Espacios. Vol. 36 (Nº 17) Año 2015. Pág. 1

Desafiando ortodoxias para inovar: Um relato de experiência

Challenging orthodoxies to innovate: An experience report

Marcos Vinícius BARROS 1; Cristiano TOLFO 2; Marcelo Gitirana Gomes FERREIRA 3; Fernando Antonio FORCELLINI 4; Osmar POSSAMAI 5

Recibido: 07/05/15 • Aprobado: 12/07/2015


Contenido

1. Introdução

2. Referencial teórico e aspectos metodológicos

3. Relato de experiência

4. Considerações Finais

Referências


RESUMO:

As organizações podem possuir um conjunto de suposições a respeito da sua área de atuação que passam a ser não mais questionados. Algumas destas suposições têm sido relacionadas ao termo ortodoxias, especialmente quando estão relacionados a iniciativas que busquem por meio do pensamento não convencional a inovação no desenvolvimento de novos produtos, serviços e modelos de negócio. Este trabalho apresenta um relato de experiência que envolve a análise de uma iniciativa de inovação que envolveu o questionamento de ortodoxias. Trata-se de um estudo qualitativo onde, alinhado a literatura que aborda o tema, foi analisada uma iniciativa de inovação que teve o questionamento de ortodoxias em sua concepção. Ao analisar alguns dos possíveis obstáculos e facilitadores envolvidos deste a concepção inicial da ideia até o lançamento do produto verificou-se que ao se desafiar ortodoxias também devem ser consideradas especificidades inerentes a iniciativas de inovação.
Palavras-chave: Inovação, ortodoxias, gestão da inovação.

ABSTRACT:

Organizations can have a set of assumptions about their area of expertise that are now no longer questioned. Some of these assumptions have been related to the orthodoxies term, especially when related to initiatives that seek through unconventional thinking innovation in developing new products, services and business models. This paper presents an experience report that involves the analysis of an innovation initiative that involved the questioning orthodoxies. This is a qualitative study which lined the literature that addresses the issue an innovation initiative that had the orthodoxies of questioning in their design was analyzed. By analyzing some of the possible obstacles and facilitators involved in this initial conception of the idea to the product launch was found that by challenging orthodoxies should also be considered specific aspects of innovation initiatives.
Keywords: Innovation, orthodoxies, management innovation.

1. Introdução

A necessidade de inovar tem se tornado uma constante nos mais variados segmentos dos sistemas produtivos, sendo que as empresas devem investir cada vez mais em iniciativas de inovação que lhes passam lhes manter competitivas. As iniciativas voltadas para inovação podem variar conforme o porte, o setor de atuação, a cultura e outras especificidades da organização. Já a sistematização destas iniciativas de inovação pode ser observada no sistema de gestão de projetos de inovação adotado pela empresa, em como está implantada a gestão da inovação e como ocorre o processo de inovação.

A sistematização das iniciativas de inovação deve considerar, conforme preconizado por Hamel (2000), que assim como ocorre com os produtos, o ciclo de vida das estratégias e da inovação também estão se tornando cada vez mais breves. O mesmo autor também utilizara o termo ortodoxia para se referir a empresas que quando bem estabelecidas em seu segmento de atuação correm o risco de acreditar na permanência da sua liderança e não mais questionar as suas estratégias.

Sharzynski e Gibson (2008) associam o termo ortodoxias às convicções a respeito do que impulsiona o sucesso em uma empresa ou setor. Para Snyder e Duarte (2008), ortodoxias são práticas arraigadas ou paradigmas que restringem a criação de novas oportunidades. Já Pascale (2007) lembra que as ortodoxias não se restringem às grandes empresas. Segundo o autor, empresas de todos os tipos - inclusive as iniciantes – apresentam normas, crenças e valores informais que podem acabar restringindo a sua capacidade de inovação.

Tendo como foco de estudo o questionamento de ortodoxia em iniciativas de inovação este artigo apresenta um relato de experiência baseado em entrevista e análise documental que relata a concepção da ideia de um produto por meio do questionamento de ortodoxias, bem como os direcionamentos adotados pela empresa desde a geração da ideia até o lançamento do produto.

O presente trabalho não foca a prescrição de um modelo de gestão de inovação ou detalhamento de um processo de inovação. Seu escopo delimita-se em evidenciar a relação existente entre inovação e ortodoxias a sua importância em iniciativas de inovação.

