Espacios. Vol. 37 (Nº 22) Año 2016. Pág. 2

Determinantes do empreendedorismo nos Municípios do Rio Grande do Sul-Brasil: Uma perspectiva espacial

Determinants of entrepreneurship in the municipalities of Rio Grande do Sul-Brazil: A spatial perspective

Carlos Hernán Rodas CÉSPEDES 1; Adelar FOCHEZATTO 2

Recibido: 23/03/16 • Aprobado: 20/04/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Revisão da literatura teórica e empírica

3. Material e métodos

4. Análise dos resultados

5. Comentários finais

Bibliografia


RESUMO:

O objetivo deste trabalho consiste em realizar uma investigação empírica sobre a relevância das características territoriais na determinação do nascimento de novas empresas. A análise está baseada no trabalho de Audretsch e Fritsch (1993), com algumas adaptações em relação às variáveis e principalmente ao modelo usado. Os resultados mostram que o nascimento de novas empresas é relativamente mais alto em lugares com altas taxas de crescimento populacional e com tamanho médio dos estabelecimentos maior. Os resultados mostram, também, que alta proporção de empregos não qualificados e alta densidade populacional diminuem o nascimento de novas empresas.
Palavras-chave: economia regional; nascimento de novas empresas; econometria espacial.

ABSTRACT:

The objective of this study is to conduct empirical research on the relevance of territorial characteristics in determining the birth of new companies. The analysis is based on the work of Audretsch and Fritsch (1993), with some adjustments concerning to the variables and especially the model used. The results show that the birth of new companies is relatively higher in places with high rates of population growth and average size of larger establishments. The results also show that a high proportion of unskilled jobs and high population density decrease the birth of new companies.
Keywords: regional economics; birth of new establishments; spatial econometrics.

1. Introdução

Segundo McCann (2013), a premissa básica da abordagem espacial é que a aglomeração conduz a um incremento da produtividade. Por isso, políticas de desenvolvimento deveriam incentivar a migração de pessoas e de empresas em direção a áreas densamente populosas para elas usufruírem das vantagens da aglomeração. Levando em consideração tal premissa, não deveria causar surpresa a constatação do efetivo exercício de empreendedores na criação de novas empresas em locais próximos das maiores aglomerações. Isto se explica, pois é nestes espaços onde se potencializam os efeitos positivos das externalidades via spillovers de conhecimento, inovação, tecnologia, mão de obra qualificada e mercados dinâmicos.

Na literatura internacional é possível encontrar muitos estudos que buscam entender os fatores que influenciam a localização do nascimento de novas empresas. Entre esse podemos citar as contribuições de Audretsch e Fritsch (1993), Lee, Florida, Acs (2004), Fritsch (2011) e Deeds (2014). Neles destaque é conferido às aglomerações, o empreendedorismo e o espaço geográfico.

São poucos, no entanto, os estudos aplicados para o Brasil, entre estes pode-se destacar o trabalho de Rezende, Paixão e Diniz (2012), em que procuram identificar a localização espacial da indústria de transformação no Brasil enfatizando a aglomeração e a concentração das atividades produtivas. Para o Rio Grande do Sul, alguns estudos realizados seguem uma linha de pesquisa semelhante à temática levantada nos parágrafos anteriores. Um exemplo é a contribuição de Canever, Menezes e Kohls (2011), Menezes (2011) e Carraro e Canever (2012). Estes estudos analisam a dinâmica do nascimento de novas empresas, salientam a importância do empreendedorismo, verificam a existência de clusters de novas empresas e o seu efeito sobre o crescimento econômico.

O presente trabalho segue a mesma linha de pesquisa e busca entender quais são os principais fatores que explicam a localização do nascimento de novas empresas nos municípios do Rio Grande do Sul. A metodologia adotada segue a utilizada por Audretsch e Fritsch (1993), os quais aplicaram um modelo econométrico para regiões da Alemanha. Uma diferença importante é que, enquanto os autores usam um modelo padrão, neste trabalho é utilizado modelo de econometria espacial.

