Espacios. Vol. 37 (Nº 20) Año 2016. Pág. E-2
Natália Tavares de PAULA 1; Adriano de Oliveira GIANOTTO 2
Recibido: 13/03/16 • Aprobado: 23/04/2016
1. A educação inclusiva na perspectiva da surdez
2. História dos surdos e seus desdobramentos linguísticos
3. Propostas políticas para a educação dos surdos no Brasil
4. Panaroma da política proposta pela rede municipal de Natal/RN
RESUMO: O objetivo deste artigo é apresentar um panorama das políticas educacionais de inclusão de alunos surdos no município de Natal/RN, uma vez que essas políticas implicam em ações para melhorar a qualidade de aprendizagem desse grupo de educandos. Analisamos a trajetória histórica da educação dos surdos e demonstramos dificuldades no processo de escolarização dos sujeitos surdos através de sua língua própria, a LIBRAS, no contexto da educação inclusiva. No Brasil, essa língua ganhou reconhecimento através Lei N.10.436, de 2002, e o Decreto N. 5.626, de 2005, tratam da língua brasileira de sinais (Libras) e da educação de surdos, indicando a necessidade de formação de futuros profissionais (professor bilíngue, instrutor surdo e intérprete de Libras) e sua regulamentação profissional pela Lei N. 12.319/10, cientes da condição linguística diferenciada dos alunos surdos. Nessa linha, o município do Natal, apresenta dois contextos na educação dos surdos: os complexos bilíngues (para alunos surdos) e as escolas regulares (para alunos ouvintes e surdos incluídos). Para a realização do trabalho realizou-se uma pesquisa bibliográfica, com base na legislação local para a educação dos surdos no município e em estudos e pesquisa sobre o tema como em Fernandes (2014); Santos (2012); Severo (2011). Concluiu-se que o município do Natal tem vários instrumentos normativos elaborados para dar proteção jurídica à inclusão educacional de alunos com surdez. Reconhece-se, portanto, a vontade política, mas além do respaldo legal, é necessário o engajamento de todos os setores sociais e educacionais para se efetivar uma educação inclusiva de qualidade aos surdos. |
RESUMEN: El objetivo de este trabajo es presentar una visión general de las políticas educativas de inclusión de estudiantes sordos en la ciudad de Natal / RN, ya que estas políticas implican acciones para mejorar la calidad del aprendizaje de ese grupo de estudiantes. Hemos analizado la trayectoria histórica de la educación de los sordos y ha demostrado dificultades en el proceso de escolarización de las personas sordas a través de su propio idioma, libras, en el contexto de la educación inclusiva. En Brasil, esta lengua ha ganado reconocimiento a través de la Ley N.10.436 de 2002, y el Decreto Nº 5626 de 2005, frente a la Lengua Brasileña sesión (Libras) y la educación de los sordos, lo que indica la necesidad de formación de los futuros profesionales ( maestro bilingüe, instructor de sordos y de interpretación libras) y su regulación profesional por la Ley N. 12.319 / 10, consciente de la diferente condición lingüística de los estudiantes sordos. En esta línea, la ciudad de Natal, tiene dos contextos en educación para sordos: Complejo bilingüe (para estudiantes sordos) y escuelas regulares (para estudiantes sordos y oyentes incluido). Para llevar a cabo el trabajo se llevó a cabo una búsqueda en la literatura, en base a la legislación local para la educación de los sordos en la ciudad y en los estudios e investigaciones sobre el tema, como en Fernandes (2014); Santos (2012); Severo (2011). Se concluyó que el municipio de Navidad tiene diversos instrumentos legales diseñados para dar protección legal a la inclusión educativa del alumnado con sordera. Se reconoce, por lo tanto, la voluntad política, pero además de apoyo legal, la participación de todos los sectores sociales y educativas apropiadas para llevar a cabo una educación inclusiva de calidad se requiere para los sordos. |
O Brasil, apesar de possuir tantas riquezas, mostra-se com grandes deficiências no sistema educacional, devendo haver uma mudança radical em todos os níveis de ensino. Significa que os investimentos devem se focar na estruturação escolar, nos processos de ensino-aprendizagem e, principalmente, na formação de professores, uma vez que profissionais bem qualificados e valorizados, dão a base para uma educação de qualidade.
