Espacios. Vol. 36 (Nº 23) Año 2015. Pág. 12

Setor Sucroenergético Brasileiro: Um estudo de prospecção tecnológica e inovação entre 1975 e 1985

Brazilian Sugarcane Sector: A study of prospecting technology and innovation between 1975 and 1985

Fabrício José PIACENTE 1; Vanessa de Cillos SILVA 2

Recibido: 10/08/15 • Aprobado: 12/10/2015


Contenido

1. Introdução e Objetivos

2. Revisão de Literatura

3. Metodologia

4. Resultados e Discussão

5. Considerações Finais

Referências


RESUMO:

O objetivo desse trabalho é elencar quantitativamente quais as principais inovações tecnológicas desenvolvidas no período de 1975-1985. A metodologia foi dividida em duas partes: pesquisa bibliográfica exploratória e busca de documentos de patentes do projeto LATIPAT depositadas no Brasil. Verificou-se que no período estudado houve uma disseminação de novos cultivares de cana-de-açúcar, desenvolvidos nacionalmente, e que colaboraram significativamente para a melhoria da produtividade agroindustrial das usinas. A busca no LATIPAT permitiu um levantamento e análise total de 251 documentos depositados, todos eles relacionados direta ou indiretamente com o desenvolvimento de inovações técnicas industriais para o setor.
Palavras-chave: agroindústria canavieira; Proálcool; inovações tecnológicas; patentes.

ABSTRACT:

The aim of this work is to list quantitatively what are the main technological innovations developed in the period 1975-1985. The methodology consists of two parts: exploratory literature search and research on patents deposited in Brazil related to the LATIPAT program. It was found that during the study period there was a spread of new varieties of sugar cane, developed nationally, and significantly contributed to improving the productivity of agro-industrial plants. The search LATIPAT allowed in a survey and analysis of 251 total deposited documents, all related directly or indirectly to the development of technical innovations for the industrial sector.
Key-words: sugarcane industry; Proálcool; technological innovations; patents

1. Introdução e Objetivos

A década de 1930 foi marcada por uma profunda crise na economia açucareira mundial e por inúmeros acordos com a finalidade de se estabilizar a produção mundial de açúcar. No Brasil, a crise internacional manifestou-se com menos intensidade, uma vez que nossa produção era voltada, basicamente, para o mercado interno e não sofria a concorrência com o açúcar de beterraba. No contexto doméstico, o problema internacional desencadeou uma crise de superprodução causada pela luta de produtores nacionais pelo domínio do mercado interno doméstico.

Como principal resposta o Estado brasileiro criou em 1931 a "Comissão de Defesa da Produção de Açúcar", com o objetivo de garantir o preço do produto no mercado doméstico através de estoques reguladores e da exportação de excedentes. Porém, foi a partir de 1933, sob um decreto federal, que a intervenção estatal no setor sucroalcooleiro nacional se fez oficialmente. Assim, foi fundado o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), uma entidade autárquica, com atribuições de planejamento e intervenções na economia do setor.

Quatro décadas após a fundação do IAA o país se vê diante de outra crise internacional sem precedentes: o primeiro choque do petróleo. Como resposta a ameaça de desabastecimento interno de combustíveis derivados do petróleo foi criado o Programa Nacional do Álcool (Proálcool). Teve, dentre outros, o objetivo principal de expandir a produção do álcool anidro para misturar com a gasolina e desenvolver tecnologias para ampliar a produção de álcool hidratado para ser consumido como combustível direto em um motor especialmente desenvolvido para esse fim. Desta forma, o país poderia substituir parte da gasolina importada pelo combustível nacional, diminuindo assim sua dependência externa.

O objetivo principal desse trabalho é elencar quantitativamente, a partir do advento do Proálcool e sob uma abordagem institucional regulatória por parte do Estado, quais as principais inovações tecnológicas desenvolvidas no período de 1975-1985, em especial: i) as industriais (ligadas ao setor de máquinas e equipamentos); ii) e as agrícolas (ligadas especificamente as novas variedades de cana-de-açúcar), com o intuito de satisfazer, mesmo que minimamente, os objetivos apontados inicialmente por esse Programa.

 

2. Revisão de Literatura

2.1 Referencial Teórico

A fim de compreender melhor esse processo de geração e apropriação de tecnologias no âmbito do Proálcool, verifica-se a necessidade de articular os conceitos neo-schumpeterianos de competitividade e inovação tecnológica com a dimensão político-institucional da relação Estado-agentes econômicos. Neste contexto, as abordagens de Labini (1980), Schumpeter (1961 e 1982) e dos neo-schumpeterianos – dentre eles Dosi (1984 e 2006), Nelson e Winter (1977 e 2005) e Malerba (2004) – configuram-se como ótimos contrapontos ao debate do desenvolvimento e da adoção tecnológica.

De maneira geral, nota-se que os conceitos propostos pelos neo-schumpeterianos explicitam a existência de um conjunto teórico que relaciona o regime de acumulação de capital, o padrão tecnológico da economia e o ambiente institucional. Assim, as instituições, incluindo o Estado, têm um importante papel na definição das diferentes trajetórias tecnológicas e de crescimento econômico adotado.

A literatura de economia institucional tem dado atenção ao conceito path dependence, que pode ser entendido como herança institucional do sistema, construída via processo de aprendizado tecnológico e institucional. Para North (1990) o conceito de path dependence ressalta a importância da trajetória histórica, ou seja, torna-se difícil compreender as escolhas atuais sem entender a evolução das instituições em períodos anteriores. Assim, as escolhas feitas no presente são influenciadas pela matriz institucional do passado e que tanto a tecnologia quanto as instituições tendem a seguir determinadas trajetórias historicamente construídas.

Nos modelos recentes (ROGERS, 1983; THIRTLE & RUTTAN, 1987; BIGGS, 1990; BELL & PAVITT, 1992), o processo de difusão de novas tecnologias é caracterizado não só pelo crescimento gradual de adoção destas pela população, mas também por seu caráter cumulativo. Neste sentido, a difusão é considerada interligada à inovação. Tais modelos se baseiam fundamentalmente na premissa de que uma inovação, depois de ser gerada, conhece, na fase de sua difusão, melhorias que facilitam sua adoção e seu uso em campos já existentes, assim como sua extensão a novas aplicações.

