Espacios. Vol. 37 (Nº 27) Año 2016. Pág. 30
Vanessa ALBERTON 1; Cláudio Shigueki SUZUKI 2; Ronaldo Ferreira MAGANHOTTO 3; Luis Paulo Gomes MASCARENHAS 4
Recibido: 06/05/16 • Aprobado: 23/05/2016
RESUMO: A utilização de áreas de preservação ambiental são fontes de contribuições sociais, econômicas e ambientais, promovendo benefícios para a comunidade local. Objetivo: Apresentar um panorama da evolução de uma propriedade particular localizada na região sudeste do estado do Paraná - Brasil, por meio de investimentos na recuperação das áreas degradadas e na atividade turística. Metodologia: Estudo de caso com abordagem qualitativa, levantamento de dados por meio de fontes bibliográficas, documentais e entrevista. Resultados: O estudo apresentou alternativas para o desenvolvimento local, pois revelou a existência de: recuperação das áreas degradadas; regulamentação da propriedade como área legalmente protegida; implementação de um empreendimento turístico, contribuindo para a geração de empregos e renda no campo e; valorização econômica e social. |
ABSTRACT: The use of environmental preservation areas sources of social, economic and environmental contributions, promoting benefits for the local community. Objective: To present an overview of the evolution of a particular property located in southeastern Paraná State - Brazil, by investing in the recovery of degraded areas and tourism. Methodology: Case study with qualitative approach, data collection through literature sources, documentary and interview. Results: The study presented alternatives to local development, as revealed the existence of: recovery of degraded areas; regulation of property as legally protected area; implementing a tourist development, contributing to the generation of jobs and income in rural areas and; economic and social value. |
A conservação da natureza se configura como uma forma de desenvolver a sustentabilidade. Quando aliada às atividades de turismo, se transforma em uma ferramenta concreta e, se bem planejada, gera resultados significativos, muitas vezes protagonizando transformações.
Falar em conservação engloba várias ações relacionadas ao manejo do uso que o ser humano destina para a natureza, “compreendendo a preservação, a manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a recuperação do ambiente natural” (BRASIL, 2000, art. 1º, inciso II).
Para regularizar as áreas de conservação e preservação ambiental, foi criada a lei nº 9.985/2000, instituindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), legalizando e incentivando a preservação do meio natural (BRASIL, 2000). Dentro do SNUC existem categorias de unidades de conservação, que podem ser de uso sustentável ou de uso integral. As Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) se enquadram na categoria de uso sustentável, sendo áreas privadas em que ocorre a preservação do meio ambiente, de espécies da fauna, da flora, preservação de paisagens e é possível praticar atividades recreativas, de lazer, culturais e educacionais, além de pesquisas científicas (BRASIL, 1996).
O desenvolvimento de atividades de turismo em RPPNs pode ser compreendido como uma forma de geração ou complementação de renda, visto que o objetivo principal dessas áreas de preservação é assegurar a manutenção dos ecossistemas típicos. No estado do Paraná, região sul do Brasil, são evidenciados alguns exemplos, como a RPPN Reserva Ecológica Itáytyba (no município de Tibagi) e a RPPN Salto Morato (em Guaraqueçaba).
O Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR, 2002) conceituou ecoturismo como sendo um segmento que “utiliza os recursos naturais e culturais de um determinado lugar e contribui para conservá-los. Busca desenvolver o respeito pela natureza por meio do contato com o ambiente natural e promove o bem-estar das populações locais envolvidas” (p. 12).
Além desse segmento, tem destaque o turismo de aventura, conceituado pelo Ministério do Turismo (BRASIL, 2005) como aquelas “atividades turísticas decorrentes da prática de atividades de aventura de caráter não competitivo”, oferecidas comercialmente, “que tenham ao mesmo tempo o caráter recreativo e envolvam riscos avaliados, controlados e assumidos” (p. 9).
De uma perspectiva interdisciplinar, esse trabalho tem como objetivo avaliar a recuperação da natureza e a prática de atividade turística como sendo elementos que fomentam o desenvolvimento comunitário.