A luta internacional pela igualdade foi proposta na Declaração de Salamanca (1994), que indica que as instituições educacionais em geral devem procurar atender às demandas de pessoas com NEE em diversos locais, com direito ao acesso a uma boa qualidade de ensino e à aprendizagem. Baseando-se nessas questões político-educacionais foi apenas no ano de 1996, com a LDB 9.394/96, que os NEE tiveram seu direito reconhecido de atendimento nas redes regulares de ensino no Brasil. Assim como no município do Natal/RN que, nesta perspectiva, busca instrumentos legais e operacionais para a organização de um sistema de educação inclusivo e integrador.
Essa inclusão vem sendo documentada desde a Resolução nº 01/96 (Fixa normas relativas à educação de aluno portador de deficiência) no município do Natal/RN, e principalmente pela Resolução nº 05/2009 (Fixa normas relativas à educação das pessoas com necessidades educacionais especiais no Sistema Municipal de Ensino do Natal/RN).
Este trabalho tem por objetivo traçar um panorama de políticas de educação dos surdos a nível local nesse município. Isso porque o presente estudo mostra-se importante para nortear o atendimento a essa grupo com necessidades especiais que possuem uma realidade linguística diferenciada e obter os desdobramentos do cumprimento do Decreto 5.626/05, permitindo desenvolver uma educação adequada e de qualidade.
Para atender as possibilidades de compreensão da complexidade das realidades humanas e educacionais, e entender o contexto da educação inclusiva no município em questão, o presente trabalho tem caráter exploratório-descritivo sendo feita uma pesquisa bibliográfica, com base na legislação e em estudos e pesquisa sobre o tema como em Fernandes (2014); Santos (2012); Severo (2011).
Desta forma, acreditamos que além de atender uma necessidade social e institucional, este estudo contribuirá significativamente ampliando os estudos os direitos e políticas públicas para o reconhecimento e inserção de estrutura, métodos e práticas pedagógicas no ensino de Libras no município do Natal/RN.
Os mais privilegiados socialmente são o que ainda tem mais acesso a um ensino de qualidade. Essa é uma das grandes diferenças sociais para o acesso a uma qualificação profissional no ensino superior. Mas se sabe que existem muitas outras diferenças, não só sociais, como as raciais, culturais e biológicas. Desse modo surge um grupo que merece bastante atenção, os das pessoas com necessidades educativas especiais-NEE.
A educação especial e inclusiva integra o sistema de ensino, nos níveis federal, estadual e municipal com a finalidade de promover o desenvolvimento de potencialidades dos educandos com necessidades educativas especiais para que se tornem cidadãos conscientes e participativos (ROSSI, 2010).
Moreira (2004) evidencia as pessoas com NEE que eram excluídas de seus direitos à educação desde a Educação Básica acabaram não tendo assegurado o seu direito a uma formação equivalente àquela oferecida aos demais alunos.
A nova política de Educação Inclusiva impõe uma restruturação do sistema educacional que objetive a transformação da escola em um espaço democrático e competente para se trabalhar com esses discentes, proporcionando a todos, a apropriação do conhecimento, gerando oportunidades para a inclusão (CARDOSO, 2003).
Atualmente questões relativas às políticas de inclusão, formação do professor de Libras, técnicas, metodologias de ensino, materiais e recursos didáticos para o ensino e aprendizagem de Libras, produção de práticas pedagógicas que atendam ao grupo de pessoas interessadas na Língua de Sinais têm sido um grande desafio de forma geral.
Para os alunos com surdez, a inclusão foi afirmada pela regularização da Lei N. 10.436 de 24 de abril de 2002, que se dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, com o direito a educação e oportunidades iguais aos que nasceram sem nenhuma deficiência (BRASIL, 2005). O Decreto N. 5626, de 22 de dezembro de 2005, trata ainda sobre a educação dos surdos, com o objetivo de atingir acessibilidade linguística a eles. Garante ainda a oferta do ensino de LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais, nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, e foi considerado obrigatório nos cursos de formação de professores nos cursos de licenciatura e Pedagogia (BRASIL, 2005).
Essas leis foram respaldadas em várias pesquisas na área da Língua Brasileira de Sinais que trouxeram uma série de evidências quanto ao seu estatuto linguístico (FERREIRA-BRITO, 1995; QUADROS, 1997; QUADROS; KARNOPP, 2004). Os linguistas reconhecem as línguas de sinais de diferentes países como línguas naturais, no sentido linguístico, ou seja, línguas que apresentam as propriedades das línguas humanas. Paralelamente aos avanços científicos, os surdos de diferentes países organizaram-se por meio de instituições representativas para convencer o poder público de que as línguas de sinais são línguas de fato pertencentes a grupos sociais que se estendem por diferentes países.
