Espacios. Vol. 36 (Nº 19) Año 2015. Pág. 18

A influência da cultura na adaptação de produtos para exportação: estudo em uma empresa do setor moveleiro

The influence of culture on adapting products for export: a study in a company of the furniture sector

Douglas SCORTEGAGNA 1; Roberto Birch GONÇALVES 2; Guilherme Bergmann Borges VIEIRA 3

Recibido: 17/06/15 • Aprobado: 24/08/2015


Contenido

1. Introdução

2. Referencial teórico

3. Método de pesquisa

4. Análise e resultados

5. Considerações finais

Referências


RESUMO:

Este estudo tem o intuito de analisar as alterações realizadas em produtos exportados do setor moveleiro sob o ponto de vista cultural. Para tanto, realizou-se uma pesquisa qualitativa exploratória em uma empresa de grande porte do setor moveleiro do sul do Brasil com forte atuação em exportações e com alto valor agregado em seus produtos. A pesquisa foi operacionalizada mediante entrevistas em profundidade submetidas a análise de conteúdo. Analisaram-se as adaptações realizadas pela empresa, tendo como foco principal a influência que a cultura do país destino dos produtos exportados exerce sobre essas alterações. Como resultados, pode-se notar que muitas das alterações realizadas tiveram como causa a influência da cultura do país destino e posteriormente foram internalizadas, passando a compor a linha nacional de produtos.
Palavras-chave: Internacionalização. Cultura. Adaptação de Produtos. Setor Moveleiro.

ABSTRACT:

This study aims to analyze the changes made in the exported products of furniture sector from the cultural point of view. To attempt this, an exploratory qualitative research was conducted in a large company of the furniture industry, located in the southern Brazil, with strong performance in exports and high added value in their products. The research was operationalized through in-depth interviews subjected to content analysis. It was analyzed the adjustments made by the company, focusing mainly on the influence of destination country's culture on these changes. The outcomes indicate that many changes were carried out due to the influence of destination country's culture and were subsequently internalized into the national product line.
Key words: Internationalization. Culture. Products Adaptation. Furniture Sector.

1. Introdução

A globalização proporcionou mudanças drásticas em diversos setores, incluindo o de negócios. Os países encontraram um sistema econômico favorável, bastante independente, com inúmeras oportunidades de comércio e com potencial de demanda crescente. Em consequência disso, as empresas passaram a buscar cada vez mais a internacionalização para expandir sua marca e conquistar mercados maiores (Kotabe e Helsen, 2000; Cateora e Graham, 2009).

Para ingressar no mercado internacional, diversos cuidados devem ser tomados, e diversas estratégias de inserção de produtos no mercado externo auxiliam as companhias a tomarem suas decisões. Um fator importante que interfere diretamente no ambiente mercadológico é a cultura. As diferenças culturais, se não bem estudadas, podem arruinar um projeto de internacionalização, sendo, em muitos casos, os fatores que mais pesam nas decisões de internacionalização.

Levando-se em conta o mix de marketing (4 p's), o produto é um dos quatro componentes e tem grande importância na tomada de decisões.  Vale salientar que um produto que tenha sucesso em seu país de origem não necessariamente terá sucesso em um país diferente. Portanto, é necessário estudar e compreender as diferenças culturais existentes. Por outro lado, segundo Keegan (2005), as negociações internacionais não são feitas apenas de diferenças, mas também de semelhanças, e estas devem ser bem analisadas antes da implantação da estratégia de marketing para que não ocorra desperdício de tempo e dinheiro. As diferenças culturais possibilitam a inserção de produtos adaptados, porém, em muitos casos, há espaço também para produtos padronizados.

O objetivo deste estudo é analisar a influência da cultura na adaptação de produtos moveleiros para o mercado externo. O setor moveleiro se justifica por ser um setor que se destaca bastante na balança comercial brasileira, secundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC, 2014). Além disso, de acordo com dados obtidos através da Associação das Indústrias de Móveis do Estado do Rio Grande do Sul (MOVERGS, 2014), o estado é responsável por 30,6% das exportações brasileiras de móveis, o que evidencia sua relevância. Estes dados demonstram o potencial e a diversificação que este mercado possui, quando se atende às demandas dos clientes com estratégias de adaptação e padronização suficientes para satisfazê-los. O estudo foi realizado em uma empresa de grande porte, localizada na região serrana do Rio Grande do Sul, que atua há mais de 60 anos no mercado moveleiro e tem realizado exportações desde meados dos anos setenta.