Na segunda seção está estruturada a literatura sobre o tema relacionado ao objetivo deste trabalho bem como os aspectos metodológicos adotados. A terceira seção contém o relato de experiência desta iniciativa de inovação e os resultados obtidos confrontando a análise do relato com a literatura adotada.

2. Referencial teórico e aspectos metodológicos

No contexto de inovação em negócios, Sharzynski e Gibson (2008. P 45) definem ortodoxias como "Convenções profundamente e amplamente aceitas quanto ao que impulsiona o sucesso em uma empresa ou setor".  Apontam também que as ortodoxias não são necessariamente negativas ou equivocadas, mas que podem acabar limitando a capacidade de inovação das empresas.

De forma complementar, Srivastava, Franklin e Martinette (2015) mencionam que as ortodoxias desenvolvidas em uma empresa podem até fazer parte da sua vantagem competitiva, mas que por outro lado, podem acabar inibindo iniciativas de inovação. Também Davila et al. (2002)  afirma que cada organização possui um sistema de crenças que orienta o seu sistema de gestão e a forma em que são tomadas as decisões. Contudo, o autor observa que há o risco destas crenças converterem-se em ortodoxias e tornarem inquestionável o modus operandi estabelecido na empresa. Por outro lado, Johnsen (2014) apresenta questionamentos e reflexões a respeito das ortodoxias.

Sheth (2007) associa as ortodoxias a hábitos autodestrutivos de organizações que alcançaram o sucesso, entre eles, o da negação. Este hábito é reforçado por mitos que a empresa cria a respeito de sua invulnerabilidade.  Segundo o autor, a negação pode gerar mecanismos de defesa que impedem: a percepção de que tecnologias emergentes podem tornar obsoleto um negócio rentável; reconhecer que os padrões de consumo estão mudando; admitir que o cenário competitivo e o ambiente global também mudam.  

Na literatura sobre o tema o termo ortodoxia é utilizado por Snyder e Duarte (2008) ao apresentar um caso em que houve uma quebra de ortodoxia ocorrida depois de questionar a premissa de que o público feminino é o principal interessado por eletrodomésticos. A partir deste questionamento, um grupo de inovadores incrementou um novo modelo de negócio tendo o público masculino como segmento alvo. O produto concebido é um sistema de organização de garagens automotivas, trata-se de um conjunto de unidades de armazenamento e utensílios.

Outro caso semelhante é apresentado por Roth e Sneader (2006), que ao abordar o desafio de ortodoxias no setor da indústria de alimentos, mencionam um caso da multinacional do setor alimentício, que ao observar o cotidiano dos alunos de algumas escolas perceberam que iogurte não fazia parte de seus lanches. A razão para isso foi detectada na falta de praticidade em consumi-lo, pois os estudantes deveriam utilizar uma colher para tomar iogurte. Desta forma, a iniciativa de oferecer o produto e a praticidade, acabou gerando o conceito de iogurte pronto para beber.

No que diz respeito a métodos e técnicas de questionar ortodoxias, Hamel (2007, p. 119) apresenta uma metodologia para que as empresas possam realizar inovação em gestão, na qual recomenda como componente básico um "Processo disciplinado para descobrir e contestar ortodoxias antiquadas de gestão que limitam o pensamento criativo".  Enquanto que Sharzynski e Gibson (2008) apresentam quatro abordagens para auxiliar as empresas a identificar e desafiar ortodoxias em suas iniciativas de inovação.

Em iniciativas de inovação em modelos de negócios, Osterwalder e Pigneur (2013, p. 137) ressaltam que "Para inovar desafiando ortodoxias em modelos de negócios além de ignorar o status quo, esquecer o passado e parar de se concentrar nos competidores". Além disso, os mesmos autores afirmam que:

"Inovar em modelos de negócios não significa olhar para trás, pois o passado indica pouco do que é possível para os modelos de negócios futuros. A inovação em modelos de negócios não tem nada a ver com observar a concorrência, já que inovar não é copiar ou comparar, mas criar novos mecanismos de valor e receitas. Ao contrário, inovação em modelos de negócios significa desafiar ortodoxias para projetar modelos de negócios originais que atendam a clientes insatisfeitos, novos ou que nem haviam sidos considerados (OSTERWALDER; PIGNEUR, 2013, p. 137)."

