Espacios. Vol. 37 (Nº 07) Año 2016. Pág. 16
Fernanda Soares Borges PERINELLI 1
Recibido: 29/10/15 • Aprobado: 15/11/15
1. Política: conceituação teórica.
RESUMO: Este artigo objetiva discutir o conceito de política. Termo que sugere complexidade, não pela articulação semântica da palavra, mas, pelo que ela tem representado na contemporaneidade. A política tem se revelado como uma das mais significativas expressões da identidade coletiva. Podendo um povo ser reconhecido, entre outros aspectos, pela sua maneira de assimilar e praticar a política. É certo que, desde a antiguidade filósofos e pensadores esforçam-se em entender as relações políticas que mediam a vida em sociedade e mesmo assim, este conceito ainda está em construção. Dado o fato de que, as sociedades se reinventam historicamente. Muitos níveis da realidade correspondem a uma necessidade cotidiana que não exprime especificamente a política. O que leva-nos a duvidar da natureza política do homem. Pois, nem todas as situações vividas pertencem à esfera do político. Ainda que nem tudo seja político, este pode apropriar-se de muitas realidades sociais que não possuem natureza política. Elementos individuais, privados ou mesmo coletivos podem ser transformados em recursos políticos. Os meios de comunicação, as artes, a literatura, a opinião pública, até mesmo a religião podem tornar - se dispositivos políticos em virtude de alguma situação. Neste sentido, buscamos uma leitura sobre o termo política. |
ABSTRACT: This article aims to discuss the concept of policy. Term that suggests complexity, not by semantic articulation of the word, but for what it has represented nowadays. The policy has proved to be one of the most significant expressions of collective identity. May a people be recognized, among other things, his way of assimilating and practicing politics. Admittedly, from ancient philosophers and thinkers strive to understand the political relations that mediate life in society and yet this concept is still under construction. Given the fact that the companies reinvent themselves historically. Many levels of reality correspond to an everyday need not specifically expresses the policy. Which leads us to doubt the man's political nature. Therefore, not all experienced situations belong to the political sphere. Although not everything is political, this can take ownership of many social realities that do not have a political nature. Individual, private or even collective elements can be transformed into political resources. The media, the arts, literature, public opinion, even religion can become - if politicians devices because of some situation. In this sense, we seek a reading of the term policy. Keywords: Politics. Participation. Collective identity |
Dos gregos antigos a contemporaneidade o termo política vem assumindo conotações diferentes. Atualmente o conceito de política é problematizado por diversos autores, mas, Campos (2014) ressalta que, em muitos destes o conceito não é claro: " alguns caracterizam a política como atividade que envolve "poder, governo e autoridade", para outros ela trata do estudo de atos/fenômenos que envolvem " valores autoritários" (Campos, 2014, p.15). Ainda assim, a concepção grega de política é bem aceita na atualidade. Para estes, a palavra pólis (politikós), referia-se à tudo que estava relacionado a cidade, o que é urbano, civil, público, e até mesmo sociável e social. (Bobbio, 1998).
Para Aristóteles (1991) "o homem, por natureza é, um animal político" ( p.11), de modo que, a política não nasce propriamente com a polis, nasce com homem. A vida social, ou o convívio em sociedade possibilitaria ao homem a oportunidade de se realizar como político. No entanto, para os gregos a política tinha uma natureza pública e estava diretamente relacionada às decisões da coletividade. Esta coletividade refere-se a uma maioria de cidadãos que, precedia as demais instituições e as individualidades, uma vez que, o coletivo está diretamente ligado à ideia de "partes", indivíduos, classes, famílias, grupos sociais que agrupados integram um todo e formam a "maioria". (Campos, 2014)
Hannah Arendt (1995) contesta Aristóteles, afirmando não ser o homem um animal político. Problematizando a tese aristotélica da natureza política do homem, ela postula que a política é imprescindível à condição humana, no entanto, não é inerente ao homem, a política não surge propriamente no homem e sim entre os homens, na "polis" ou no convívio social. Para esta autora, "a política é uma dimensão essencial da condição humana, algo que não pode ser dispensado sem que essa mesma condição se altere de forma irreparável" (ARENDT, 2006, p. 2000).
Para Arendt (2006), a política não é domínio, força e tão pouco violência, nem se baseia nas diferenças entre governantes e governados. E sim, no comum acordo, nas decisões conjuntas, na participação coletiva, no respeito à vida e a liberdade. Deste modo, política pressupõe participação e liberdade. Isto leva-nos a erguer os seguintes questionamentos: Existe compatibilidade entre política e liberdade? A política se limita ao Estado? Política, o que de fato significa?