2. Referencial teórico

2.1. A cultura e as estratégias de marketing

Para Geertz (1989), cultura é um sistema ordenado de significados e símbolos em relação aos quais a interação social ocorre. Ela também pode ser um meio de controle social, que manipula os membros para pensarem, sentirem e agirem de determinadas formas (Schein, 2009).

Segundo Keegan (2005), as culturas são definidas como 'formas de viver' desenvolvidas por grupos de pessoas e transmitidas ao longo das gerações. Elas possuem facetas relacionadas, ou seja, a mudança de algum fator influencia todos os outros. Complementando, Hofstede (1991) define cultura como a configuração coletiva da mente, que diferencia membros de um grupo de pessoas para outro. Cabe salientar que um grupo de pessoas pode ser considerado uma nação, uma região ou um grupo étnico.

Conforme afirmam Cateora e Graham (2009), a geografia tem influenciado não somente a cultura, mas a história, a tecnologia, a economia e, inclusive, a forma do ser humano pensar. Além disso, os fatos históricos de um país influenciam diretamente na maneira do povo agir e pensar (Cateora e Graham, 2009).

A cultura é um fator determinante que influencia na escolha das estratégias de marketing. Keegan (2005) exemplifica a diferença de cultura que ocorre entre os americanos e os europeus, quando o assunto é engenhocas, explicando que os americanos são fãs de inovações de produtos, como facas e escovas de dente elétricas, enquanto os europeus são mais clássicos. Essas diferenças são fruto das diferenças culturais, que também podem sofrer influência dos níveis de renda da população.

Portanto, a cultura tem influência direta em uma decisão estratégica de marketing. Existem diversos fatores que podem auxiliar na classificação de uma cultura, como, por exemplo, religião e idioma. Porém, existem alguns outros fatores mais difíceis de identificar como, por exemplo, as preferências estéticas de uma sociedade. Tais fatores ficam em segundo plano, mas têm impacto direto no design dos produtos e nos aspectos criativos relacionados a uma campanha de marketing (Kotabe e Helsen, 2000). Exemplos como estes evidenciam a importância da cultura na internacionalização. Portanto, uma estratégia de entrada em um novo mercado deve ser muito bem estudada, levando-se em conta as alternativas de adaptar ou padronizar produtos, ou mesmo uma combinação de ambas. Tais alternativas são discutidas na próxima seção.

2.2 . Padronização e adaptação

Segundo Keegan (2005), um produto pode ser considerado um conjunto de atributos tanto físicos como psicológicos, de utilidade ou simbólicos. Esses atributos, coletivamente, devem satisfazer o consumidor.

Keegan (2005) aponta para duas fraquezas frequentemente encontradas pelas empresas quanto ao lançamento de um produto global. Uma delas é a síndrome do 'não foi criado aqui', em que são ignoradas as decisões tomadas pelos gerentes das filiais ou subsidiárias. Outro erro comum é impor as políticas de decisão de produto para as filiais, presumindo que o que funciona na matriz vai funcionar em qualquer outro lugar.

Cateora e Graham (2009) ratificam o pensamento de que os produtos estão diretamente ligados à cultura. Para entender a complexidade da questão de produtos adaptados e padronizados, é necessário antes entender a cultura e sua influência sobre os mesmos. É preciso analisar a forma com que o mercado vê este produto. Não deve ser analisada apenas a forma física, mas também outros fatores que contribuem para a aceitação do produto. Para Cateora e Graham (2009, p.315), "um produto é a soma das satisfações tangíveis e psicológicas que ele proporciona ao usuário".

Na maioria dos casos, são os atributos físicos que definem a função principal de um produto, porém todo produto possui um pacote de características psicológicas que podem proporcionar satisfação do consumidor. Essas características podem variar entre as culturas, portanto, às vezes é necessário que ocorram algumas alterações no produto para suprir as necessidades e maximizar a satisfação dos consumidores (Cateora e Graham, 2009).

