Espacios. Vol. 37 (Nº 18) Año 2016. Pág. 1
Bruno Luiz AMÉRICO 1; Raiane Gonçalves de Oliveira MARTINELLI 2; Adonai José LACRUZ 3
Recibido: 28/02/16 • Aprobado: 14/03/2016
2 A literatura sobre parcerias multissetoriais: apresentação de campo
RESUMO: Nos Estudos Organizacionais muito foi pesquisado sobre colaboração dentro de um mesmo setor, mas, poucos trabalhos analisam parcerias entre diversos setores da economia. Assim, vem crescendo o número de estudos desenvolvidos sobre este tema. No que concerne os Estudos Organizacionais brasileiros, constata-se que são poucas as pesquisas desenvolvidas sobre parcerias multissetoriais. De tal modo, o objetivo geral deste artigo é colaborar com a ascendente discussão sobre parcerias multissetoriais no Brasil. Para tanto, com base em uma revisão sobre referenciais empírico e teórico relevante da literatura de parcerias multissetoriais, descrevem-se os principais conceitos e perspectivas deste campo de pesquisa científico em construção. |
ABSTRACT: In Organizational Studies much has been researched on collaboration within the same sector, but few studies analyze partnerships between various sectors of the economy. So it is increasing the number of studies conducted on this topic. Regarding the Brazilian organizational studies, it appears that few developed research on multi-sector partnerships. In this way, the objective of this article is to collaborate with the upward discussion of multisector partnerships in Brazil. Therefore, based on a review of relevant empirical and theoretical references from the literature of multisector partnerships, this study describes the main perspectives of this scientific research field under construction. |
O campo dos estudos sobre parcerias multissetoriais vem ganhando reconhecimento e difusão ao redor do globo muito recentemente. Afinal, conforme expõem Selsky e Parker (2005), há pouco mais do que vinte e cinco anos que os três principais setores da economia (negócios, governo e sociedade civil) colaboram frente a causas e temas sociais como educação, miséria, saúde, sustentabilidade, empreendedorismo, emprego, segurança. Na mesma direção dos autores supracitados, Reed e Reed (2009) atestam que nas últimas duas décadas houve uma proliferação de parcerias multissetoriais visando a promoção do desenvolvimento econômico e social.
Não obstante, Babiak e Thibault (2009) expõem que muito já foi estudado sobre colaboração dentro de um mesmo setor e sobre parcerias entre até dois setores. Para estas autoras, apesar da crescente importância das parcerias multissetoriais, permanecem insuficientes as pesquisas sobre este tema. James Austin (2000) também aponta que a maioria dos estudos organizacionais ainda insiste em analisar um único setor: o privado. Similarmente, Wymer e Samu (2003) sugerem que a grande maioria dos estudos organizacionais se dedica a estudar parcerias do tipo "corporação – corporação" que tenham como objetivo o desenvolvimento de novos produtos, mercados e/ou tecnologias.
Para que seja possível entender a gravidade do tema, uma rápida sondagem ao Google Scholar aponta que são apenas 675 trabalhos publicados sobre "multi-sector partnerships", enquanto 26.700 estudos sobre "business partnerships" encontram-se disponíveis para pesquisa. No que diz respeito às pesquisas organizacionais brasileiras sobre parcerias multissetoriais, a situação é ainda mais alarmante. O Google Scholar demonstra que apenas 14 estudos foram desenvolvidos tendo "parcerias multissetoriais" como temática. Na primeira página do Google Scholar apenas dois estudos organizacionais brasileiros analisam parcerias multissetoriais de maneira direta. Os outros artigos, publicados em revistas brasileiras e portuguesas de áreas distintas como pneumologia, psicologia, segurança, estudos críticos das ciências sociais e cardiologia, apenas fazem referência às parcerias entre setores diversos. Na página 2 do Google Scholar encontram-se quatro estudos dessemelhantes. Destes, três artigos se relacionam a partir de uma perspectiva organizacional com parcerias multissetoriais. Em destaque tem-se Medeiros (2009) do Programa de Pós-Graduação da Universidade de Brasília (UNB), citado por 30 artigos.
Considerando os outros artigos sobre parcerias multissetoriais acessados a partir da obra de Medeiros (2009), nossa rede de artigos pode ser expandida. E, seguindo a exploração no Google Scholar, redefinindo a busca sob o termo "parcerias tri-setoriais", outros 38 resultados apareceram. Mesmo assim, a partir desta analise iniciada por meio do Google Scholar, não foi possível rastrear um número significativo de produção acadêmica organizacional a respeito de parcerias com mais de dois setores da economia no Brasil. Portanto, é exequível afirmar que enquanto mundialmente cresce a importância (e o número de estudos) sobre parcerias multissetoriais, as pesquisas sobre o tema (mesmo que reconhecido como relevante) ainda engatinham nos Programas de Pós-Graduação em Administração no Brasil.
Assim, o objetivo geral deste artigo é colaborar com a ascendente discussão sobre parcerias multissetoriais no Brasil. Para tanto, a seguir, com base em uma revisão sobre referenciais empírico e teórico relevante da literatura de parcerias multissetoriais, os principais conceitos e perspectivas deste campo de pesquisa científico em construção são descritos: conteúdo dos textos, objetivos dos autores, tópicos teóricos abordados, resultados obtidos. Por último, apresentam-se as considerações finais que emergiram da análise comparada dos artigos, dando ênfase nas convergências e divergências entre os textos revisitados, bem como nos limites e possibilidades do tema e dos textos expostos.