O trabalho está estruturado da seguinte forma. Na segunda seção é apresentada a argumentação teórica que fundamenta o propósito deste estudo. Na terceira seção será apresentada a metodologia empregada. Na quarta são apresentados e discutidos os resultados encontrados. Por fim, na última seção, são apresentadas as principais conclusões.

2. Revisão da literatura teórica e empírica

Quando o estudo do empreendedorismo e do nascimento de novas firmas se realiza desde uma perspectiva espacial, a teoria da localização oferece pautas que nos aproximam daquilo que pretendemos entender. Resumidamente, tal teoria refere-se à escolha do local onde a unidade produtiva estabelece sua operação produtiva e/ou comercial. A opção escolhida deveria estar fundamentada no comportamento racional e econômico do agente, isto é, o resultado final teria que ser ótimo em qualquer situação; próximo da fonte de matéria prima, da oferta de mão de obra barata e/ou especializada, do mercado consumidor, da melhor rede logística, etc.

Se, em nível de uma unidade produtiva, tal racionalidade é procedente, quando se observa que regiões vizinhas de regiões mais desenvolvidas se beneficiam economicamente do crescimento e desenvolvimento, o fator vizinhança geográfica resulta uma variável importante para entender o desenvolvimento. Caberá aos potenciais e efetivos empreendedores saber tirar proveito econômico do efeito da proximidade espacial, representadas pelas externalidades territoriais.

Um instrumento utilizado para mensurar o efeito da proximidade é o que em econometria espacial se conhece com o nome de autocorrelação espacial. No caso em estudo, ela nos reporta informação acerca das atividades econômicas estarem correlacionadas de forma espacial. Entende-se que regiões vizinhas de centros econômicos dinâmicos representados por clusters de inteligência, inovação, etc. repercutem de forma mais intensa o efeito das externalidades positivas decorrentes da proximidade espacial.

Importa agora entender a forma pela qual o empreendedorismo ingressa nesta história. Lee, Florida e Acs (2004) propõem a abordagem ao empreendedorismo de duas formas: a primeira diz respeito ao comportamento do indivíduo e procura explicar os motivos pelos quais ele decide tornar-se empreendedor quando impulsiona o nascimento de uma nova firma; a segunda explica, do ponto de vista agregado, a formação ou nascimento de firmas em nível regional, enfatizando os aspectos estruturais das áreas geográficas.

Em relação ao estudo do indivíduo empreendedor, Storey (1994) efetua um levantamento acerca das características individuais dos empreendedores de sucesso. Entre essas destaca: a personalidade, o capital humano e a origem étnica. Quanto à personalidade do indivíduo, esta característica está associada com a visão empresarial, a busca de oportunidades de negócios, a pro atividade e a tradição familiar. Em relação ao capital humano, este guarda relação com a educação e a experiência de trabalho do  indivíduo, sendo que, pessoas com maior educação tendem a abrir mais e novos negócios do que as pessoas com baixa educação. Segundo Casson (2003) "Human capital is often assumed to reflect technical skills acquired through education and training, but it may also reflect the underlying entrepreneurial abilities of the population. In this case, to fully eliminate the 'residual' from the explanation it is necessary to have a theory of the entrepreneur".

Finalmente, segundo Lee, J. (2001), existem indivíduos com empreendedorismo associado a sua origem étnica. O pesquisador constata que judeus e coreanos tem maior sucesso que os povos afro-americanos porque desfrutam de maior acesso ao capital através de redes familiares e étnicas. Nesta linha, o trabalho de Yoon (1997) sugere que fluxos migratórios são provavelmente mais empreendedores, uma vez que, ao carecer de habilidades na comunicação e sofrer discriminação, são impulsionados para o empreendimento em sociedade de um negócio e/ou tornam-se auto-empregados.