A autora postula que "para as questões políticas, o problema da liberdade é crucial [...]"(ARENDT, 1992, p.191). A ação e a política, entre todas as capacidades e potencialidades que tangem a existência humana, "são as únicas coisas que não poderíamos conceber sem ao menos admitir a existência da liberdade" (ARENDT, 1992, p.191). A liberdade, segundo esta autora é a razão de ser da política, sua inexistência destitui a política de significado. No entanto, a experiência política do presente, ou mesmo a referencia política que permeia o ocidente desde a instauração da modernidade, instiga - nos a desacreditar na política como sinônimo de liberdade. Ora, o oposto parece mais óbvio! Estes dois elementos parecem divorciados.
"O Ascenso do totalitarismo, sua pretensão de ter subordinado todas as esferas da vida as exigências da política e seu consequente descaso pelos direitos civis, entre os quais, acima de tudo, os direitos a intimidade e a isenção da política, fazem nos duvidar não apenas da coincidência da política com a liberdade, como de sua própria compatibilidade". (ARENDT, 1992, p.195)
É fato, "Inclinamo-nos a crer que a liberdade começa onde a política termina" (ARENDT, 1992, p.195), isto por entender que os regimes autoritários, constantes durante o século XX, não só na Europa, mas também na América, especificamente nos países de consolidação capitalista tardia, os ditos países de terceiro mundo, que a exemplo do Brasil, também implantaram regimes totalitários, expurgaram da vida política o direito a liberdade. Nestes regimes, definitivamente a política não pode ser tida como sinônimo de liberdade. Diante disto, a nossa inclinação apolítica dá se, sobretudo, "por termos visto, a liberdade desaparecer sempre que as chamadas considerações políticas prevalecem sobre todo o restante" (ARENDT, 1992, p.195).
Arendt defende que a ação é o "domínio de experiência da liberdade" (ARENDT, 1992, p.198). O agir pode mudar o destino dos homens. De modo que "os homens são livres enquanto agem, nem antes, nem depois" (ARENDT, 1992, p.199). Nesta visão, o ser livre e o agir constituem a mesma coisa. As instituições políticas, não importa a origem, bem ou mal projetadas dependem de homens em ação, para que existam ou para que sejam mantidas. O individuo só é livre, quando as suas ações também são desprendidas. A relação entre política e liberdade esta presente no discurso de Arendt: "a liberdade como fato demonstrável e a política coincidem e são relacionadas uma a outra como dois lados de uma mesma matéria" (ARENDT, 1992, p.195). A liberdade tanto quanto a política só se manifesta no âmbito público. Neste sentido os gregos serão sempre referência para tratar estas questões. A política de fato, está relacionada à cidade ou a "polis". E a liberdade, salvo as divergências apresentadas, só se manifesta nesta mesma condição, na relação plural entre os indivíduos.
Percebe-se que, a política não está exclusivamente relacionada ao Estado, "tudo o que acontece nesse espaço de aparecimentos é político por definição, mesmo quando é um produto direto da ação" (ARENDT, 1992, p.2001). A política esta relacionada às relações humanas que permeiam o espaço público, sempre figurando ações conjuntas. Ainda que esta tentativa de relacionar à liberdade a política cause estranheza, é preciso lembrar que não podemos confundir a verdadeira política com o que seria o fim da política, lembra-nos bem Hannah Arendt. A liberdade justifica a política e sua ausência no processo pode significar a ruína dos agentes envolvidos, ou mesmo dos governos.
Gramsci (1978) define elementos centrais da política. "O primeiro é que existem realmente governantes e governados, dirigidos e dirigentes" (p.165), e nisto se baseia toda ciência política. Neste ponto, Gramsci e Arendh entram em desacordo, pois, a autora defende que a política não emana destas relações de poder. Embora elas existam, o verdadeiro sentido da política está relacionado à liberdade, as decisões e ações conjuntas e por isto não se fundamenta especificamente nas diferenças entre governantes e governados. Ela não desconsidera estas relações de força ou fraqueza, só acredita que estas relações deformam o real sentido de liberdade política. Já Gramsci, defende que estas relações existem e que justamente elas determinam toda a organização política.