Como sugere o estudo de Yakovleva e Alabasterb (2003), a questão multissetorial é urgente e deve ser entendida como uma demanda contemporânea para que o gerenciamento de temas sociais e ambientais – via processos de consulta pública, programas de desenvolvimento comunitário, financiamento de projetos de investimento social, fundações de empresas – seja eficiente. Outros autores, como Reed e Reed (2009), contrapõem a visão de que as parcerias multissetoriais são uma nova abordagem para engajar negócios, com a dos críticos para quem estas alianças entre diversos setores da economia são ineficientes e legitimam uma ordem econômica e neoliberal que inibe o desenvolvimento.
No embalo dos proponentes e críticos das parcerias entre Organizações, Governo e Sociedade, proliferam conceitos, perspectivas e práticas para trabalhar e pesquisar as parcerias multissetoriais. A construção de um quadro teórico homogêneo não é algo passível de ser alcançado – e tão pouco é o objetivo dos diversos estudos pesquisados – por autores que se relacionam e pesquisam parcerias multissetoriais. Mesmo apesar da fragmentação e heterogeneidade dos estudos de parcerias multissetoriais, as pesquisas visitadas por este presente artigo demonstram cientificidade e rigor, contribuindo para o crescimento e robustez do campo. Dessa forma, estes estudos diversos têm contribuído para a construção de um referencial sobre as parcerias multissetoriais, um campo de estudo científico e legitimo dos Estudos Organizacionais.
Um ponto comum em todos os estudos visitados é o entendimento de que é complexa a natureza das parcerias multissetoriais (BABIAK; THIBAULT, 2009; YAKOVLEVA; ALABASTERB, 2003; REED; REED, 2009). Gerir e administrar uma única organização que se relaciona e se associa com vistas a promover seus objetivos (lucro, bem-estar social ou desenvolvimento humano) não é tarefa fácil. Quanto mais uma associação complexa – sendo que complexidade é entendida como sequencias de tensões entre o geral e o particular (LAW; MOL, 2002) – entre organizações de diferentes setores com "valores gerenciais específicos, crenças, e expectativas" que, segundo Babiak e Thibault (2009, p. 120) podem até mesmo puxar uma organização sem fins lucrativos, para citar um exemplo, para direções potencialmente incompatíveis. Existe também o entendimento comum de que toda e qualquer parceria, seja ou não multissetorial, é competitiva e colaborativa ao mesmo tempo (BABIAK; THIBAULT, 2009; AUSTIN, 2000; KANTER, 1994; HUXHAM; VANGEN, 2000b).
São inúmeros os desafios que as parcerias multissetoriais impõem à gestão / administração contemporânea, seja pelas barreiras culturais existentes ou pelos diferentes objetivos das partes que compõem cada parceria. Pelo próprio desenvolvimento histórico de nossas sociedades, baseado em forte especialização dos fatores de produção e segmentação do consumo, para Babiak e Thibault (2009) os diferentes setores da nossa economia buscam alianças para superar recursos escassos, para reduzir a incerteza e para resolver problemas. Nesse sentido, as autoras reconhecem como importante notar a existência de um limiar muito frágil entre ganhar ou perder com a parceria. Babiak e Thibault (2009) consideram que o desafio que persiste para as parcerias multissetoriais é compreender o processo de trabalho entre atores múltiplos e heterogêneos – diferentes organizações, metas, objetivos, linguagens, culturas, papeis e relações de poder, além de marcada dicotomia competitiva – como colaborativa. Babiak e Thibault (2009), assim, não promovem uma discussão sobre evolução das parcerias multissetoriais, sobre os méritos e benefícios das parcerias, ou procuram contrapor caracterizações das parcerias como "demanda moderna". As autoras consideram apenas que organizações devem pensar diferentemente sobre suas parcerias frente a uma dependência cada vez maior sobre parceiros múltiplos de diferentes setores da economia. Na percepção de Babiak e Thibault (2009), devemos compreender as diferentes complexidades, dificuldades e conceitos encontrados nos distintos tipos de parcerias coletivamente.
Complexidade que foi explorada por Yakovleva e Alabasterb (2003) ao estudar a "natureza" de uma parceria trissetorial aplicada ao desenvolvimento comunitário no setor de mineração. Esta parceria multissetorial se dá entre ALROSA (companhia de mineração de diamantes), o Governo da República de Sakha (Yakutia), e o Fundo Target. Com base em explicações posteriores, será possível compreender que o Fundo Target foi precedido por outras duas fundações, bem como os motivos pelos quais os autores se referem a esta aliança como uma "jornada" que culminou em uma parceria bilateral entre ALROSA e o Governo de Yakutia, representado pelo (government-based) Fundo Target.
