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Espacios. Vol. 37 (Nº 35) Año 2016. Pág. 21

Comparação de dietas rurais e urbanas: Escolha de alimentos pelas mães de crianças pré-escolares na cidade de Piracicaba, São Paulo, Brasil

Diets comparison of rural and urban: Food choice by mothers of children preschool in Piracicaba City, São Paulo, Brazil

Ana Paula do Nascimento LAMANO-FERREIRA 1; Simone AQUINO 2; Silvia Maria Guerra MOLINA 3

Recibido: 03/08/16 • Aprobado: 15/08/2016

Conteúdo

1. Introdução

2 Metodologia

3. Análise dos resultados

4. Considerações finais

Referencias

1. Introdução

As escolhas alimentares podem trazer informações valiosas sobre a relação das pessoas com seu ambiente sociocultural e biológico (Hanazaki; Begossi, 2004). O estudo da dieta das populações humanas pode ser compreendido como uma abordagem que integra diversos aspectos do uso de recursos (Nascimento et al., 2010). De acordo com Abrão (2011), estudar o consumo é importante, pois por meio dele podemos identificar dinâmicas culturais e sociais, razão pela qual, ao ingerirmos algum alimento estamos também ingerindo seu aspecto simbólico na sociedade.

A estrutura social também afeta a maneira pela qual as refeições são preparadas e o que é servido. Às vezes as pessoas não têm tempo disponível para comprar e preparar o alimento e nem o conhecimento sobre o valor nutricional dos alimentos. Já o conhecimento sobre a importância da alimentação para manter uma boa saúde, é uma grande motivação para mudanças nas escolhas alimentares. E um especial interesse ou necessidade de um membro da família pode influenciar na escolha alimentar de toda família (Avelar; Rezende, 2013).

O intenso processo de urbanização associado a uma acelerada industrialização têm gerado mudanças no padrão dietético com o aumento do consumo de dietas de alto valor energético, ricas em gorduras, especialmente as saturadas, redução do consumo de carboidratos complexos e fibras, além de um menor consumo de frutas e vegetais (Mondini  et al., 2010; Jorge  et al., 2008). O aumento na venda ou consumo de alimentos embalados (produtos ultraprocessados) ocorrem em países de baixa renda per capita (Monteiro et al., 2013; Stuckler et al., 2012) e segundo Martins et al. (2013) houve aumento no consumo de produtos ultraprocessados no Brasil (de 20,8% para 25,4%) entre 2002-2003 e 2008-2009, com redução significativa na diversidade da composição de alimentos e de ingredientes culinários, com o aumento uniforme da participação calórica de produtos prontos para o consumo em áreas metropolitanas, acompanhada tanto por reduções de alimentos in natura ou minimamente processados, quanto ao número de ingredientes culinários (Martins et al., 2013).

Em geral, os produtos ultraprocessados são mais ricos em energia, contêm gorduras mais prejudiciais, menos fibra, mais açúcares e sal do que os alimentos não transformados ou minimamente processados (Moodie et al., 2013; Monteiro et al., 2011). Além disso, há evidência direta de ligações entre o consumo de produtos ultraprocessados e o excesso de peso, obesidade e síndrome metabólica (Moubarac et al., 2013; Tavares et al., 2012).

Um estudo comparativo de todos os alimentos adquiridos pelas famílias no Canadá e no Brasil demonstrou que produtos ultraprocessados estão substituindo alimentos básicos, como batatas (Canadá), e arroz e feijão (Brasil), além de outros alimentos, como legumes, leite e frutas (Canadá), e leite, mandioca, legumes e frutas (Brasil); e do número e diversidade de ingredientes culinários em ambos os países (Monteiro et al., 2011). Essa substituição transforma a cultura alimentar e hábitos alimentares, indicando que essas mudanças são prejudiciais para a saúde pública (Moodie et al., 2013; Monteiro et al., 2011).