Quanto às formas de transmissão do conhecimento, existem duas: formal ou informal. A transmissão formal é padronizada e codificada, e sua difusão ocorre através de publicações, licenças, manuais e patentes. Para esta forma de transmissão do conhecimento a proximidade geográfica não tem muita importância. A transmissão informal é específica e tácita, e a difusão do conhecimento só ocorre através das pessoas, ensinamentos, treinamentos e aprendizado. Por ser informal, é muito mais sensível à distância (MALERBA & ORSENIGO, 1997).

A apropriação é um importante fator em inovação, dado que os resultados de pesquisas e as novas tecnologias têm frequentemente aspectos de bem público, pois os custos para torná-las disponíveis a vários usuários são baixos se comparados aos seus custos de desenvolvimento. Uma vez disseminada a inovação, não poderá mais ser vedado aos usuários seu acesso futuro. Nesses casos, a firma não pode captar todos os benefícios gerados pela inovação realizada, o que diminui o incentivo a investir nesse tipo de atividade. Assim, a capacidade de proteger inovações tem uma importante influência na atividade inovadora.

As condições de apropriabilidade de uma inovação, ou seja, da possibilidade de se manter o controle monopolista sobre essa tecnologia por um determinado período de tempo, é geralmente exercido pelo inovador por meio da propriedade intelectual sobre bens imateriais, principalmente por meio de patentes ou direitos autorais. Segundo Dosi (2006) uma tecnologia não protegida e facilmente imitável leva os rendimentos monopolistas de uma inovação à quase zero. Por outro lado, uma apropriação exclusiva e prolongada de direitos sobre inovações pode restringir a difusão do conhecimento. Isso ocorre não apenas porque o monopólio resulta em maiores custos para os usuários, mas principalmente pela pouca transparência técnica oferecida, o que inibe o processo de aprendizado interativo.

A apreciação teórica a respeito dos mecanismos de apropriação de novas tecnologias foi tratada por Scherer (1970, p. 123), que destacou o impacto das patentes sobre a estrutura industrial, por Bain (1956) que constatou que o sistema de patentes cria uma vantagem absoluta de custo e uma barreira à entrada de novas firmas e pela OCDE (1989) que abordou a questão dos acordos de licenciamento de patentes e seus riscos ao livre comércio.

Segundo INPI (2009), patente é um instrumento criado institucionalmente pelos governos como forma de disseminação do conhecimento para a sociedade. Trata-se de um título de propriedade temporária sobre uma invenção ou um modelo de utilidade, outorgado pelo Estado aos inventores ou autores ou outras pessoas físicas ou jurídicas detentoras de direitos sobre a criação. Em troca, o depositante da invenção se obriga a revelar, detalhadamente, todo o conteúdo técnico da matéria protegida pela patente.

O objetivo principal de um sistema legal de patentes é de estimular o progresso tecnológico e a invenção, permitindo ao inventor uma concessão do monopólio temporário de sua criação. Em todo o mundo, dezenas de bancos de dados com registros de patentes são disponibilizados periodicamente para consultas aos seus documentos. As buscas são feitas por categoria e os documentos são depositados com uma classificação internacional que permite sua identificação em diferentes áreas do conhecimento.

As pesquisas a bancos de patentes são realizadas com propósitos distintos: com a finalidade de buscar uma determinada solução tecnológica para um problema; como identificação do estado da arte; como base para o estudo de trajetórias tecnológicas; para formar indicadores para subsidiar políticas de ciência e tecnologia; entre outras.

De maneira geral, a análise da produção científica permite a caracterização das áreas de conhecimento e respectiva hierarquização das prioridades. Tal análise identifica trabalhos já produzidos e oferece diretrizes de investigações futuras. Trata-se também de uma das maneiras de se medir o desenvolvimento tecnológico de uma nação, estabelecendo uma relação direta entre o número de patentes concedidas nacionalmente entre diferentes países.

2.2 Referencial histórico analítico

O complexo produtivo sucroalcooleiro do Brasil, desde a sua instalação no período colonial, sempre foi objeto de regulamentações por parte do Estado. Notadamente na década de 1930, com o advento do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), o produtor açucareiro passou a se submeter a uma série de arranjos institucionais, vinculando os interesses do setor às esferas de decisão do Estado. Essa intervenção foi instaurada sob forte apelo dos próprios produtores devido à ameaça de ruína dessa economia em função da superprodução, da queda do preço doméstico e dos volumes de exportações, e da desorganização dos mercados internos (SZMRECSÁNYI, 1979, p. 169-170).

Dentre as medidas intervencionistas adotadas destaca-se o regime de quotas individuais para a produção de açúcar, com a finalidade dupla de regular o crescimento da produção, e de planejar e equilibrar as relações entre as diversas regiões produtoras do país (RAMOS, 1999).

Esses instrumentos utilizados pelo Estado para controlar o setor permitiram aos produtores de açúcar uma série de privilégios como garantia de mercado, de margem de lucro, concessão de subsídios, entre outros. Nota-se que, no período de intervenção, essas medidas reforçaram a rigidez do setor, impossibilitando o surgimento de um ambiente competitivo na agroindústria canavieira nacional. Fica claro entender que, esse ambiente controlado e sem competição interna, explica em parte, o baixo grau de importância da adoção do progresso técnico para a evolução de todo o complexo canavieiro do país.

O que vai de encontro com Galloway (1989, p. 96), que aponta que o modelo de produção açucareiro desde o período colonial nas Américas admitiu características fundamentais quanto à adoção por parte dos produtores de inovações técnicas. Para tanto, o autor apresenta três hipóteses para entender o processo de adoção dessas melhorias. A primeira hipótese é a de que as inovações possibilitaram aos produtores elevar seus ganhos líquidos, reduzindo perdas e tornando o processo de produção mais eficiente. A segunda destaca a escassez e o esgotamento dos recursos naturais disponíveis como motivador de soluções técnicas, sejam melhorias de processo ou permitindo a substituição de fatores de produção. A terceira, que a concorrência de mercado encorajou a adoção de inovações.