Para Yakovleva e Alabasterb (2003), parcerias multissetoriais é um movimento de responsabilidade social corporativa empurrado por stakeholders que, sistematicamente, cobram de organizações não apenas uma harmonia relacional com o meio no qual estão incertos, mas também o melhoramento das condições das comunidades e do ambiente no qual elas operam. Nesse sentido, os autores, com base nos entendimentos de Acquah (1994) e Davy (1999), apontam um melhor caminho ao afirmar que existe um consenso crescente de que o desenvolvimento sustentável deve envolver inputs construtivos das corporações, do governo e da sociedade civil. A fim de desbravar este "caminho", bem como entender suas "possibilidades", Yakovleva e Alabasterb (2003), autorizados pelo caso estudado, avaliam os aspectos de uma situação específica passível de ser estabelecida e operacionalizada pela abordagem trissetorial, a saber: as Fundações Corporativas (organizações sem fins lucrativos com objetivos filantrópicos gerenciada com fundos de corporações de maneira independente). Os autores procuram compreender a "natureza" de 4 Grupos de Fundações Corporativas – estabelecidas pelas 50 maiores companhias de mineração, pelas 10 maiores mineradoras de ouro, pelas 7 maiores mineradoras de diamante e pelas 20 maiores companhias extrativistas da Rússia – fundadas pela indústria da mineração: objetivos, modos de operação, áreas de financiamento e população atendida. Os autores contataram cada mineradora por e-mail ou fax (com exceção das companhias extrativistas Russas) questionando se estas constituíram uma Fundação e se poderiam acessar documentos públicos relacionados às respectivas Fundações (reporte atual da empresa doadora, da fundação e da comunidade interessada). E, uma vez que Yakovleva e Alabasterb (2003) também realizaram coleta em campo (documentos e entrevistas semiestruturadas) em visitas a República de Sakha de 1999-2001, é possível inferir que se refere a um estudo longitudinal com corte transversal. Dessa forma, Yakovleva e Alabasterb (2003) estruturaram uma tabela que demonstra a natureza das Fundações analisadas:
Tabela 1: Operações das Fundações Corporativas.
|
Fundações mineradoras (22%) |
Fundações de mineração de ouro (13%)
|
Fundações de mineração de diamantes (3%)
|
Fundações russas (6%)
|
Fundação SAPI
|
Fundo Target |
Ano de fundação |
|
|
|
|
|
|
1930-1950s |
30 |
0 |
0 |
0 |
|
|
1960-1980s |
20 |
30 |
33 |
0 |
|
|
1990-2000 |
50 |
70 |
66 |
100 |
√ |
√ |
|
100 |
100 |
100 |
100 |
|
|
Despesa |
|
|
|
|
|
|
Menos de 1 milhão USD |
45 |
15 |
66 |
- |
|
|
1-5 milhão USD |
23 |
30 |
33 |
- |
|
|
2-5 milhão USD |
4 |
8 |
0 |
- |
|
|
Mais de 20 milhões USD |
4 |
0 |
0 |
- |
√ |
√ |
|
100 |
100 |
100 |
- |
|
|
População-alvo principal |
|
|
|
|
|
|
Comunidades próximas às minas |
77 |
92 |
0 |
80 |
√ |
√ |
Comunidades regionais |
1 |
9 |
0 |
0 |
|
|
Comunidades nacionais |
1 |
0 |
100 |
20 |
|
|
Público Internacional |
1 |
0 |
0 |
0 |
|
|
|
100 |
100 |
100 |
100 |
|
|
Modo de operação |
|
|
|
|
|
|
Tomada de recursos |
55 |
92 |
100 |
16 |
|
|
Fundação operacional |
0 |
0 |
0 |
50 |
√ |
√ |
Modo combinado |
5 |
0 |
0 |
34 |
|
|
Desconhecido |
40 |
8 |
0 |
0 |
|
|
|
100 |
100 |
100 |
100 |
|
|
Áreas de financiamento (não adicionar até 100%) |
|
|
|
|
|
|
Desenvolvimento de negócios |
36 |
30 |
66 |
16 |
√ |
√ |
Comunidade |
60 |
23 |
100 |
50 |
√ |
√ |
Cultura, arte e esporte |
41 |
23 |
66 |
83 |
√ |
√ |
Desenvolvimento econômico |
18 |
8 |
33 |
0 |
√ |
√ |
Educação e formação |
82 |
70 |
66 |
50 |
√ |
√ |
Ambiente |
27 |
8 |
33 |
33 |
√ |
√ |
Saúde |
45 |
62 |
100 |
33 |
√ |
√ |
Criação de emprego |
9 |
23 |
33 |
0 |
√ |
√ |
Pesquisa |
14 |
15 |
33 |
50 |
√ |
√ |
Rural e agricultura |
9 |
23 |
0 |
0 |
√ |
√ |
Bem-estar social |
50 |
30 |
33 |
0 |
√ |
√ |
Mulheres e juventude |
18 |
15 |
66 |
16 |
√ |
√ |
Fonte: Yakovleva e Alabasterb (2003). Tradução nossa.
