Espacios. Vol. 37 (Nº 07) Año 2016. Pág. 20
Adriana Campelo GAMA 1; Carlos Alberto Figueiredo da SILVA 2
Recibido: 01/11/15 • Aprobado: 01/12/15
RESUMO: Este estudo é oferecido com o objetivo de compreender a percepção de profissionais de saúde sobre a participação do Profissional de Educação Física em uma instituição de reabilitação. Utilizou-se a observação participante e a entrevista semiestruturada para coletar os dados, cuja análise priorizou a abordagem qualitativa e o arcabouço da etnometodologia. A conclusão aponta para questões relacionadas à noção de membro, ao trabalho participativo e criativo, à interação no dia a dia entre os profissionais de educação física e os outros profissionais. |
ABSTRACT: This study is offered in order to understand the perception of health professionals on the participation of the Professional Physical Education at a physical rehabilitation facility. We used participant observation and semi-structured interviews to collect the data, the analysis of which prioritized the qualitative approach and the framework of ethnomethodology. We conclude by discussing issues related to membership notion, participatory and creative work, the interaction in everyday life between the physical education teachers and other professionals |
O aumento da expectativa de vida da população causou profundas mudanças no impacto que a saúde e a doença têm sobre a sociedade. Os profissionais deste campo têm grandes desafios para realizar seu trabalho devido à complexidade dos problemas que afligem a população no contexto atual.
Vários estudos preconizam que, nesta área, o trabalho em equipe tem sido o mais apropriado para assegurar uma atenção integral com a intenção de desenvolver a autonomia e a qualidade de vida do indivíduo (Anjos; Duarte, 2009; Ceccim; Feuerwerker, 2004; Costa; Enders; Menezes, 2008; Queiroz; Araújo, 2009; Neumann Et Al, 2010; Sargeant; Loney; Murphy, 2008; Sinclair; Lingard; Mohabeer, 2009; Souza; Loch, 2011).
A literatura menciona como fundamental a boa interação entre as diferentes áreas de conhecimento no trabalho em equipe multidisciplinar de saúde em prol de uma proposta de intervenção que não poderia ser produzida por nenhum profissional de forma isolada. Este tipo de trabalho não implica necessariamente a construção de um novo conhecimento, mas requer que o planejamento das ações seja compartilhado e que haja cooperação e colaboração entre os profissionais envolvidos (Kato; Blascovi-Assis, 2004; Sargeant; Loney; Murphy, 2008).
Diversos estudos também apontam a manutenção de uma comunicação contínua, que se tenha ciência do modelo filosófico da instituição onde atua, e clareza quanto aos objetivos e prioridades da equipe. Além disso, que se esteja consciente da contribuição individual, reconhecendo as interseções dos campos de atuação. Dentre os aspectos que podem prejudicar o bom andamento de uma equipe multidisciplinar estão a competitividade, a liderança inadequada, comunicação deficiente e excesso de importância à própria atuação (Sinclair; Lingard; Mohabeer, 2009; Queiroz; Araújo, 2009; Sargeant; Loney; Murphy, 2008).
É neste contexto que cresce o número de profissionais de educação física (PEF) envolvidos em equipes multidisciplinares de saúde, uma vez que a atividade física está associada à promoção da saúde. Um exemplo deste modelo de trabalho multidisciplinar é realizado em uma Instituição de Reabilitação para Pessoas com Deficiência, doravante denominada como IRPD, uma organização não governamental, localizada na cidade de Niterói, com o propósito de desenvolver ações que garantam e promovam os direitos das pessoas com deficiência física (PCD) utilizando o esporte como sua principal ferramenta.
Este estudo tem por objetivo compreender a percepção de profissionais de saúde que atuam na equipe do Programa de Reabilitação Integrada (PRI) da IRPD sobre a participação do PEF.
