Espacios. Vol. 36 (Nº 11) Año 2015. Pág. 16

Uma análise do capital social e qualidade de vida dos moradores da Vila Emater II, Maceió-AL

An analysis of social capital and quality of life of the residents of Vila Emater II, Maceió-AL.

Keuler Hissa TEIXEIRA 1; Iago MENDES 2; Rodrigo GOMES 3

Recibido: 24/02/15 • Aprobado: 03/04/2015


Contenido

1. Introdução

2. Referencial teórico

3. A Vila Emater: Origem e trajetória de desenvolvimento

4. Procedimento metodológico

5. Resultados

6. Conclusões

7. Referência Bibliográfica


RESUMO:
A Vila Emater II é o local de moradia de 200 famílias que sobrevivem trabalhando como catadores de materiais recicláveis no antigo lixão de Maceió, localizada no estado de Alagoas, Brasil. O objetivo geral deste estudo foi analisar as possíveis diferenças entre a qualidade de vida dessas famílias decorrentes da presença/ausência de capital social. Para realizar o trabalho foram empregados dados de origem primária e secundária. Os resultados mostraram que o grupo de moradores que fazem parte de alguma rede de cooperação possui um maior estoque de capital social e desfrutam de uma melhor qualidade de vida.
Palavras-chave: Qualidade de Vida, Capital Social e Vila Emater II, Maceió/AL.

ABSTRACT:
The Village Emater II is the home place of 200 families who survive by working as recyclable material collectors in former landfill of Maceio, located in the state of Alagoas, Brazil. The aim of this study was to analyze possible differences between the quality of life of these families from the presence / absence of social capital. To conduct the research we use data from primary and secondary source. The results showed that the group of residents who participate in any cooperative network has a larger stock of social capital and enjoy a better quality of life.
Keywords: Quality of Life, Social Capital e Vila Emater II, Maceió/AL.

1. Introdução

No debate e reflexões de políticas públicas que visam apontar as causas e soluções para melhoria da qualidade de vida das pessoas tem tido cada vez mais espaço nessas discussões o conceito sobre capital social.  De maneira geral, o capital social tem sido empregado, sobretudo para explicar os benefícios individuais ou coletivos oriundos da articulação em diferentes redes de relacionamento dos indivíduos e coletividade.

Para Bourdieu, o precursor dos estudos do Capital Social, como "el agregado de los recursos reales o potenciales que están ligados a la posesión de una reddurable de relaciones de conocimiento y reconocimiento mutuos mas o menos institucionalizadas" (Bourdieu, 1986). James Coleman (1990) sugere o capital social como recurso estrutural proveniente das relações sociais.

Este trabalho tem como objetivo avaliar, empiricamente, a relação entre capital social e qualidade de vida dos moradores de um território de alta vulnerabilidade social – A comunidade da Vila Emater II, localizada no bairro de Jacarecica, em Maceió/AL, Brasil. Com dados da pesquisarealizada na localidade em 2014, buscamos inferir sobre um possível padrão que caracteriza a relação entre capital social e qualidade de vida naquele território. Em outras palavras, pretendemos analisar as possíveis diferenças entre a qualidade de vida das famílias, decorrentes da presença/ausência de capital social, de modo a obter subsídios para elaboração de um diagnóstico que auxilie em políticas voltadas a melhoria da qualidade de vida destes moradores.

A área de estudo citada acima se justifica, em função, por ser um território com numa situação bastante, emblemática, caracterizado por alta vulnerabilidade social dos seus moradores.

Para atender nossos objetivos, buscamos por meio da aplicação de questionários, entrevistas, visitas à comunidade, gerar um índice relativo à qualidade de vida na Vila Emater II que envolvam os aspectos associados às características educacionais, habitacionais, de saúde, econômicas e de organização social.

Além desta introdução este trabalho será distribuído da seguinte forma: na segunda seção será apresentado o referencial teórico sobre capital social, enquanto que na terceira seção será feito uma breve contextualização da origem e trajetória de desenvolvimento da Vila Emater II. Na seção 4, apresenta-se o procedimento metodológico que será utilizado com intuído de atender nossos objetivos. Já a seção 5 traz os resultados encontrados desta pesquisa e, por fim, na última seção, serão apresentadas as conclusões do trabalho.

2. Referencial teórico

Para Nussbaum e Sen (1996) qualidade de vida pode ser definida como sendo a representação de combinações de coisas que um indivíduo é capaz (capacitações) de fazer ou ser, e as funcionalidades, que representa partes do estado de uma pessoa – as várias coisas que ela faz ou é. Em outras palavras, podemos dizer que a qualidade de vida pode ser analisada em termos da capacitação para alcançar as funcionalidades que envolvem aspectos que vão desde nutrir-se, ter saúde, educação até mesmo àqueles atributos ligados ao autorrespeito e intergração social.