Um exemplo de inovação concebida por meio do questionamento de ortodoxias durante a concepção de um novo modelo de negócio pode ser observado em Snyder e Duarte (2008) que relata que um novo modelo de negócio surgiu a partir da identificação da ortodoxia de que os lucros da indústria da linha branca são impulsionados apenas por determinados tipos de eletrodomésticos.  Trata-se de um modelo de negócio no qual o purificador de água é instalado sem custos na residência do cliente mediante ao pagamento de uma assinatura mensal para utilizar o produto.

De acordo com Snyder e Duarte (2008), quando se busca ideias inovadoras, são realizadas seções de brainstorming que visam identificar e desafiar ortodoxias, sendo que as mesmas iniciam com questões do tipo: O que os clientes jamais falariam sobre a nossa empresa? Este exercício faz com que sejam identificadas ortodoxias sobre situações, modelos de negócio, produtos ou serviços. Assim, as mesmas podem ser exploradas com questões do tipo: Se invertermos estas ortodoxias, que novas oportunidades ou novas regras surgem?

O questionamento de ortodoxias normalmente está vinculado ao estimulo da capacidade criativa e de inovação dos funcionários, possibilitando que estes possam vislumbrar alternativas em serviços, produtos ou modelos de negócios que não se enquadrem ao pensamento convencional da sua área de atuação.

2.1. Aspectos metodológicos do trabalho

Baseado em Bertucci (2011) o relato de experiência apresentado neste trabalho pode ser classificado a pesquisa como do tipo descritiva, trata-se de um estudo que descreve um fenômeno organizacional com o objetivo ilustrar algumas das relações entre as ortodoxias e a possibilidade de gerar inovação. A técnica utilizada foi pesquisa documental a respeito de registros do projeto de inovação apresentado na quarta seção e também o relato de experiência de um dos participantes de projeto.

Em relação à unidade de análise trata-se de uma unidade de uma multinacional da indústria de eletrodomésticos tendo como critério de escolha a existência de um projeto em que foi vivência do tema de estudo dos pesquisadores e também o acesso às informações sobre o mesmo.

A variável de pesquisa envolve o processo de operacionalização e de gestão de um projeto de inovação em que a unidade de análise participou e tem como dimensão observada a condução de uma ideia inovadora deste a sua concepção até o lançamento do produto. A análise dos dados ocorreu de forma qualitativa relacionando o relato de experiência com a literatura sobre o tema. Os resultados do relato de experiência foram analisados sob a ótica de um dos participantes do projeto de inovação e teve como guia um conjunto de questionamentos propostos por Sharzynski e Gibson (2008) para verificar iniciativas de inovação.

A análise dos resultados deste trabalho também utilizou as classificações de oportunidades de inovar propostas por Sharzynski e Gibson (2008), o autor classifica oportunidades de inovar como do tipo sprint e do tipo Maratona. As sprints são oportunidades de inovar que devem ser postas em prática, porque além da evidência do lucro, há competências e tecnologias disponíveis. Já as maratonas requerem um desenvolvimento mais lento, pois podem ser necessários alguns anos para definir a tecnologia adequada e sensibilizar o público alvo para que ocorra o seu lançamento. 

O relato de experiência a ser apresentado na próxima seção foi obtido em uma unidade brasileira de multinacional do setor de eletrodomésticos. A interação com a empresa ocorreu por meio de entrevistas realizadas com um gerente da unidade que é uma da fábrica de produtos de refrigeração.

A partir dessa interação, obtiveram-se informações sobre o projeto de um novo conceito de refrigerador, idealizado por funcionários das unidades que integram a representação da multinacional no Brasil. A concepção e desenvolvimento desse projeto valeram-se do desafio de ortodoxias, sendo que houve a efetiva participação do Gerente entrevistado.

 

3. Relato de experiência

O relato de experiência apresentado nesta seção envolve a concepção de um que foi objeto de dois projetos sucessivos. Assim, apesar dos relatos dos projetos que são feitos a seguir serem oriundos da mesma idéia (conceber um novo conceito de refrigerador compacto), o relato foi observado sob dois momentos distintos. Num primeiro cenário observa-se o projeto do refrigerador FC, posteriormente o projeto do refrigerador FP.