Acreditamos que a contribuição da educação física na melhoria da qualidade de vida e no cuidado integral do ser humano foi reconhecida, e que para melhor atuar para a promoção, prevenção e manutenção da saúde das PCD o trabalho em equipe multidisciplinar é indispensável (Cidade; Freitas, 2002; Kato; Blascovi-Assis, 2004; Almeida; Bang; Vieira, 2012; Carvalho; Marega, 2012).
O estudo realizado utilizou-se de uma abordagem qualitativa. Foi utilizado o arcabouço da etnometodologia (Silva; Votre, 2012).
Os sujeitos da pesquisa foram 10 profissionais com idade entre 23 e 53 anos, graduados há pelo menos um ano e que atuavam há pelo menos seis meses na IRPD. Para garantir o sigilo de suas identidades foram nomeados como: IRPD 01 até 10. O critério de inclusão na amostra foi a atuação no Programa de Reabilitação Integrada (PRI).
Observações foram realizadas durante as reuniões semanais, permitindo levantar informações relevantes para descrever o cenário profissional dos informantes, bem como o contexto de sua produção discursiva. Um diário de campo foi construído para registrar de forma não-estruturada os comportamentos. Além disso, também utilizamos a entrevista semiestruturada.
Demos início à pesquisa utilizando a observação. Desta forma, foi possível realizar uma exploração para identificar possíveis informantes para o estudo. A observação ocorreu em um período de nove meses.
Na primeira visita, nos foi apresentado o espaço físico da IRPD, construído num terreno em aclive. No primeiro plano ficam a academia, a biblioteca e a quadra de treino. Num segundo plano ficam a pista de atletismo e o campo de futebol de grama, num terceiro plano fica a piscina, a quadra oficial onde acontecem os eventos e o refeitório, e no último plano fica o alojamento, a clínica onde são feitos os atendimentos do setor da saúde, o auditório e os escritórios.
Todo o espaço foi construído de modo a promover a acessibilidade, para que a PCD possa ter autonomia dentro da associação, que também dispõe de um automóvel tipo van para transportar os pacientes para a clínica que fica no último patamar.
Todas as PCD são incentivadas a participar de uma atividade física, que depende de seu quadro clínico. A intenção é que depois de reabilitada, ela continue praticando a atividade física a fim de manter ou melhorar ainda mais a sua condição física.
O PRI é composto pelo setor de saúde, setor de serviço social, o setor de esportes e o setor de escolaridade. Nas reuniões de equipe são discutidos os casos dos pacientes. Participam praticamente todos os profissionais desse setor: médicos, fisioterapeutas, psicólogas, terapeuta ocupacional, nutricionista, fonoaudióloga e dentista. Também participa das reuniões a coordenadora do setor de esportes.
Todos os participantes do PRI passam por uma avaliação com a assistente social, a fisioterapeuta e a coordenadora do setor de esportes. Somente são aceitas no programa as PCD que tenham alguma capacidade de evolução, a mínima que seja.
Após o preenchimento de questionário de identificação do entrevistado, foi utilizado o roteiro de entrevista individual com os profissionais do setor da saúde.
Para maximizar a confiabilidade do estudo fizemos uma combinação dos dados coletados através da entrevista individual e da observação. A observação das reuniões de equipe teve o propósito de verificar a interação do PEF com o restante do grupo. O engajamento prolongado no campo também foi um recurso utilizado.
A presente pesquisa atendeu às exigências éticas e científicas fundamentais. Todos os sujeitos envolvidos preencheram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido manifestando a sua permissão à participação na mesma. O projeto da pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Salgado de Oliveira, e aprovado através do parecer 027/2012.
A observação iniciou-se num período um tanto conturbado na instituição. Alguns ajustes no atendimento estavam a se realizar e muitos profissionais se encontravam insatisfeitos, pois teriam de cortar pacientes que não se enquadravam no novo perfil estabelecido, mas que vinham recebendo atendimento.
A coordenadora do setor de esportes também demonstrou insatisfação, pois teria de acolher esses pacientes fora do perfil nas atividades desenvolvidas na academia. Porém, não há espaço nem material adequado para que esse trabalho seja desenvolvido de maneira satisfatória. Uma frase emblemática que ouvimos da coordenadora de que não vestia jaleco branco, e por isso não teria como receber essas pessoas que ainda estavam em fase de reabilitação.