A política, a seu ver, demanda uma relação de forças entre os que dirigem e os que são dirigidos. Posto isto, "ver-se-á como se pode dirigir da maneira mais eficaz (dado certos fins) e como, portanto, preparar do melhor modo os governantes". Colocado estes princípios crê-se que o problema central da política não esta propriamente na existência do Estado, e sim em quem dirigi - o. Daí a necessidade de pensar a formação dos dirigentes a partir de uma premissa de fundamental importância: "queremos que governantes e governados existam sempre ou queremos criar condições para que a necessidade dessa divisão desapareça?" Esta divisão "é inevitável ou é apenas um fato histórico que responde a determinadas condições?". (GRAMSCI, 2005. p.12)
Assim como Arendt, Gramsci também presume que política prevê participação ativa e eles pensam esta participação de maneira semelhante. Admitem que os sujeitos precisam assumir uma consciência coletiva política, fugindo assim do automatismo social e posicionando - se frente as diferentes situações vigentes. O que significa agir para fugir do comodismo. E neste sentido, a respostas paras as questões postuladas são obvias. A divisão do gênero humano não é inevitável é uma condição histórica que pode ser superada justamente pelo agir, que atribui sentido a política.
No pensamento arendtiano, "as massas existem em qualquer país e constituem a maioria das pessoas neutras e politicamente indiferentes, que nunca se filiam a partidos e raramente exercem o poder de voto" (Arendt,1989, p. 361). No caso do Brasil que, o voto é obrigatório, ainda podemos acrescentar a este grupo de apolíticos, os sujeitos que votam mecanicamente, por pura obrigação, mas são alheios e não atuantes no processo. Esta neutralidade é vista como problemática, uma vez que, opõe - se a participação ativa que deveria ser adotada pelos diferentes agentes e nas diferentes situações, ainda que nos governos autoritários. Então Arendt, vê este comportamento apolítico como negativo, e sugere que esta neutralidade contribui com surgimento de regimes ditatoriais na Europa, durante o século XX. Para Gramsci, estes apolíticos são desprovidos de consciência revolucionária. Arendt concorda! Salvo os motivos, ainda que por opção, os que não se posicionam politicamente, permitem os desdobramentos do poder do governo sobre a sociedade civil.
Em Gramsci, o partido é tido como um órgão fundamental para dirigir os grupos sociais, e a questão ativa perpassa pela ação do indivíduo, porém, a partir de um partir, um sindicato, o Estado, em síntese, de uma organização coletiva. De modo que, os agentes precisam se organizar em torno de um partido, por não ter uma consciência revolucionária, por isso à necessidade de intelectuais profissionais que possuem esta consciência, cujo papel é o de inculcá-la nos demais: "não se pode haver elaboração de dirigentes onde falta atividade teórica, doutrinária dos partidos, onde as razões de ser e as razoes de desenvolvimento da classe representada não são pesquisadas e estudadas." (GRAMSCI, 2005, p. 120).
O grande problema apontado pelo autor concentra-se na formação destes intelectuais, uma vez que, a maioria das universidades e instituições que preparam as capacidades intelectuais "formam quadros nacionais apolíticos, com formação mental puramente retórica, não nacional" (IDEM). Face a este pressuposto, cresce o numero de políticos despreparados para exercerem cargos públicos, a desagregação e a debilidade dos partidos que, desconhecendo sua verdadeira essência afunda-se em meio a oportunismos, "descontinuidade orgânica", e a incoerência entre a tática e estratégia.
Não só as instituições universitárias são responsáveis em preparar as lideranças políticas, o Estado/governo também é responsável por gerir algumas situações no sentido de fortalecer ou despolitizar os partidos. No caso Italiano, em alguns momentos o Estado apresentou-se ditador.
"O governo operou de fato como, um "partido", colocou-se acima dos partidos, não para harmonizar os interesses e as atividades nos quadros permanentes da vida e dos interesses estatais nacionais, mas, para desagregá-los, para afastá-los das massas e ter "uma força partido ligada ao governo por vínculos paternalistas do tipo bonapartista – cesarista"[...]. (GRAMSCI, 2005, p. 119)
Nesta citação Gramsci (2005), refere-se à ditadura instalada por três primeiros - ministros italianos Depretis ( 1876 - 1887), Crispi ( 1893) e Giolitti ( 1892 e 1893). Governantes que, de forma coercitiva apelaram por desagregar os partidos, com a finalidade de despolitizar a sociedade e instaurar um regime paternalista, antidemocrático. Isto está relacionado à cultura sujeição, conforme já discutimos com Campos (2014). E como vimos isto não é exclusividade europeia, no Brasil regeram-se esquemas semelhantes.