A fundação da empresa governamental ALROSA (Almazy Rossii – Sakha, ou, Diamante da Rússia e Sakha) em 1992, precedeu uma história marcada por disputas de interesses, territórios, valores, porcentagens e diversos danos socioambientais. Yakovleva e Alabasterb (2003) exploram o desenvolvimento comunitário na província a luz da transição econômica e política dentro do setor de mineração da Federação Russa. ALROSA, uma joint-stock venture, é obrigada a realizar pagamentos do tipo leasing para a recuperação de recursos minerais, pelo uso de recursos minerais, para um fundo ambiental, entre outros. Somente em 1993 foi fundada a Fundação SAPI pelo governo de Sakha para reabilitação de danos ambientais causados pela mina de diamantes e para melhoras socioambientais na província diamante. De 1993 a 1999 a Fundação SAPI evoluiu para uma ONG (organização não governamental) e, em 2000, o governo de Sakha criou o Fundo Target que substituiu a Fundação SAPI – passando a receber os recursos doados pela ALROSA. De tal modo, o artigo de Yakovleva e Alabasterb (2003) investiga uma tentativa inovadora de criar um novo mecanismo para resolver problemas sociais e ambientais em Yakutia por meio do estabelecimento da Fundação SAPI e, mais tarde, do Fundo Target. A estratégia de pesquisa utilizada por estes autores foi o estudo de caso sobre a referida iniciativa – de 1993 a 1999 (SAPI) e de 2001 (Target) – para melhorar as condições ambientais e para promover o desenvolvimento socioeconômico na província "Diamante" da Republica de Sakha (Yakutia), na Federação da Rússia. Os autores objetivaram, para tanto, avaliar a cooperação entre Governo, a Indústria de mineração de diamantes e ONGs no que diz respeito à promoção do crescimento econômico, desenvolvimento social e melhora ambiental na província diamante com base no modelo de parceria trissetorial de Davy (2001) e Hamann et al. (2001). Paralelamente, os autores avaliaram criticamente a natureza, estrutura, gerenciamento, investimento, accountability, planejamento e implantação de programas da Fundação Sapi e do Fundo Target utilizando os conceitos de "efetividade de ONGs" de Fowler (1998), Easterling e Csuti (1999) e Thayer e Fine (2001); e, de "avaliação de programas" de Pine et al. (1998) e Clarke e Dawson (1999).
Como foi possível averiguar na Tabela 1 disposta anteriormente, os autores compararam os dados do estudo de caso com companhias mineradoras, companhias mineradoras de diamantes e ouro, e companhias extrativistas russas – demonstrando o crescimento de Fundações Corporativas de indústrias da mineração a partir de 1990 ao redor do mundo. Outro resultado organizacional relevante do caso da Fundação SAPI e do Fundo Target é o acordo existente entre a mineira e o governo visando um financiamento de investimentos sociais com base em sua receita bruta, ao invés de um "certo montante" de dinheiro fixo ou condicionado ao lucro. Yakovleva e Alabasterb (2003) ainda apontam outras "particularidades organizacionais" de seu estudo de caso: (1) a Tabela 1 demonstra como são "largas" as Fundações do estudo de caso com relação às demais; (2) como indicado pelo modelo de parceria trissetor (DAVY, 2001; HAMANN et al., 2001), o corpo administrativo da Fundação SAPI incorporava além dos diretores das empresas doadoras, também os membros da comunidade local e/ou autoridades regionais – já o Fundo Target integra seus programas com Programas governamentais conforme indica o modelo de parceria trissetorial (implementação "profissional", avaliação e replicação em larga escala e sem duplicar custos); (3) o Fundo Target promoveu um maior controle governamental sobre os recursos como reflexo da falha da Fundação SAPI em promover accountability e transparência nos gastos – os problemas relativos à "boa governança" permanecem e, nesse sentido, o Fundo Target não pode se considerar uma verdadeira parceria trissetorial; (4) o estudo de caso demonstra um vasto número de programas e iniciativas por parte da Fundação SAPI e do Fundo Target em comparação com as demais Fundações estudadas; (5) a comunidade local é mais ampla nas Fundações do estudo de caso (toda a província diamante, e não apenas a comunidade local da Fundação); e, (6) as Fundações do estudo de caso planejam e implementam suas iniciativas, enquanto a maioria das demais Fundações da Tabela 1 financiam ONGs.
Como "falha principal" das Fundações do estudo de caso, Yakovleva e Alabasterb (2003) citam a ineficiência em abraçar as capacidades do Governo, Indústria e Sociedade Civil; contrariando sugestão do modelo de parceria trissetorial. Esta falha refere-se ao ponto "3" citado anteriormente, que trata da centralização governamental dos gastos "socioambientais" da mineradora russa de diamantes: "esta pesquisa sugere que o Fundo Target é um passo atrás das potencialidades das parcerias trissetoriais para uma parceria bilateral entre Governo e ALROSA" (YAKOVLEVA; ALABASTERB, 2003, p. 98,). Os autores igualmente abalizam que a ALROSA segue sem participar do processo de tomada de decisão sobre alocação da verba para atividades socioambientais, tal como se dava na época da Fundação SAPI. Yakovleva e Alabasterb (2003) inclusive questionam se a ALROSA não deveria ter um papel mais importante no processo além de financiar projetos para a comunidade local: responsabilidade social em distribuir e saber onde será reinvestido o dinheiro. Outrossim, o Fundo Target ignora os recursos complementários das organizações da sociedade civil que atualmente são apenas envolvidas por meio de editais de financiamento – como a maioria das outras mineradoras estudadas. Com base neste meio criado, falhas e inabilidades proliferam nesta atual parceria bilateral pela não incorporação e pela comunicação falha com stakeholders chave e pela falta de avaliação dos projetos que não são levados a uma discussão pública.