Existem importantes razões para que a dieta nas áreas rurais e urbanas seja diferente, como por exemplo, diferenças no estilo de vida e disponibilidade de alimentos. Famílias rurais eventualmente têm condições de cultivar grande parte dos alimentos que consomem, enquanto famílias urbanas não os cultivam e encontram-se mais expostas a uma grande variedade de produtos oferecidos pelo comércio (Nascimento et al., 2005; Schlindwein; Kassouf, 2007). Por outro lado, fenômenos como os de desagrarização levam a estilos de vida urbanos em áreas rurais (Lui; Molina, 2013). Portanto, a questão de pesquisa é: Qual o perfil de mães de pré-escolares residentes em áreas rurais e urbanas, frente às escolhas alimentares e ao consumo de alimentos na cidade de Piracicaba, São Paulo?

2. Metodologia

O presente trabalho foi realizado em Piracicaba, SP, situada no interior do Estado, a 180 km da capital. A área urbana compreende 158,06 km2, abrigando 97% da população e a área rural constitui-se por 1.154,24 km2. Localizada em uma das regiões mais desenvolvidas e industrializadas do Estado de São Paulo, Piracicaba tinha aproximadamente 391.449 habitantes em 2015. A economia do município está vinculada à produção agrícola e industrial. No ano de 2010 a população rural foi estimada em 7.821 e a população urbana em 356.440 indivíduos (Instituto de Pesquisas e Planejamento de Piracicaba, 2016).

O sistema de referência para a constituição do Plano Amostral foi elaborado a partir das listagens fornecidas pela Secretaria da Educação do Município de Piracicaba, contendo todas as Escolas Infantis Municipais, sendo 40 na área urbana com total de 6.649 crianças e três na área rural somando 135 crianças, especificando o número de crianças que frequentam cada instituição como também sua localização.

As entrevistas foram realizadas nas escolas de educação infantil com 137 mães de sete escolas da área urbana e 51 mães das três escolas localizadas na área rural do município. Os métodos de investigação nutricionais utilizados no presente trabalho foram o Recordatório e o Questionário de Frequência Alimentar (QFA). Estes métodos investigam diretamente o consumo de alimentos e um complementa o outro.

O QFA é um instrumento que identifica a dieta habitual de grupos populacionais sendo muito utilizado em estudos epidemiológicos para verificação da relação dieta-doença (Slater et al., 2003). No QFA os alimentos são apresentados em uma listagem pré-estabelecida que, portanto, não contempla todos os alimentos disponíveis para o consumo e, alimentos diversos são agrupados em um mesmo grupo. Estimativas mais acuradas são obtidas pelos métodos de registro diário (RD) e recordatório de 24 horas (R24h) (Slater et al., 2004). E esses métodos além de se basearem na memória recente dos indivíduos, possuem as questões abertas, o que permitiu a obtenção de um quadro mais detalhado do consumo da população estudada.

As dietas da população rural e urbana foram caracterizadas com base nos itens: composição da dieta; responsável pela preparação da alimentação; número de refeições; refeições realizadas fora de casa; entre outros pontos relevantes que surgiram durante a entrevista. Os itens alimentares foram distribuídos em dez grupos, sendo oito grupos de acordo com a pirâmide alimentar adaptada ao Brasil, proposta por Phillipi et al. (1999 revisada por Phillipi, 2015), e outros acrescentados pelos autores. Considerou-se a contribuição de cada nutriente básico na dieta, e os grupos estão representados na Quadro 1.

Quadro 1. Divisão por grupos alimentares de acordo com a composição da dieta.