Mesmo com todo o respaldo legal ainda se percebe a discriminação aos surdos, de sua cultura e língua, como uma questão ambiental, social, política e cultural, o que pode ser trabalhado pela divulgação e aprendizagem dessa Língua. Aprendendo a Língua de Sinais muitos ouvintes têm a oportunidade de conhecer uma nova forma de comunicação que não só a oral, mas sim a gesto-visual, e este aprendizado beneficia os ouvintes também, de uma maneira a sensibilização e interação social que pode proporcionar este conhecimento. Além de uma língua há o conhecimento cultual, pois o sujeito surdo se identifica com sua cultura e a utilização da LIBRAS é uma das formas de demonstrá-la.
O ensino de LIBRAS na educação básica, na rede municipal de ensino torna-se um fator a mais na inclusão dos surdos nos espaços educacionais e sociais definidos junto aos ouvintes, prevalecendo a aceitação das diferenças linguísticas e culturais de uma comunidade. Nessa perspectiva, o presente trabalho busca analisar a realidade política da educação dos surdos no município de Natal/RN na atualidade.
A retomada histórica da educação dos surdos nos esclarece a importância do ensino adequado, atendendo a legislação para o sucesso de ensino-aprendizagem na educação dos surdos.
Os surdos, até o início da Idade Moderna, eram considerados ineducáveis. Desse modo eram excluídos da sociedade e não tinham direitos como casar, a herança, enfrentavam o preconceito, a piedade, o descrédito, e até mesmo a denominação de loucos (DIAS, 2006).
Segundo Soares (1999), sob uma visão clínico-terapêutica, o médico pesquisador italiano Cardamo afirmou que o surdo possuía habilidade de raciocinar, isto é, que os sons da fala ou ideias do pensamento podem ser representados pela escrita. Desta maneira, a surdez não poderia se constituir num obstáculo para o surdo adquirir o conhecimento. Posteriormente o frade espanhol Pedro Ponce de Leon foi considerado o primeiro professor para surdos. Seus ensinamentos de escrita e elementos fonéticos eram direcionados para crianças surdas da elite, sob o sistema de tutoria.
No século XVIII, a educação dos surdos ganha um caráter institucional, e em 1760 o Abade Michel L´Épée funda a primeira escola para surdo da França o Instituto Nacional de Surdos Mudos de Paris. Seu método de ensino consistia em "sinais metódicos" (gestos), oralismo e leitura labial. Este sistema ensino era profissionalizante, objetivando a inserção do surdo no mundo do trabalho. Sua filosofia e método, por meio dos seus seguidores, em pouco tempo iria influenciar a educação do povo surdo no mundo todo, inclusive no Brasil que em 1857, a convite do Dom Pedro II, o francês Edward Huet funda a primeira escola para surdos no Rio de Janeiro, o atual INES- Instituto Nacional de Educação de Surdos (DIAS, 2006).
Com objetivo de discutir a educação das pessoas com surdez, ocorreu o Congresso de Milão em 1880. Nesse Congresso, foram apresentados vários surdos que falavam bem, com o intuito de mostrar a eficiência do método oral, pois o pressuposto vigente era que a aprendizagem da língua oral era de suma importância para a vida social do surdo, e que o uso de gestos e sinais o desviava desse caminho (LACERDA, 1998). O Oralismo vigorou na educação do aluno surdo por um longo período, até mesmo nos dias atuais encontramos escolas de educação de surdos que seguem essa perspectiva.
Tendo em vista que a filosofia oralista na Educação de Surdos não estava garantindo a qualidade do ensino, na década de 60, tornam-se evidentes os resultados de pesquisas realizadas sobre a Língua de Sinais indicando que o aprendizado da Língua de Sinais ajuda o desenvolvimento escolar das crianças surdas e que esta se constitui em uma língua completa, que não prejudica as suas habilidades orais (DIAS, 2006). Nessa época, pesquisadores americanos adotaram uma filosófica de comunicação total, que é uma combinação do método oral com os sinais da língua de sinais e o alfabeto digital.