Assim, tanto as empresas que buscam iniciar sua atuação no mercado externo quanto as que já possuem experiência internacional têm de tomar a decisão de padronizar ou adaptar produtos (Hise e Choi, 2004). Para Cavusgil, Knight e Riesenberger (2010), no marketing internacional, a questão fundamental é saber, com base nas condições do mercado-alvo, se a estratégia deverá ser de adaptação ou padronização. Segundo Ryans, Griffith e White (2003) existem dois pontos principais a serem analisados no que tange a padronizar ou adaptar: o primeiro ponto, defendendo a padronização, é a redução de custos, através de economias de escala; o segundo, em defesa da adaptação, é o aumento do valor oferecido. Cabe ao empresário tomar a decisão, avaliando se a economia gerada pela padronização supera os possíveis lucros que seriam possíveis graças à adaptação do produto.

Em decorrência disso, as empresas precisam decidir entre uma estratégia de mix de marketing seguindo um plano único em todos os mercados, ou optar por ajustar o mix de marketing para cada mercado pretendido (Vrontis, Thrassou e Lamprianou, 2009). Essa decisão afeta muitos aspectos da operação da empresa no exterior, como pesquisa e desenvolvimento, estratégia de entrada no mercado, produção, entre outros (Hise e Choi, 2004). Adicionalmente, Waheeduzzaman e Dube (2004) afirmam que uma decisão de adaptar ou padronizar deve, por obrigação, criar vantagens competitivas, dando retornos positivos para a empresa em vendas, participação de mercado e lucro, tornando a atuação no mercado externo rentável.

Vrontis, Thrassou e Lamprianou (2009) afirmam que a padronização oferece ganhos de escala não apenas na produção, mas também em marketing. A padronização visa atingir o maior mercado possível com um mesmo produto. Essa estratégia busca suprir a falta de adaptação, oferecendo produtos de qualidade elevada por um preço bastante competitivo. As barreiras culturais, dentre outras, podem ser vencidas quando adotada uma boa estratégia de entrada global, procurando estabelecer a marca como ponto de referência em qualidade e preço.

Por outro lado, a estratégia de adaptação abrange um nicho de mercado menor, porém com mais qualidade e melhor atendimento. Dessa forma, é possível criar e vender exatamente o que o cliente deseja, atendendo suas necessidades e desejos.

2.2.1  Adaptações de produto s sob o ponto de vista cultural

Para Kotler (2000), o produto é o principal item do composto de marketing, pois interfere diretamente nas outras variáveis. Segundo a pesquisa elaborada por Vrontis (2005), a cultura é o fator que mais pesa quando a decisão de adaptar é tomada pela empresa, já que muitos fatores sofrem direta influência da cultura, principalmente na tomada de decisões estratégicas. E as exigências de adaptação variam de produto para produto e de país para país.

Segundo Cateora e Graham (2009), a cultura tem influência direta na construção de um país. A história de uma nação influencia a cultura e a cultura influencia a história. Esse processo de transformação gera um grande efeito borboleta, que interfere em diversos outros aspectos.

Um desses aspectos são as leis e normas de cada país, que têm fundamental importância no processo de adaptação de um produto. Algumas nações sofrem com regras mais rígidas, enquanto outras convivem com um sistema mais liberal. Keegan (2005) exalta o fato de que as leis e regulamentos dos diferentes países têm impacto direto na decisão do projeto de um produto, gerando a necessidade de adaptações para atender às normas do mercado desejado e criando custos não esperados. A título de exemplificação, a criação do Mercado Comum Europeu teve como um de seus principais objetivos a eliminação de barreiras legais e normativas que dificultavam o comércio além das fronteiras nacionais. A criação desse mercado resolveu o problema local, porém, quando alguma empresa decide sair de seus domínios e partir para mercados distantes, fora da área de abrangência de seus acordos, deve adaptar-se às exigências locais (Keegan, 2005).

Nesse sentido, a Figura 1 apresenta os fatores que mais sofrem influência da cultura do país destino, sendo detalhados os elementos contidos em cada fator e os autores que os citaram.