Quanto à frequência alimentar (QFA) o questionário constava de 30 itens alimentares, sendo aplicado na área urbana e rural. As respostas, fechadas, referiram-se à frequência de consumo: diário, semanal, mensal ou nunca. Para demonstrar a frequência do consumo, os 30 itens alimentares foram reagrupados, de acordo com os níveis da pirâmide alimentar:

- Energéticos I: que corresponde ao 1º nível da pirâmide alimentar (grupo 1);

- Reguladores (2º nível): que incluem o grupo de hortaliças (grupo 2) e frutas (grupo 3);

- Construtores I: grupo do leite e produtos lácteos (3º nível);

- Construtores II: grupo das carnes e ovos, e das leguminosas (3º nível);

- Energéticos II (4º nível): grupo dos óleos e gorduras e grupo dos açúcares e doces;

      E um 6º grupo o qual não foi baseado em alimentos da pirâmide, mas que facilitará a comparação entre o consumo de alguns produtos:

- Bebidas e guloseimas: grupo de bebidas (alcoólicas, refrigerante, chá, café), sorvete, mel, açúcar e adoçante.

      Frente à escolha alimentar, a partir do conteúdo das entrevistas, identificou-se seis categorias associadas ao principal fator que está relacionado com a escolha alimentar pelas mães: 1= Prazer / social; 2= Preocupação com a saúde e ¤ ou qualidade do alimento; 3= Conveniência / preparo rápido (congelados, produtos mais industrializados); 4= Baixo custo; 5= Controle de peso / imagem corporal (alimentos com menos calorias); 6= Outro.

3. Análise dos resultados

Recordatório de 24 horas (R24h)

Segundo o recordatório de 24 horas (R24h) a base da dieta das mães entrevistadas na área urbana (n=137) é constituída por arroz, feijão e carne bovina, respectivamente em 86,16%, 78,10% e 58,39% das refeições. Na área rural (n=51) esses mesmos itens foram os mais frequentes e corresponderam a 88,24%, 74,51% e 62,75%, respectivamente. Evidencia-se nesses dados (Tabela 1), a similaridade entre os padrões de ambas as áreas, rural e urbana.

Tabela 1 - Itens alimentares consumidos pela população urbana (n=137) e rural (n=51) de Piracicaba, SP, ocorrência e percentagem em relação à população específica.

* Incluem: calabresa, salsicha, linguiça, hambúrguer, nuggets.

Os dados demonstram a mudança para alimentos de consumo rápido (fast food) e semiprontos, conforme constatado por Schlindwein e Kassouf (2007), em pesquisa sobre consumo alimentar, com enfoque econômico, de âmbito nacional no Brasil. A carne de peixe, apresentou frequência de consumo baixa (0,73%) na área urbana, revelando que este tipo de alimento não é apreciado e(ou) valorizado pelas mães, responsáveis pela aquisição, preparo e  escolhas alimentares da família. Embora a prática de pesca seja comum em Piracicaba (Silvano; Begossi, 2001) o consumo dessa fonte de proteína animal não se refletiu como hábito de inserção de peixes na alimentação, pela população rural local (7,84%).

Na tabela 2, observa-se que 41,6% das mães da área urbana alimentam-se quatro vezes ao dia, sendo seguidas por aquelas que se alimentam apenas três vezes (27%), cinco vezes (20,4%), duas vezes (8,8%) e por último por aquelas que se alimentam apenas uma vez ao dia (2,2%). Na área rural, 43,1% das mães relataram alimentar-se três vezes ao dia, não sendo essa proporção, muito diferente daquelas que se alimentam quatro vezes ao dia (41,1%). Portanto constata-se que tanto na área urbana quanto na rural, as mães procuram se alimentar predominantemente entre três (31,4%) e quatro (41,5%) vezes ao dia.

Tabela 2 – Informações relacionadas as refeições e/ou lanches realizadas por mães de crianças
pré-escolares na área rural e urbana do município de Piracicaba, SP, relatadas no R24h.

Nota-se que o número de refeições foi modificado na área urbana, devido à falta de tempo das mães, que acabam realizando menos de três refeições diárias (9,6% das mulheres). De acordo com o R24h, as refeições intermediárias (lanches da manhã, lanche da tarde e a ceia) são menos frequentes na área rural que na área urbana. As refeições principais (café da manhã, almoço e jantar) são realizadas pela maior parte dos entrevistados de ambas as populações, sendo que na zona rural, 100% das pessoas almoçam o que não ocorre na zona urbana (Tabela 2).