Para Reed e Reed (2009), que similarmente afirmam que as parcerias de negócios multissetoriais são uma realidade muito mais abstrusa do que é geralmente promovida, está complexidade passa pela integração de diferentes lógicas e racionalidades dos diferentes setores envolvidos, e também pelas desiguais relações de poder entre as partes da parceria. Para tanto, os autores questionam: como as parcerias de negócios podem contribuir efetivamente para o desenvolvimento considerando critérios econômicos e socioambientais? Para responder este questionamento, Reed e Reed (2009) consideram importante compreender o que envolve o conceito de desenvolvimento. Portanto, os autores elaboram quatro diferentes abordagens para "conceituar desenvolvimento" baseado nos critérios de Reed (2008).
Figura 1: Quatro abordagens para conceituar desenvolvimento.
Fonte: Desenvolvido pelos autores com base em Reed e Reed (2009).
Reed e Reed (2009) distinguem cada uma das quatro abordagens com base em três critérios: problema do desenvolvimento, justiça social, e agência. A tabela a continuação sumariza as quatro abordagens para conceituar desenvolvimento e cada um dos seus três critérios.
Tabela 2: Abordagens para conceituar desenvolvimento e seus critérios.
|
Problema do Desenvolvimento |
Justiça Social |
Agência |
Neoliberal |
Surge porque as instituições políticas exercem atividades que estão além de seu mandato. |
Concepção distributiva que envolve o mercado e a democracia liberal. |
O setor privado é o agente: motor do crescimento, gera riqueza, cria empregos e participa do controle da extensão do poder do Estado. |
Capacidades |
Abordar o que tem impedido os Estados, que são responsáveis por essa tarefa, garantir um mínimo decente que para tal é necessário |
O desenvolvimento é compreendido em termos de melhoria das capacidades individuais e da liberdade. |
Desenvolvimento da agência dos indivíduos que devem ter acesso a pacotes mínimos de bens. Em última instância, é responsabilidade do Estado garantir que as pessoas tenham acesso a esses pacotes. |
Face Humana |
Relações político-econômicas internacionais atuais se manifestam nas políticas das instituições globais. |
Este modelo deve distribuir direitos básicos à proteção social. Postula um papel para o governo. |
Exigências que os estados nacionais sejam proativos e autônomo para prosseguir políticas orientadas. Caracterizada por dependência de voluntarismo e apelo moral. |
Poder Social |
As relações desiguais de poder que se manifestam em instituições e práticas. |
Maior acesso a estas bases de poder social. Visam criar estruturas alternativas que promovam mais relações sociais igualitárias e reconfigurar as matrizes de poder social. |
Estados e instituições são vistos como espaços de poder que são principalmente impulsionados por interesses estruturais. |
Fonte: Elaborado pelos autores com base em Reed e Reed (2009).
Uma vez que Reed e Reed (2009) criam uma tipologia para compreender os diferentes conceitos de desenvolvimento, eles colocam outras questões fundamentais para os interesses deste ensaio teórico: O que são as parcerias para o desenvolvimento? Quais os interesses destas parcerias? Segundo Reed e Reed (2009), as duas questões estão interligadas. Isso por que as parcerias para o desenvolvimento buscam promover uma autorregulação dos negócios frente à economia internacional e, ao mesmo tempo, evitar instrumentos que regulem a ação das transnacionais no globo. Os autores apontam algumas das associações feitas com diferentes atores – Nações Unidas, atores não governamentais, firmas de todos os tamanhos, stakeholders – para promover este regime de autorregulação da economia por meio dos negócios. Contudo, os autores reconhecem que, mesmo frente a "complexidade" inerente às parcerias multissetoriais e ao seu processo histórico de constituição, uma vasta variedade de parcerias podem contribuir potencialmente ao desenvolvimento. Assim sendo, Reed e Reed (2009) avaliam diferentes tipos de parcerias multissetoriais para compreender suas formas básicas (diversidade), suas funções, suas condições de operacionalização, o engajamento das parcerias, o grau de controle social destas e as diferentes concepções de desenvolvimento. Os autores buscam compreender a agenda de globalização – diferentes concepções normativas de desenvolvimento e função como paradigma político no contexto de competição entre abordagens para regulação da economia internacional – por detrás de cada parceria multissetorial, bem como quem coordena e empurra esta agenda. Reed e Reed (2009) distinguem então quatro diferentes "tipos" de parcerias multissetoriais baseados em diferentes graus de controle social: negócios convencionais; responsabilidade social corporativa; accountability corporativa; e, economia social. Reed e Reed (2009) analisam parcerias multissetoriais e distinguem as mesmas objetivando identificar contribuições individuais de parcerias ao desenvolvimento e como diferentes tipos de parcerias funcionam como "paradigma político". Portanto, os autores estruturaram uma tabela (Tabela 3) sumarizando as principais características e aspectos das parcerias para o desenvolvimento.
Tabela 3: Principais características da Parceria no para desenvolvimento.