Quanto à segunda linha de pesquisa classificada, Lee et elii (2004) referem-se aos aspectos agregados em nível regional que estimulam o empreendedorismo, entre os quais se destacam os custos tributários, os custos de transporte e as economias de escala. Reynolds, Miller e Maki (1993), sinalizam que a taxa de desemprego, a densidade populacional, a disponibilidade de financiamento, etc., são importantes para explicar a variação, em nível regional, da taxa de nascimento de novas firmas. Armington e Acs (2002) encontram que a concentração industrial, o crescimento da renda, o crescimento da população e o capital humano estão fortemente relacionados ao nascimento de novas firmas. Por sua parte, Kirchhoff, citado por Lee (2010) sinaliza que a pesquisa acadêmica e os gastos com o desenvolvimento estão associados de forma significativa com a taxa de formação de novas firmas em nível regional.

Entendida assim a classificação do empreendedorismo, neste trabalho opta-se pela abordagem do empreendedorismo de acordo com a segunda linha de pesquisa, isto é, os aspectos macroeconômicos vinculados ao nascimento de novas firmas, em detrimento aos aspectos individuais e característicos da personalidade do empreendedor. O motivo desta escolha está relacionado com o modelo aqui proposto que pondera, primeiramente, as variáveis agregadas relacionadas com os indicadores que formam as aglomerações. Por exemplo, densidade populacional, taxa de desemprego, crescimento do produto agregado, tamanho médio dos estabelecimentos, etc.

Além disso, resulta oportuno recordar que o empreendedorismo pode ser abordado desde perspectivas diferentes e com outras finalidades, igualmente importantes. Entre essas, Saxenian (1999) destaca o papel das redes sociais favoráveis ao empreendedorismo, como por exemplo, as representadas por trabalhadores chineses e indianos que ajudam às pessoas a iniciar novos negócios através de contatos e apoio financeiro no Vale do Silício. Stuart e Sorenson, (2003) destacam o aspecto espacial na formação de novos empreendedores "... argue that businesses cluster because geographical proximity enables them to use social ties necessary to mobilize essential resources. Their findings imply that na entrepreneur's social relationship is crucial in using critical business – resources critical to start a firm and set up a new organization."    

Afastando-nos um momento dessa classificação do empreendedorismo e aproximando-nos da questão geográfica do nascimento de novas empresas, Fochezatto (2010), ao comentar as abordagens mais recentes do desenvolvimento regional destaca, entre outras, a Nova Geografia Econômica e a Teoria do Crescimento Endógeno. Sobre a primeira, enfatiza a contribuição de Krugman à teoria da aglomeração através dos modelos envolvendo retornos crescentes de escala e concorrência imperfeita, específicamente ele disse: "Sua origem esta nas teorias de aglomeração e localização espacial e procura dar explicação para a distribuição das atividades no espaço geográfico." (FOCHEZATTO. P.172)

Apoiados nessa referencia que coincide com a tese de Audretsch e Fritsch em relação aos efeitos espaciais dos indicadores das aglomerações, outorga-se neste trabalho especial importância aos retornos crescentes, à densidade populacional, ao tamanho dos estabelecimentos, ao emprego qualificado, à taxa de desemprego, entre outros. Ou seja, as externalidades, cuja origem esta centrada nas aglomerações, ocorrem de forma transversal, entre firmas, entre indústrias e tem a capacidade de gerar produtividade crescente, inclusive em nível espacial.

Fochezatto (2010) também destaca que as forças de aglomeração das atividades apontam para a tríade das economias externas marshallianas e que o mecanismo gerador das externalidades, relacionado aos retornos crescentes, está baseado nos encadeamentos para trás e para frente das unidades produtivas. Se imaginarmos uma configuração espacial das aglomerações e a ela adicionarmos a contribuição da teoria do crescimento endógeno (incluindo o assim denominado capital empreendedor) na forma das externalidades associadas aos spillovers do conhecimento, poderemos melhor representar e distinguir no mapa geográfico a distribuição das aglomerações e os raios de sua influencia sobre a sua vizinhança.

