Espacios. Vol. 37 (Nº 12) Año 2016. Pág. 21

A contribuição da responsabilidade social corporativa para a transição de um modelo de negócios sustentáveis – um ensaio teórico

The contribution of corporate social responsibility for the transition to a sustainable business model - A theoretical paper

Kátia C. de Araujo VASCONCELOS 1; Annor da SILVA JUNIOR 2

Recibido: 10/01/16 • Aprobado: 02/03/2016


Contenido

Introdução

1. As transformações no mundo dos negócios e a inserção do conceito de sustentabilidade

2. A evolução do conceito de RSC e sua contribuição para a transição de um modelo de negócios sustentáveis

3. Considerações finais

Referências


RESUMO:

O objetivo deste ensaio é o de apresentar os conceitos de sustentabilidade corporativa e responsabilidade social corporativa (RSC) identificando a evolução conceitual e a contribuição da RSC para a consolidação de um modelo de negócios sustentáveis. Embora presentes de forma intensa na literatura acadêmica e na prática empresarial, os temas não possuem consenso e são criticados pela imprecisão conceitual e superposição. Entretanto, as mudanças nos ambientes de negócios fizeram com que o debate quanto ao grau de responsabilidade social das organizações ganhasse cada vez mais importância e o que se argumenta neste ensaio é que a maior contribuição da RSC para a transição de um modelo de negócios sustentáveis esteja no fato de que sua adoção estimula um novo pensamento e formas de relacionamento das organizações com a sociedade.
Palavras chaves: Responsabilidade social corporativa, Sustentabilidade, negócios sustentáveis

ABSTRACT:

The objective of this paper is to present the concepts of corporate sustainability and corporate social responsibility (CSR) identifying the conceptual evolution and the CSR' contribution to the consolidation of a sustainable business model. Although present intensively in the academic literature and business practice, the subjects do not have consensus and are criticized for conceptual vagueness and overlap. However, changes in business environments have made the debate about the degree of corporate social responsibility gain increasing importance and what is argued is that the greatest contribution of CSR to the transition of a sustainable business model is the fact that its adoption stimulates new thinking and forms of relationships between organizations and society.
Key words: Corporate Social Responsibility, Sustainability, Sustainable Business

Introdução

O ambiente de negócios tem passado por profundas mudanças nos últimos tempos. A visão de racionalidade, de especialização, da busca pelo resultado com uma visão de curto prazo e em bases competitivas vem sendo questionada e cada vez mais observa-se exigências para a consolidação de um modelo de negócios que considere que as ações humanas devam estar atreladas às vertentes econômicas, sociais e ambientais, considerando a finitude de recursos, as gerações futuras e o equilíbrio entre crescimento econômico e benefícios sociais e ambientais. Esta visão, que busca a interseção e equilíbrio dos objetivos e resultados financeiros, sociais e ambientais, denominado de sustentabilidade, exige cada vez mais das empresas a interação com a sociedade e uma postura integradora entre as condições internas e externas às organizações. Esta temática é ainda extremamente nova para o ambiente de negócios e como tal, vem gerando tanto no mundo empresarial, como no acadêmico, muitas discussões, críticas, sobreposições dos conceitos e práticas envolvidas. Além disso, a transição para um modelo de negócios centrado na sustentabilidade traz em si uma profunda transformação na forma de pensar, nas relações de poder, na hierarquia e na cultura de relacionamento estabelecida nas organizações (VASCONCELOS et al, 2013).

Sendo assim, propõe-se discutir neste ensaio os conceitos de sustentabilidade corporativa e responsabilidade social corporativa (RSC) apresentando a evolução conceitual da RSC e a sua contribuição para a consolidação de um modelo de negócios sustentáveis. Entende-se que a contribuição deste ensaio está na possibilidade de, ao se estabelecer relações com diferentes pensamentos e promover reflexões sobre uma temática que ainda carece de amadurecimento teórico, ampliar este debate nos meios acadêmicos e empresariais, promovendo maior entendimento sobre o tema e a consequente adoção de práticas empresariais que caminhem na direção de uma transformação na forma de se fazer negócios. Desta forma, este ensaio, além da presente introdução, abordará a mudança no ambiente de negócios e a inserção do conceito de sustentabilidade, a evolução do conceito de RSC e sua contribuição para a transição de um modelo de negócios sustentáveis, além das considerações finais.