O jaleco branco representa no imaginário de nossa sociedade a vestimenta do profissional que atua na área de saúde, quando avistado é relacionado à saúde, na maioria das vezes à classe profissional mais forte da área: os médicos.
Estar trajando o jaleco branco acompanhado do estetoscópio pendurado no pescoço, automaticamente remete ao imaginário a figura do médico. Esta associação é tão forte que pode até mesmo influenciar na medida da pressão arterial de uma pessoa (Adam; Galinsky, 2012).
Para a PEF que coordena o setor de esportes, o jaleco branco está associado à área da saúde, pois seus colegas de trabalho do setor o utilizam. Este fato foi um indício que nos sinalizou para algum descontentamento da profissional de Educação Física em relação àquele momento.
Apesar de o objetivo da IRPD ser promover a inclusão das pessoas com deficiência física na sociedade por meio do esporte adaptado, somente um PEF, a coordenadora, participa das reuniões do PRI e dos estudos de caso. No entanto, todos os outros profissionais de saúde participam das reuniões, inclusive os estagiários.
A justificativa dada é a dificuldade para acertar um horário favorável a todos os PEF que atuam na IRPD, pois a maioria também atua em outros locais. Deste modo, as informações das reuniões são repassadas aos demais profissionais do esporte pela coordenadora do setor.
Além disso, apesar de a educação física ter sido legitimada como uma das profissões da área da saúde em 1997, através da Resolução n° 287/97, os PEF que atuam na IRPD não integram a equipe de saúde e sim a equipe do setor de esportes.
Se o PEF tem um papel fundamental na equipe do PRI como foi relatado nas entrevistas, por que não é escolhido um horário e datas que permitam a participação de todos os envolvidos na reabilitação dos assistidos pela IRPD, inclusive os PEF?
O produto de cada pergunta nos permitiu a captação das ideias centrais de cada entrevista. A partir daí, reunimos as ideias centrais de todos os entrevistados e elaboramos um texto em primeira pessoa, para marcar a subjetividade do grupo (Lefèvre; Lefèvre, 2010).
A seguir, apresentamos as questões formuladas ao grupo de profissionais que atua no PRI, exceto os profissionais de Educação Física.
Apresentamos a seguir as categorias formadas a partir das ideias centrais captadas, a frequência das respostas e o percentual referente a cada ideia central. As ideias centrais relativas à primeira pergunta foram: a) complementar o trabalho/parceria, frequência 7 (46,66%); b) desenvolver o potencial, frequência 5 (37,50%); c) promover reabilitação, frequência 4 (25%).
Utilizando as ideias centrais contidas nos discursos individuais de cada profissional foi possível construir um texto na primeira pessoa, com partes dos diferentes discursos (Lefèvre; Lefèvre, 2010). Este discurso coletivo é apresentado entre colchetes.
Ideia Central: Complementar o Trabalho/Parceria
[O PEF tem um papel muito importante porque é um complemento. Para que a gente consiga alcançar os nossos objetivos dentro dessa visão da reabilitação como um todo, um acaba complementando o serviço do outro. A gente sempre inicia com a parte de reabilitação e busca sempre trabalhar junto pra poder favorecer o paciente. Eu acho que é complementação do serviço mesmo, eles (PEF) ajudam muito a gente na hora do estudo de caso também, a gente consegue ter uma troca muito grande, ele é um parceiro de trabalho. A gente vê muito como uma continuidade daqui da nossa reabilitação, pois após a reabilitação aqui em cima, na saúde, na fisioterapia, todos os pacientes são encaminhados pro condicionamento físico, pro esporte, e por isso o PEF é fundamental aqui na IRPD].