Este último conjunto de efeitos pode ser denominado de externalidades territoriais/espaciais, e, nessa fase, é destacável o papel que cumpre o empreendedor individual, uma vez que o efeito transbordamento ocorre por seu intermédio. É este quem realiza e/ou torna efetiva a externalidade.

Assim, o construto aqui pretendido segue a seguinte sequencia lógica. As aglomerações espaciais geram externalidades territoriais que formam parte dos aspectos macroeconômicos impulsionadores do empreendedorismo na vizinhança a tal ponto que a autocorrelação espacial das atividades produtivas se torna significativa. Então, é pertinente, como mostram os estudos citados no final desta seção, verificar não apenas a presença de aglomerações, nem tão somente a possibilidade das externalidades marshallianas, mas, também, como aqui é proposto, a possibilidade das aglomerações tornarem possível, via externalidades territoriais, o nascimento de novas empresas.

Deeds (2015), ao afirmar que a atividade empreendedora não ocorre num vácuo, apoia a ideia do parágrafo anterior. Segundo ele, certas "condições" devem existir para que o nascimento de novas empresas se torne efetivo. A proximidade geográfica é, para o autor, o espaço propício para o intercambio de informações via redes formais e informais. Portanto, constitui-se também num estímulo importante para a captura de spillovers do conhecimento.

Assim, o espaço geográfico torna-se uma variável importante a ser considerada pelos eventuais empreendedores, uma vez que neste espaço podem estar concentrados, entre outros: uma relação risco/retorno atrativa, uma oferta de mão de obra qualificada, o conhecimento técnico e científico especializados, os provedores de matérias primas essenciais, os valores culturais da sociedade que ali convive, as normas institucionais que tornam sólidos os contratos, as redes de capital social, etc. Resulta evidente que, se potenciais empreendedores localizados numa região se beneficiam dos efeitos das externalidades propiciadas por uma ou varias empresas ali instaladas, o mesmo ocorre quando esses empreendedores estão dispersos em varias regiões vizinhas de uma região privilegiada pela presença de aglomerações produtivas.

Os indicadores agregados regionais que refletem o cenário anterior são importantes na hora de decidir pela realização efetiva de empreendimentos uma vez que sinalizam a presença de aglomerações no espaço. Entre esses indicadores podem ser citados os seguintes: o nível de emprego, a densidade populacional, a renda per capita, o crescimento populacional, o tamanho médio dos estabelecimentos, etc.

O trabalho de Audretsch e Fritsch (1993), inspirador desta pesquisa, procura estabelecer a relação entre a dimensão dos retornos crescentes de escala dentro de um espaço geográfico e a tendência à concentração da atividade econômica. O resultado do seu estudo é compatível com a teoria da nova geografia econômica proposta por Krugman no ano de 1991 no sentido de enfatizar a importância das aglomerações na geração de retornos crescentes de produção dentro de uma unidade espacial.         

Como o seu trabalho reflete o processo de concentração econômico que ocorre dentro de uma região, não específica o efeito das externalidades territoriais, objetivo do presente estudo. No entanto, resgatam que a fonte da variação espacial da taxa de nascimento de firmas está relacionada com os seguintes aspectos, cruciais na tomada de decisão por parte do empreendedor: a) o pool de trabalhadores já observado por Marshall em 1920, isto é, os empregadores tendem a recorrer a um lugar onde provavelmente farão boas escolhas de trabalhadores com habilidades especiais e, por outro lado, os trabalhadores se deslocarão para espaços onde os empregadores buscam indivíduos com habilidades específicas; b) as aglomerações, enquanto condutoras de uma grande provisão de insumos não comercializáveis de grande variedade e baixo custo; e c) os spillovers tecnológicos e de informação que parecem beneficiar mais às novas firmas do que as firmas incumbentes, assim, novas firmas tendem a se localizar em regiões onde tais spillovers são maiores (aglomerações).