Brito (1993), acredita que a Comunicação Total artificializa a comunicação, pois reduz o uso dos sinais apenas como recurso para apoiar a fala, desta maneira é uma forma de eliminar o reconhecimento da língua de sinais tanto em termos de filosofia, como de implementação.
A partir dos anos 90, uma nova filosofia educacional que propõe o aprendizado de forma genuína é chamada de Bilinguismo. A educação bilíngue é uma filosofia de ensino que recomenda o acesso a duas línguas no contexto escolar, sendo a Língua de Sinais considerada como língua natural e por meio dela será realizado o ensino da língua escrita. Essa filosofia resgata o direito da pessoa surda de ser ensinada na Língua de Sinais, respeitando-se seus aspectos sociais e culturais (BRASIL, 2004).
Mais que frequentar o ensino regular, o aluno surdo deve ser atendido nas suas necessidades especiais e o professor enquanto mediador do conhecimento deve estar preparado para inserir seus alunos no contexto social de forma geral. É por isso, que carece destacar que a relação entre as propostas teóricas e a prática pedagógica para o ensino de Libras tem se constituído em uma questão de grande complexidade e permeada por fatores diversos. Sendo assim, Oliveira (2010), baseada nos pressupostos de Vygotsky esclarece que:
Nas relações interpessoais na educação a interação do sujeito com o mundo se dá pela mediação feita por outros sujeitos (...) a aprendizagem não é fruto apenas de uma interação entre indivíduo e o meio. A relação que se dá na aprendizagem é essencial para a própria definição desse processo, que nunca ocorre no indivíduo isolado. (...) o processo ensino e aprendizagem inclui sempre aquele que aprende aquele que ensina e a relação entre essas pessoas. (OLIVEIRA, 2010, p.56).
Vygotsky (1997, apud OLIVEIRA, 2010) afirma que o problema da linguagem de alunos surdos não será solucionado pela metodologia especial e, sim, pela reestruturação geral da escola sobre os princípios da educação social. A linguagem da criança surda deve surgir quando se tem necessidade dela, quando possa representar uma experiência que lhe sirva para todas as outras experiências e por toda a vida escolar. A educação social amplamente desenvolvida é a base necessária para solucionar o problema existente em torno da linguagem.
Essa condição traz consigo que o trabalho pedagógico deve ser orientado tanto do lado social quanto cultural, para dessa forma estabelecer o desenvolvimento cognitivo e mental, causando um sentido no mundo.
A inclusão no Brasil começa a ganhar destaque na década de 1990 com um marco internacional, a Declaração de Salamanca (1994), que propõe a educação de pessoas com necessidades especiais-NEE de forma assegurada no sistema educacional. Essa declaração foi um propulsor para a criação da Lei de Diretrizes Básica da Educação, Lei N. 9.394 de 20 de dezembro de 1996, garantindo a oferta da educação especial como modalidade de ensino preferencialmente no ensino regular, em todos os níveis de educação. O que se torna um grande desafio, visto que existe uma forte carência na formação de profissionais e no direcionamento de políticas públicas que avancem numa educação inclusiva de qualidade (GURGEL, 2010). Além disso, a permanência desses alunos no ensino fundamental e médio ainda é um grande desafio.
Após a LDB, a educação dos surdos no Brasil passou por mudanças e influências nos estudos de linguística de vários países sobre a linguagem. Destacam-se esses estudos de linguística sobre a LS- Língua de Sinais no final do século XX e início do século XXI na França, Espanha e Estados Unidos, que auxiliaram para o reconhecimento dos gestos utilizados pelas comunidades surdas como uma língua, e não uma linguagem (BRITO,1997). Além disso, a luta das associações dos surdos com o objetivo desse reconhecimento favoreceu ainda uma nova proposta pedagógica.
A conquista do direito à língua de sinais como produto de identificação cultural e interlocução social determina mudanças no campo político que levou à transformação de arranjos institucionais em vários níveis de ação estatal, a partir de 2000 com a Lei N. 10.436/02.
Através da homologação da Lei Federal N. 10.436, de 24 de abril de 2002, a LIBRAS- Língua Brasileira de Sinais foi reconhecida como língua oficial dos surdos no Brasil. Sendo considerado um marco para a comunidade surda, pois promove o direito aos surdos como cidadãos, o direito de estarem incluídos na sociedade de forma atuante. Importante também na sensibilização do ambiente escolar em todos os níveis de ensino, buscando uma qualificação adequada dos profissionais envolvidos.