Para tanto, será apresentado um panorama da evolução de uma propriedade particular, localizada no interior do município de Prudentópolis, na região sudeste paranaense, Brasil, por meio da recuperação das áreas degradadas e uso indireto dos recursos naturais, através da atividade turística.
Para isso, identificou-se como era a propriedade na época da aquisição, quais ações foram realizadas para transformá-la em RPPN, além de verificar as atividades turísticas realizadas na atualidade finalizando com uma análise entre o antes e o depois de se tornar uma RPPN, trazendo inúmeros benefícios para o entorno.
Conservar a natureza e ao mesmo tempo obter alguma rentabilidade por meio do espaço utilizado para tal conservação é algo difícil de ser realizado, visto que é necessário um planejamento minucioso e a adoção de práticas sustentáveis e acompanhamento constante. Portanto, esse trabalho se apresenta como de suma importância, explicitando um caso prático onde acontece a conservação da natureza, por meio da implementação de uma RPPN, e a utilização dos recursos naturais gera renda, por meio da atividade turística ecologicamente sustentável.
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) conceitua o meio ambiente como o habitat natural do homem, e como ambiente natural, Casasola (2003) entendeu como sendo o “conjunto de ecossistemas naturais cujos recursos são utilizados tal e qual existem na natureza” (p. IX ).
O ambiente natural, também chamado por Casasola (2003) como patrimônio natural, é entendido como algo composto de duas partes: de um lado está o ambiente transformado, ou seja, lugares arqueológicos, zonas coloniais, populações indígenas e tradicionais e, de outro lado, o ambiente sociocultural, também tido como sinônimo de patrimônio cultural.
Ceballos-Lascuráin (2001) frisou que as “áreas naturais, em particular as protegidas legalmente, sua paisagem, fauna, flora – juntamente com os elementos culturais existentes – constituem grandes atrações” para os habitantes dos países ao qual pertencem e para turistas de todo o mundo (p. 26).
Para que essas áreas e paisagens possam ser usufruídas de forma sustentável, é necessário pensar a conservação na natureza não apenas como uma ação isolada do Estado, por meio de leis, normas, regulamentos e fiscalização. Apenas as iniciativas governamentais não são suficientes. Marcatto (2002) salientou que é preciso a participação da sociedade, da sensibilização da população em relação aos problemas ambientais, trabalhando conjuntamente no controle, conservação e preservação dos recursos naturais.
Conservar a natureza é um ato sustentável e importante para garantir que as gerações futuras tenham acesso aos recursos naturais que utilizamos hoje, para que haja a continuidade de espécies da fauna e da flora além de ecossistemas fundamentais para o desenvolvimento do planeta.
A conservação da biodiversidade é uma questão mundial e que tem sido garantida por meio de leis e compromissos assumidos em grandes eventos, como a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92). Entre as estratégias de conservação da biodiversidade, se destacam aquelas contidas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).
O SNUC foi criado em 18 de julho de 2000, através da Lei nº 9.985 da Presidência da República, com o objetivo de ordenar e monitorar o uso e a ocupação das áreas protegidas em território nacional. Possui uma série de objetivos, conforme o Artigo 4º da referida Lei, dos quais destacamos:
I - contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no território nacional e nas águas jurisdicionais;
II - proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional;
III - contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas naturais;
IV - promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais;
V - promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento.
Dentro do SNUC, as unidades de conservação (UC) de dividem em duas categorias: de Unidades de Proteção Integral e de Unidades de Uso Sustentável.
Brasil (2000), diz que as Unidades de Proteção Integral têm como objetivo básico a preservação da natureza, admitindo o uso indireto dos recursos naturais, exceto nos casos previstos em lei. Entre as Unidades de Conservação que a compõe, estão as denominadas: Estação Ecológica; Reserva Biológica; Parque Nacional; Monumento Natural e; Refúgio de Vida Silvestre.