Assim, conforme posto, a presença intervencionista reguladora do Estado na agroindústria canavieira do Brasil a partir da década de 1930 derruba pelo menos duas das hipóteses fundamentais colocadas por Galloway (1989). A rigidez do setor com garantia de mercado através das quotas de produção fixadas desencoraja a adoção de inovações que possibilite elevar os índices de produção agroindustriais e a política de preços garantidos inibi a concorrência de mercado entre firmas.

Pesquisadores que analisaram a evolução da atividade canavieira no Brasil, destacam-se Eisenberg (1977), De Carli (1936), Ramos (1999), Szmrecsányi (1979), destacaram em seus trabalhos que, de maneira geral, os esforços de modernização com recursos próprios eram esporádicos e não retratavam o comportamento histórico dos proprietários canavieiros. A disponibilidade de terras abundantes, a mão-de-obra barata e a atitude conservadora dos empresários do setor se combinavam para uma atitude refratária à adoção de inovações tecnológicas.

Estes fatores negativos eram reforçados por oscilações de instabilidade no mercado internacional de açúcar e pelo fato de que grande parte dos produtores nacionais não dispunha de capitais para a modernização. Assim, observa-se que a predisposição à modernização tanto das lavouras, quando da indústria com recursos próprios era a exceção e não a regra. Isso explica em parte que, durante todo o período de intervenção, o Estado financiou e coordenou os programas de desenvolvimento e adoção de melhorias tecnológicas para o setor, preponderantemente através de institutos de pesquisas ligados a órgãos públicos.

3. Metodologia

A metodologia adotada para a construção do artigo teve como base o mapeamento de informações relevantes com a finalidade de identificar e elencar as inovações tecnológicas apresentadas entre os anos de 1975-1985. As informações coletadas com esse intuito envolveram necessariamente agentes privados, instituições de ensino e pesquisa, ações governamentais e outros que estão envolvidos especificamente com o desenvolvimento uma determinada tecnologia. Para tanto, a metodologia foi dividida basicamente em duas partes.

A primeira trata especificamente de uma pesquisa bibliográfica exploratória com a finalidade de identificar entre os anos de 1975-1985 a evolução da adoção (plantio) de novos cultivares de cana-de-açúcar desenvolvidos a partir do início da década de 1970 no âmbito do Programa Nacional de Melhoramento da Cana de Açúcar (PLANALSUCAR), do Programa de Racionalização da Agroindústria Canavieira (ambos de 1971) e do Programa de Apoio à Agroindústria Açucareira (1973), suas principais vantagens e influências nos resultados de produtividade agrícola e industrial [3]. A metodologia foi escolhida uma vez que o SNPC – Serviço Nacional de Proteção de Cultivares [4], que é o órgão competente no Brasil para a aplicação da lei e para acatar os pedidos de proteção de cultivares, ainda não operava e a propriedade intelectual de cultivares ainda não estava regulamentada e nem disseminada cientificamente.

Essa opção metodológica partiu de uma relação favorável entre a pesquisa e adoção de novas tecnologias para o setor sucroalcooleiro e o ambiente institucional criado pelo Proálcool. Fatos históricos vinculados a decisões tomadas anteriormente ao Proálcool tais como, a criação dos Programas já citados, podem ser entendidos como uma herança institucional do sistema, construída via processo de aprendizado tecnológico. O que justifica analisarmos nesse trabalho as pesquisas de novos cultivares de cana-de-açúcar desenvolvidas desde o início da década de 1970 e sua efetiva adoção entre 1975-1985.

Na segunda parte foi realizada uma busca no site do INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) na base de dados de patentes do projeto LATIPAT [5], verificando o número e a classificação dos principais documentos de patentes depositados no Brasil [6] durante os anos de 1975-1985, relacionados com as seguintes palavras chaves de interesse no título ou no resumo: cana-de-açúcar, cana de açúcar, etanol, etanol de cana, álcool, álcool de cana; e álcool combustível. O objetivo foi fazer uma varredura nos documentos de patentes encontrados e identificar através da Classificação Internacional de Patentes os que efetivamente estão relacionados com áreas de conhecimentos ligadas a: processos de produção; máquinas e equipamentos; e desenvolvimento de novos produtos para o setor sucroalcooleiro durante o período relacionado.

A escolha metodológica pela busca de documentos de patentes depositados entre 1975-1985 teve o objetivo de minimizar o efeito da defasagem temporal entre depósito e concessão da patente, problema esse que existe até hoje. Assim, apesar da dificuldade de se comprovar a relação direta entre os documentos depositados no período e o âmbito do Proálcool, que não é objeto desse trabalho, nota-se que o ambiente institucional proporcionado pelo Programa favoreceu diretamente as pesquisas e a adoção de novas tecnologias para o setor.

4. Resultados e Discussão

Com o objetivo de proporcionar um aumento na produção agrícola canavieira, o governo federal institui no início da década de 1970 o Programa Nacional de Melhoramento da Cana de Açúcar (PLANALSUCAR) e o Programa de Racionalização da Agroindústria Canavieira. Como efeito desses programas, na safra de 1971/72 o Brasil passou a ser o primeiro produtor mundial de açúcar centrifugado de cana, o segundo exportador mundial e o único país a possuir uma capacidade instalada de produzir o equivalente a 2 milhões de toneladas métricas de açúcar em uma única safra (MORAES, 2000, p. 58-59).

Segundo Azzi (1971, p. 26-27), o Programa Nacional de Melhoramento da Cana de Açúcar tinha a finalidade de ampliar a rede de Estações e Subestações Experimentais, promover o recrutamento e a capacitação das equipes técnicas e iniciar a utilização, pela indústria sucroalcooleira nacional, de variedades especializadas, com alto rendimento agrícola e industrial, de acordo com as particularidades locais, técnicas e econômicas de todas as zonas produtoras do país.