Nesse aspecto, a Lei N. 10.436/02 apresenta, também, preocupações no sentido da institucionalização desse apoio. Isso representa que o poder público busca mecanismos legais demonstrando o reconhecimento da Libras como Língua natural do surdo, ao sancionar uma lei que em seu artigo quarto determina:
Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente. (BRASIL, Lei N. 10.436/02).
Com a regulamentação da lei pelo Decreto N. 5626, de 20 de dezembro de 2005, houve o reconhecimento do direito dos Surdos a uma educação bilíngue, na qual a língua de sinais é a primeira língua e a língua portuguesa, preferencialmente na modalidade escrita, é a segunda. De acordo com o artigo 22,
Art. 22. As instituições federais de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de:
I - escolas e classes de educação bilíngüe, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngües, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental;
II - escolas bilíngües ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, para os anos finais do ensino fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes das diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade lingüística dos alunos surdos, bem como com a presença de tradutores e intérpretes de Libras - Língua Portuguesa.
§ 1o São denominadas escolas ou classes de educação bilíngüe aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo.
Dentro desta educação, não havendo um professor proficiente em LIBRAS em sala de aula, o profissional Tradutor Intérprete de LIBRAS (TILS) é fundamental para a comunicação. Esse profissional surgiu com a necessidade da comunidade surda de possuir um mediador no processo de comunicação com os ouvintes. Sabe-se que informalmente membros da família faziam essa função, por não conhecerem a Língua de Sinais, construíam uma comunicação usual própria, diferente da Língua de Sinais, com assuntos relacionados apenas as necessidades básicas e momentâneas da criança Surda (CASTRO, 1999).
Nesse contexto, a Lei N. 12.319 de 01/09/2010 foi de grande importância, pois regulamentou a profissão do Intérprete. No Brasil, além de ter domínio sobre a LIBRAS, ele precisa ter domínio do idioma falado no país, conhecer processos, estratégias, técnicas de interpretação e tradução e possuir formação específica na área de atuação.
Para este trabalho foram considerados documentos referentes ao atendimento especial e educação dos surdos no município do Natal/RN através dos seguintes textos do Conselho Municipal de Educação: Resolução nº 01/96 (Fixa normas relativas à educação de aluno portador de deficiência), Resolução no 004/2007 (Estabelece normas para o Sistema de Ensino do Município do Natal, em observância às disposições da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e da Lei 5.339 de 26 de dezembro de 2001 que dispõe sobre o Sistema de Ensino do Município do Natal e dá outras providências) e Resolução nº 05/2009 (Fixa normas relativas à educação das pessoas com necessidades educacionais especiais no Sistema Municipal de Ensino do Natal/RN). Além disso, foram considerados dados estatísticos do último senso escolar do município.
O foco principal da análise dos documentos é marcar o ensino realizado aos alunos surdos através da LIBRAS como língua de acesso a comunicação e aprendizagem, afim de criar condições para a permanência dos surdos no ambiente escolar e no meio social.
No município do Natal, o Sistema de Ensino adota a política de inclusão desde os anos 90 com a Resolução N. 01/96 do Conselho Municipal de Educação (Fixa normas relativas à educação de aluno portador de deficiência). O termo portador hoje em dia não é mais utilizado, pois houve uma mudança de nomenclatura com uma Portaria posterior a essa resolução, a Portaria N.2.344 de 3 de novembro de 2010. A educação para alunos surdos nessa resolução destaca-se na forma de avaliação diferenciada:
Art. 7º – O processo de avaliação e promoção do aluno dar-se-á de acordo com a observância às especificidades de cada deficiência.
Essa forma de avaliar confirma o embasamento da diretriz a qual cita a implementação de uma política de inclusão que contemple programas de atendimento específico ao aluno com necessidades educativas especiais e de serviços de apoio especializado.
Mas que se possa concretizar essa avaliação, é necessário a formação e conhecimento dessa língua por parte de coordenadores, professores do ensino regular e demais professores. Por isso a Secretaria Municipal de Educação - SME propôs ainda nesta Resolução N. 01/96
Art. 8º – A Secretaria Municipal de Educação, através de convênio com a Associação de Surdos do Rio Grande do Norte, deve dispor de instrutor surdo para ministrar curso de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS).