As Unidades de Conservação de Uso Sustentável tem como objetivo “compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais” (Art. 7º, § 2º s. p.) e se subdividem em sete categorias: Área de Proteção Ambiental; Área de Relevante Interesse Ecológico; Floresta Nacional; Reserva Extrativista; Reserva de Fauna; Reserva de Desenvolvimento Sustentável e; Reserva Particular do Patrimônio Natural.
As RPPNs, segundo Brasil (2000) são áreas privadas, de posse de pessoa física ou jurídica que prevê em seu interior o desenvolvimento de pesquisa científica e a visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais (art. 21). O Decreto Federal nº 1.922, de 5 de junho de 1996 (BRASIL, 1996) que dispõe sobre o reconhecimento das RPPNs, diz que
Art. 1° Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN é área de domínio privado a ser especialmente protegida, por iniciativa de seu proprietário, mediante reconhecimento do Poder Público, por ser considerada de relevante importância pela sua biodiversidade, ou pelo seu aspecto paisagístico, ou ainda por suas características ambientais que justifiquem ações de recuperação.
Art. 2° As RPPN's terão por objetivo a proteção dos recursos ambientais representativos da região.
Art. 3° As RPPN's poderão ser utilizadas para o desenvolvimento de atividades de cunho científico, cultural, educacional, recreativo e de lazer, observado o objetivo estabelecido no artigo anterior (p. 1).
Segundo dados do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), existem 652 reservas abertas no âmbito federal, destas, 16 estão localizadas no Paraná, somando uma área de quase 8 mil hectares de mata e fauna preservadas. Na esfera estadual, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) é o órgão responsável por registrar, orientar e monitorar as reservas, contabilizando um total de 220 áreas reconhecidas. Na mesorregião sudeste paranaense, a que pertence o município de Prudentópolis, são 7 RPPNs registradas, nos municípios de: General Carneiro (1), Imbituva (1), Ipiranga (1), Ivaí (2), Prudentópolis (1) e Rio Azul (1) (IAP, 2014).
Durante o processo de formalização de uma RPPN, faz-se necessário elaborar o Plano de Manejo. Brasil (2000) frisou que se trata de um “documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área”, bem como sobre o manejo dos recursos naturais, incluindo a necessidade de construir estruturas físicas para gerir a unidade e o desenvolvimento de atividades de recreação e lazer (artº 2º, XVII, s. p.).
No município de Prudentópolis, há o registro de apenas uma RPPN, reconhecida a nível estadual, criada em 2007 junto à regional do IAP em Guarapuava: a RPPN Ninho do Corvo. Nessa área de preservação são desenvolvidas atividades relacionadas ao turismo, tanto de eventos, como em áreas naturais com o ecoturismo e o turismo de aventura. Dessa forma, alia a preservação do meio natural, a geração de renda e a oferta de um produto turístico de qualidade para o visitante.
Praticar o turismo em áreas naturais é uma das principais motivações de viagens na atualidade. O meio ambiente é considerado por Ruschmann (1997) como a matéria prima do turismo e ambos possuem uma inter-relação incontestável, porém não tem apresentado um relacionamento harmonioso. Foi a partir do fim do século XX que as populações dos países desenvolvidos, que pertenciam às classes de alta renda se interessaram em aumentar a qualidade de vida, buscando essa alternativa no meio natural (Dias, 2003).
Tornar uma área natural protegida configura-se, de acordo com Diegues (1997), com uma das principais estratégias para a conservação da natureza e tem como objetivo “preservar espaços com atributos ecológicos importantes” (p. 85). Em alguns casos, como nos parques, essa mudança é feita para que o visitante aprecie a estética e a riqueza natural, não se permitindo a moradia de pessoas em seu interior.
Segundo Diegues (1997), o primeiro parque nacional, em Yellowstone, nos Estados Unidos, foi criado por volta de 1872, sendo considerada uma solução para proteger a vida selvagem ameaçada pela civilização urbano-industrial, que destrói a natureza. Pretendia-se manter pedaços de natureza intocada, em seu estado primitivo sem ter sofrido intervenção humana e, que também servissem de “como locais selvagens, onde o homem pudesse refazer as energias gastas na vida estressante das cidades e no trabalho monótono e alienante” (p. 86).