Até a introdução desse programa, a pesquisa com variedades de cana limitava-se as técnicas de adaptação de variedades importadas às condições edafoclimáticas das principais regiões canavieiras do país. Segundo Landell & Bressiani (2008, p. 105-107), entre as décadas de 1950 e 1960, as cultivares de cana-de-açúcar em plantio no Brasil eram basicamente das siglas Co (Co 419, Co 421, Co 740 e Co 775); CB (CB45-3, CB41-76); e IAC (IAC48-65, IAC51-205, IAC52-150).

No início da década de 1970, as variedades predominantemente plantadas no Brasil eram as CB45-76 e NA56-79. A primeira foi desenvolvida em Campos - RJ (daí a nomenclatura CB) por Frederico Menezes Veiga como resposta ao surto de carvão, uma espécie de fungo, que atacou os canaviais do país, principalmente as variedades Co e POJ (de Coimbatore na Índia e as da Ilha de Java, respectivamente). A segunda foi desenvolvida para as condições de plantio e cultivo no norte da Argentina e disseminada no país a partir de iniciativas do IAC (Instituto Agronômico de Campinas) e do PLANALSUCAR (NUNES, 1987, p. 188-189).

A partir da metade da década de 1970, o Estado de São Paulo assumiu a liderança na produção e na tecnologia de novas variedades de cana de açúcar. Desenvolveram-se neste Estado os três principais programas de melhoramento genético da cana, os quais proporcionaram novas opções de plantio para produtores de todo o país, através das variedades denominadas de: IAC (Instituto Agronômico de Campinas); RB (PLANALSUCAR) [7]; e SP (COPERSUCAR).

Nota-se na TABELA 1 que na safra de 1977 em torno de 648 mil ha de cana-de-açúcar eram originados de variedades estrangeiras, o que representava aproximadamente 31% de toda a cana plantada no país. Em São Paulo, para a mesma safra, dentre as variedades importadas, apenas a argentina NA56-79 era relativamente difundida, representando cerca de 20% dos canaviais.

Tabela 1 – Participação percentual das principais variedades de cana-de-açúcar
plantadas no Brasil e no Estado de São Paulo – período de 1977

Brasil

São Paulo

Variedade

Área (ha)

% total

Variedade

Área (ha)

% total

CB45-3

548.495

26,4

CB41-76

344.320

32,7

CB41-76

386.701

18,6

NA56-79

209.567

19,9

Co331

328.953

15,8

IAC52-150

63.659

6,1

NA56-79

241.931

11,6

IAC48-65

45.048

4,3

CP51-221

77.624

3,8

CB49-260

41.750

3,4

IAC52-150

65.032

3,2

CB47-355

38.567

3,7

CB47-89

55.404

2,6

IAC51-205

32.184

3,1

IAC48-65

45.715

2,2

CB46-47

31.134

2,9

Fonte: Relatório Anual do PLANALSUCAR (1977)
 Nota: 1 No final da década de 40 foram introduzidas no Brasil as variedades CP (Canal Point) da Flórida-EUA

Observa-se, a partir do final da década de 1970 uma substituição considerável de variedades de cana-de-açúcar, até então disseminadas, pelas desenvolvidas mais recentemente e que apresentam vantagem comparativa, principalmente em função do seu tempo de degenerância ou por necessidade de aumento de produção. Em São Paulo, esse movimento foi mais agudo. Nota-se na TABELA 2 que houve uma substituição considerável dos canaviais da variedade CB41-76 pela NA56-79. Segundo Nunes (1987, p. 191), especialmente em São Paulo, observou-se entre a segunda metade da década de 1970 e a primeira de 1980, um crescimento ao redor de 10% na produção agrícola que passaram de 55 t/ha para uma média estadual em torno de 60 t/ha.

Tabela 2 – Evolução comparada em percentual da participação das diferentes variedades de cana plantadas durante os anos de 1977-1985 no Brasil

Variedade

1977

1979

1980

1981

1982

1983

1985

CB45-3

26,4

25,96

25,27

23,3

22,22

20,59

21,43

CB41-76

18,6

14,2

11,8

9,91

7,62

5,97

2,79

Co331

15,8

12,9

11,16

9,18

7,98

7,96

5,16

NA56-79

11,6

14,26

18,23

22,5

26,16

28,61

27,72

CP51-221

3,8

3,16

2,79

3,5

4,57

4,55

4,74

IAC52-150

3,2

3,53

4,31

4,8

4,76

4,73

3,29

CB47-89

2,6

2,42

1,97

2,26

2,19

2,1

0,49

IAC48-65

2,2

2,25

2,41

2,51

2,08

2,18

1,31

RB70194

-

-

0,81

1,4

1,47

1,36

0,94

RB70141

-

-

-

0,38

0,45

0,41

-

SP70-1143

-

-

-

-

1,51

3,33

8,87

SP70-1078

-

-

-

-

-

0,46

1,11

SP71-1406

-

-

-

-

-

-

1,12

Fonte: Relatório Anual do PLANALSUCAR (1977 a 1985).
Nota: 1 No final da década de 1940 foram introduzidas no Brasil as variedades CP (Canal Point) da Flórida-EUA.

Conforme NUNES (1987, p. 193), o rendimento industrial paulista também apresentou um incremento a partir de 1975, à razão de 2,2 kg de açúcar por tonelada de cana, por ano. Apesar da melhoria na maquinaria e nas etapas de processamento da cana da usina, o autor aponta a melhoria genética que introduziu novas variedades mais produtivas como o principal responsável pelo ganho, dentre elas destaca a NA56-79 e a rápida disseminação das recém-introduzidas variedades SP, em especial a SP70-1143.

Analisando a TABELA 2 nota-se, comparativamente, entre os anos de 1977 e 1985 que as principais variedades no início desse período, de nomenclatura CB, IAC e Co perderam importância relativa para as variedades mais modernas, principalmente a NA56-79. As variedades desenvolvidas pelo PLANALSUCAR (RB) a partir da metade da década de 1970 passam a ganhar importância no cenário nacional no início da década de 1980, juntamente com as novas variedades introduzidas pela COPERSUCAR (SP).