Em relação às refeições fora de casa, no meio urbano 32,8% das mães disseram ter realizado pelo menos uma das refeições fora de casa, enquanto que no meio rural essa frequência (7,8%) é menor (Tabela 2). Os brasileiros estão cada vez mais se alimentando fora de seus lares, com 61,97% das refeições realizadas fora de casa. Entretanto, segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) realizado pelo IBGE (2002) as despesas com alimentação revela que na área urbana, o percentual gasto com alimentação fora do domicílio (25,74%) é o dobro do da área rural (13,07%). O valor em reais utilizado para comer fora também é bem maior na área urbana (R$ 80,06) do que na rural (R$ 34,73). No entanto no presente estudo a alimentação fora de casa é quatro vezes mais frequente na área urbana (32,8%) que na área rural (7,8%). Essa tendência já foi reportada por Collaço (2003) a exemplo de uma única praça de alimentação de Shopping Center, que oferece diferentes tipos de alimentos e preços. No entanto não são todos os indivíduos que têm acesso a essa opção, como moradores de áreas rurais.

Em relação sobre o responsável pelo preparo das refeições, na população urbana, 85,3% das mães preparam as refeições, enquanto na população rural esse valor corresponde a 92% das mães (Tabela 2). Na área urbana, quando elas não podem preparar o alimento, são as avós que preparam as refeições em 12,5% dos casos, frente a 3,9% no ambiente rural. Parte das mães que trabalham fora, deixa as refeições preparadas no jantar (com quantidade maior para sobrar para o almoço do dia seguinte).

Os dados do IBGE sobre mulheres que trabalham fora demonstram que nas áreas rural e urbana esse percentual é de 54,1% e 53,6% respectivamente (IBGE, 2002). Esses dados corroboram os dados obtidos na cidade de Piracicaba, com o total de mulheres que trabalham fora de 53,7%, porém, 61,3% das mães da área urbana e 33,3% da área rural (Tabela 6). O município de Piracicaba-SP é o mais urbanizado na região sudeste do País, o que explica o percentual elevado de mulheres que trabalham fora, na área urbana, ser expressivamente maior que o percentual médio nacional.

A escolaridade materna influi na percepção que as mães têm sobre o estado nutricional de seus filhos, pois mães com nível de escolaridade mais baixo são as que apresentam maior porcentagem de discordância entre a sua percepção e o estado nutricional medido, o que ainda é considerado um risco a mais para o desenvolvimento da obesidade da criança e do futuro adulto (Molina et al., 2009).

Durante as entrevistas três mães (F15, 36 anos; F123, 28 anos; F178, 35 anos) da área urbana afirmaram estar tomando remédio para emagrecer no período em que foi realizada a entrevista. Duas declararam ter feito dieta (F1, 36 anos, Rural; F110, 34 anos, Urbano), sendo que uma delas residente na área urbana também tomava remédio para emagrecer e duas mães (F2, 35 anos, Rural; F108, 38 anos, Urbano) ressaltaram que seus filhos estão fazendo dieta porque estão obesos.

Questionário de frequência alimentar (QFA)

O questionário de frequência alimentar (QFA) aplicado continha a seguinte frequência de consumo: diária, semanal, mensal ou nunca. Os itens alimentares foram agrupados em energéticos I (carboidratos), reguladores (frutas e hortaliças), construtores I (produtos lácteos), construtores II (carnes e leguminosas), energéticos II (óleos e gorduras) e um último grupo de bebidas e guloseimas.