Figura 1 – Detalhamento dos fatores que influenciam na adaptação

Fator

Detalhamento

Autores

Embalagem

Cor, Conteúdo, Idioma

Keegan (2005), Dias, Consoli e Neves (2005), Czinkota, Ronkainen e Tarrant (1995)

Medidas

Alterações de medidas influenciadas por regras leis e gostos

Keegan (2005)

 

Composição

Alterações em composições devido a leis, regras e fatores climáticos

Keegan (2005)

Design

Desenho, Funcionalidade, Visual, Cor

Lehrer e Behnam (2009), Bumgardner, Bush e West (2000), Czinkota, Ronkainen e Tarrant (1995)

Efeito País de Origem

Percepção do país destino, Pontos positivos e negativos

Keegan (2005)

 

Marca

Posicionamento, Intermediários, Reconhecimento

Kotler (2000), Keegan e Green (1999), Kotabe e Helsen (2000)

Manual de Instruções

Idioma, Conteúdo, Detalhamento

Keegan (2005)

 

 

3. Método de pesquisa

Considerando que o objetivo deste estudo foi apontar a influência da cultura na adaptação e padronização de produtos moveleiros exportados por empresa localizada na Serra Gaúcha, optou-se pelo desenvolvimento de uma pesquisa qualitativa de caráter exploratório.

A empresa objeto deste estudo atua há mais de 60 anos no mercado moveleiro e teve sua primeira experiência no mercado externo em 1976, com a exportação de móveis domésticos. Porém, seu efetivo sucesso no mercado internacional ocorreu apenas em 1980, quando começou a exportar móveis para escritório. Desde então, a empresa atua no mercado externo com regularidade e solidez. A empresa possui uma grande variedade de produtos e atua em distintos mercados, tais como Estados Unidos, México, Guatemala, República do Panamá, Trinidad e Tobago, Chile, Uruguai, Venezuela e Nova Zelândia.

O estudo foi operacionalizado mediante entrevistas em profundidade, apoiadas por um roteiro semiestruturado. Foram entrevistados três gestores, responsáveis pela tomada de decisões quanto à adaptação e padronização de produtos para o exterior. O perfil dos entrevistados é apresentado na Figura 2.

Figura 2 – Perfil dos entrevistados

Entrevistados

Função

Tempo de cargo

Idade

Formação

Entrevistado 1 (E1)

Coordenador de Engenharia

7 anos

30

Engenharia de Produção

Entrevistado 2 (E2)

Coordenador de Marketing

6 anos

35

Administração

Entrevistado 3 (E3)

Diretor

23 anos

54

Administração

As entrevistas, as quais foram realizadas de forma presencial nas dependências da empresa, foram gravadas, transcritas e submetidas a técnicas de análise de conteúdo (Bardin, 2004). A Figura 1 foi utilizada como base para a análise de dados, sendo considerados os sete fatores que influenciam na adaptação de produtos identificados na literatura e seus respectivos detalhamentos.

4. Análise e resultados

Nesta seção é apresentada a descrição das entrevistas realizadas e a síntese e discussão dos resultados obtidos.

4.1. Descrição das entrevistas

Nas seções a seguir são apresentados os resultados das entrevistas para cada um dos sete fatores que influenciam na adaptação de produtos identificados na literatura, sendo posteriormente apresentada a síntese dos resultados e discussão à luz da literatura.

4.1.1. Marca

Conforme citado pelos entrevistados E1, E2 e E3, a marca não foi alterada em função da atuação da empresa no mercado externo. Os entrevistados E1 e E2, a empresa estudada possui uma marca consolidada no exterior, vendendo seus produtos com marca própria nos diferentes mercados em que atua. O entrevistado E3 afirmou que a empresa não trabalha diretamente com o consumidor final, aproximando-se de arquitetos e designers para divulgar seu produto. Além disso, segundo o entrevistado E3, a empresa atua com diversas lojas de mostruário no exterior.

O entrevistado E3 afirmou também que a empresa explora a questão ambiental no mercado externo, a partir da certificação ISO 14001, aspecto muito valorizado em alguns mercados. Por outro lado, o entrevistado E2 afirmou que a empresa com os mesmos produtos e com a mesma marca em todos os países. Segundo o entrevistado, o que ocorre, às vezes, são algumas adaptações, mas sem ser criada uma linha específica de produto para um só mercado. Complementando, o entrevistado E3 justifica essa estratégia afirmando que a empresa consegue internalizar no mercado brasileiro quase que todas as alterações realizadas para adaptação a mercados externos. Essa internalização, que ocorre na maioria dos casos, segundo o entrevistado E1, acrescenta muito na qualidade do produto. O entrevistado afirmou que "o mesmo produto vendido em Chicago é vendido também Caxias do Sul" e que "a internalização das adaptações para o mercado brasileiro aumenta a qualidade dos produtos".