O relato de experiência apresenta uma iniciativa de inovação que se originou a partir de uma perspectiva de que a indústria de linha branca, tradicionalmente organizada na produção em alta escala e estreita margem de lucro, possui preceitos que atribuem características de commodities a alguns produtos.  Esta iniciativa de inovação acabou direcionando dois projetos de lançamento de um refrigerador compacto voltado a segmentos específicos. Neste trabalho os projetos serão denominados de Projeto Youth FC e de Projeto FP ambos tiveram origem depois que a empresa desafiou a ortodoxia de que refrigeradores compactos são apenas caixas brancas, de baixo custo e que servem apenas para refrigerar.

3.1. Projeto Youth FC

A ideia inicial do Youth FC nasceu em 2001 durante um projeto de inovação promovido pela multinacional. Nesta iniciativa, representantes das unidades mundialmente distribuídas reuniram-se para discutir e encontrar soluções inovadoras. Compondo a região da América Latina, no Brasil reuniram-se representantes das unidades que foram o grupo.

Com a proposta apresentada e obtida a permissão para desenvolvimento do projeto definiu-se que, apesar da idéia ter sido concebida no Brasil, o primeiro lançamento do produto seria no mercado dos Estados Unidos. Como segmento alvo se elegeu o público jovem, mais especificamente, os estudantes norte-americanos. No Quadro 1 estão descritas algumas das  principais premissas do projeto.

Quadro 1 – Principais premissas para o desenvolvimento do Youth FC.

Premissa

Explicação

Apresentar design atrativo e não convencional

Estar alinhado com as novas tendências da moda, esportes, automóveis, entre outros.

Utilizar diferentes materiais como plástico, tecidos, couro, madeira, entre outros.

Adequar-se ao estilo de vida do usuário

Possuir novas formas, tamanhos, cores e texturas.

Permitir o uso da mesma unidade refrigerada com diferentes opções de gabinete.

Disponibilizar acessórios exclusivos (etiquetas, imãs, CD FPyers, relógio, etc.), permitindo que os mesmos sejam escolhidos de maneira a melhor atender o estilo de vida.

Ter mobilidade e portabilidade

Ser composto de rodas, permitindo que o produto seja movimentado pela casa.

Ser composto de pegas, facilitando a mobilidade do produto para outros lugares.

Ser modular

Permitir ao gabinete ser alterado sempre que surgir a necessidade de algum novo design ou função.

Fonte: Empresa objeto de estudo.

A fim de traduzir as premissas do projeto, foram realizados workshops na área de design industrial da unidade objeto de estudo, onde surgiram as primeiras propostas de projetos representadas na Figura 1.

Figura 1 – Primeiros Esboços para o Youth FC. Fonte: Empresa objeto de estudo.

Uma segunda abordagem para o projeto foi posteriormente desenvolvida em 2002. Esta abordagem foi concebida tendo como segmento alvo home enthusiasts, ou seja, pessoas que querem ter em suas residências tudo o que há de novo e diferente. Neste projeto o produto foi chamado Premium FC, devido ao seu caráter mais sofisticado.  Estudou-se como seria a sua usabilidade e quais seriam os possíveis acessórios, tal como painéis frontais removíveis, botons e aparelhos inclusos no produto, como rádio e relógio.

Uma vez definido o escopo final das versões Youth FC e Premium FC, no ano de 2002 foi feita uma avaliação de vários produtos semelhantes que empregassem mobilidade, portabilidade e customização. Os produtos foram avaliados quanto a sua usabilidade, sendo que alguns deles foram colocados em casas de consumidores por um período de quatro semanas. Neste período diferentes aspectos foram monitorados, tais como: o que as pessoas costumavam armazenar no refrigerador, sua facilidade de uso, mobilidade e portabilidade, percepções a respeito do design, em que parte da residência o produto foi colocado e quais comentários os usuários realizaram.

Também foram realizados workshops e pesquisas junto aos potenciais consumidores do produto, neste caso, os estudantes norte-americanos. A interação com os estudantes permitiu aos mesmos representar em forma de desenhos suas percepções sobre a proposta do projeto, bem como quais as suas expectativas com relação a este tipo de refrigerador.