Na Figura 2, pode-se observar o consumo de alimentos energéticos, do grupo 1 da pirâmide alimentar, pela população estudada. O consumo diário do pão foi relatado por 84,61% na área urbana, seguido por 12,82% que consomem pelo menos uma vez por semana; 0,85% consomem mensalmente e 1,71% não consomem. Na área rural 66,66% declararam consumir pão diariamente e 33,33% semanalmente.

O alimento do Grupo 1 mais consumido diariamente pelas populações estudadas é o arroz. De acordo com as mães, na área rural é consumido em 97,07% das refeições e na área urbana em 94,01%. De acordo com as mães entrevistadas, o consumo de macarrão é na maioria das vezes semanal na área rural (82,35%) e urbana (82,05%). No entanto, na área rural 7,84% declararam que o consumo de macarrão é diário. Já na área urbana este número cai pela metade (3,41%). Já o consumo de farinha, de qualquer tipo, foi citado pelas entrevistadas da área rural como sendo diário em 11,76% dos casos, 35,29% semanal, 37,25% mensal e 15,68% disseram que nunca consomem. Esses números na área urbana foram 23,07%, 24,78%, 29,05% e 28,07%; respectivamente.

Alimentos energéticos muito consumidos pela população são bolacha e bolo, visto que o consumo diário de ambos na área rural é de 33,33%, semanal de 47,05%, mensal de 45,68 e nunca é consumido por 3,92%. Na área urbana o consumo maior também é semanal (44,44%), seguido do consumo diário (41,88%), mensal (11,96%) e apenas 1,7% não consomem.

Figura 1- Frequência de consumo de alimentos energéticos do grupo I
(fontes de carboidratos) por mães de pré-escolares da área rural e urbana de Piracicaba, SP

Na Figura 2 observamos a frequência de consumo de hortaliças e frutas e nota-se que o consumo diário de hortaliças é maior na área rural (68,62%) do que na área urbana (58,97%). O consumo semanal de hortaliças é relatado por 29,41% das mães na área rural e 33,33% na área urbana.

Figura 2- Frequência de consumo de alimentos reguladores (frutas e hortaliças)
por mães de pré-escolares da área rural e urbana de Piracicaba, SP.

Quanto às frutas, verifica-se que a frequência de consumo diário na área rural (45,09%) é similar à da área urbana (45,29%). Semanalmente o consumo de frutas é maior na área rural (47,05%) do que na área urbana (41,88%). Ainda na área rural é relatado o consumo mensal de frutas de 7,84% e na área urbana, de 11,11%, além de 1,71% das mães entrevistadas na área urbana que disseram não consumir frutas.

Com relação à frequência de frutas e hortaliças na área rural, ao longo do mês as pessoas diminuem o consumo, uma vez que a população rural realiza suas compras apenas uma vez por mês, em supermercados localizados em áreas urbanas, devido ao deslocamento da população rural porque em nenhum dos três bairros rurais estudados possui supermercados e assim o consumo de frutas e hortaliças é reduzido com o tempo, dado à sua natureza perecível.

A frequência de consumo dos alimentos construtores I, como leite, iogurte e queijo demonstrou que o leite é mais consumido diariamente tanto na área rural (58,82%) como na área urbana (63,25%). Algumas mães relataram que consomem de 1 a 6 vezes na semana na área rural (21,56%) e urbana (13,67%). Já o consumo de iogurte é mais frequente diariamente e semanalmente na área urbana (11,96% e 37,60%) do que na rural (5,88% e 23,52%); mensalmente é mais consumido na área rural (39,21%) do que na urbana (36,75%); e 31,77% na área rural e 13,67% na área urbana não consomem iogurte. O consumo diário de queijo é maior na área rural (23,52%) do que na urbana (9,40%). Na área rural 35,29% relataram consumir queijo semanalmente e na urbana 40,17%, seguido do consumo mensal (rural: 29,41%; urbano: 34,18%).