De maneira geral, entre o período analisado as variedades de cana-de-açúcar importadas reduziram sua participação relativa no montante de toda a produção nacional de aproximadamente 53% em 1977 para algo em torno de 41% em 1985, o que equivale a uma redução média anual da ordem de 1,5%. Essa redução não foi ainda mais significativa em função da variedade NA56-79 ter apresentado, durante o período analisado, um excelente desempenho a ponto da sua participação relativa no total das variedades crescer em média 17% ao ano.

O destaque fica com as variedades SP (COPERSUCAR), que foram introduzidas no início da década de 1980 e desenvolvidas substancialmente para condições no Centro-Sul do Brasil, principalmente para São Paulo, conforme TABELA 3. Destaque especial para a variedade SP70-1143, que em termos relativos participava em 1982 com 1,51% de toda a cana cultivada no país e em 1985 saltou para 8,87%, um crescimento médio de aproximadamente 2,45% ao ano sob todo o montante de cana cultivado durante essas três safras.

Em parte, a expansão do plantio da variedade NA56-79, variando de 11,6% em 1977 para 27,7% em 1985, pode ser explicada pelo seu elevado teor de sacarose, adaptabilidade e precosidade, conforme TABELA 3. Esse fato vem ao encontro da mudança no modelo de pagamento de cana-de-açúcar, que em 1983 passou a ser baseado no teor de sacarose, ao invés do volume em tonelada da matéria-prima.

Em 1975 foi instalado o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), criado para expandir a produção do álcool viabilizando seu uso como matéria-prima para indústria química e como combustível adicionado à gasolina. Conforme o Decreto n° 76.593 de 14 de novembro de 1975, o principal objetivo desse programa era de estimular a produção do álcool, visando o atendimento das necessidades do mercado interno e externo e da política de combustíveis automotivos. Assim, conforme esse programa, a produção do álcool oriunda da cana-de-açúcar, da mandioca ou de qualquer outro insumo deveria ser incentivada por meio da expansão da oferta de matérias-primas, com especial ênfase no aumento da produção agrícola, da modernização e ampliação das destilarias existentes e da instalação de novas unidades produtoras, anexas a usinas ou autônomas, e de unidades armazenadoras.

Tabela 3 – Principais variedades de cana cultivadas durante o período analisado,
indicação de cultivo e características agroindustriais relevantes

Variedade

Região indicada

Importância e Característica Agroindustrial

NA56-79

Centro-Sul

Melhoria nos rendimentos agroindustriais, elevado teor de sacarose, adaptabilidade e precosidade.

CB41-76

Centro-Sul

Elevada produtividade, resistência a doenças.

CB45-3

Nordeste

Adaptabilidade a solos áridos e pouco férteis.

Co331

Nordeste

Rusticidade, teor médio de sacarose.

IAC48-65

Nordeste e Centro-Sul

Adaptação em solos pouco férteis, resistente a doenças.

IAC52-150

Centro Sul

Produtividade, médio teor de sacarose, adaptabilidade a solos pouco férteis.

SP70-1143

Centro-Sul

Adaptação a solos pouco férteis, longevidade, resistência a doenças.

SP70-1078

São Paulo e Paraná

Produção agrícola, resistente ao mosaico e carvão da cana.

SP71-1406

São Paulo, Paraná, Goiás

Alta produtividade de colmo, teor de sacarose alto, adaptabilidade em solo média fertilidade, facilidade de transporte.

RB70194

Nordeste

Produtividade, resistente a mosaico, rusticidade.

RB70141

Norte e Nordeste

Rusticidade, adaptabilidade a solos pouco férteis.

Fonte: Adaptado de NUNES (1987, p. 211-217)

A TABELA 4 apresenta, comparativamente, dados referentes às safras de 1974/75 e 1986/87, das principais variáveis selecionadas a fim de constatar o desempenho do setor sucroalcooleiro nacional quanto aos objetivos propostos inicialmente pelo Proálcool. Conforme dados apresentados, verifica-se que houve evolução em todos os parâmetros selecionados e analisados no período. O número de plantas processadoras de cana-de-açúcar total, que na safra de 1974/75 era de 216 saltou para 402 na safra 1986/87, um crescimento médio anual de aproximadamente 7,8%. A produtividade agrícola é um parâmetro que merece destaque, variou de 46,8 t/ha em 1974/75 para 60,4 t/ha em 1986/87. Resultado esse, em boa parte, do melhoramento genético das novas variedade de cana-de-açúcar desenvolvidos a partir de 1971 no âmbito do PLANALSUCAR e disseminados nas usinas de maneira acelerada durante o período de 1975-1985, o que coincide com a fase de expansão e consolidação do Proálcool.

Analisando a TABELA 4, nota-se que a produção de cana-de-açúcar para processamento em usina durante o período analisado cresceu em média 18,7% ao ano, o que representa uma variação de 205,8% para o período analisado. A produção de álcool total (anidro+hidratado) cresceu em média mais de 150% por ano, cumprindo um dos principais objetivos estabelecidos inicialmente no Proálcool.

Tabela 4 – Evolução de algumas variáveis da agroindústria canavieira nacional (1974/75 – 1986-87)

Variáveis

1974/75

1986/87

Variação (%)

Nº usinas

216

402

86,11%

Cana própria moída (t)

39.312.756

141.110.125

258,94%

Cana moída fornecedores (t)

35.195.887

86.765.721

146,52%

Total de cana moída (t)

74.508.643

227.875.846

205,84%

Cana própria moída (%)

52,76

61,92

17,36%

Área colhida com cana (milhões de ha)

1,9

3,95

107,89%

Produção cana (milhões de t)

88,92

238,49

168,21%

Rendimento agrícola (t/ha)

46,8

60,4

29,06%

Produção total de álcool (m3)

594.985

10.506.712

1.665,88%

Produção de álcool hidratado (m3)

378.457

8.343.243

2104,54%

Produção de álcool anidro (m3)

216.528

2.163.469

899,16%

Rendimento industrial (kg açúcar/tc)

90,2

111,8

23,95%

Fonte: Elaborada a partir de Relatório Anual do IAA (Superintendência de São Paulo, vário números);
IBGE (Anuários estatísticos de vários anos); e Balanço Nacional da Cana-de-Açúcar e Agroenergia – MAPA (2007).