1. As transformações no mundo dos negócios e a inserção do conceito de sustentabilidade

É consenso entre diversos autores que o modelo econômico baseado em uma mentalidade cartesiana, sustentado pelo ciclo extração, produção e descarte e nos padrões de eficiência e eficácia que moldaram estilos de vida e garantiram o progresso da sociedade por muito tempo trouxeram efeitos colaterais ao planeta. Este debate teve início a partir da década de 50 com forte influência ambientalista e a partir da década de 80 de forma mais intensa com foco no desenvolvimento sustentável, enfatizando a necessidade de uma revisão nos padrões de desenvolvimento, onde o crescimento econômico, ao contrário da lógica do pensamento vigente, esteja apoiado na conservação e expansão da base de recursos naturais e o lucro, até então entendido como a parte principal do sistema econômico, ceda espaço para uma visão onde o planeta seja entendido como a parte principal do sistema e o lucro seja decorrente da forma como cuidamos do planeta (PENTEADO, 2003; HERRMANN, 2004; ALMEIDA, 2008; SACHS, 2008). O modelo econômico tradicional, que reforça o caráter linear, infinito e degenerativo do desenvolvimento, vem sendo substituído gradativamente pelo modelo de economia sustentável que implica no entendimento da circularidade dos processos e sistemas, da finitude dos recursos e de seu caráter regenerativo e inclusivo. Entretanto, por mais que o tema seja pauta constante nos debates, admite-se que pensar nesta perspectiva exige uma visão multidisciplinar e um enfrentamento para a necessidade de mudanças profundas na forma de fazer negócios (SENGE, 2009; VASCONCELOS et al, 2013).

O conceito de desenvolvimento sustentável entrou na agenda mundial de debates por meio da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU em 1983 para estudar e propor uma agenda global com objetivos de capacitar a humanidade para enfrentar os principais problemas ambientais do planeta e assegurar o progresso humano. Esta comissão divulgou o relatório que ficou conhecido como "Relatório Brundtland – Nosso futuro comum", publicado em 1987, e nele, "desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades" (CMMAD, 1991, p. 46). A premissa básica contida no documento é do reconhecimento da insustentabilidade econômica, social e ambiental do padrão de desenvolvimento das sociedades contemporâneas e a necessidade de se pensar nos limites deste desenvolvimento. Embora presente de forma intensa nos debates acadêmicos e empresariais, muitas críticas são realizadas a este conceito por se entender que ele é difícil de ser operacionalizado e com isso, ser questionável o potencial de viabilização e de mudança e por conter sobreposições de conceitos e estratégias (FERGUS; ROWNEY, 2005).

O termo sustentabilidade, foi apresentado por Elkington (1999), ainda na década de 80 e ficou conhecido como modelo do Triple bottom line. Ao propor o conceito, o autor preconizou a mudança social e a forma de se fazer negócios, a partir do entendimento de que as organizações precisavam medir o valor que geravam nas dimensões econômica, social e ambiental.

O conceito de sustentabilidade corporativa (SC), entendido a partir de uma mudança social, onde todos os problemas estão conectados por uma relação de causa e efeito, é, portanto, concebido, neste ensaio, como atividades empresariais que são voltadas para o desenvolvimento econômico, o desenvolvimento social equilibrado nos ecossistemas locais, para a modernidade e com vocação para o longo prazo, considerando as necessidades das gerações futuras ao assumir uma postura de cooperação em detrimento da competição (VASCONCELOS et al, 2013).