4.1.2 Medidas

Quando questionados sobre alterações nas medidas de produtos exportados, os entrevistados E1, E2 e E3 afirmaram que as alterações foram realizadas para atender a demandas externas e não devido a leis ou normas. O entrevistado E3 afirmou também que foram necessárias algumas alterações devido às unidades de medida utilizadas. Outro exemplo citado foi a profundidade maior de alguns estofados para atender à demanda dos consumidores norte-americanos, que preferem móveis com maior profundidade. Nota-se, no entanto, que essas alterações foram bem recebidas no mercado nacional, conforme citado pelo entrevistado E3. Além disso, o entrevistado citou a alteração no padrão de alguns outros estofados, pois no mercado norte-americano, diferentemente do Brasil, são vendidos sofás de dois lugares e meio e de três lugares e meio.

4.1.3 Composição

Os três entrevistados (E1, E2 e E3) concordaram ao afirmar que não ocorrem alterações nas composições dos produtos especificamente para o exterior. O que ocorre, segundo o entrevistado E3, são mudanças em alguns compostos químicos, mas isso ocorre em toda linha de produção. O entrevistado E3 citou a utilização de componentes que poluem menos. Essas alterações, segundo o entrevistado E3, são feitas tendo em vista a preocupação com o meio ambiente, fato que contribui para a afirmação da marca no exterior, considerando que o mercado externo dá muito valor às questões ambientais.

4.1.4 Rótulo e Embalagem

Quando questionados sobre alterações em idiomas nas embalagens dos produtos, os três entrevistados foram unânimes, afirmando que as embalagens de produtos exportados foram traduzidas para o inglês e o espanhol. O entrevistado E3 explicou como funciona o sistema: "Realizamos alterações no idioma das etiquetas. Elas saem em português, espanhol ou inglês. Nosso sistema detecta o mercado destino e, na hora de imprimir, seleciona os idiomas adequados".

Quando questionados sobre alterações em embalagens influenciadas por leis e normas, os entrevistados E1 e E3 afirmaram que o mercado impõe algumas exigências em embalagens para transporte, porém a empresa já atende essas exigências no mercado interno. Dessa forma, torna-se desnecessária a alteração, conforme citado pelo entrevistado o E1. Por outro lado, o entrevistado E3 cito algumas alterações que são feitas na forma de embalar o produto exportado, afirmando que, sempre que possível, o móvel é enviado para o exterior desmontado. O entrevistado E3 complementou, afirmando que a primeira linha de produto vendida ao mercado americano era toda desmontável, para facilitar a exportação. Porém, atualmente, o que ocorre são apenas mudanças pontuais na forma de envio e não produtos totalmente adaptados em função da logística de exportação.

4.1.5 Manual de Instruções

A empresa disponibiliza manuais de instruções em todos os móveis vendidos. Essa informação foi confirmada pelos três entrevistados (E1, E2 e E3). O entrevistado E3 complementou, afirmando que a empresa utiliza o mesmo manual, tanto para o mercado interno quanto para o externo. O entrevistado E1 afirmou ainda que a empresa procura elaborar manuais bem detalhados para satisfazer a exigência do mercado externo e diminuir as chances de problemas de montagem e má utilização.

Os três entrevistados afirmaram que a empresa produz manuais trilíngues, em português, inglês e espanhol. Os entrevistados E2 e E3 afirmaram que os manuais não sofrem alteração para os mercados externos, pois já são elaborados para atender às exigências dos mesmos.

4.1.6 Design

Quando questionado sobre alterações no design de produtos para o mercado externo, o entrevistado E2 citou que houve muitas alterações no início do processo de exportação, tais como modificações no tamanho dos móveis e gavetas, qualidade dos materiais, dentre outras.

O entrevistado E1 complementou, afirmando que inicialmente foi criada uma linha nova especialmente baseada no mercado americano". Já o entrevistado E3 citou o lançamento de linhas de produtos-conceito, criados com foco no design. Essa 'revolução', como chama o entrevistado E3, deu-se devido à contratação de um diretor de marketing americano, que criou um novo conceito na empresa e gerou uma grande mudança nos produtos, sendo inseridos novos acabamentos, cores, texturas e peças complementares. Todas essas alterações foram baseadas no mercado americano, mais precisamente Nova Iorque.