A questão é que nesta dinâmica "as classes exprimem os partidos, os partidos elaboram os homens de Estado e de Governo, os dirigentes da sociedade civil e sociedade política" (GRAMSCI, 2005, P.120). Nesta visão o poder político não está desvinculado do poder econômico, pois, "toda forma de poder político não pode ser historicamente concebida e justificada se não como aparato jurídico de um real poder econômico" (Gramsci, 2005: p. 85). Este poder é determinado por um ordenamento de relações de força em que alguns grupos tentam impor-se politicamente sobre outros, por meio da reprodução cotidiana de um capital que se aloja nas diversas conjunturas. No entanto, o autor expressa de forma clara o papel do Estado, no sentido de ser também um instrumento nas mãos da classe operária.
Serge Berstein (2003) está em acordo com Gramsci (2005), que a política demanda relações de poder, mediação partidária e participação ativa. E também com Arendt (1992), entre muitos aspectos, por entender que a política não é inerente ao homem.
É evidente que não se pode considerar o homem como sendo um animal político; sozinho ou em sociedade, ele sente necessidades e aspirações que lhe concernem diretamente, a ele mesmo ou a sua família e que se situam ao nível estrito da existência cotidiana. (BERSTEIN, 2003, p. 60)
Esta fala nitidamente desmonta a ideia de que todas as ações que, manifestam-se na sociedade, tida como espaço do aparecimento é político. Isto, dado o fato de que algumas ações são reflexos das necessidades cotidianas do homem. "A passagem destas aspirações e necessidades á expressão de um pensamento político não aparece de modo algum, como algo evidente, mas dá lugar a uma misteriosa alquimia que modifica a natureza do fenômeno". Isso considerando a existência de uma "realidade cotidiana" relacionada ao âmbito do concreto, do real vivido e o espaço do político vinculado à outra dinâmica, "a esfera do discurso e das representações especulativas". (BERSTEIN, 2003, p. 60)
E não há uma ponte natural entre o real vivido e o campo da política, "há uma distancia considerável, porque passamos então do campo do concreto para o do discurso que comporta uma expressão das ideias e linguagens codificadas" (BERSTEIN, 2003, p. 61). Na esfera do concreto é que surgem os problemas que dão origem a determinados projetos políticos. E é justamente neste espaço existente entre o concreto e o discurso que situa a mediação política, a cargo das forças políticas que, desempenham papel primordial, "articulando na linguagem que lhes é própria, as necessidades ou as aspirações mais ou menos confusas das populações". Na contemporaneidade os partidos são os principais mediadores neste processo, exibem a "maior ou menor fidelidade ao modelo que pretende exprimir" (BERSTEIN, 2003, p. 61).
A fala de Rémond (2003) complementa a de Berstein (2003). Na sua concepção o campo político não apresenta fronteiras naturais e nem fronteiras fixas delimitadas. "Se o político é uma construção abstrata assim como, o econômico e o social é também a coisa mais concreta com que todos se deparam na vida, algo que interfere na sua atividade profissional ou se imiscui na sua vida privada". (RÉMOND, 2003, p. 443). Os meios de comunicação, por exemplo, não são realidades propriamente políticas, mas eles podem tornar - se políticos, podem converter-se em instrumentos políticos. Em virtude das mais diversas situações, os meios de comunicação podem se tornar objetos ou veículos de reprodução dos discursos políticos.
Na dificuldade de explicar o que é a política e na impossibilidade de estabelecer seus limites, "somos levados a definições mais abstratas", das quais a mais constante está relacionada a reverencia ao poder. [2] (RÉMOND, 2003, p. 443 - 444) Assim, política passa a ser atividade relacionada à conquista, ao exercício e a prática do poder. E neste caso os partidos políticos tem por motivação chegar ao poder. "Mas, não a qualquer poder"!