Quando se trata de turismo em áreas protegidas, surge o conflito: preservação e uso. A concepção inicial que se deu aos parques nacionais colocava em primeiro plano a recreação e não a preservação, ou seja, foram criados com a função utilitária de lazer para a população (Lima, 2003).
São necessários estudos para o manejo dos visitantes, a determinação e o monitoramento dos seus impactos e a definição de limites de uso, principalmente por meio da capacidade de carga (Lima, 2003). Porém, muitas vezes o comportamento do visitante influencia na degradação de forma mais agressiva que a quantidade de pessoas ao mesmo tempo, em determinado local. Além disso, outros fatores como o tipo de uso, as condições biofísicas e de manejo, e a época em que ocorre o uso são importantes determinantes da deterioração ambiental.
As áreas protegidas, do mundo todo, estão recebendo números cada vez maiores de turistas, às vezes duplicando ou triplicando a cada ano, porém muitas dessas áreas não estão preparadas para receber uma atividade de maneira tão intensa. Por isso, faz-se fundamental a educação ambiental e o cumprimento de normas e regras, seguindo o estabelecido pelas diretrizes específicas.
O município de Prudentópolis está localizado na região sudeste paranaense, a cerca de 207 km da capital do estado, Curitiba, no Brasil. De acordo com o IBGE (2010), o município somava uma população de 48.792 habitantes, desse total quase 54% residia no meio rural (26.329 pessoas). A área territorial é de 2.236,579 km², resultando em uma densidade demográfica de 21,14 habitantes por km² (IBGE, 2010).
O fato de o relevo apresentar declives acentuados influenciou na formação dos rios da região, acarretando em vales profundos e cânions originados pelos processos exógenos de modelação de tal relevo, tendo relação direta com as dezenas de cachoeiras gigantes localizadas no município. Consequentemente, tornando o município propício para a prática de atividades de aventura.
Atualmente, o município encontra na agricultura sua maior fonte de renda. Porém, outro segmento que gera renda para o município de Prudentópolis é a atividade turística. São dezenas de atrativos naturais, culturais, religiosos e gastronômicos. Não há registros significantes da demanda turística no município, nem da renda gerada com a atividade.
Localizada na Linha Paraná, a 25 km do centro do município de Prudentópolis, a propriedade Reserva Particular do Patrimônio Natural Ninho do Corvo foi adquirida em 2003. A área era utilizada na produção agrícola, com o uso de queimadas para limpar o solo, degradando e alterando as características naturais do mesmo (RPPN Ninho do Corvo, 2009).
Desde a aquisição, a intenção do proprietário era promover a atividade turística na região e preservar a área natural. Assim, buscou informações sobre os procedimentos para criação e, no dia 05 de dezembro de 2007, a RPPN foi criada legalmente, reconhecida a nível estadual pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) (RPPN Ninho do Corvo, 2009).
A RPPN está localizada no segundo Planalto paranaense, subunidade Planalto de Prudentópolis, que de acordo com a caracterização do Serviço Geológico do Paraná (MINEROPAR), possui topos aplainados, vertentes convexas e vales em forma de V aberto. Nessa subunidade, a altitude varia entre 580 a 1.040 metros do nível do mar e possui uma área total de 2.628 km² (MINEROPAR, 2006).
A propriedade é banhada pelo Rio Barra Bonita, pertencendo à Bacia do Rio Ivaí, além de duas nascentes possui algumas cachoeiras em sua área preservada, como a Cachoeira Ninho do Corvo, Cachoeira do Funil, Salto Boqueirão, Cachoeira Água Verde, se apresentando como atrativos naturais de valor significativo (RPPN Ninho do Corvo, 2009).
Segundo a RPPN Ninho do Corvo (2009), as atividades são desenvolvidas por guias treinados “para exercer as suas funções e os equipamentos utilizados são certificados pelos órgãos competentes, garantindo o máximo de segurança” (p. 55).
O empreendimento possui infraestrutura física completa e através de planejamento constante tanto na parte administrativa quanta ambiental, desenvolve as atividades de forma sustentável e ecológica, fomentando o desenvolvimento do turismo local e agregando valor à propriedade.