Com base nesses dados podemos inferir que para a maioria dos profissionais que atua na equipe do PRI o papel do PEF é complementar. Esta ideia está presente nas ideias centrais de sete dos dez profissionais entrevistados. Pelos relatos, há demarcação do espaço do PEF. Basicamente, aduzem que reabilitam a pessoa recém-lesionada, após essa reabilitação elas são inseridas num programa de atividade física, para condicionamento físico ou para competir num esporte.
Ser um complemento é fazer parte daquilo que estamos completando. Segundo o psicanalista Pichon-Riviére (2005), para que um grupo seja funcional, o princípio da complementaridade deve conduzir as relações de papéis desse grupo. Este princípio está relacionado com a cooperação, uma das características mais importantes para o trabalho em equipe.
Entretanto, uma ideia emblemática que surgiu nas entrevistas foi esta: "pois após a reabilitação aqui em cima, na saúde". Ou seja, a saúde é aqui em cima. Pelo relato podemos verificar que o PEF ainda não é percebido efetivamente como da saúde.
Ideia Central: Desenvolver o Potencial
[O PEF é muito importante, pois tá contribuindo pra evolução do paciente e também é um aliado na reabilitação, ele pode manter e aumentar o potencial de cada paciente. Após a alta da fisioterapia ou assim que a gente vê que o paciente tá apto a realizar atividade física, a gente já inicia um trabalho com os PEF pra fortalecimento muscular, pro condicionamento físico, pra ter um suporte de manutenção ou pra fazer adaptação pro esporte. Os PEF realizam todo o programa de treinamento após a reabilitação aqui em cima na saúde, fazem todo o trabalho de preparação, desde trabalho de força muscular, desempenho e rendimento. Um trabalho fundamental principalmente em relação aos casos clínicos dos atletas].
Reforça-se aqui também a ideia de que o PEF está em outro espaço, pois em cima é a saúde e o espaço dos PEF é o esporte, o treinamento, rendimento. A ideia pode ser em relação ao ambiente físico, mas contamina o discurso metafórico. A saúde é aqui em cima, e o esporte? Lá embaixo? Há uma distância física que perpassa os relatos, mas esta distância também se constata nas ações do cotidiano.
Ideia Central: Promover Reabilitação
[A gente entende que a reabilitação funciona como um todo, eu acho que o esporte é fundamental, uma forma de manter uma atividade física né, de tá mexendo com o corpo e tudo, e tá inserido né, nesse meio social em contato com outras pessoas, e sem o educador físico não tem como fazer o esporte e alcançar os nossos objetivos dentro dessa visão. Por isso nada melhor que o profissional de educação física para levar esses pacientes ao sucesso que é a reabilitação total].
Os profissionais relatam que essa melhora não se dá apenas no aspecto fisiológico e biológico, estendendo-se para a esfera social, uma vez que promove a interação, figurando como uma poderosa ferramenta para a reintegração da PCD à vida social.
Por meio da prática de uma atividade física ou de um esporte a PCD pode aumentar sua autoestima, ampliar seu círculo de amizades, e melhorar seu humor, obtendo uma melhora em sua qualidade de vida.
Apresentamos as ideias centrais, a frequência das respostas e o percentual referente a cada categoria relativas à segunda pergunta. As ideias centrais relativas à segunda pergunta foram: a) multidisciplinaridade, frequência 7 (43,75%); b) troca de conhecimento, frequência 5 (33,33%); c) união/integração, frequência 4 (26,67%).
Ideia Central: Multidisciplinaridade
[Excelente, excelente, a relação é muito boa. A gente faz um trabalho interdisciplinar, inter e multidisciplinar, trabalhamos sempre em equipe, sempre conversando. A gente tem uma troca muito boa, tanto o PEF para ajudar a gente na nossa reabilitação, como a gente pra ajudar na atividade física adaptada para eles, o pessoal da educação física vem esclarecer, perguntar sobre alguma patologia. A gente tá direto com eles (PEF) porque o foco daqui é a gente passar por todos os setores né, que é do programa de reabilitação integrada. A IRPD realiza um trabalho excelente, multidisciplinar, e a nossa relação é muito boa, é uma relação muito respeitosa, né, não tem interferência, pelo contrário é uma soma de trabalho, qualquer lesão os atletas sobem com cada técnico que relata o tipo de lesão, como ocorreu e a gente faz a nossa avaliação e reabilitamos pra ele voltar o mais rapidamente ao treinamento].