Na sociedade global o Estado é apresentado como instrumento e símbolo da "nação", expressão maior de poder. A este dispositivo, "se reconhece o poder de decidir por todos, de impor a obediência às leis e o direito de punir as infrações", de regular a vida em sociedade. É este o poder almejado pelos partidos, como representantes e mediadores de alguns segmentos da sociedade. (RÉMOND, 2003, p. 444). A política tem mesmo relação direta com o Estado, entretanto não se limita a isto:
"ela se estende também ás coletividades territoriais e a outros setores por este movimento que ora dilata e ora encolhe o campo do político. Praticamente não há setor ou atividade que em algum momento da história, não tenha tido uma relação com o político: existe uma política para habitação, assim como, para a energia, a televisão é um investimento político, o sindicalismo intervém no campo das forças políticas". (RÉMOND, 2003, p. 444)
De fato, não existem fronteiras entre a esfera do cotidiano e universo do "político". Não existem margens que o delimite, que o contorne, ele comunica-se com muitos outros setores de atividades humanas, manifesta-se em outros domínios. Embora nem tudo seja político, as relações se afunilam em muitas situações. Ainda assim, seria reducionismo acreditar que tudo se conflui as dependências políticas. Seria inclusive "ingênuo acreditar que o político escapa das determinações externas, das pressões, das solicitações de toda espécie" ( Rémond, 2003, p.445). É preciso considerar que as decisões políticas resultam de variáveis que nem sempre são políticas.
Na discussão de Rémond (2003) a complexidade que envolve o termo "política" é problematizada. A política nem sempre determina os resultados, mas também seria exagero inferir que ela seja a todo instante, consequência de parâmetros que lhes são estranhos. É mais complexo ainda, os homens muitas vezes tomam partido que não coincide com seu status sócio profissional ou com a sua condição material. Ainda é preciso lembrar que, entre "os fatores que concorrem para moldar uma sociedade e influenciar o curso dos acontecimentos estão às instituições" ( RÉMOND, 2003, p.448). A política não segue uma lógica linear, pelo contrário é marcada por rupturas, por acontecimentos, eventos inesperados que vem a tona, quase que como acidente.
O acontecimento político "solda uma geração", é carregado de "afetividade positiva ou negativa" que marca e perpassa gerações convertendo-se em lembrança, em memória coletiva. Por isto mesmo, os acontecimentos políticos são fundadores das mentalidades. É certo que o político recapitula outros níveis da realidade e "é uma das expressões mais altas da identidade coletiva: um povo se exprime tanto pela sua maneira de conceber, de praticar, de viver a política, quanto por sua literatura, seu cinema e sua cozinha." Todos os comportamentos coletivos, incluindo a relação dos sujeitos com a política, revela-os, confere-lhes identidade.
Deste modo, "o comportamento político de um povo, não é um elemento comum, entre outros da paisagem política, é um poderoso revelador do ethos [3] de uma nação e do gênio de um povo". (RÉMOND, 2003, p. 450). Os eventos políticos ocorridos no Brasil em 1985-1989 imprimiram os comportamentos políticos individuais e coletivos daquela geração.
Considerar que a política pressupõe participação e que esta é um direito significa defender o envolvimento de agentes sociais nas principais decisões políticas. Movimentação feita mediante as ações individuais ou coletivas, por meio do voto, ou engajamento em movimentos sociais, partidos políticos, grupos corporativistas e sindicatos. A participação política está corelacionada as atitudes, as formas e processos, que orientam a participação dos indivíduos integrados em sociedade, em seus respectivos sistemas políticos. A participação caracteriza o envolvimento ativo dos sujeitos no sistema político. Manifestando-se de variadas maneiras.
O Estado moderno criado como gerenciador de interesses privilegiados de alguns grupos políticos que detinha também o poder econômico, arrasta-se até os dias de hoje como gerenciador destes mesmos interesses. O que tenciona os conflitos de classes e culmina em constantes crises políticas. Mas, não podemos simplesmente acreditar que tudo a todo instante acontece na sociedade, como manobra política das classes privilegiadas. Concordamos com Eric Hobasbawm : "simplesmente concluir de forma automática a vontade de cooptação e penetração real em uma manipulação, seria esquecer os agentes sociais, seus valores próprios e sua inserção nacional" (HOBASBAWM, 2005, p.163). Não são foram raros os momentos em que, os governos apresentaram incapacidade em conter o curso dos acontecimentos. Neste sentido, os desfechos políticos não se privam a História da "classe" política, e sim, na relação desta com o público.
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1. Pós Graduação - Mestrado em "Território e Expressões Culturais no Cerrado". Universidade Estadual de Goiás - UEG - Campus de Ciências Socioeconômicas e Humanas (CSEH), Anápolis – GO, Brasil. Email: feteccer.fe@gmail.com
2. Remond considera que, no século XX houve um abuso da noção de poder, desencadeando sua diluição e tudo passou a ser visto como relação de poder. Ler: REMOND, 2003, p. 444. Não objetivamos aqui discutir as noções de poder.
3. O termo de origem grega "ethos" no sentido empregado por Rémond (2003) está relacionado a hábitos comuns, valores, ética ou moral.