Trata-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, caracterizada por Minayo (2010) como aquela que “trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos”, que não podem ser medidos em números (p. 21-22).
O procedimento adotado foi o estudo de caso, que para Gil (2002) “Consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento” (p. 54).
A pesquisa foi desenvolvida no primeiro semestre de 2016, na RPPN Ninho do Corvo, localizada na Linha Paraná, município de Prudentópolis, a 25 km do centro da cidade e a 203 km da capital Curitiba.
Para Marconi & Lakatos (2003) a etapa de levantamento de dados é caracterizada como a “fase da pesquisa realizada com o intuito de recolher informações prévias sobre o campo de interesse”, e para isso, usou-se fontes primárias (documentais) e secundárias (bibliográficas) (p. 174).
Utilizou-se de pesquisa bibliográfica e documental, principalmente através do Plano de Manejo da propriedade. Esta consiste em um documento técnico com a descrição de todas as informações referentes à RPPN, desde o histórico, meios bióticos, abióticos e antrópicos, até o zoneamento contendo quais atividades e ações podem ser feitas em determinadas áreas da propriedade.
Por meio de tal documento, foi extraída a maior a parte das informações necessárias, tais como: situação da propriedade na época da aquisição, ações realizadas para transformar a propriedade em RPPN e atividades desenvolvidas.
Como forma de complementar as informações a respeito da RPPN e do empreendimento turístico Ninho do Corvo, utilizou-se de entrevista com o proprietário, buscando informações atualizadas sobre as atividades desenvolvidas, por exemplo.
Para auxiliar na análise, utilizou-se da Teoria de Valoração de Recursos Ambientais, utilizada pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza em estudos desenvolvidos em suas duas RPPNs, a saber: Reserva Natural Salto Morato (PR) e Reserva Natural Serra do Tombador (GO).
Por fim, foi possível fazer um comparativo dos dois períodos, a fim de confirmar como a conservação ambiental e o desenvolvimento de atividades de turismo, de forma sustentável, são capazes de desenvolver uma propriedade rural.
A propriedade hoje denominada RPPN Ninho do Corvo, adquirida em 2003, era até aquele momento utilizada para a atividade agrícola, principalmente com as culturas de feijão e milho. Para isso, o antigo proprietário se valia de roçadas frequentes e queimadas para limpar o solo, causando degradação do mesmo e prejudicando a biota local.
Boa parte do solo havia sofrido com a derrubada da mata nativa, cedendo espaço para os grãos. As imagens a seguir mostram a recuperação da mata nativa de um determinado ponto da propriedade, no ano de 2003 (Imagem A) e 2008 (Imagem B).
Imagem A – Vista parcial em 2003 Fonte: o proprietário |
Imagem B - vista parcial em 2016 Fonte: os autores |
Em outro ponto da propriedade, através das imagens C e D, é visível a modificação que a ação do tempo e a não interferência humana foi capaz de fazer.
Imagem C – Vista parcial, em 2003. Fonte: o proprietário |
Imagem D – vista parcial em 2016 Fonte: os autores |
Com o passar dos anos, a vegetação foi ocupando o espaço vazio deixado pela lavoura, recuperando diversas espécies nativas de plantas e devolvendo aos animais uma área para reprodução e sobrevivência. Segundo o proprietário, são cerca 4 alqueires de mata recuperada, onde antes era lavoura. Ainda, 1 alqueire é de área construída e outros 5 alqueires de mata preservada, ou seja, a vegetação está intocada desde a época da aquisição.
Quando comprou a área, o atual proprietário já almejava promover a atividade turística na região da Linha Paraná e do município de Prudentópolis, além de querer preservar a terra e seus componentes naturais. O Secretário Municipal de Meio Ambiente da época expressou seu interesse em transformar a área adquirida em Monumento Natural, preservando a biodiversidade existente. De posse de algum conhecimento a respeito das unidades de conservação, o proprietário buscou informações junto à Associação Paranaense de Proprietários de RPPN, a qual auxiliou no processo de implementação da RPPN Ninho do Corvo.