Percebe-se, que ao se introduzir esta nova concepção nos ambientes empresariais, que um longo e lento caminho vem sendo trilhado de forma a modificar o modelo de negócios vigente, mas, embora exista cada vez mais consenso social sobre as questões insustentáveis muito ainda se tem para discutir sobre o desenvolvimento sustentável e este novo modelo econômico (ALMEIDA, 2008). Assumir uma nova forma de fazer negócios a partir do entendimento dos impactos gerados no seu entorno exige das empresas o entendimento de seu papel no cenário social, uma visão e postura mais inter-relacionada, mais conectada e responsável pelos seus atos. Enfim, exige das empresas transformação na sua forma de administrar e de dar respostas às demandas sociais, econômicas e ambientais, saindo de um isolamento e auto centrismo, até então existente, para adentrar em um cenário social ainda desconhecido e pouco ocupado. Nos debates sobre o tema, autores alertam que as forças do mercado não podem sozinhas solucionar os problemas que assolam a humanidade e que esta visão de desenvolvimento sustentável demanda esforços conjuntos, na medida em que, combinar crescimento econômico a longo prazo, capitalismo e saúde ambiental e social não é uma tarefa simples (ELKINGTON, 1999; HERRMANN, 2004; SACHS, 2008).

As pressões de mercado e da sociedade vêm exigindo das empresas mudanças rápidas em seus posicionamentos, acarretando o surgimento de conflitos nos ambientes empresariais, tais como o da conciliação de interesses de curto prazo com a visão de longo prazo, o balanço de riscos e oportunidades frente ao mercado, assim como de repertório para as tomadas de decisões e de relacionamento com o mundo interno e externo às organizações. O que se observa é que as iniciativas empreendidas pelas organizações são ainda, em sua maioria, de caráter corretivo, reativas e pautadas no conceito de melhoria contínua. As ações têm se mostrado muitas vezes oportunistas e efêmeras, não resolvendo a causa, e somente reforçando a visão unidimensional e especializada, fazendo com que as organizações, ainda baseadas em um modelo de obtenção de resultados de curto prazo, convivam entre o discurso da mudança e a prática de continuidade, tornando-se alvo de muitas críticas.

Observa-se também, um desacordo entre os executivos quanto ao significado específico e as motivações para a sustentabilidade empresarial ou corporativa (HART; MILSTEIN, 2004; ALMEIDA, 2008; SACHS, 2008; SENGE, 2009; VASCONCELOS ET AL, 2013). Diante deste cenário de mudanças, assume-se neste ensaio a proposição teórica de que sustentabilidade é uma abordagem em transição (GEELS, 2011; MARKARD et al, 2012). Esta perspectiva teórica surge com o propósito de facilitar o entendimento de que ações complexas e modificações profundas são necessárias na sociedade, e que por isso, não podem simplesmente serem criadas ações que mantenham o status quo, mas sim que representem uma transformação na forma de pensar e de agir. Com isso, os autores defendem de que as organizações necessitam de iniciativas que ajudem na criação de novas lentes organizacionais, do surgimento de um pensamento coletivo e na efetivação desta nova forma de se fazer negócios considerando as diversas inter-relações, por meio de ações sistêmicas considerando as dimensões tecnológicas, culturais, socioculturais, institucionais, políticas e econômicas. Dentre as iniciativas que facilitam o processo de transição para sustentabilidade, os autores citam os esforços de modernização tecnológica, de participação pública e democratização, de movimentos governamentais e de responsabilidade social corporativa (HOPWOOD et al, 2005; GEELS, 2011; SMITH et al, 2010; MARKARD et al, 2012). Neste ensaio, escolheu-se a responsabilidade social corporativa (RSC) como objeto de discussão e que será foco na próxima seção.

2. A evolução do conceito de RSC e sua contribuição para a transição de um modelo de negócios sustentáveis.

Embora se aponte que o tema responsabilidade social esteja presente nas comunidades de negócios há bastante tempo, é possível identificar que a literatura formal sobre responsabilidade social ligada ao mundo dos negócios seja da década de 50, tendo sua popularização se dado na década de 60 nos Estados Unidos e Europa e no Brasil no final da década de 70 (CARROLL, 1999; ALVES,2003).