Após o entendimento das premissas de projeto, a análise de produtos que entregavam conceitos semelhantes e a sondagem das expectativas dos futuros consumidores, foi realizada a materialização das idéias em um conceito de produto. Nesta etapa, as áreas de CIT e Design Industrial trabalharam juntos no desenvolvimento dos primeiros protótipos. Uma força tarefa, em um mês, executou um conjunto de onze protótipos. Na Figura 2 é mostrado o caminho de migração até se chegar aos primeiros protótipos.

Figura 2 – Dos primeiros esboços aos primeiros protótipos. Fonte: Empresa objeto de estudo.

Uma vez desenvolvidos os primeiros protótipos, a etapa seguinte foi obter uma avaliação dos mesmos por parte dos seus potenciais consumidores. Esta etapa foi realizada nos EUA. Algumas seções com grupos de consumidores foram realizadas para entender suas percepções a respeito do produto, design, características, acessórios, entre outros.  No Quadro 2 é apresentado algumas das constatações obtidas pelo grupo projeto de inovação LAR (Latin American Region).

Quadro 2 - Principais premissas para o desenvolvimento do FC.

Constatação

Explicação

Refrigerador compacto

Combinar tamanho pequeno com grande capacidade de armazenagem, ou seja, deve maximizar a pequena quantidade de espaço existente.

Versatilidade

Fornecer ajustes e possibilidade de remoção de componentes para melhor se adequar a todos os tipos de necessidade. Compartimentos especializados acabam por diminuir a capacidade de armazenar alimentos ao invés de aumentá-la.

Estética

Não ter a aparência de um refrigerador. Deve se integrar ao ambiente. Muitas vezes o refrigerador serve como móvel onde se coloca televisão ou microondas em cima.

Manter sempre o aspecto de limpo. Segundo os estudantes, deveria dissimular a sujeira, mesmo que o mesmo não fosse limpo por muito tempo.

Interior

Compartimentos especializados foram bem avaliados pela comodidade de pôr os alimentos sem a necessidade de se pensar onde colocá-los, mesmo que estes compartimentos interferissem na possibilidade do consumidor otimizar o espaço interno. O conceito de porta-lata também foi um acessório bem avaliado e teve um grande apelo. A gaveta de legumes foi um acessório considerado com baixa prioridade.

Controles

A grande maioria dos estudantes afirmou que os controles devem ser fáceis de usar, não devem ser muito aparentes e que não tivessem a necessidade de muita interação.

Acessórios

O sistema de degelo automático foi considerado importante para muitos consumidores. Os rodízios também tiveram um apelo grande pela necessidade de movimentação freqüente. Como os refrigeradores compactos são colocados normalmente em espaços pequenos, portas reversíveis foi um item bem avaliado. Um acessório que não teve uma avaliação positiva foi o dispositivo ice maker que, embora seja de comum o uso de gelo nos EUA, tiraria espaço do produto.

Fonte: Insights & Findings. Fonte: Empresa objeto de estudo.

Segundo o entrevistado deste trabalho, uma das principais competências da Multinacional objeto de estudo é a sua capacidade de criar parcerias estratégicas com o varejo. Desta forma, ainda no ano de 2002 o projeto foi apresentado a uma grande rede de varejo norte-americana, a qual se tornou o financiador do projeto. Definiu-se que o refrigerador faria parte de um mix de produtos que comporiam uma nova marca, aqui denominada de Emotional Appliances. No mix dessa marca seriam incluídos aparelhos microondas, purificadores de ar, dentre outros.

Estabelecida a parceria estratégia e a nova marca, o projeto foi submetido ao comitê de avaliação e seleção de conceitos de projeto, situação em que teve o seu conceito definido. Neste processo, ficou determinado que devessem ser feitos testes de campo para avaliação dos aspectos funcionais do projeto.

Os protótipos para teste de campo foram construídos em setembro de 2002 e os referidos testes iniciados em novembro de 2002. Em dezembro de 2002 o projeto obteve aprovação, passando com isso para a fase de conversão. O projeto passou a ser chamado Youth FC Lite (Figura 3).

Figura 3 – Youth FC Lite. Fonte: Empresa objeto de estudo.

O projeto foi apresentado em março de 2003 para aprovação do seu FP no de negócio. Em agosto de 2003, decidiu-se pela postergação do lançamento do produto de outubro de 2003 para fevereiro de 2004. Isso ocorreu em função do atraso apresentado pelos demais projetos da marca Emotional Appliances, principalmente o projeto de móveis que deveriam compor esta marca.