A solicitação de reconhecimento foi feita junto ao órgão ambiental gestor e fiscalizador, o Instituto Ambiental do Paraná (IAP), através de um processo burocrático que envolveu o preenchimento de um requerimento e encaminhamento de documentos referentes à propriedade e ao proprietário, tais como: matrícula do imóvel; comprovante de anuência do credor; documentos pessoais do proprietário e do cônjuge; comprovante de quitação do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR); mapa georeferenciado do imóvel e da área proposta para RPPN; planta de situação, com informações de limites, área proposta, localização no município e outras informações; justificativa técnica e; demais registros documentais relevantes para a propriedade (IAP, 2015).
O reconhecimento a nível estadual foi efetivado no dia 05 de dezembro de 2007, por meio da portaria nº 231 - IAP/SEMA, determinando que a propriedade cuja área total de 18 hectares, tivesse 10,59 hectares pertencentes ao modelo C, onde é permitido realizar atividades de proteção, pesquisa, educação, restauração, turismo sustentável e recreação.
De acordo com a RPPN Ninho do Corvo (2009), a partir do ano de aquisição, em 2003, o proprietário foi construindo infraestrutura física em uma pequena parte da área adquirida, “preservando todo o restante de mata e abandonando as áreas de plantio para regeneração da mata nativa” (p. 22). Com o passar dos anos e a recuperação das áreas degradadas, as principais atividades desenvolvidas na propriedade eram relacionadas ao turismo sustentável incluindo rapel, arvorismo, circuito de canyon, entre outros.
Em relação ao uso turístico da propriedade, atualmente a propriedade atende o público mediante agendamento, oferecendo pacotes de atividades com trilhas, cachoeiras, canyons e atividades de recreação. O empreendimento também oferece hospedagem e alimentação, com culinária local, além de toda a infraestrutura necessária para recepcionar com conforto. Entre as atividades desenvolvidas, destacamos:
Em relação à infraestrutura, disponibiliza ao visitante: hospedagem e área de acampamento, de forma controlada, sendo alugada apenas para grupos fechados; sede para recepção dos visitantes; a casa do administrador; banheiros externos; quiosques e; restaurante, com mesas e bancos rústicos e sustentáveis. Nesse mesmo espaço de alimentação, são feitas palestras e apresentações institucionais, com vídeos explicativos e falas do proprietário sobre o empreendimento.
Para explanar sobre os benefícios que a área de preservação proporciona em termos ambientais, sociais e econômicos, nos baseamos nos estudos elaborados pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza e na Teoria de Valoração de Recursos Ambientais, levando em conta os seguintes itens:
Uso público – antes de ser uma área preservada, havia apenas o cultivo da agricultura. Agora, com a visitação turística, há geração de empregos diretos e indiretos, além de renda, inclusive para o entorno da RPPN, valorizando a economia local.
Erosão de solo evitada – com a recuperação de áreas degradadas, antes utilizadas para plantio e atingidas pelas queimadas, o processo de erosão foi revertido e o solo preservado, reestabelecendo a qualidade e capacidade de reproduzir.
Repartição de receitas tributárias (ICMS Ecológico) – do total de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) arrecadado pelo Estado, 5% é repassado para os municípios que possuem Unidades de Conservação ou áreas protegidas em seu território. Só no ano de 2015, o município de Prudentópolis recebeu R$ 620.395,66, por causa de áreas como a RPPN Ninho do Corvo, além dos nove faxinais, que apresentam um poder de captação de recursos ainda maior.
Impacto de contratações e aquisições locais – a RPPN precisa fazer o manejo de sua área e para isso, demanda serviços, mão de obra e produtos, muitas vezes locais, retornando à comunidade em forma de salários pagos, por exemplo.
Educação ambiental – a RPPN trabalha com educação ambiental, sensibilizando sobre a importância da preservação dos recursos e da sustentabilidade. Essas ações, certamente não existiam anteriormente, visto a exploração constante da área. Inclusive, com o uso excessivo do solo e desmatamento, as espécies nativas acabam perdendo seu habitat natural, buscando novos locais de moradia, entrando em extinção ou mesmo causando distúrbios em áreas povoadas, em busca de alimentação e abrigo.