Parágrafo único: O educador que leciona a aluno surdo deve ser orientado pelo instrutor quanto ao uso da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)
Embora houvesse atendimento especializado aos alunos surdos, não havia garantia de uma educação que respeitasse as características linguísticas desse alunado. Isso porque, por muitos anos a cultura oralista imperou no ambiente escolar e social dos surdos, até os profissionais eram formados nesse contexto, orientados a falarem sempre de frente numa sala de aula para que os surdos conseguissem fazer a leitura labial. Ainda era uma fase de transição, uma mudança histórica de paradigmas começava a aflora. Segundo Skliar (1999) considerou a surdez como uma característica socioantropológica e a Libras como língua de direito - que é defendida nas esferas políticas e sociais (associações de surdos, acadêmica, entre outras), mas não necessariamente assimilada pelas práticas escolares.
Após o Decreto Federal N. 5.626/05 (BRASIL, 2005), no qual foram indicados novos profissionais a serem integrados nas escolas responsáveis pelo atendimento de alunos surdos, é que o município de Natal publica duas novas resoluções e um projeto de educação e assistência social com objetivo de cumprir as leis relacionadas aos direitos dos surdos.
Com esse Decreto N. 5.626/05, há a inclusão obrigatória da disciplina da Libras nos cursos de formação de professores, a criação de cursos de Licenciatura em Letras Libras e Bacharelado em tradução e interpretação. Desse modo houve aberturas de vagas e concursos públicos na área da Língua Brasileira de Sinais nos anos de 2008 e 2015 no município do Natal para o cumprimento desse decreto (Dados da Secretaria Estadual de Educação, 2016).
A Resolução N. 004/2007 (Estabelece normas para o Sistema de Ensino do Município do Natal, em observância às disposições da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e da Lei 5.339 de 26 de dezembro de 2001 que dispõe sobre o Sistema de Ensino do Município do Natal e dá outras providências), no seu Capítulo IV- modalidade da Educação Especial- o munícipio reafirma as características linguísticas específicas dos surdos com a utilização da sua língua própria (LIBRAS) e ainda garante a inclusão de profissionais especializados nesta língua:
Art. 21 - A Rede Municipal de Ensino, de acordo com o disposto no Plano Nacional de Educação Especial / SEESP – MEC, garantirá aos educandos com deficiência, altas habilidades/ superdotação e transtornos globais:
I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos específicos para atender às suas necessidades, bem como profissionais habilitados - intérprete e instrutor de Língua Brasileira de Sinais / LIBRAS, para inclusão desses educandos;(...)
Tais profissionais foram definidos como necessários para uma educação dos surdos no ensino regular e no ensino bilíngue; são eles: professor bilíngue, professor e/ou instrutor de Libras e intérprete de Libras.
Mais de 10 após a primeira resolução que tratava sobre os NEE, a Resolução N. 05/2009 fixa normas relativas à educação das pessoas com necessidades educacionais especiais no Sistema de Ensino Municipal do Natal/RN. Seu texto revela-se bem mais encorpado e maduro em relação à inclusão dos alunos surdos na rede municipal de ensino. Isso também se deve a maior firmeza nos cumprimentos legais:
Art. 11 - Considerando as necessidades educacionais especiais dos educandos com surdez, no que tange à acessibilidade comunicativa, a Secretaria Municipal de Educação de Natal implantará, a partir de 2010, dez unidades de ensino regular, que se tornarão complexos bilíngues de referência para surdos, respaldadas na Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002 e no Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005.
Mesmo tendo as escolas regulares que incluem os alunos surdos e que devem adotar a política inclusiva e educacional conforme a Lei N. 10.436/02, esses complexos bilíngues tornam-se escolas específicas no atendimento desses alunos surdos, dando maior suporte e qualidade, de acordo com essa Resolução:
Art. 13 – Os complexos bilíngues de referência para surdos oferecerão o ensino em duas línguas: na língua portuguesa e na Língua de Sinais Brasileira-LIBRAS, de modo a garantir a acessibilidade do conhecimento curricular regular aos educandos surdos, cuja deficiência auditiva impede que os mesmos possam assimilá-lo por meio da modalidade oral da língua portuguesa, comum aos demais educandos que ouvem.
Art. 14 - Nos complexos bilíngues de referência para surdos a língua portuguesa será considerada como segunda língua para os educandos surdos e contarão obrigatoriamente com os serviços especializados do professor/instrutor de LIBRAS, para o ensino sistematizado desta língua e do professor/tradutor-intérprete de LIBRAS, que atuará na sala de aula regular na qual estiverem matriculados os educandos surdos. Esses professores, assim como ocorre com os demais professores da rede municipal de ensino de Natal serão contratados por concurso público.