Em outubro de 2003 a rede de varejo norte americana que financiou o projeto resolveu cancelar a criação da marca Emotional Appliances e em dezembro de 2004, depois de avaliações sobre mudanças nas condições do mercado, o Marketing da Multinacional objeto de estudo também desistiu do lançamento do produto. Em fevereiro de 2004 todas as negociações encerraram-se e a mesma declinou do lançamento do projeto nos EUA. Nesta etapa, o produto estava praticamente pronto para o lançamento, inclusive já havia sido efetuado o ajuste da linha de montagem na unidade brasileira, conforme a Figura 4.

Figura 4 – Youth FC Lite. Fonte: Empresa objeto de estudo.

Segundo o entrevistado, apesar de não ter ocorrido o lançamento do Youth FC Lite, ao longo da estruturação de seu sistema de inovação a multinacional também aprendeu a reavaliar os produtos e serviços que falharam na primeira tentativa. O mesmo afirma que a empresa possui um portfólio de experimentos que é disponibilizado para que outros funcionários possam rever estas experiências. O caso do FP, descrito a seguir, baseado na experiência obtida com o projeto FC representa um exemplo do uso deste portfólio.

3.2. Projeto FP  

O projeto do refrigerador que seria lançado no mercado dos EUA foi de fato suspenso para aquele país, mas teve a oportunidade de ser repensado e se concretizar no Brasil. Inspirado no projeto FC, o departamento de marketing regional recebeu apoio para tentar inovar no mercado brasileiro. O refrigerador lançando no Brasil com a marca comercializada no país e neste trabalho é denominado de FP. Uma das estratégias utilizadas foi a de marketing de segmentação, associando o produto ao mundo fashion e aos formadores de opinião. Seu lançamento ocorreu na décima edição de um dos maiores eventos de moda do Brasil.

O produto tentou diferenciar-se por ser lançado contendo a grife de renomados estilistas da moda. As obras criadas pelos estilistas para o FP estão representadas em painéis que são afixadas na porta do refrigerador, podendo ser trocadas conforme as percepções do usuário.

De acordo com os relatos fornecidos, o FP atingiu parte de seus propósitos, pois houve a aproximação de novos segmentos com a organização e, principalmente, uma importante estratégia de marca. O conceito que envolveu o FP gerou mídia em canais de comunicação: revistas, jornais e televisão. Sua proposta e o inusitado lançamento em um evento que dita tendências foi elogiada por arquitetos, designers e profissionais ligadas à moda.  

3.3. Resultados obtidos

Diante da análise dos projetos FC e FP, são identificados alguns possíveis facilitadores e obstáculos que envolveram estas iniciativas de inovação. Estes projetos também são analisados sob a ótica do portfólio de experimentos mantido pela multinacional.

O presente trabalho utiliza-se desses questionamentos para refletir sobre os projetos apresentados na terceira seção. Ou seja, os projetos do FC e do FP foram submetidos a determinadas reflexões para que se compreenda parte do contexto que se apresentou nas tentativas de lançamento do produto (Quadro 3). A partir da interpretação destes contextos é possível presumir alguns dos aspectos que influenciaram na trajetória dos dois projetos.

Quadro 3: Questões ao avaliar a oportunidade de inovar, contexto do Youth FC Lite e do Projeto FP.

Questionamentos para inovar (SHARZYNSKI E GIBSON, 2008).

Contexto observado no projeto do Youth FC Lite

Contexto observado no projeto do FP

Existem obstáculos substanciais que devem ser superados?

Transformar commodities em price-premium.

Criar vínculo emocional entre consumidor e produto. 

Customização direcionada a públicos específicos e à associação do produto a um estilo de vida.

Inserir refrigeração em diferentes pontos da residência.

O lançamento no mercado depende de produtos ou serviços complementares?

Trata-se de um item de um mix de produtos. O produto esteve associado a produtos e serviços complementares.

A capacidade de criar vínculo entre a marca e seus clientes é uma das suas competências essenciais.

Será necessária uma nova infra-estrutura pra que este tipo de mercado se desenvolva?

A aliança da empresa objeto de estudo com a rede de varejo parece ter evitado a criação de uma infra-estrutura para a comercialização do FC.