Características |
Atividades de Parcerias |
Setores-chave |
Condição para o Sucesso |
Benefício para os Parcerias de Negócios |
Parceria de negócios convencional |
*Núcleo de Negócios: Melhoria da eficiência |
*Infraestrutura: Água, eletricidade, comunicações, transportes |
*Bom clima para investimentos, preço total de custo, regulação eficaz: Independência, precificação ideal, redução da corrupção |
*Geração de receitas |
Parceria de responsabilidade social corporativa |
*Provisão de recursos: meios de subsistência, programas sociais, assistência humanitária, configuração da regra, códigos, certificado. |
*Vestuário e equipamento esportivos, setores de recursos, alimentação e agricultura, serviços financeiros |
*Situações vantajosas - Melhor alternativa - Competências - Dinâmicas de poder |
*Relações públicas *Oportunidades de marketing *Acesso a informações estratégicas |
Parcerias corporativa accountability |
*Configuração da regra: Certificado, transparência, relatando, evasão fiscal, atividades de entrada. |
*Vestuário e equipamento desportivo, setores de recursos: silvicultura, marinha, alimentação e agricultura. |
*Mobilização social, compensações de déficits de recursos, longo prazos e engajamento estratégico corporativo, apoio governamental e instituição pública. |
*Imagem de reforma, recrutamento e retenção, acesso aos mercados éticos, prêmio de preço. |
Parcerias da economia social |
*Provisão de recursos: desenvolvimento empresarial, configuração da regra, certificado. |
*Alimentação e agricultura, setores informais, infraestrutura. |
*Estruturas de apoio às empresas SE, desenvolvimento de redes, estratégia de engajamento corporativo, contato com os movimentos sociais |
*Missão principal, benefícios da rede. |
Fonte: Reed e Reed (2009). Tradução nossa.
Ao promover a classificação dos quatro tipos de parceria para a promoção do desenvolvimento social, que foram classificados com base nos diferentes graus de controle social, Reed e Reed (2009) contribuem com uma claridade conceitual sobre a natureza e a diversidade de parcerias, bem como sobre a contribuição potencial destas ao desenvolvimento. Cada uma das parcerias detalhadas na Tabela 3 é analisada pelos autores com base em estudos empíricos prévios: "a análise é primeiramente conceitual na natureza e heurística na tentativa, buscando promover uma base de informação para futuras pesquisas" (REED; REED, 2009, p. 13). Os autores se interessam por parcerias individuais com foco na compreensão em como os diferentes tipos de parcerias funcionam como paradigmas políticos: "a ênfase é menor sobre o impacto das parcerias individuais e suas contribuições para o desenvolvimento do que compatibilidades amplas entre as parcerias como paradigmas políticos e as várias concepções de desenvolvimento" (REED; REED, 2009, p. 26). Dessa forma, os autores oferecem de maneira integrada – ver Figura 2 – os diferentes tipos de parceria, suas abordagens para o desenvolvimento, e suas diferentes agendas de globalização.
Figura 2: Parceria e abordagens para o desenvolvimento e agendas de globalizações
Forma de parceria |
Negócios convencional
|
Responsabilidade social das empresas
|
Accountability Corporativo
|
Economia social |
Abordagem para o desenvolvimento
|
Neoliberal |
Recursos |
Face Humana |
Poder social |
Agenda da globalização |
Neoliberal |
Reincorporação do liberalismo |
Pós-nacional Keynesianismo |
Globalização alternativa |
Fonte: Reed e Reed (2009). Tradução nossa.
Reed e Reed (2009) no artigo descrevem e analisam o esquema disposto anteriormente confrontando opiniões e estudos de "críticos" e "defensores" de cada uma das formas de parcerias e de suas respectivas abordagens frente ao desenvolvimento da agenda de globalização. É importante ressaltar que, assim sendo, os autores inscrevem a modernização e o desenvolvimento como possibilidade, e não de forma restringida. Outro estudo relevante para tratar de complexidades, e de maneira similar de possibilidades, é o desenvolvido por Babiak e Thibault (2009). As autoras observam parcerias entre organizações de diferentes setores, bem como mudanças no nível organizacional associado com a interação de uma ONG (organização foco do estudo) com múltiplos setores. Em particular, o artigo estuda uma ONG canadense dentro do sistema de esporte nacional (que prove serviços para atletas e técnicos de nível olímpico), bem como seus numerosos parceiros no setor público, no terceiro setor, e setores comerciais. Visando desvelar os desafios inerentes às parcerias multissetoriais, Babiak e Thibault (2009) utilizaram uma abordagem qualitativa. O tratamento dos dados (analise de 110 documentos organizacionais analisados desde 1994 quando nasceu a ONG e entrevistas semiestruturadas para compreender as estratégias, interesses, percepções e expectativas dos participantes com respeito às parcerias) foi intermediado pelo software de análise de dados qualitativos ATLAS.ti. A Tabela 4 resume o número de informantes, o tipo de relação e o papel destes na parceria multissetorial. O objetivo geral das autoras é desvelar os desafios relacionados a fatores estratégicos e estruturais, duas categorias que emergiram como relevantes com base na analise dos dados no que diz respeito aos problemas enfrentados na parceria multissetorial estudada pelas autoras. Babiak e Thibault (2009) assinalam que os fatores estratégico e estrutural estão envolvidos em parcerias multi e entre setores da referida ONG do Canadá que trabalha com esporte para entender as mudanças a nível organizacional associadas com o desenvolvimento e manutenção de parcerias múltiplas entre setores. O foco das autoras é em compreender como estas mudanças são interpretadas e gerenciadas pelas pessoas envolvidas.