A frequência de consumo de construtores II (carnes, ovos e leguminosas) é observada na Figura 3. No presente estudo foi verificada alta frequência de consumo de arroz e feijão, alimentos que requerem maior tempo de preparo, além de serem considerados como integrantes básicos da dieta da população brasileira. O consumo diário de feijão é maior na região rural (92,16%) do que na área urbana (86,32%). Em seguida vem o consumo semanal de feijão pelas mães na área rural 3,92% e urbana (10,26%).

Figura 3- Frequência de consumo de alimentos construtores II,
por mães de pré-escolares da área rural e urbana de Piracicaba, SP

A frequência de consumo de ovos é maior semanalmente na área rural e urbana; 70,58% e 65,81%, respectivamente. A carne com maior frequência de consumo diário é a bovina com 25,64% na área urbana e 19,6% na área rural. Em segundo lugar de consumo diário urbano, a carne de frango com 12,82%, não sendo consumida diariamente na área rural. Esta fonte de proteína animal é mais consumida semanalmente, tanto na área rural (82,35%) quanto na área urbana (74,35%). As carnes suínas e de peixe são mais consumidas mensalmente.

Na área rural o consumo apenas uma vez por mês de carne de porco (58,82%) é maior do que o de peixe (49,08%). Já na área urbana o consumo apenas mensal de peixe (55,5%) é maior do que o de suíno (47,86%). Ainda ocorreram relatos das mães que não consomem algum tipo de carne como, por exemplo, as que não comem carne de porco (11,76%), peixe (9,8%) e frango (1,96%) na área rural e aquelas que não consomem carne de porco (16,21%), peixe (14,53%) e carne bovina (5,98%) na área urbana.

Na Figura 4 observa-se que em relação à frequência de consumo de óleo, maionese, manteiga e margarina ambas as populações, rural e urbana, seguem uma mesma tendência.

Figura 4- Frequência de consumo de alimentos energéticos II (óleos e gorduras)
por mães de pré-escolares da área rural e urbana de Piracicaba, SP

Na área rural, os doces são consumidos diariamente por 13,72% e semanalmente por 64,7%. Já na área urbana são consumidos diariamente por 37,6% e semanalmente por 38,46%. Na área rural o consumo semanal (43,1%) de refrigerantes é mais alto do que o consumo diário (23,52%) e mensal (15,68%). Além disso, 17,64% da população disseram não consumir refrigerante. O consumo semanal (51,28%) de refrigerantes é mais alto do que o consumo diário (29,05%) e mensal (13,67%), na área urbana. E apenas 5,98% não consomem refrigerantes. Os itens mais consumidos diariamente são: o café (80,39%, rural; 68,37%, urbano) e o açúcar (90,19%, rural; 85,47%, urbano). O consumo de adoçante é um pouco maior na área urbana (12,82%) do que na rural (9,80%). Já o chá é consumido diariamente mais na área urbana (21,36%) do que na rural (9,80%).

Na área urbana houve relato de consumo diário de bebida alcoólica por 3,41% das mães, semanal por 7,69%, e 78,63% disseram que nunca consomem. Já na área rural nenhuma mãe relatou consumir bebidas alcoólicas diariamente, mas o consumo semanal foi citado por 15,68% das mães, e 64,70% afirmaram que não consomem. Cabe destacar ainda, que a percentagem de mães que não consomem mel é bem alta na área urbana (67,52%) e na área rural (70,58%).

É interessante comparar alguns alimentos citados durante a entrevista através do R24h e que consta no questionário de frequência alimentar (QFA) utilizado (tabela 3). Os alimentos arroz, pão, frutas, iogurte, leite, queijo, feijão, margarina, doce e refrigerante tiveram um consumo menor quando comparamos esses alimentos com a frequência diária relatada pela população. Isto é um exemplo de que um método pode complementar o outro, pois no dia anterior à entrevista do R24h algumas pessoas podem ter consumido menos arroz do que seu costume ou elas tendem a estimar uma maior quantidade de certos alimentos, que acreditam que deveriam ser consumidos em maior quantidade. De forma oposta, o consumo de macarrão, carne de aves, bovina e suína e de ovos foram relatados como menores no QFA.