Pesquisa científica – a presença da RPPN proporciona o desenvolvimento de inúmeras pesquisas, que podem retornar positivamente para a comunidade e o município.
Redução de emissões por desmatamento e degradação – durante a fotossíntese, as árvores removem o dióxido de carbono da atmosfera, auxiliando na diminuição desse gás, que causa o efeito estufa. Portanto, a recuperação da mata na RPPN beneficiou a qualidade do ar, o que é bom para a fauna, a flora, o solo e para a população.
Pecuária evitada – semelhante ao item anterior, a retirada de criações animais e o fim das queimadas, fez com que encerrasse, ao menos na área da RPPN, a emissão de gás metano dos bovinos e de gás carbônico através das queimadas que eram realizadas para preparar o solo para o plantio e que se caracterizam com uma das fontes mais eficientes de emissão de gás carbono na atmosfera.
A prática de atividades de turismo na RPPN Ninho do Corvo gera benefícios diversos, tais como a geração de renda, pois é necessário mão de obra especializada para desenvolver as atividades de aventura, bem como é preciso adquirir alimentos para oferecer as refeições aos visitantes. Boa parte dessa renda fica na própria comunidade, por meio dos funcionários e colaboradores residentes no entorno e dos produtos e serviços terceirizados dentro do município. Ainda, acredita-se que a demanda que procura o Ninho do Corvo também visita outros atrativos e recursos naturais, culturais do município, além de utilizar equipamentos e serviços turísticos nos mais diversos locais da cidade, seja em hospedagem, alimentação, artesanatos, eventos, etc.
Por meio do turismo na RPPN, se percebe contribuições sociais e culturais para a sociedade, por meio do desenvolvimento de ações que a área proporciona. Em sinergia com os demais atrativos naturais da região, ocorrem investimentos e desenvolvimento mútuo, além da troca de conhecimentos, experiências, divulgação da cultura, da gastronomia local típica ucraniana e das tradições do povo.
Por meio da pesquisa qualitativa, consultas em documentos, entrevista e observação in loco, foi possível identificar como se deu o processo de transformação de uma área dominada pela produção agrícola, que com o tempo teve sua vegetação reconstituída e o reestabelecimento da mata nativa, abrigando dezenas de espécies da flora e da fauna.
O meio ambiente recebe uma contribuição através da preservação das espécies, da proteção de áreas com nascentes e de espécies que, muitas vezes, se encontravam ameaçadas e desorientadas por terem seu habitat natural destruído.
A iniciativa de transformar uma área em unidade de conservação gera benefícios diversos, relacionados com os fatores econômicos, sociais e ambientais. A população do entorno se beneficia com a melhora na qualidade do ar, do solo, por meio de empregos e renda gerados com a contratação de mão de obra ou a venda de produtos locais e artesanatos.
Por meio da atividade turística desenvolvida dentro da unidade de conservação estudada, há um processo de sensibilização e educação ambiental, repassando aos visitantes a importância de preservar o meio ambiente, de forma sustentável, para que as gerações futuras também possam apreciar o que temos hoje. Ainda, a atividade turística auxilia na geração de renda e empregos, pois é necessário contratar guias de turismo, condutores e cozinheiras para atender as demandas existentes.
Portanto, considera-se de suma importância a existência da RPPN Ninho do Corvo, destacando todo o processo de evolução que ocorreu desde a aquisição da propriedade, eliminando a degradação ambiental, as queimadas, substituindo por melhorias diversas e que, certamente, afetam inúmeras famílias em toda a região da Linha Paraná.
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2. Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), São Paulo/Brasil. Docente do PPIDC/UNICENTRO.
3. Doutor em Geografia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba/Paraná/Brasil. Docente do PPIDC/UNICENTRO.
4. Doutor em Saúde da Criança e do Adolescente (UFPR), Curitiba/Paraná/Brasil. Docente do PPIDC/UNICENTRO.