Tabela 4: O número de informantes, o tipo de relação e o papel destes na parceria multissetorial.
Função |
Entrevistas* |
Como relação é definida ou suportada |
Centro de Esportes Canadense: equipe ou conselho/diretoria |
7 (12) |
Responsável pela execução de programas ou serviços para atletas de alto rendimento elegíveis; gerenciar múltiplas parcerias intersetoriais. |
Parceiros governamentais |
2 (2) |
Objetivos ou interesses comuns – financeiros. |
Parceiros sem fins lucrativos |
15 (27) |
Programação e prestação de serviços; coordenação de serviços em todo país ou compartilhamento de recursos. |
Parceiros corporativos |
4 (8) |
Envolvimento comunitário/financeiro ou em espécie/gênero. |
* Os números entre parênteses refletem o número total de possíveis informantes ou organizações a partir das quais
foram selecionadas; por exemplo, 15 parceiros sem fins lucrativos foram entrevistados de 27 organizações
parceiras sem fins lucrativos no total.
Fonte: Babiak e Thibault (2009). Tradução nossa.
As conclusões e implicações apresentadas por Babiak e Thibault (2009) são práticas e teóricas. Ambas giram em torno da necessidade de compreensão da importância das categorias "estratégia" e "estrutura" das parcerias multissetoriais. Entre as descobertas feitas pelas autoras, é importante notar:
Por fim, Babiak e Thibault (2009) utilizam como referencial teórico para interpretar parcerias Oppen, Sack, e Wegener´s (2005). As autoras não demonstram preocupação com uma tipologia das parcerias organizacionais, elas "usam o termo genérico parceria para incluir diferentes formas de relações" (2009, p. 119). Todavia as autoras reconhecem que diferentes formas de parceria existem e que podem influenciar a dinâmica das parceiras. Em curto, com base em uma análise dos resultados da pesquisa, Babiak e Thibault (2009) apontam desafios nas áreas de estrutura (governança, papeis e responsabilidades) e estratégia (binarismo entre competição e colaboração entre parceiros frente a mudanças recorrentes).
Relações cada vez mais marcadas pela complexidade abalizam a existência das sociedades modernas. Relações heterogêneas permeiam relações humanas dentro das escolas, dos laboratórios, das corporações, das organizações não governamentais, das universidades; de aparelhamentos de variadas sortes. O mesmo ocorre com os grupos e com as nossas organizações contemporâneas. O nível organizacional, como foi possível ver, permanece cerceado por interesse, poder e política. Contudo, os tipos de relações foram diversificados a partir de uma lógica hodierna de mercado que demanda relações multissetoriais para compensar danos ambientais com contrapartidas sociais, e vice-versa. A natureza das relações segue intricada, e devido a esse fator que se optou por revisitar diferentes estudos de caso, entre diferentes setores da econômica que levaram a parcerias com "estruturas" e "estratégias" diversas, para compreender as novas associações geradas com a eminência das parcerias multissetoriais – desafios, oportunidades, convergências e divergências dos estudos de parcerias complexas.
É antigo o estudo de parcerias, redes e relações intra e interorganizacionais. Perspectivas econômicas e sociológicas diversas marcam uma disputa teórica e empírica sobre o tema: custos transacionais (WILLIAMSON, 1981; CHILES; MCMACKIN, 1996), redes (GRANOVETTER, 1973), a perspectiva do capital social (PUTNAM, 1995), entre inúmeras outras, são utilizadas na compreensão de relacionamentos organizacionais. Relações que ocorrem de diversas formas, como pudemos entender por meio do texto de Reed e Reed (2009). Ademais, estas relações podem tomar forma por meio de associações, agencias federal voluntarias, Joint Ventures, Joint Programs. Relações que podem ser estudadas com base em metodologias quantitativas, qualitativas, entre setores, longitudinalmente, teórica e empiricamente. Laços diáticos, múltiplos, horizontais, verticais, contratuais, sociais, políticos, marcam estas diversas relações inter e intra organizacionais. Os níveis de análise variam entre indivíduos, grupos de indivíduos, organizações, indústrias, mineradoras e societárias. A questão multissetorial, com base no exposto no decorrer deste artigo, não pode necessariamente ser considerada nova. Ela é marcada por habitar a exata região fronteiriça que todas as demais "parcerias" se encontram: entre a cooperação e o interesse, entre ajudar e controlar, entre habilitar e desconfiar, entre transparência e centralização, sempre buscando discursivamente a governança e a accountability.