Como antecipado, estudos com o objetivo de entender a taxa de nascimento de empresas sob os efeitos da dependência espacial foram elaborados para o Rio Grande do Sul, dentre os quais destacamos o trabalho de Canever, Menezes e Kohls (2011). Um dos seus resultados aponta para a formação de clusters de novas empresas e o resgate do aspecto locacional. Também destacam o fato de que regiões com taxa menor de nascimento de empresas correspondem às mais desenvolvidas, tanto que, as taxas de maior nascimento de empresas correspondem às regiões menos desenvolvidas, o que na sua apreciação poderia significar um processo de convergência regional do desenvolvimento. Mas, sinalizam que o empreendedorismo das regiões menos desenvolvidas é de qualidade inferior, provavelmente pelo fato dele ocorrer por necessidade, não afetando de forma positiva e significativa o crescimento.

3. Material e métodos

O modelo aqui ensaiado está baseado na proposição de Audretsch e Fritsch (1993), mas, com algumas adaptações em relação às variáveis, como especificado mais abaixo e com a diferença do modelo dos autores supracitados. A estimação do modelo é realizada através da econometria espacial.

Como já adiantado na seção anterior, neste trabalho se postula a dependência espacial da formação de novas empresas, assim a variável dependente do modelo refere-se ao nascimento de novos estabelecimentos. Em relação às variáveis independentes, estas fazem parte do contexto macroeconômico e sintetizam o efeito das aglomerações sobre a formação de novas firmas. Elas são: a taxa de desemprego e a sua variação; a densidade populacional; o crescimento populacional; a relação entre empregados qualificados e não qualificados; o produto per capita; e o tamanho médio dos estabelecimentos. As variáveis se referem ao Estado de Rio Grande do Sul e ao ano de 2010, uma vez que, para anos mais recentes, não foi possível contar com os dados oficiais da taxa de desemprego dos 496 municípios do Estado.

A variável dependente é a taxa de nascimento de novas empresas (NNE), que foi obtida a partir da relação entre a diferença do número de estabelecimentos no ano de 2012 e do ano de 2010 dividido pelo número de estabelecimentos no ano inicial. Em relação às variáveis independentes, o seu cálculo foi obtido da seguinte maneira: a) o produto per capita (YPC) é o resultado da divisão entre o PIB do município e a população respectiva (número final dividido por 1000); b) o emprego não qualificado (ENQ) é expresso pela relação entre emprego não qualificado (trabalhadores de serviços administrativos, vendedores do comércio em lojas e mercados, trabalhadores agropecuários, florestais e pesca, ocupados na agricultura, setor de produção de bens e serviços industriais, serviços e manutenção) e o emprego total (os anteriores mais os membros do poder público, dirigentes de organizações de interesse publico, profissionais das ciências e das artes e os técnicos de nível médio) em nível municipal; c) a densidade populacional (DP) é o produto da relação entre a população municipal e a extensão territorial do município, expresso em raiz quadrada; d) o tamanho médio do estabelecimento (TME) é resultado da relação entre o número de pessoas ocupadas e o número de estabelecimentos por município; e) a taxa de desemprego (TD) é expressa pelas pessoas desempregadas mais pessoas disponíveis para trabalhar em relação à população economicamente ativa em nível municipal; f) variação da taxa de desemprego (VTD) é resultado da variação da taxa de desemprego municipal; e g) variação populacional (VP) é resultado da variação populacional municipal entre o ano de 2010 e 2006. A Tabela 1 abaixo apresenta um resumo dos estatísticos descritivos das variáveis apresentadas do modelo.

Quanto à fundamentação para a escolha dessas variáveis e das relações parciais estabelecidas entre elas, pode-se expressar o que segue. No caso da relação entre a taxa de desemprego e a taxa de nascimento de novas firmas, os autores supracitados assumem a sua complexidade. Por um lado, as taxas de desemprego elevadas podem atenuar a taxa de nascimento de novas firmas, mas, por outro lado, um pool maior de recursos humanos disponíveis às empresas entrantes tenderia a motivá-las de maneira a tornar efetivo o seu ingresso.