Tabela 3 - Comparação entre o relato de consumo de alimentos através do
Recordatório de 24 horas e o Questionário de Frequência Alimentar

De uma forma geral, quando comparamos a dieta da população rural e urbana ambas seguem a mesma tendência de consumo, tanto em relação aos itens como em relação à frequência. No entanto, quando se observa na tabela 10 o consumo de hortaliças, verifica-se que na área urbana o consumo é relatado como mais frequente no R24h e na área rural é relatado como mais frequente no QFA.

Escolha Alimentar

Durante a entrevista foi perguntado às mães quais os fatores que influenciam nas escolhas alimentares na hora de fazer as compras no supermercado, visto que a importância de tais escolhas reflete na prevalência de obesidade entre as entrevistadas, sendo maior na zona rural que urbana (respectivamente, 25,5% e 19,26%) assim como de sobrepeso (41,1% e 31,1%, respectivamente) e todos esses valores encontram-se acima dos característicos de populações nutricionalmente saudáveis.

O principal critério adotado pela população na área urbana é o preço do alimento, ou seja, 29,62% escolhem os alimentos mais baratos. Neste grupo há mães na faixa de eutrofia (9,64%), sobrepeso (4,44%) e obesidade (1,96%). O segundo critério que influencia a mãe da área urbana é o alimento saudável (25,18%). Dentre as mães que escolhem os mais saudáveis estão 10,37% eutróficas, 7,41% com sobrepeso, 5,93% obesas e 1,48% que apresentam baixo peso. No entanto o fator mais citado na área rural como determinante da escolha alimentar é o alimento ser saudável (37,25%) e em seguida o preço (31,37%).

O terceiro fator que influencia na escolha por ambas as populações, rural e urbana, é o sabor (17,64% e 14,8%, respectivamente), ou seja, aqueles que são preferidos pela família. Dentre as mães que escolhem os alimentos pelo sabor (ou pelo conjunto das características organolépticas: sabor, cor, textura, cheiro) estão 9,63% eutróficas, 4,44% com sobrepeso e 1,48% obesas da área urbana. No entanto, na área rural todas as mães deste grupo estão acima do peso (7,84% com sobrepeso e 9,8% obesas). As pessoas tendem a escolher o que elas gostam e a rejeitar um alimento de que não gostam, mesmo este último sendo considerado aceitável, conveniente ou valor saudável.

Outro fator citado pelas mães como influenciador na escolha dos itens alimentares é o preparo rápido (alimentos congelados e/ou empacotados). Na área urbana 7,4% afirmou ser um fator fundamental e sendo menor na área rural de 3,92%. Dentre as mães que escolhem alimentos de preparo rápido estão eutróficas (4,44%), com sobrepeso (1,48%) e obesas (1,48%). No entanto na área rural apenas as mães com sobrepeso (3,92%) relataram escolher os alimentos pelo preparo rápido. No presente estudo dentre as poucas mães que escolhem os alimentos de preparo rápido (6,4%), 5,3% são da área urbana; 2,7% têm entre 20 e 29 anos; 3,2% são da classe econômica D; e 3,2% com até quatro anos de estudo e 3,7% das mães que consomem alimentos de preparo rápido trabalha fora. Algumas mães escolhem os alimentos por outros fatores como, por exemplo, a marca do alimento, a qualidade do produto, entre outros.

É importante ressaltar que o número de mulheres com sobrepeso e obesidade na rural é maior que na área urbana e tais números são preocupantes, pois a ocorrência de sobrepeso e obesidade são fatores condicionantes para mal estar da população e contribui de maneira significativa para o aumento da mortalidade, como identificado com a população da Argentina (Acosta; Peláez, 2015).