Em função desse sucesso na produção em larga escala de um combustível substituto a gasolina, desenvolvido com tecnologia própria, a produção de automóveis movidos a álcool tornou-se a prioridade do governo e da indústria automobilística durante a década de 1980. Desta forma, o país poderia substituir parte do combustível e das matérias-primas importadas que derivassem do petróleo, utilizando para isso parte da capacidade produtiva ociosa das usinas e destilarias de cana para a produção de álcool.

O segundo choque do petróleo (1979-80) triplicou o preço do barril de petróleo e as compras desse produto passaram a representar 46% da pauta de importações brasileiras em 1980. O governo, então, resolve adotar medidas para plena implementação do Proálcool. São criados organismos como o Conselho Nacional do Álcool - CNAL e a Comissão Executiva Nacional do Álcool - CENAL para agilizarem o programa. A produção alcooleira atingiu aproximadamente 10,5 bilhões de litros em 1986-87 (TABELA 4), superando a meta inicial do governo de 10,7 bilhões de litros/ano para o fim do período. A proporção de carros a álcool no total de automóveis de ciclo Otto (passageiros e de uso misto) produzidos no país aumentou de 0,46% em 1979 para 26,8% em 1980, atingindo um teto de 76,1% em 1986, com aproximadamente 619 milhões de unidades produzidas. Entre o período de 1980 e 1986, o total de veículos automotores à álcool produzidos no país variou, respectivamente de 254.015 para 699.183, um crescimento de 175,25%, o equivalente a uma taxa média de crescimento anual de 29,21%. Especificamente para o caso dos automóveis, a variação foi de 239.251 unidades produzidas em 1980, para 619.854 em 1986, uma variação de 159,08% para o período, uma média anual de 26,51% de crescimento (TABELA 5).

Tabela 5 – Evolução da produção de carros movidos a álcool fabricados
no Brasil no período de 1979 a 1986, por categoria de veículos

Ano

Automóveis

Comerciais Leves

Caminhões

Ônibus

Total

Var anual (%)

1979

3.328

1.286

10

---

4.624

---

1980

239.251

14.750

14

---

254.015

5.393,40

1981

120.934

6.761

1.126

7

128.828

(49,28)

1982

214.406

22.272

904

3

237.585

84,42

1983

549.550

41.365

2.069

---

592.984

149,59

1984

496.653

61.234

2.590

15

560.492

(5,48)

1985

573.383

66.856

1.908

---

642.147

14,57

1986

619.854

77.877

1.452

---

699.183

8,88

Fonte: Anuário da Indústria Automobilística Brasileira (2012)

Nota-se definitivamente que os objetivos do Proálcool surtiram efeito, ou seja, no tocante a expansão do setor sucroalcooleiro nacional durante o período analisado, novas variedades de cana-de-açúcar foram desenvolvidas nacionalmente e introduzidas em larga escala. A área cultivada com cana praticamente dobrou, o volume de cana-de-açúcar processado cresceu mais do que 200%, a produção de álcool total superou as expectativas iniciais e os índices de produtividade agrícola e industrial melhoraram relativamente. Resta analisar o quanto esse cenário próspero de expansão, fortemente impulsionado pelo Estado, suscitou a expansão da base científica nacional voltada a esse setor. Para tanto, a proposta da segunda parte do trabalho é de analisar documentos de patentes depositados no Brasil durante o período de 1975-1985 que se relacionam com o tema do desenvolvimento tecnológico para o setor sucroalcooleiro nacional.

As palavras chaves utilizadas na busca e o número de documentos de depósitos de patentes gerados como resultados foram: cana de açúcar (50 resultados); cana-de-açúcar (47 resultados); etanol (439 resultados); etanol de cana (1 resultado); álcool (145 resultados); álcool de cana (4 resultados); e álcool combustível (11 resultados). Do total de resultados da busca para cada item foram selecionados somente aqueles que apresentaram informação sobre a publicação com o código BR, que se refere ao Brasil. Dos 697 documentos encontrados, foram selecionados 301 com código BR, dos quais retiraram-se os repetidos, os que não se relacionavam com os objetivos do trabalho, os que não apresentaram informações sobre requerentes (1 documento) ou classificação internacional (4 documentos), totalizando assim 251 documentos de depósito de patentes para o período.

O GRÁFICO 1, refere-se às principais classes de pedidos de patentes selecionadas na etapa de busca, segundo a Classificação Internacional  de Patentes [8]. Nota-se que as principais classes enquadradas foram associadas às seções A, B, C e F. A seção A refere-se a necessidades humanas; a seção B a operações de processamento e transporte; a seção C a química e metalurgia e a seção F a engenharia mecânica, iluminação, aquecimento, armas e explosão.

Gráfico 1 – Principais classes dos pedidos de patentes selecionados na etapa de busca

Fonte: Elaborado pelos autores a partir da base de dados.
Nota: Um pedido de patente pode apresentar mais de uma classificação, sendo que todas foram contabilizadas
na pesquisa, por isso a soma da frequência das classes é superior ao número de documentos pesquisados

As classes com maior concentração de resultados apresentados na busca foram: C12 (69 resultados), A01 (59 resultados), C07 (45 resultados), C13 (45 resultados), B01 (39 resultados), F02 (24 resultados), C10 (13 resultados), C08 (7 resultados), B02 (6 resultados) e F01 (5 resultados). As demais classes foram desconsideradas por apresentarem no máximo quatro repetições.