Art. 15 - O professor/tradutor-intérprete e o professor/instrutor de LIBRAS que atuarem nas escolas bilíngues de referência para surdos, assumirão a responsabilidade formativa dos educandos surdos, conforme ocorre em relação aos demais professores, considerados regentes das disciplinas curriculares.
Para justificar a importância desses complexos bilíngues no município e as formas de aprendizagem das duas línguas (LIBRAS e português), citamos Amorin (1999), que explica que a metodologia de ensino de português deve ser diferenciada para alunos surdos, uma vez que possui diferença de modalidade de segunda língua, a modalidade oral-auditiva. Já a LIBRAS, primeira língua de comunicação na comunidade surda, possui modalidade espaço-visual.
Segundo o Departamento de Ensino Fundamental e a Secretaria Municipal de Educação, atualmente já estão em funcionamento os 10 (dez) complexos educacionais bilíngues, envolvendo cerca de 20 escolas de 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental.
De acordo com o último Boletim Estatístico do Senso Escolar da Secretaria Municipal de Educação de Natal de 2014, foram matriculados 59 alunos surdos e 73 alunos deficientes auditivos na educação especial. Por modalidade de ensino foram matriculados na Educação Infantil 4 alunos surdos e 2 deficientes auditivos; no Ensino Fundamental 50 alunos surdos e 66 deficientes auditivos; e no EJA (Educação de Jovens e Adultos) 5 alunos surdos e 5 deficientes auditivos.
Nos complexos bilíngues destaca-se a proposta de atuação de novos profissionais responsáveis pelo atendimento de alunos surdos: um professor especialista no ensino de português para surdos e um professor de Libras.
Além desses complexos, o ensino dos alunos surdos também ocorre nas escolas regulares, onde há dois momentos na educação dos surdos: a presença de um professor bilíngue no ensino infantil que é necessário e garantido por lei, e a presença do intérprete em Libras/Português para facilitar a aprendizagem do aluno surdo no ensino fundamental também necessária e garantida por lei.
O município do Natal parece ter despertado para uma política inclusiva dando uma importância a uma educação especial de um grupo especial, o de alunos surdos. Há uma convergência de entendimentos dos textos legais, no que diz respeito às finalidades da educação dos surdos, assim como na educação de forma geral, que é tida como passo fundamental para a formação do sujeito surdo, reconhecendo suas características linguísticas, permitindo sua comunicação e aprendizagem e, desta forma, garantindo sua cidadania.
A atual política nacional de inclusão escolar tem recebido severas críticas por não aprofundar as ações relativas às especificidades de seu alunado-alvo. Só que constatamos ao longo deste trabalho, que foram e são muitos os instrumentos normativos elaborados para dar proteção jurídica à inclusão educacional de alunos com surdez, dentro de perspectivas concretas de inclusão escolar e de desenvolvimento cognitivo e social.
Contudo além da inclusão do professor e/ou intérprete de Libras e a inclusão dos alunos surdos na escola regular, é preciso garantir uma proposta de trabalho educativa que contemple a diversidade linguística e a adaptação de recursos metodológicos em que os alunos surdos tenham a possibilidades de aprender os conteúdos e se desenvolver.
Os documentos analisados indicam a escolha de uma educação plural, entendendo que pessoas com surdez têm diversas necessidades e condições. Conhecer melhor essa proposta pode orientar novas políticas públicas atentas à condição bilíngue implicada na surdez. Cabe, então, acompanhar os efeitos da implementação de tal legislação a fim de compreender seus impactos sobre as práticas educacionais que envolvem alunos surdos.
Reconhece-se, portanto, que a vontade política, os esforços e a convicção de que a educação inclusiva, diante de inúmeras fragilidades que assolam o espaço escolar, é mais que um ideal, é um projeto a ser perseguido, conquistado a cada dia. Diante disto, pode-se ressaltar a importância da adesão de todos os segmentos ao paradigma inclusivo implica em vencer desafios que afetam a educação de todos.
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1. Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) E-mail: natavares1@gmail.com
2. Professor e Mestrando em Desenvolvimento Local da Universidade Católica Dom Bosco. UCDB E-mail: adriatto@outlook.com