Carroll (1999), em seu estudo sobre a evolução do conceito de responsabilidade social, identificou que os primeiros escritos tratavam do aspecto da consciência social da responsabilidade dos homens de negócio muito centrado nos valores morais presentes à época na sociedade.  Alves (2003) destaca que a visão de responsabilidade social proposta por Bowen em 1950, além de refletir os valores morais da época, possuía um forte cunho religioso, tendo inclusive o livro sido patrocinado pelo Conselho Federal das Igrejas de Cristo da América. O autor aponta ainda, que é possível identificar nas ideias de Bowen um misto de obrigação e dever social e o reflexo ideológico da sociedade capitalista americana pós-guerra. Ou seja, o início da era moderna da responsabilidade social, conforme denomina Carroll (1999), é marcada pela preocupação com a doutrina da responsabilidade social.   A despeito das críticas existentes, a contribuição de Bowen influenciou os estudos seguintes o que faz com que ele seja considerado até os dias atuais o pai da responsabilidade social corporativa.

Na tentativa de formalizar o conceito de responsabilidade social corporativa, observa-se na década de 60 uma expansão na literatura sobre o tema e a proposição de conceitos que estabeleciam uma relação direta entre responsabilidade social, o poder empresarial e o poder social. Conforme aponta Carroll (1999), as contribuições de Keith Davis e William C. Frederick foram de grande valia para a época e continuaram influenciando para a consolidação dos estudos na área. Para estes autores, as decisões dos homens de negócios deveriam estar pautadas em razões que transcendessem os interesses econômicos e técnicos das empresas fazendo com que a geração de lucro estivesse associada com a contribuição de bem-estar social e econômico para a sociedade e que caberia as empresas medirem os efeitos de sua atuação sobre os ambientes que operam.  Em oposição a esta linha de pensamento, se tem a contribuição de Friedman (XXXX) que argumentava que as organizações deveriam estar orientadas para gerir recursos e promover crescimento, pois ao administrarem com eficiência, criando empregos, pagando impostos e gerindo de forma lucrativa, as empresas estariam agindo responsavelmente. Para o autor, aspectos econômicos e sociais não devem ser misturados sendo a questão ética da esfera da consciência individual e das leis que regem a sociedade. Ainda segundo o autor, as empresas não teriam competência para tratar da esfera social, ne medida em que não diz respeito ao seu core business (CARROLL, 1999; ALVES, 2001; GOMES; MORETTI, 2007).

Na década de 70 assiste-se a uma proliferação de estudos que propunham diferentes conceitos reforçando o que já vinha sendo discutido: a necessidade da empresa em reconhecer suas obrigações para com a sociedade, extrapolando as funções econômicas. É nesta época que se consolida a visão de que por meio da RSC as empresas podem maximizar seus lucros no longo prazo e a sua utilidade perante a sociedade. O grande marco de contribuição para a RSC surge nesta época, por meio do Comitê de Desenvolvimento Econômico que em 1971 publica um documento apontando que a finalidade básica de uma organização é servir construtivamente às necessidades da sociedade visando a sua satisfação. Este documento propunha o modelo de círculos concêntricos da responsabilidade social corporativa apresentando 3 níveis distintos de responsabilidade que vão da responsabilidade econômica, passando pela responsabilidade na melhoria das relações com os grupos de interesse, até o nível de melhoria das condições sociais da comunidade do entorno e da sociedade. É a partir daqui que se enfatiza cada vez mais o desempenho social corporativo e a capacidade das empresas de darem respostas suficientes às expectativas da sociedade (CARROLL, 1999). Diferente da proliferação dos anos 70, nos anos 80 observa-se o deslocamento da preocupação central de definição de conceitos para a tentativa de operacionalização da RSC. Carroll (1999) argumenta que é nesta época que surgem temas complementares que estimularam o processo de institucionalização da responsabilidade social, sendo os temas complementares mais relevantes, a responsividade, o desempenho social corporativo (CSP), política pública, ética nos negócios, cidadania corporativa e teoria dos stakeholders.