Seguem, em ordem decrescente, as definições para as classes que mais apresentaram documentos de patente na pesquisa:

  1. C12: bioquímica, cerveja, álcool, vinho, vinagre, microbiologia, enzimologia, engenharia genética ou de mutação;
  2. A01: agricultura, silvicultura, pecuária, caça, captura em armadilhas e pesca;
  3. C07: química orgânica;
  4. C13: indústria do açúcar;
  5. B01: processos ou aparelhos físicos ou químicos em geral;
  6. F02: motores de combustão, instalações de motores a gás quente ou de produtos de combustão;
  7. C10: indústrias do petróleo, do gás ou do coque; gases técnicos contendo monóxido de carbono; combustíveis; lubrificantes; turfa;
  8. C08: compostos macromoleculares orgânicos; sua preparação ou seu processamento químico; composições baseadas nos mesmos;
  9. B02: trituração, pulverização ou desintegração; beneficiamento preliminar do grão antes da moagem;
  10. F01: máquinas ou motores em geral; instalações de motores em geral; máquinas a vapor.

Verifica-se que essas classes abrangem todas as etapas da cadeia produtiva de álcool e açúcar, compreendendo desde as fases agrícolas, que precedem ao plantio, até o processamento final e estocagem dos produtos acabados.

O GRÁFICO 2 traz a evolução do número de patentes em relação ao período analisado (1975-1985). Observa-se que houve um crescimento de 600% nos anos de 1975 a 1976, que coincide com a implantação do Proálcool. Até o ano de 1977 notam-se taxas de variação positivas (600 e 28,57%, respectivamente). No período de 1978 a 1980 houve queda no número de documentos relacionados às patentes.

O pico do período analisado ocorreu no ano de 1982, onde foram encontrados 37 patentes. Esse período coincide com o auge (período entre 1981 e 1985) da segunda fase do Proálcool (1980 a 1989), decorrente de incentivos públicos fiscais e financeiros, que beneficiaram produtores de etanol e consumidores finais (VEIGA FILHO & RAMOS, 2006, p.48-50). Pode-se notar que, em geral, houve um crescimento representativo no período analisado (1975-1985), que apresentou taxa média de crescimento de 71,57%.

Gráfico 2 – Distribuição das patentes selecionadas na etapa de busca por período 1975-1985

Fonte: Elaborado pelos autores a partir da base de dados.

O GRÁFICO 3 apresenta os principais requerentes, no Brasil, dos pedidos de patente considerados no presente trabalho. Foram identificados 192 requerentes para os 251 pedidos de patente publicados no período estudado. Observa-se que a Massey Ferguson Services apresentou o maior número de pedidos de patentes publicados durante o período analisado, ou seja, 14 pedidos. Os demais requerentes com frequência maior ou igual a três são: Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool (10 pedidos); Santal Equipamentos S/A (7 pedidos); Grace WR & Company (4 pedidos); General Motors Corporation (3 pedidos); Instituto Agronômico - IAC e Instituto de Tecnologia de Alimentos - ITAL (3 pedidos); Minas Gerais Siderurgia (3 pedidos); Petróleo Brasileiro S/A (3 pedidos) e Zanini S/A Equipamentos Pesados (3 pedidos).

Gráfico 3 – Principais depositantes no Brasil dos documentos considerados no presente trabalho para o período de 1975-1985

Fonte: Elaborado pelos autores a partir da base de dados

5. Considerações Finais

De maneira geral o Programa Nacional do Álcool proporcionou os resultados esperados quando da sua criação. Possibilitou a expansão da produção canavieira, ampliou a capacidade de processamento da agroindústria nacional e colaborou decisivamente para a consolidação de um combustível em larga escala substituto da gasolina, algo até então inédito. É sabido que alguns condicionantes para o sucesso desse programa deu-se anteriormente a sua instalação, o Programa Nacional de Melhoramento da Cana de Açúcar (PLANALSUCAR), o Programa de Racionalização da Agroindústria Canavieira e o Programa de Apoio à Agroindústria Açucareira foram fundamentais para alicerçarem as bases para o salto de produção que veio na sequência.

Assim, no contexto teórico apresentado, os três principais programas de incentivo a agroindústria canavieira instalados no início da década de 1970 e que precederam o Proálccol, podem ser entendidos como uma herança institucional do sistema, construído via processo de aprendizado tecnológico e de trajetórias históricas que colaboraram para o sucesso do último.

Apesar dos resultados positivos, nota-se que o decreto que instituiu o Proálcool não destaca em momento algum que a expansão da capacidade de produção da agroindústria canavieira viria de uma maior racionalização do emprego dos fatores, o que proporcionaria ganhos de produtividade através do desenvolvimento e adoção de novas tecnologias voltadas ao setor produtivo agrícola ou industrial.

Nesse sentido, o decreto destaca apenas que um dos objetivos do programa foi de expandir a produção de bens de capital, através da crescente colocação de encomendas de equipamentos com alto índice de nacionalização, destinado à ampliação, modernização e implantação de destilarias. Deixando para segundo plano de atuação, sem uma estratégia definida, os condicionantes necessários para que fomente o desenvolvimento de novas tecnologias produtivas para sustentar esse novo ciclo da produção sucroalcooleira nacional.

Apesar disso, com o levantamento dos depósitos de patentes realizadas entre o período de 1975-1985 pode-se notar uma relativa movimentação dos diferentes agentes envolvidos no desenvolvimento de tecnologias para o setor sucroalcooleiro. Dos 251 documentos listados e analisados no sistema LAPITAT, verificou-se que a maioria deles foi depositada entre os anos de 1981 e 1985, que coincide com o auge do Proálcool. Pelo menos 218 depósitos foram classificados nos códigos C12 (bioquímica, álcool etc.), A01 (agricultura, entre outros), C07 (química orgânica) e C13 (indústria do açúcar), que envolvem os setores produtivos variados, relacionados com a indústria metal pesada, química e de alimentos. E que entre os principais requerentes encontravam-se instituições de pesquisa pública e privada, empresas privadas produtoras de bens de capital para o setor, fabricantes automotivos e petroleiro.

A criação do Plano Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar (PLANALSUCAR) foi conduzido no âmbito institucional pelo Instituto do Açúcar e do Álcool – IAA e sucedeu as estações experimentais vinculadas à União, mantendo o foco na criação de variedades de cana-de-açúcar, o que proporcionou um significativo aumento na capacidade de gerar variedades e de aumentar a produtividade do setor.