Infere-se que a relação do PEF com os outros membros da equipe envolve a multidisciplinaridade, o que vai ao encontro da literatura atual, pois vários estudos postulam que o trabalho em equipe multidisciplinar é fundamental para melhor intervir na questão da deficiência. Através da interação entre as diversas áreas de conhecimentos específicos será possível elaborar uma proposta de intervenção que não seria produzida por nenhuma área isoladamente (Kato; Blascovi-Assis, 2004; Sargeant; Loney; Murphy, 2009).
O discurso demonstra que trabalham baseados na cooperação e na colaboração, conforme dito por IRPD 02: "É uma relação muito respeitosa, né, não tem interferência, pelo contrário é uma soma de trabalho". Essa forma de produzir saúde - a articulação de profissionais - é considerada como uma estratégia básica na atenção à saúde também no Sistema Único de Saúde (SUS) (Costa; Enders; Menezes, 2008).
Ideia Central: Troca de Conhecimento
[A nossa relação é muito boa, a todo momento a gente tá trocando informações, estamos sempre complementando o trabalho entre os profissionais. Eles (PEF) passam as informações e a gente tá sempre em comunicação. Lá fora a gente vê uma disputa muito grande, então eu gostaria muito que a relação que a gente mantém aqui dentro da instituição fosse estendida lá prá fora, a soma de trabalho, a troca é muito importante].
Constata-se que o PEF participa ativamente da equipe, pois desde que a saúde passou a ser vista como um construto multifatorial faz-se necessário a troca de conhecimento entre os especialistas de diferentes grupos profissionais, buscando a resolução de um problema da melhor forma possível, o que provavelmente seria mais difícil se cada membro da equipe agisse de forma isolada (Ceccim; Feuerwerker, 2004; Oliveira; Moretti-Pires; Parente, 2011; Sinclair; Lingard; Mohabeer, 2009).
Ideia Central: União/Integração
[A equipe é muito unida, existe muito diálogo, está cada vez mais estreito o relacionamento. Todos os setores são altamente integrados, a gente tem um contato direto com os PEF. Eu vejo o PEF já parte da equipe de saúde, numa integração total pra poder prevenir as lesões, reabilitar num tempo o mais rápido possível pra não interferir nas competições].
As ideias centrais aqui nos remetem à noção de membro da etnometodologia, pois demonstram como o PEF é aceito e reconhecido pelos demais membros como um integrante da equipe, vejamos a fala de IRPD 07: "Agora eu vejo o profissional de educação física, o pessoal do esporte, já parte da equipe de saúde, assim, é, já tá bem integrado".
A PEF que participa das reuniões de equipe e dos estudos de caso consegue, sem dificuldade, preencher as lacunas induzidas pela indicialidade dos discursos através da busca de padrões de senso comum. Esta PEF possui claramente o domínio da linguagem natural do grupo, interagindo naturalmente com seus membros, mas não se pode afirmar isto dos outros PEF. Entretanto, os PEF são muitas vezes nomeados como o pessoal do esporte, transmitindo uma ideia de separação; há o pessoal da saúde e o pessoal do esporte.
Apesar de ter sido mencionado nos discursos que existe uma interação total entre os profissionais do setor da saúde e os PEF, na prática observamos que os PEF se limitam a ministrar suas aulas ou treinamentos sem muita interação com os demais profissionais que compõem a equipe do PRI. Por exemplo, cabe à coordenadora do setor repassar o que foi discutido nas reuniões aos demais PEF, pois só ela vai às reuniões.
Esta constatação é emblemática, visto que o discurso dos profissionais entrevistados (que não eram PEF) não é ratificado na prática. Os dados coletados na observação mostram que os PEF não atuam de forma efetiva, principalmente, nas reuniões que definem politicamente os rumos institucionais.