A concentração de muitas firmas num único lugar oferece a possibilidade de se contar com um pool de trabalhadores com habilidades específicas e de apresentar uma baixa probabilidade de desemprego. Portanto, a presença da variável mão de obra qualificada em relação à não qualificada está justificada no modelo.

Tabela 1: Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas

Variáveis

Média

Desvio padrão

Valor mínimo

Valor máximo

NNE

14,12

17,31

-29,17

225,00

TD

2,80

2,17

0,06

13,83

VTD

116,13

384,73

-96,57

5.583,30

TME

7,51

3,51

2,73

28,42

DP

87,04

316,89

1,61

2.915,34

VP

-0,15

1,14

-4,08

3,50

YPC

19.571,20

13.384,61

7.017,00

252.773,00

ENQ

0,76

0,09

0,41

0,94

Fonte: elaboração dos autores.

Audretsch e Fritsch (1993) consideram que os spillovers de informações podem oferecer às firmas entrantes uma melhor função de produção. Isto sugere que o nascimento de novas firmas se encontre positivamente relacionada com a densidade populacional, uma vez que a possibilidade de transferência de informações é maior quanto maior é a densidade. Da mesma maneira, espera-se que a aglomeração de novas firmas ocorra onde o produto per capita é relativamente mais elevado.

Quanto ao tamanho médio dos estabelecimentos e ao seu efeito sobre o nascimento de novas firmas, estabelecimentos de tamanho médio menor estão constituídos por trabalhadores mais propensos para iniciar novos negócios. Para que essa relação seja válida, presume-se, implicitamente, que a mensuração do nascimento de novas firmas segue a abordagem do mercado do trabalho, em que o número de novos estabelecimentos está relacionado com a força de trabalho.

Essa abordagem tem apelo teórico porque está baseada na teoria da escolha empreendedora proposta por Evans e Jovanovic (1989), em que uma nova firma é inaugurada em função do potencial empreendedor localizado no mesmo mercado de trabalho.

O resultado da relação entre o tamanho médio do estabelecimento e a taxa de nascimento de novas empresas pode ser diferente se esta última é mensurada a partir da abordagem ecológica, ou seja, a partir da relação entre as novas entrantes e o número de firmas existentes. Isto provoca um problema, o de superestimar as taxas de nascimento em regiões onde a média do tamanho do estabelecimento é alta.

Finalmente, tendo em mente a formatação do atual modelo e, uma vez verificada a dependência espacial da variável dependente através do Índice de Moran (I de Moran), a estimação do modelo não deve ser realizada através do método de mínimos quadrados ordinários porque as estimativas resultarão viesadas, inconsistentes e ineficientes. Assim, na presença de dependência espacial, a omissão da variável dependente defasada espacialmente e/ou a suspeita de erros não independentes e heterocedásticos habilita a enfrentar tal problema através de um dos seguintes modelos: Modelo Autoregressivo Espacialmente (SAR) ou Modelo de Erros Espaciais (SEM).

A estimação do modelo foi realizada com o uso do programa de econometria espacial GeoDa e os dados das variáveis requeridas pelo modelo estimado foram obtidos junto aos bancos de dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios ( IBGE-PNAD) e Fundação de Economia e Estatística (FEE).

4. Análise dos resultados

O primeiro resultado é a verificação da dependência espacial da variável dependente, Nascimento de Novas Empresas (NNE), através do estatístico Índice de Moran. Embora o seu valor seja baixo (0,05), conforme mostra a Tabela 2, a dependência espacial da referida variável é significativa.