Em meados da década de 1980, a COPERSUCAR passou a pesquisar variedades de cana-de-acúcar e a desenvolver tecnologias industriais próprias, para isso realizou convênios com instituições de pesquisa do exterior e trouxe pesquisadores internacionais. Isso permitiu as usinas paulistas um melhor aproveitamento agroindustrial. Em parte, graças a combinação dos cultivares com as novas técnicas agrícolas e de processamento industrial, o que reforçou a capacidade das usinas de gerar seu próprio conhecimento e difundir tecnologia.

Quanto ao setor de bens de capital que se desenvolveu durante esse período, as firmas até então instaladas no país se aproveitaram substancialmente da Resolução CNA1 nº 09/79 publicada pela Comissão Nacional do Álcool – CNA cujo objetivo era de acelerar a produção de álcool e aumentar a oferta de equipamentos para construção de destilarias autônomas. Essa resolução destacava que esses objetivos deveriam ser cumpridos sem que para isso outra resolução, a CNA1 nº 05/76 fosse desconsiderada, essa por sua vez tratava da proibição da importação de máquinas e equipamentos para usinas e destilarias, com similares de produção nacional. Regrava a aquisição por empresas titulares de destilarias autônomas, de moendas usadas e outros equipamentos complementares, indicando a Secretaria Executiva da Comissão Nacional do Álcool como responsável por emitir as autorizações prévias de negociação, compra e transferências de tais equipamentos (CNA, 1979, p. 18).

Isso fortaleceu a concentração produtiva industrial do setor de máquinas e equipamentos para agroindústria sucroalcooleira, criando um duopólio composto pelo Grupo Dedini e a Zanini Equipamentos Pesados S. A.

Assim o Proálcool ampliou sobremaneira a capacidade de produção desses dois grupos empresariais que praticamente dominavam o fornecimento de equipamentos para o processamento da cana no Brasil, basicamente através do licenciamento de equipamentos e máquinas desenvolvidas em outros centros canavieiros, ou da engenharia reversa de modelos já em domínio público. Ou seja, essas firmas atuavam estrategicamente muito mais ligadas a difusão de tecnologias conhecidas do propriamente dito no seu desenvolvimento.

De maneira geral, o crescimento da atividade alcooleira no período analisado só foi possível em função de esforços tecnológicos exógenos aos produtores de álcool. O crescimento do padrão tecnológico da agroindústria sucroalcooleira foi impulsionado pelos fornecedores de tecnologia, basicamente as instituições de pesquisa agrícola e fornecedores de bens de capital.

Referências

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1. Professor do Programa de Pós-Graduação de Gestão e Tecnologia em Sistemas Produtivos do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (CEETEPS). São Paulo/SP, Brasil. Email: fjpiacente@yahoo.com.br

2. Professora da Faculdade de Tecnologia de Piracicaba. Piracicaba/SP, Brasil. Email: va.csilva@hotmail.com

3. Conforme Szmrecsányi (1979, pág. 434), os Programas de Racionalização da Agroindústria Canavieira (1971) e de Apoio à Agroindústria Açucareira (1973) tiveram os objetivos principais de proporcionar a economia de escala através de fusões de usinas de açúcar e de áreas de produção, e da modernização agrícola e industrial das empresas. Como meios para isso, foram direcionados pelo IAA estímulos financeiros através de créditos de longo prazo e taxa de juros baixa. Por fim, o autor desta que esses dois Programas não apresentavam metas a serem alcançadas e que os resultados obtidos não puderam ser efetivamente ligados aos objetivos iniciais estabelecidos previamente.

4. Serviço Nacional de Proteção de Cultivares – SNPC tem como objetivo garantir o livre exercício do direito de propriedade intelectual dos obtentores de novas combinações filogenéticas na forma de cultivares vegetais distintas, homogêneas e estáveis, zelando pelo interesse nacional no campo da proteção de cultivares. E o de desenvolvimento de novas variedades vegetais através da proteção da Lei de Cultivares (nº 9.456 de 25.04.1997), concedida pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares - SNPC do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA. O SNPC está ligado ao Departamento de Propriedade Intelectual e Tecnologia da Agropecuária – DEPTA – da Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e Cooperativismo – SDC – e tem como área de suporte o Laboratório de Análise, Diferenciação e Caracterização de Cultivares – LADIC.

5. Base de patentes organizada e gerenciada pelo Escritório Europeu de Patentes (EPO) que disponibiliza o acesso a uma base de dados com mais de 1.5 milhão de informações bibliográficas e imagens de documentos de patentes de 18 países da América Latina, a saber: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai, além da Espanha. A base é resultado de um trabalho conjunto entre a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), Escritório Europeu de Patentes (EPO), Oficina Espanhola de Patentes e Marcas (OEPM) e de mais de 19 Escritórios de Patentes da América Latina.

6. O registro de patentes de invenção no Brasil é de responsabilidade do INPI, regulado pela Lei Federal n° 9.279, de 14 de maio de 1996, e que trata da forma de proteção conferida às criações intelectuais relacionadas ao objeto da criação, seja no campo da propriedade industrial, científico, literário ou artístico.

7. Conforme Szmrecsányi (1979, pág. 461), os recursos financeiros alocados ao PLANALSUCAR durante os anos de 1972 a 1974 foram superiores as previsões feitas pelo programa. Em 1972 foi alocado um volume 54% superior aos previsto incialmente, em 1973 essa diferença foi de 294% em 1974 de 541%. Isso pode ser explicado pela destinação de uma parte do fundo especial de exportação do IAA ao PLANALSUCAR.

8. A Classificação Internacional de Patentes, também chamada de IPC (International Patent Classification), estabelece um sistema hierárquico de símbolos para a classificação de Patentes de Invenção e de Modelo de Utilidade de acordo com as diferentes áreas tecnológicas. Ela é adotada por mais de 100 países e coordenada pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (INPI, 2013).


Vol. 36 (Nº 23) Año 2015

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