Quando questionados sobre cores, os entrevistados explanaram informações diferentes. O entrevistado E1 citou a existência de cores mais clássicas nos catálogos da empresa, devido à demanda do mercado norte-americano. Já o entrevistado E2 citou uma coloração específica (wengué), adicionada no catálogo especificamente para atender a demanda da América Latina. O entrevistado E3, por sua vez, afirmou que a empresa possui um leque variado de cores, e que algumas auxiliam a empresa a posicionar-se como "atualizada".

Quando questionado sobre a necessidade de alteração de cor de algum produto para atender à demanda do mercado externo, o entrevistado E3 afirmou que já foram desenvolvidas cores específicas como esse intuito e que, na maioria das vezes, essas cores passaram a ser vendidas para todos os mercados (internalização).

4.1.7. Efeito País de Origem

Tratando-se de efeito país de origem, os entrevistados E1, E2 e E3 responderam que a empresa nunca foi afetada negativamente por esse fator. O entrevistado E3 foi além, afirmando que a empresa tirou vantagem do efeito país de origem e que alguns produtos foram bem recebidos no exterior justamente por serem brasileiros. O entrevistado também mencionou que Copa do Mundo ajudou, deixando o país mais visível no exterior.

4.2. Síntese e discussão dos resultados

A Figura 3 apresenta a síntese dos fatores citados pelos entrevistados em que houve adaptação dos produtos da empresa. Percebe-se que, em grande medida, o caso estudado reflete o que havia sido identificado na literatura, já que apenas um dos sete fatores identificados na revisão bibliográfica não foi citado pelos entrevistados.

Figura 3 – Fatores em que houve alterações nos produtos conforme os entrevistados

Fator

Houve alterações nos produtos?

SIM

NÃO

Marca

 

X

Medidas

X

 

Composição

 

X

Rótulos e Embalagem

X

 

Manual de Instruções

X

 

Design

X

 

Efeito País de Origem

 

X

Kotabe e Helsen (2000) afirmam que a escolha do país destino é um ponto crucial no desenvolvimento de um projeto de internacionalização. No caso da empresa estudada, o primeiro mercado de atuação foi o dos Estados Unidos. Cavusgil, Knight e Riesenberger (2010) afirmam que muitas empresas, quando decidem inserir-se no mercado externo, acabam escolhendo mercados semelhantes para internacionalizar seus produtos. Neste caso, a empresa estudada optou por um mercado pouco semelhante ao seu. Na realidade, o que mais contribuiu foram os contatos que a empresa possuía nos Estados Unidos. Eles foram o ponto crucial para a inserção da empresa no mercado externo.

Para Cateora e Graham (2009), o lançamento de um produto no mercado externo exige total atenção da empresa. A informação é crucial para o sucesso da estratégia de internacionalização, e foi o que fez a empresa. Os contatos da empresa nos Estados Unidos já conheciam o mercado-alvo e tinham contato direto com a cultura local. Isso facilitou o processo de internacionalização, mas, mesmo assim, muitas mudanças foram necessárias.

Segundo Pride e Ferrell (2001), muitas empresas quando iniciam processos de internacionalização buscam firmar sua marca globalmente. É o que ocorreu com a empresa estudada, que tem conseguido vender a mesma marca e o mesmo produto, salvo algumas alterações, em todo o mundo. Essas alterações são consequência de diversos fatores e têm por objetivo possibilitar a entrada do produto em um mercado destino. Para Theodosiou e Leonidou (2003), a adaptação aproveita uma brecha de mercado, atendendo às necessidades do consumidor. É o que ocorreu com a empresa estudada, que muitas vezes se viu obrigada a realizar adaptações para competir com a concorrência local e desenhar um produto mais adequado ao mercado pretendido (Keegan, 2005).

Tendo em vista o plano de adaptação, destacam-se algumas alterações que sofreram influência direta da cultura, como mudanças em alguns padrões de tamanho devido ao sistema de medidas dos Estados Unidos e ao gosto do consumidor americano por ambientes mais espaçosos. Outra estratégia utilizada pela empresa é a criação de novas linhas de produto com foco no design, ou 'linhas-conceito'. Essas linhas surgiram após a contratação de um diretor de marketing americano, que trouxe para a empresa sua experiência e a usou para elaborar novos conceitos.