A ideia por trás do Índice de Moran é caracterizar a dependência espacial da variável quando os seus valores se encontram correlacionados no espaço. O índice é submetido a um teste cuja hipótese nula é favorecer a autocorrelação espacial igual a zero. Se o respectivo valor se encontra no intervalo entre zero e a unidade (0,1), a correlação é direta e, se o valor se situa entre um negativo e zero (-1,0), a correlação é inversa.

Uma vez que o teste aponta para a autocorrelação direta da variável NNE, o procedimento a seguir exige a escolha de um dos modelos anteriormente anunciados, SEM ou SAR. A Tabela 2 mostra que o teste do Multiplicador de Lagrange do erro foi significativo, razão pela qual se permite rodar os dados seguindo o modelo SEM.

Tabela 2: Diagnóstico para a dependência espacial da variável endógena (NNE).

Test

MI/DF

Valor

Prob

I de Moran

0,0531

2,1637

0,030

M. Lagrange (lag)

1

2,7037

0,10011

LM Robuso (lag)

1

1,1872

0,27590

M. Lagrange (erro)

1

3,6583

0,05579

LM Robusto (erro)

1

2,1417

0,14334

M Lagrange (Sarma)

2

4,8454

0,08868

Fonte: resultados da pesquisa.

A Tabela 3 mostra o resultado da estimação do modelo SEM pelo método da máxima verossimilhança. De acordo com esses resultados, afirma-se que foram significativas as variáveis emprego não qualificado, tamanho médio dos estabelecimentos, densidade populacional, variação populacional e o coeficiente do erro aleatório espacial (lambda).

O coeficiente da variável emprego não qualificado (ENQ) é negativo, razão pela qual as novas empresas optariam por locais onde houvesse maior oferta de mão de obra qualificada. O resultado é consistente com os encontrados por Audretsch e Fritsch (1993) e com o apontado por Krugman, para quem o pool de trabalhadores e os spillovers do conhecimento (informações) são mais prováveis de ocorrer entre trabalhadores mais qualificados.

Em relação à variável tamanho médio dos estabelecimentos (TME), a interpretação do seu coeficiente muda de acordo com o tipo de abordagem utilizado para mensurar a variável dependente. Se a opção fosse pela abordagem do mercado do trabalho, se esperaria que o coeficiente fosse um valor negativo, uma vez que, em estabelecimentos pequenos, maior é a propensão de trabalhadores para iniciar seu próprio negócio.

Como neste trabalho optou-se pela abordagem ecológica e o valor do respectivo coeficiente foi positivo, a sua leitura indica que, quanto maior o tamanho médio do estabelecimento, maior é a taxa de nascimento de novas empresas. Isto reflete que, em tese, em um número relativamente crescente de municípios do Rio Grande do Sul estariam se instalando unidades produtivas de tamanho médio maior. Além disso, este fenômeno estaria contribuindo para que o número de novas empresas aumentasse em função dos efeitos que os retornos crescentes de firmas de maior tamanho provocariam no seu entorno geográfico.

Tabela 3: Modelo erro espacial (SEM). (Var dep.: NNE – No de observações: 496)

Variável

Coeficiente

Erro padrão

z-valor

Probab.

Constante

50,126

7,570541

6,621191

0,00000

YPC

-0,07278366

0,0575507

-1,264688

0,20598

ENQ

-0,466668

0,09559

-4,881878

0,00000

TME

0,5995859

0,2456507

2,440807

0,01465

TD

-0,5134437

0,3882151

-1,322576

0,18598

VTD

-0,02764709

0,01803904

-1,532625

0,12537

DP

-0,2953889

0,1389007

-2,126619

0,03345

VP

0,4845858

0,2133121

2,271721

0,02310

Lambda

0,1491089

0,06855827

2,174922

0,02964

R 2

0,084160

Log verossímil.