De acordo com Cavalli-Sforza e Feldman (1981) os alimentos favoritos de uma pessoa geralmente são aqueles que foram utilizados pela mãe durante a infância. Muitos adultos têm forte sentimento em relação à alimentação, experimentam sentimentos conflitantes com relação à escolha dos alimentos que preferem consumir ou que acreditam que deveriam, por razões de saúde, e aqueles que preferem por razões afetivas associadas em sua família de origem.

4. Considerações finais

Considerando conjuntamente as informações obtidas com o R24h, o QFA e os critérios particulares para as escolhas alimentares, pode-se constatar que os itens alimentares que compõem a dieta de mães de pré-escolares do município de Piracicaba, não são diferentes nas áreas rural e urbana.

A população da zona rural adquire seus alimentos somente uma vez ao mês, inclusive as frutas e verduras, as quais tendem a escassear na dieta à medida que o mês termina, o que se reflete na menor frequência de consumo desses itens do grupo dos alimentos reguladores em relação à frequência de consumo dos mesmos na cidade, onde o acesso é mais fácil. Em muitos casos, entretanto, na zona rural, os alimentos cultivados no quintal suprem essa deficiência. A utilização de quintais domésticos como fonte de suplementação da dieta é duas vezes maior na área rural do que na área urbana. Cabe ressaltar que as famílias que utilizam os quintais para alimentação, utilizam como forma suplementar e não como forma de subsistência. Na zona urbana o sabor foi considerado o principal critério de escolha, já na zona rural, o alimento saudável é a prioridade na dieta. Em ambas as zonas, rural e urbana, o preço dos itens alimentares é o segundo fator de maior relevância para a escolha dos mesmos.

Os dados indicam que a alimentação de ambas as regiões, rural e urbana, está inadequada quanto à sua composição, visto a frequente ocorrência de mães com sobrepeso e obesidade em ambas as áreas, ainda que maior na área rural. Sabe-se que todas as entrevistadas deveriam incluir alimentos de todos os grupos de acordo com a pirâmide alimentar, ao longo de um dia, nas refeições familiares, o que não foi observado, sendo os alimentos energéticos os mais consumidos em ambas as áreas.

Referencias

ABRÃO, Maria Amélia Paiva. Comunicação, a recepção e o consumo enquanto práticas culturais: um novo olhar. Comunicação & Educação, v.16, n.1, 45-55, 2011.

ACOSTA, Laura Débora; PELÁEZ, Enrique. Mortalidad atribuible al sobrepeso y la obesidade em Argentina: comparación entre los años 2005 y 2009. Revista Brasileira de Estudos de Populações, v.32, n.2, p. 277-292, 2015.

AVELAR, Ana Elisa de; REZENDE, Daniel Carvalho de. Hábitos alimentares fora do lar: um estudo de caso em Lavras-MG. Organizações Rurais & Agroindustriais, Lavras, v. 15, n. 1, p. 137-152, 2013.

CAVALI-SFORZA, Luigi Luca; FELDMAN, Marcus W. Cultural Transmission and evolution: A Quantitative Approach. Princeton: New Jersey, 1981.

COLLAÇO, Janine Helfst Leicht. Restaurantes de comida rápida, os fast-foods, em praças de alimentação de shopping centers: transformações no comer. Estudos Históricos, n.33, 116-135, 2004.

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1. Bióloga e Doutora em Ecologia Aplicada. Professora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Ambiental e Sustentabilidade da Universidade Nove de Julho (São Paulo), Brasil. E-mail: ana_paula@uninove.br
2. Médica Veterinária Especialista em Vigilância Sanitária de Alimentos. Professora Doutora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão de Sistemas de Saúde da Universidade Nove de Julho (São Paulo), Brasil. E-mail: siaq66@uninove.br
3. Economista Doméstico. Professora Associada do Departamento de Genética da ESALQ/USP e do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Ecologia Aplicada da Universidade de São Paulo (Piracicaba), Brasil. E-mail: silviamgmolina@usp.br