-analise-do-indice-de-desigualdade-de-genero-idg/ . Acesso em 13 de maio de 2015.

BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Políticas para as Mulheres. Plano Nacional de Políticas para as Mulheres 2013-2015 (PNPM – 2013-2015). Brasília: Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2013. 114 p.

BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Políticas para as Mulheres. Mulheres do Campo e da Floresta: Diretrizes e Ações Nacionais. Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Brasília, 2011.

CARRASCO, Cristina. El trabajo doméstico: un análisis económico. Madrid: Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, 1991.

CALÁS, Marta; SMIRCICH, Linda. Do ponto de vista da mulher: abordagens feministas em estudos organizacionais. In: CLEGG, Stewart; HARDY, Cynthia; NORD, Walter. Handbook de estudos organizacionais: modelos de análise e novas questões em estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 1998.

DELGADO, Nelson Giordano. 6 de novembro de 2002. Extensão e desenvolvimento local: em busca da construção de um diálogo. Palestra feita na Mesa 1 – Desenvolvimento Rural no Nordeste do Brasil do Seminário Nacional sobre a Extensão e o Novo Espaço Rural no Nordeste Brasileiro. Recife, Pernambuco. 2002.

FARIAS, Nalu. NOBRE, Mirian (org): Economia Feminista. São Paulo: SOF, 2002.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2010.

HIRATA, Helena. Globalização e divisão sexual do trabalho. Cadernos Pagu, v. 17, n. 2, p. 139-156, 2001.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estatísticas de Gênero. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/apps/snig/v1/?loc=0. Acesso em 01 de junho de 2015.

MALUF, Renato Sérgio, “Atribuindo sentido(s) ao desenvolvimento econômico”. Estudos Sociedade e Agricultura, n. 15, p. 53-86, 2000.

MATA, H. T. C; CAVALCANTI, José Euclides A . A Ética Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Revista de Economia Política, v. 22, n.1, 2002. Disponível em: http://www.rep.org.br/pdf/85-10.pdf . Acesso em 17 de agosto de 2014.

OIT. Organização Internacional do Trabalho. Mulheres representam até 70% da força de trabalho rural em economias agrícolas. Publicado em 8 de março de 2012. Disponível em: http://www.onu.org.br/mulheres-representam-ate-70-da-forca-de-trabalho-rural-em-economias-agricolas-afirma-oit/ . Acesso em 15 de junho de 2013.

OXFAM . Equality for women starts with chocolate: Mars, Mondelez and Nestle and the fight for women’s rights. Disponível em: http://www.oxfam.org/sites/www.oxfam.org/files/equality-for-women-starts-with-chocolate-mb-260213.pdf . Acesso em 03 de abril de 2013.

PUJOL, Michele. Feminism and anti-feminism in early economic thought. London: Edward Elgar, 1992.

ROMANO, Jorge O.; ANDRADE, Maristela de Paula; ANTUNES, M. 2007. Olhar crítico sobre participação e cidadania: a construção de uma governança democrática e participativa a partir do local. São Paulo, 1ed, ACTION AID Brasil, 296 p.

ROMANO, Jorge O.; ANTUNES, Marta. 2003. Empoderamento e direitos no combate à pobreza. Rio de Janeiro: Action Aid.

SCHNEIDER, Sergio. Agricultura familiar e emprego no meio rural brasileiro: análise comparativa das Regiões Sul e Nordeste. Parcerias Estratégias, Brasília, CGEE, n. 22, junho de 2006. Disponível em: http://biblioteca.planejamento.gov.br/biblioteca-tematica-1/textos/desenvolvimento-agrario/texto-45-agricultura-familiar-e-emprego-no-meio-rural-brasileiro-analise-comparativa-das-regioes-sul-e-nordeste.pdf. Acesso em 01 de junho de 2015.

SEN, Amartya. A ideia de Justiça. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo, Cia. das Letras. 2000.

SEN, Amartya. Food and freedom. Sir John Crawford Memorial Lecture. Washington DC, 1987.

SPECHT, Analine Almeida. Economia Feminista. Cadernos Brasil Local: Desenvolvimento e Economia Solidária, Suplemento Julho, a. 2009. Disponível em: http://portal.mda.gov.br/o/2776316. Acesso em: 18 de maio de 2015.

TEIXEIRA, Marilane Oliveira. Desigualdades salariais entre homens e mulheres a partir de uma abordagem de economistas feministas. Revista Niterói, v. 9, n. 1, p. 31-45, 2. sem. 2008.

WARING, Marilyn. If Women Counted: A New Feminist Economics. San Francisco: Harper & Row. 1988.

ZELIZER, Viviana. Economia do Care. Revista Civitas. Volume 10. Número 3. Disponível em http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/civitas/article/view/8337 . Acesso em 17 de agosto de 2014.


1. Pós doutoranda em Administração na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul – Campo Grande – Mato Grosso do Sul – Brasil Doutora em Ciências Sociais, Desenvolvimento e Agricultura - UFRRJ Professora Adjunta da Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus – Bahia – Brasil. E-mail: ksgestival@uesc.br

2. Professora Adjunta da Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus – Bahia – Brasil Doutora em Ciências Sociais, Desenvolvimento e Agricultura - UFRRJ. E-mail: srscorrea@uesc.br

3. Professor Adjunto da Escola de Administração e Negócios (ESAN) da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul - Campo Grande – Mato Grosso do Sul – Brasil Doutor em Educação - UFMS. Email: elciobenini@yahoo.com.br


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 01) Año 2017

[Índice]

[En caso de encontrar algún error en este website favor enviar email a webmaster]

revistaespacios.com