Para o FP, já existia pesquisa, testes, protótipos e o alinhamento da linha de produção. Além disso, O FP é comercializado pela internet.

Os clientes precisarão aprender novas técnicas ou adotar novos comportamentos?

Tendo um público alvo, realizaram-se diferentes pesquisas para conceber um produto que fosse ao encontro do estilo de vida e necessidades deste público.  

A proposta, o visual, o valor da marca e a estratégia de marketing de associar o produto ao conceito fashion geraram aceitação e mídia espontânea.

Haverá altos custos para os clientes?

Identificado e reproduzido as necessidades de um segmento alvo, os mesmos estariam dispostos a pagar pela diferenciação.

Trata-se de um produto exclusivo e customizável. É direcionado ao público que está disposto a pagar pela diferenciação.

Os padrões de concorrência confundirão os clientes e causarão o atraso em sua aceitação?

Uma particularidade do setor linha branca é justamente superar o obstáculo de diferenciar alguns de seus produtos não apenas pelo preço.

A imagem da marca, somada à estratégia de marketing adotada fizeram com que o FP alcançasse seus objetivos.

Será que o sucesso depende do alinhamento de interesses dos diversos componentes?

O lançamento da marca parece ter dependido, sobretudo, do alinhamento de interesses entre as partes envolvidas no projeto.

O FP inseriu-se na estratégia de marketing que reforça a identificação de certos segmentos de clientes com a marca.

Existem concorrentes poderosos que tentarão nos atrasar ou nos tirar dos trilhos?

Concorrentes que se caracterizam pelo baixo custo de produção e pouca diferenciação podem atrasar ou cancelar o lançamento de produtos segmentados.

O ativo estratégico representado pelo valor da marca e o conceito fashion que foi agregado acabou gerando um diferencial competitivo para o FP.

Diante da aplicação do questionamento proposto por Sharzynski e Gibson (2008) é possível salientar alguns aspectos importantes. Inicialmente é preciso notar que em virtude do tempo levado desde a concepção da idéia do refrigerador no ano de 2001 e a finalização do projeto em 2004 a oportunidade vislumbrada com o FC aproxima-se do tipo maratona.

Os quatro anos de desenvolvimento do projeto do refrigerador representaram mais que o triplo do tempo que normalmente é dispensado nestes produtos. Entre as justificativas para este atraso destacam-se as constantes interrupções, a experimentação de novas técnicas de pesquisa, as mudanças ocorridas no mercado.

Já em relação ao contexto do FP pode-se dizer que o projeto se aproxima de uma oportunidade Sprint. Neste caso, observa-se que já existem competências, tecnologias e ativos disponíveis, o que podem oportunizar a inovação. Além disso, a imagem da marca juntamente com a estratégia de marketing adotada pode ter contribuído para que o FP alcançasse seus objetivos.

Analisando os contextos dos projetos descritos no Quadro 3 percebe-se que mesmo valendo-se do questionamento de ortodoxias que conduzem a uma ideia original a apresentada nesta seção, a materialização de um novo conceito nem sempre ocorre facilmente. Apesar de desafiar ortodoxias, o lançamento do produto continuou atrelado à complexidade inerente a maioria das iniciativas de inovação.

4. Considerações Finais

Neste estudo verificou-se que iniciativas de inovação que buscam identificar e desafiar eventuais ortodoxias da empresa ou setor de atuação são alternativas que podem gerar inovação de valor para os clientes e a organização. Além disso, observou-se que o questionamento de ortodoxias é uma forma das empresas manterem-se atentas frente às possíveis mudanças de cenário competitivo.

Verificou-se também que, assim como outras formas de buscar a inovação, o desafio de ortodoxias é uma iniciativa de inovar que deve ser contextualizada a realidade da empresa, verificando se há competências e recursos para experimentá-la ou se é vislumbrado mercado para absorvê-las. Por outro lado, neste estudo constatou-se que a criação de portfólios de experimentos é uma alternativa para a experimentação de ideias não convencionais e a verificação de oportunidades de lançamento.

Referências

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1 (UFSC) marcos_vinicius_barros@whirlpool.com
2. (UNIPAMPA) cristianotolfo@unipampa.edu.br
3. (UFSC) Marcelo.gitirana@gmail.com
4. (UFSC) forcellini@deps.ufsc.br

5. (UFSC) possamai@deps.ufsc.br


 

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