O argumento de que no conceito de responsabilidade social corporativa estão contempladas as expectativas éticas, legais, econômicas e discricionárias que a sociedade tem perante as organizações em determinado momento é apresentado por Carroll (1991), que sistematiza o conceito em uma pirâmide de responsabilidade social corporativa, onde considera que a responsabilidade econômica é base para os demais níveis de responsabilidade (legal, ética e humanitária) e que estas devem ser cumpridas de forma simultânea. Embora não tenha explicitado a responsabilidade ambiental, o autor argumenta que este nível se encontra subjacente nos níveis éticos e humanitários.  Este modelo piramidal, na visão do autor, foi muito mais uma tentativa de sistematizar graficamente do que adicionar qualquer elemento nos conceitos até então apresentados. Ainda para o autor, uma organização socialmente responsável é aquela cujo modelo de gestão se esforça para gerar lucros, cumprir com as obrigações legais, agir com ética e ter uma boa cidadania corporativa com diferentes grupos de interesse. Para Gomes e Moretti (2007), o modelo proposto por Carroll representa a prevalência de uma a ética empresarial sobre a ética social e é uma outra forma de reforçar que RSC é uma oportunidade de negócio. No meio empresarial, o conceito de RSC passa a ser operacionalizado no final da década de 90, a partir da formulação feita pelo Conselho Mundial para o Desenvolvimento Sustentável, contendo elementos de responsabilidade econômica, responsabilidade ética, responsabilidade filantrópica, responsabilidade com partes interessadas e com recursos ambientais e culturais e neste conceito observa-se também a mesma prevalência da ética empresarial.

Nesta evolução conceitual, é possível observar que as ideias inicias de obrigação, de dever social e de integridade moral presentes nos pressupostos de  Bowen vão sendo aperfeiçoadas na medida em que o capitalismo também vai se constituindo como teoria econômica, as discussões da ética no mundo dos negócios crescem, assim como crescem as preocupações com poder, equilíbrio nas relações internas e externas, regulações de mercado, questões ambientais, reputação empresarial, performance e criação de vantagem competitiva (ALVES, 2003; GOMES; MORETTI, 2007).  

É justamente na década de 90 que é possível observar que o conceito de RSC ganha maturidade e se consolida no entendimento de que é uma prática de gestão empresarial que, preocupada com os interesses de seus stakeholders, busca atender às expectativas de ordem econômica, social e ambiental incorporando estas características aos produtos e serviços, atuando de forma de ética visando alcançar sucesso em seus negócios, incluindo uma boa reputação. Observa-se a partir daí, tanto no meio acadêmico quanto empresarial o movimento de reconhecimento da RSC como uma prática estratégica na medida em que confere vantagem competitiva. Com esta visão a RSC passa a ser considerada como função do negócio, recebendo tratamento com o mesmo status da qualidade, da marca e dos produtos e normatizando padrões de relacionamentos entre diferentes atores sociais (HART; MILSTEIN, 2004; HERRMANN, 2004; MOON, 2007; SOUZA FILHO et al, 2010).

Nos estudos que defendem a vertente estratégica da RSC, encontram-se os argumentos de que a RSC, e de forma mais global  a sustentabilidade,  devem  ser consideradas uma vantagem competitiva e de geração de valor para todas as partes interessadas,  na medida em que suas ações, quando atreladas aos propósitos estratégicos das organizações,  criam melhoria na reputação e imagem, possibilitam maior motivação e consequente retenção de pessoas, a criação de projetos inovadores e eficientes que possibilitam um melhor desempenho econômico alinhada com estratégias de desempenho ambiental e social, assim como a melhoria na governança corporativa (HART; MILSTEIN, 2004; HERRMANN, 2004; MOON, 2007; SOUZA FILHO et al, 2010).

Esta vertente RSC tem sido defendida também pelos autores que argumentam que, enquanto aspecto estratégico, a RSC pode facilitar a efetivação do processo de mudança para um modelo de sustentabilidade na medida em que institucionaliza práticas responsáveis, trazendo oportunidades de convergência de ações, facilitando a construção deste novo contexto aumentando suas chances de sobrevivência, sendo entendida portanto, como um meio para o alcance da sustentabilidade (HART; MILSTEIN, 2004; EBNER;BAUMGARTNER, 2006; SCHULTZ; WEHMEIER, 2010; MARKARD et al, 2012; SILVA, 2014). Entretanto, embora esta vertente estratégica da RSC possibilite conciliar o conceito do triple botton line sem alterar os fundamentos do sistema econômico e forneça ferramentas de gestão apropriadas que concentra o foco nos fundamentos operacionais da RSC, sendo por isso, a visão predominante nos meios empresariais e nas escolas de negócios, observa-se que ainda há desafios nesta inserção na medida em que se observam discrepâncias na incorporação dos desafios às estratégias corporativas, bem como a interpretação da relevância desses desafios (HART; MILSTEIN, 2004; GOMES; MORETTI, 2007; BOECHAT;PARO, 2007)