É assim que Cindy Hardy e Nelson Phillips (1998) narram as parcerias entre setores dentro do sistema de refugiados do Reino Unido: uma forma de reduzir incertezas, de buscar recursos e resolver problemas, sendo, ao mesmo tempo, uma forma de explorar, reprimir, questionar práticas organizacionais, de criar relações desiguais de poder e de injustiça. Para estes autores, frente a relações heterogêneas o foco não recai sobre aspectos funcionais das parcerias. Mesmo por que uma visão estratégica de parcerias multissetoriais não deve apenas considerar a questão filosófica "colaborar ou não colaborar": Cindy e Nelson sugerem ser possível a colaboração, a observância, a contenção e a contestação. O foco dos autores é compreender quais parcerias são (ou não) colaborativas, mas sem necessariamente compreender colaboração como positivo e contestação como algo necessariamente negativo no processo de concepção, implementação e representação de parcerias multissetoriais. Afinal, como nos ensina o dualismo radical de Eduardo Viveiros de Castro (2012, p. 10), o que aparentemente pode ser compreendido como uma representação dual, e, para tanto, simplista da vida, não é nada além de uma forma de "multiplicidade mínima e não uma estrutura autossuficiente e fundamental – uma que seria inerente a realidade ou ao pensamento".
Para tanto, este presente ensaio teórico sugere ser importante superar a discussão dicotômica entre cooperação e contestação, funções e disfunções das parcerias. Faz-se importante considerar que a administração pública colaborativa, segundo McGuire (2006), é um conceito que descreve o processo de facilitar(ing) e operacionalizar(ing) em arranjos multiorganizacionais para remediar problemas que não podem ser resolvidos a contento por uma única organização. Colaboração ocorre por meio de uma rede de atores e é o processo de associação destes que deve ser compreendido. McGuire (2006) sustenta que a Gestão Colaborativa ocorre na prática da administração pública há algumas décadas: é historicamente real e concreto (conforme descrito pelo autor por meio do caso do Federalismo norte americano), e apenas recentemente vem ganhando importância e se consolidando como uma abordagem alternativa aos estudos de gestão colaborativa.
Ansell e Gash (2008), com base em uma metapesquisa que levantou 137 artigos teóricos e empíricos em inglês sobre Governança Cooperativa em diferentes áreas de políticas publicas, apontam que uma nova forma de governança emergente é capaz de substituir modos tradicionais de formulação e implantação de política publica. Para os autores, a Governança Colaborativa reúne stakeholders públicos e privados em fóruns coletivos com agencias públicas para levar a cabo processos de tomada de decisão consensual em grupo. A Governança Colaborativa permite, dessa forma, superar contingencias – tempo, confiança e interdependência – inerentes ao processo colaborativo entre diferentes setores. Consonante com o exposto no inicio destas considerações finais, Selsky e Parker (2005) apontam que a pesquisa organizacional utiliza de duas plataformas analíticas para estudar parcerias sociais: dependência de recursos (trata Cross-Sector Social Partnership (CSSPs) de maneira estreita, instrumental e no curto prazo) e temas sociais (parceria com foco no tema). Logo, os autores sugerem uma terceira plataforma analítica denominada societal sector (para os autores a principal contribuição desta revisão), encontrada fora da literatura organizacional para tratar de novas relações entre governo, negócios e a sociedade civil que extrapolam as fronteiras entre setores – governança hibrida (KLITGAARD; TREVERTON, 2003; KRAMER, 2000, apud SELSKY; PARKER, 2005).
Selsky e Parker (2005), na mesma direção de Ansell e Gash (2008), referem-se a uma nova plataforma analítica emergente e capaz de substituir modos tradicionais de formulação e implementação de política pública. Selsky e Parker (2005), em suma, sugerem que modelos institucionais e complexos aplicados à pesquisa de CSSPs podem desafiar os modelos prevalentes de entrada-saída. Os autores chamam atenção para aspectos negligenciados até então, como: temas micro como liderança em interfaces setoriais, análises entre culturas, métodos, poder, entre outros. Ou, conforme apontado por McGuire (2006), é importante identificar as habilidades e as pessoas certas para gerir o processo e para construir confiança em redes de cooperação. As variáveis críticas que influenciam a Governança Cooperativa, segundo Ansell e Gash (2008), envolvem não apenas temas macroestruturais (design institucional e diferenças entre recursos e poderes), mas também microssociais (liderança e participação de toda a sociedade interessada) e históricos (conflitos e cooperações entre as partes). Assim, com base no entendimento comparativo de todos os textos de maneira geral – conteúdo dos textos, objetivos dos autores, tópicos teóricos abordados e resultados obtidos – pode-se compreender a Governança Cooperativa como uma maneira de direcionar pesquisas emergentes sobre parcerias multissetoriais em direção à compreensão de processos que envolvem entendimentos compartilhados, o desenvolvimento de comprometimento e a construção da confiança em meio a uma rede de atores de indivíduos, objetos, problemas, temas, grupos e organizações.
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1. Doutorando em Administração (UFES). Mestre em Administração. Administrador. Bolsista - CAPES/DS. Email: brunolaa@hotmail.com
2. Mestranda em Administração (UFES). Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. Programa de Pós-Graduação em Administração. Email: raianemartinelli@gmail.com
3. Doutorando em Administração (UFES). Mestre em Economia. Administrador. Bolsista - CAPES/DS. Email: adonailacruz@uol.com.br
4. Os tipos de parceria identificados por Reed e Reed (2009) "superam outras tipologias insuficientes" na concepção dos autores, tais quais: a classificação empregada pelas Nações Unidas e a abordagem similar oferecida por Zadek e Radovich (2006).