-2096,6679

Sigma2

273,774

Criterio Akaike

4209,33

DP regressão

16,5461

Criterio Schwarz

4242,99

Diagnostico para heterocedasticidade

Teste

Graus de liberdade

Valor

Prob

Breusch-Pagan

7

492,9708

0,00000

Diagnostico para a dependência espacial

Erro espacial dependente para a matriz de ponderação

Teste

DF

Valor

Prob

 R. Verossiml.

1

3,9798

0,04605

Fonte: resultados da pesquisa.

Quanto à variável densidade populacional, o seu coeficiente, embora significativo, é negativo e contrário ao que se esperaria do efeito transbordamento da informação, que ocorreria com mais fluidez em contextos demográficos com uma concentração maior de pessoas. Quanto à variável variação populacional, o coeficiente resultou positivo o que está de acordo com a expectativa de um empreendedor iniciar um negócio em locais onde a demanda futura por seus produtos e a oferta esperada de trabalho sejam crescentes.

Não deixa de chamar a atenção os valores negativos dos coeficientes das variáveis produto per capita e taxa de desemprego. Em relação à taxa de desemprego, Audstresch e Fritsch (1993) esperam um valor ambíguo para o seu coeficiente, uma vez que, em contextos de desemprego elevado, o empreendedorismo por necessidade pode ser maior, mas por outro lado, e por motivos diferentes, uma taxa de desemprego dessa dimensão pode ser um desestímulo para a abertura de novas empresas em função do quadro recessivo que ela representa.

O coeficiente do produto per capita confirma que, naquele ano, a abertura de novos negócios foi afetada de forma negativa por esta variável. Teoricamente, quando a economia apresenta um quadro recessivo em função da queda do produto per capita, fluxos migratórios de indivíduos se deslocam de regiões mais deprimidas em direção de horizontes potencialmente mais prósperos com a intenção de apostar em negócios próprios.  

5. Comentários finais

Os resultados do modelo estão de acordo com a proposta original do Audretsch e Fritsch (1993) e com o que nos propusemos na introdução deste estudo, isto é, verificar os efeitos das aglomerações sobre a taxa de nascimento de novas empresas no Rio Grande do Sul. Fica evidenciado que a variação populacional, o tamanho médio dos estabelecimentos, o emprego não qualificado e a densidade populacional são variáveis significativas, embora o sinal do coeficiente da última conteste a nossa expectativa.

Pesquisas futuras sugeridas por este estudo podem seguir vários caminhos. O primeiro seria construir um modelo com as mesmas variáveis para um intervalo de tempo tal que acompanhasse a dinâmica temporal das variáveis e das relações entre elas. O segundo seria estudar e identificar, por município ou por grupos destes, os espaços geográficos onde se apresentam as relações positivas entre o nascimento de novos estabelecimentos, de um lado, e o tamanho médio dos estabelecimentos, a densidade populacional, o emprego qualificado, etc., por outro lado. Um terceiro seria identificar a localização dos maiores estabelecimentos, os setores aos quais eles pertencem, a evolução da sua dinâmica produtiva e de que maneira sua presença territorial acaba afetando a vizinhança.

O fato do tamanho médio dos estabelecimentos e do aumento da população terem coeficientes positivos e a densidade populacional coeficiente negativo, pode estar sinalizando algumas questões importantes. Primeiro, que o nascimento de novas empresas no Rio Grande do Sul é mais significativo em cidades médias, especialmente naquelas próximas às grandes cidades. Segundo, que as grandes cidades deixaram de ser o local mais importante para o empreendedorismo. Por fim, que o nascimento de novas empresas é relativamente maior em regiões industriais. Isto porque o local preferido das indústrias não são os grandes centros urbanos, mas sim em cidades próximas a estes grandes centros.

6. Bibliografia

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1. Professor da UNIPAMPA. Doutorando em Economia do Desenvolvimento no PPGE/PUCRS. E-mail: carloshrodasc@gmail.com
2. Professor Titular da PUCRS. Doutor em Economia. Pesquisador do CNPq. E-mail: adelar@pucrs.br


Revista Espacios. ISSN 0798 1015
Vol. 37 (Nº 22) Año 2016

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