3. Considerações finais

O objetivo deste ensaio foi apresentar os conceitos de sustentabilidade corporativa e responsabilidade social corporativa (RSC) identificando a evolução conceitual e a contribuição da RSC para a consolidação de um modelo de negócios sustentáveis. Com este propósito, e a partir das leituras, identificou-se que os temas, embora presentes de forma intensa na literatura acadêmica e na prática empresarial, não possuem consenso nem claro entendimento, sendo criticados pela imprecisão conceitual e superposição. Identificou-se ainda, que ao se discutir responsabilidade social corporativa duas linhas distintas são encontradas: a tradicional, que considera que a empresa ao focar no mercado e em sua responsabilidade de gerar lucro cumpre com seu papel e uma segunda, que estabelece um foco multidimensional englobando outras dimensões além da econômica. As profundas mudanças que o ambiente de negócios tem passado nos últimos tempos vem exigindo   das empresas uma maior interação com a sociedade e uma postura integradora entre as condições internas e externas o que fez com que o debate quanto ao grau de responsabilidade social das organizações ganhasse cada vez mais importância.

A sustentabilidade é um conceito complexo, que altera as formas de relacionamento entre a sociedade e as organizações, fazendo com que as empresas revejam seus padrões de pensamento e ação na forma de se fazer negócios, nas definições estratégicas, na tomada de decisão gerencial e de relacionamento com os diferentes ambientes. Essa complexidade não permite que o entendimento e a consequente adoção de novas práticas empresariais sejam equacionados por meio de uma única ação corporativa fazendo com que as empresas lancem mão de diferentes estratégias de atuação de forma a destacar os esforços para efetivar a transição para o modelo de negócios sustentáveis. O que se observa, é que dentre as estratégias, a RSC tem servido para sinalizar a preocupação das organizações em se adequar a este novo ambiente de negócios, mesmo que ainda com um caráter reativo.

Se no meio empresarial já há consensos sobre a contribuição estratégica da RSC, cabe destacar que no meio acadêmico é bastante discutido a utilização desta iniciativa, seja pela incapacidade das organizações de colocarem em prática, pela visão limitada do tema e pelo ocultamento das questões reais que atravessam uma organização, ou até mesmo pelo entendimento de que seja mais um modismo na área da Administração. É natural que, dependendo da linha epistemológica adotada, a definição e as proposições para a RSC sejam diferentes. Entretanto, a despeito das críticas quanto à postura ideológica, prescritiva e normativa da RSC, típica de um mundo empresarial funcionalista, reconhece-se neste ensaio que ter a responsabilidade social corporativa incorporada à estratégia de uma organização é uma contribuição para os esforços de transição para a sustentabilidade.

A RSC quando incorporada à estratégia de uma organização e refletidas em diferentes iniciativas no âmbito social, econômico, ambiental, ético e humanitário, permite a criação de pontes entre o lucro e as ações sociais, entre o mundo mecânico ainda tão presente nos modelos de negócios e o mundo orgânico e holístico que requer o entendimento da complexidade e de diferentes níveis de impacto,  e o incentivo para o olhar na face mais humana do mundo dos negócios,  além de ajudar a ver algumas das restrições e limitações do modelo econômico dominante até então, forçando a revisão da concepção de desenvolvimento e a criação de novas lentes organizacionais. Enfim, como aponta Blowfield (2005), talvez a maior contribuição da RSC para a transição de um modelo de negócios sustentáveis esteja no fato de que sua adoção estimula um novo pensamento e formas de relacionamento das organizações com a sociedade e que, mesmo que estejamos muito longe de encontrar soluções, estamos ao menos nos conscientizando da necessidade de novas formas de diálogo.

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1. Doutoranda em Administração – Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) – Brasil - katia.vasconcelos@oi.com.br
2. Professor dos programas de pós-graduação em Administração (PPGADM) e Ciências Contábeis (PPGCON) -  Universidade Federal do Espírito Santo – UFES – Brasil


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