Cateora e Graham (2009) afirmam que a cultura afeta todos os aspectos da vida do ser humano, desde a forma de viver até a forma com que gasta seu dinheiro. Para Kotabe e Helsen (2000), existem alguns fatores da cultura que são facilmente estudados pelas empresas, como religião e idioma, porém existem outros que são mais difíceis de estabelecer, principalmente as preferências estéticas. Dessa forma, a empresa acertou ao contratar alguém que já possuía conhecimento da cultura do mercado de destino, facilitando o entendimento do consumidor.

O diretor de marketing introduziu novas linhas-conceito, baseadas na demanda do mercado destino. O mercado americano carecia de peças soltas, para composição de mobiliário. Dessa forma, a empresa supriu essa demanda, adotando um novo conceito e criando linhas mais focadas na estética. Essas linhas posteriormente foram trazidas ao Brasil, fortalecendo a imagem de modernidade da empresa no mercado nacional. Isso encontra eco em Cateora e Graham (2009), que afirmam que um ponto fundamental na criação de um produto é o seu grau de inovação e a capacidade que tem de criar uma nova demanda e estabelecer padrões.

Cateora e Graham (2009) afirmam que, para competir no mercado global, as empresas devem focar em qualidade, pois atualmente o consumidor tem a capacidade de pesquisar e descobrir exatamente o que está consumindo. A empresa estudada tem internalizado adaptações e, com isso, tem aumentado a qualidade dos produtos. Essa internalização contribui também para a padronização. Kotabe e Helsen (2000) reiteram que a padronização contribui para a qualidade e também para a redução de custos. Já Ryans, Griffith e White (2003) afirmam que a padronização contribui para a redução de custos, enquanto a adaptação aumenta o valor agregado do produto. Nesse sentido, Alimiene e Kuvykaite (2008) sintetizam que uma boa escolha é uma solução composta de marketing, permitindo adaptar quando necessário, mas padronizando a maioria das operações para reduzir custos, sempre observando e tomando cuidados com fatores pontuais. É isso que ocorre com a empresa estudada, que Busca adaptar seus produtos para atender demandas dos mercados externos e, sempre que possível, internaliza essas adaptações no mercado interno, buscando uma padronização. Conforme enfatizaram os entrevistados, assim praticamente todos os produtos vendidos no mercado externo acabam também sendo vendidos aqui no Brasil.

5. Considerações finais

Observou-se que a empresa estudada optou pelo mercado americano como porta de entrada para o exterior por possuir contatos que já conheciam a cultura local. Essa experiência facilitou a entrada dos produtos e as alterações nos mesmos. Diversas alterações feitas durante o processo de internacionalização foram internalizadas e agora fazem parte do processo de produção da empresa. Esse fato denota a transferência de tecnologia e melhoria de produtos provenientes da atuação no exterior.

Houve convergência entre o levantamento bibliográfico e os resultados encontrados quanto aos seguintes fatores: medidas, rótulos e embalagens, manual de instruções e design. Por outro lado, os entrevistados não citaram alterações nos produtos no que se refere à marca, à composição e ao efeito país de origem. Portanto, pode-se afirmar que, em linhas gerais, o estudo refletiu o que havia sido identificado na literatura, corroborando-a, embora não totalmente. Por outro lado, deve-se ressaltar que os resultados encontrados limitam-se apenas à empresa estudada, tornando-se inviável sua generalização. Deve-se destacar, também, que a escolha da empresa foi feita por conveniência e que o estudo abrange apenas o setor moveleiro.

Finalmente, sugere-se que, em estudos futuros, seja aprofundada a análise dos fatores referentes à internalização ou à transferência de tecnologia, pois os mesmos apresentaram uma forte ligação com as adaptações realizadas. Também podem ser realizadas pesquisas mais amplas, abrangendo mais de uma empresa e outros setores além do moveleiro.

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1. Universidade de Caxias do Sul (UCS), Brasil – e-mail: douglas.scortegagna@gmail.com
2. Universidade de Caxias do Sul (UCS), Brasil – e-mail: rbgoncal@ucs.br
3. Universidade de Caxias do Sul (UCS), Brasil – e-mail: gbbvieir@ucs.br


 

Vol. 36 (Nº 19) Año 2015

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