Constatamos que os termos indiciais mais utilizados pela equipe do PRI são caracterizados pelas siglas referentes às patologias que acometem as pessoas atendidas na IRPD. Esses termos são utilizados por todos os profissionais da equipe do PRI, inclusive pela coordenadora dos PEF, o que sugere que ela possui a linguagem natural do grupo.
Entretanto, tanto na atuação prática como nas reuniões, as falas dos informantes e as observações realizadas indicam que a linguagem natural do grupo não é partilhada pelos PEF. Aquele que possui a linguagem natural do grupo ouve e é ouvido. Nas trocas interativas do cotidiano é que se dá a construção do mundo social. Se os PEF não participam das reuniões e na prática se constatou que eles não trabalham de forma coparticipativa e cocriativa com os demais membros, como podemos concebê-los como membros do grupo?
Os profissionais entrevistados mostraram-se conscientes do mundo que constroem. A reflexividade é a capacidade que o indivíduo tem de descrever e construir a realidade, portanto, há no discurso dos entrevistados elementos que sinalizam a concepção de mundo que têm sobre o trabalho dos PEF. Para os entrevistados o trabalho dos PEF é complementar ao trabalho deles.
O conceito de relatabilidade está intimamente ligado à reflexividade, pois será através dos discursos (relatos) que os membros de um grupo vão descrever a sua realidade. Vejamos a fala de IRPD 01: "a gente, é, faz um trabalho multidisciplinar, então a gente tem reuniões semanais e a todo momento a gente tá trocando informações, estudando os casos dos pacientes...".
Encontramos a mesma ideia no discurso de IRPD 10: "Na equipe multidisciplinar todo profissional tem seu valor que é, a gente toda sexta-feira, exatamente hoje, nós temos uma reunião multidisciplinar".
A reunião é destacada como elemento fundante para o trabalho em equipe. Mas o que dizer dos PEF? Eles não participam! Ou seja, é a reunião o espaço onde as trocas verbais, as posições políticas, os ajustes são realizados, mas os PEF são representados por uma coordenadora que posteriormente faz o resumo do que se discutiu na reunião. O espaço de ação comunicativa não é assumido pelos PEF. Não existe um processo interativo pleno de construção daquele mundo social, pois os PEF estão de fora. Isto perpassa pelos discursos, mesmo que os entrevistados não o tenham explicitado.
O papel do PEF em uma equipe multidisciplinar é reconhecido pelos profissionais da equipe do PRI que foram entrevistados. Estes percebem o profissional de educação física como um aliado em seu processo de trabalho e acreditam que têm muito a aprender com ele.
A educação física é parte de um processo de reabilitação total, tem um papel fundamental na manutenção da saúde física, no desenvolvimento de potenciais e relações sociais. Atua em um momento de culminância de um processo de reabilitação física, psicológica e social, rumo ao sucesso na vida.
O conceito fundamental que caracteriza o pertencimento, a filiação, é a noção de membro. É membro de um grupo a pessoa que domina a sua linguagem natural seja ela gestual, comportamental, discursiva, corporal. Os relatos permitem-nos constatar que os PEF não são membros efetivos deste grupo. Desde a imagem do jaleco branco, a não participação dos PEF nas reuniões, o não trabalho coparticipativo e cocriativo, a falta de interação no dia a dia entre os PEF e os outros profissionais; enfim, a imagem que fica é a concepção de que o trabalho dos PEF é dissociado.
A constatação é a de que os PEF não interagem naturalmente com os outros membros. Se não houver assunção da competência para dizer o seu mundo social e participar de forma crítica para a sua construção compartilhada, esse espaço multidisciplinar de saúde carecerá ainda deste profissional fundamental exercendo sua atividade plenamente.
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1. MsC - Universidade Salgado de Oliveira, Rio de Janeiro, Brasil.
2. PhD - Universidade Salgado de Oliveira/Centro Universitário Augusto Motta, Rio de Janeiro, Brasil. ca.figueiredo@yahoo.com.br