Portanto, a compreensão sobre o desenvolvimento não se restringe apenas a uma análise das condições de renda dos indivíduos, mas deve-se considerar também uma abordagem mais ampla, que verifica também os funcionamentos e as capacitações dos indivíduos na busca de melhorias das suas condições de vida.  Conforme Scheneider e Freitas (2013), a condição de vulnerabilidade social diz muito mais que apenas "estar abaixo da linha da pobreza"; deve-se ir além de indicadores como a carência econômica das populações. Devem-se considerar também outros tipos de carência como desnutrição, condições precárias de habitação e saneamento, subemprego, subconsumo, falta de integração e suporte familiar e baixos níveis educacionais e culturais que têm a mesma importância que a carência econômica.

Segundo Pierre Bourdieu, para entender o mundo social dentro do sistema capitalista, é necessário discutir o capital em todas suas formas, não apenas limitado pela teoria econômica, que o reduz apenas ao aspecto da troca. Essa visão acaba escondendo a percepção não econômica do capital, que engloba os conceitos de capital cultural e capital social. (BOURDIEU, 1986).

O capital social pode ser definido, primeiramente, como a capacidade de produção formada por um fortalecimento do tecido social de cada comunidade. É a eficácia das ações promovidas pela coletividade, a reunião das demandas individuais de cada elemento da comunidade para que o litígio seja apresentado de uma maneira mais rígida.

Conforme Monasterio (2000), o principal responsável pela introdução do capital social nas agendas de pesquisa é James Coleman. Esse autor introduziu capital social como uma ferramenta conceitual para entender uma orientação teórica para a ação social, que combina componentes de perspectivas sociológicas e econômicas (FELDMAN e ASSAF, 1999).

Coleman (1988) refinou o conceito desenvolvido por ele mesmo, sobre capital social, antes contextualizado apenas no aspecto educacional. Buscou, então inseri-lo em uma estrutura teórica mais ampla, estabelecendo, dentro de uma perspectiva neofuncionalista, um vínculo casual claro entre o capital social e o acesso a recursos. Como outras formas de capital social, assinala o referido autor, o capital social é produtivo e possibilita a realização de certos objetivos que não seriam alcançados sem ele.  Ele ainda define capital social como recursos sócio-estruturais que consistem um ativo de capital para o indivíduo e facilitam certas ações de indivíduos dentro dessa estrutura.

Coleman ainda enumerou três formas básicas de capital social que podem ser encontradas dentro dessa estrutura. A primeira trata da confiança e reciprocidade, em relação à aceitação das obrigações a serem exercidas por cada indivíduo estruturante. A segunda relaciona a troca de informações dentro da comunidade e a terceira se refere às normas e sanções estruturantes do corpo social, que tem a função de retirar o foco dos interesses próprios em prol de um bem comum dos integrantes. (COLEMAN apud TEIXEIRA, 2004).

Após os estudos realizados por James Coleman, foi a vez do Professor da Universidade de Havard, Robert Putnam, aumentar a visibilidade do conceito de capital social na apropriação do estudo pela ciência política. O estudo de Putnam está registrado no livro Comunidade e Democracia: a experiência da Itália moderna. Nesta obra o autor aproveitou-se da reforma institucional da Itália, realizada após grande crise nacional, que resultou na descentralização de sua organização política, criando 20 regiões. Nesse período o governo central não deixou de existir subitamente, foi perdendo seu poder imperativo sobre as regiões de forma gradual, numa batalha de poderes que acontecia nas eleições.

O autor considera a experiência regional italiana como praticamente perfeita para se estudar o desenvolvimento institucional, visto que, foram criadas 20 novas organizações formalmente idênticas que foram adotadas por regiões socioeconomicamente diferentes, quase que ao mesmo tempo.

O livro nos conta fatos interessantes do período, como a forma como os líderes se comportam diante dos momentos históricos, primeiramente havia uma grande divergência entre os representantes comunitários e políticos propriamente ditos, era uma batalha de extremos. Após a conclusão da reforma institucional, o jogo político era mais importante do que as divergências ideológicas, dessa forma, a maior preocupação dos representantes democráticos era de conseguir um acordo com os inimigos do que fomentar um embate político (PUTNAM, 1996).

O estudo comparativo foi realizado principalmente em duas regiões, a próspera Emilia-Romagna e a pobre Calábria, que por diversos fatores como participação cívica, efetividade dos governos regionais, antecedentes históricos e distribuição política e econômica, acabaram divergindo no seu desenvolvimento institucional. Isso acabou provando que dependendo da situação social e cultural de cada comunidade, a auto-organização não é nenhuma fórmula mágica do sucesso.

Assim como Coleman, Putnam relaciona a reciprocidade e a confiança com o capital social, sendo elementos catalizadores para a cooperação espontânea. Ele prova que as sociedades que já tem um estoque anterior de capital social por meio das regras de reciprocidade e confiança tendem a ter uma integração maior do que as outras, ele usa o exemplo das associações de crédito rotativo, que se trata de um agrupamento de pessoas que define uma quantia a ser depositada em nome da associação para que a cada período de tempo um participante receba esse montante. Nessas associações, a única coisa que faz uma pessoa depositar a quantia acertada é a confiança de que quando for sua vez de receber o "bolo" os outros membros irão também contribuir para que a associação continue funcionando. (PUTNAM, 1996).

Para ele o capital social tem que ser formado pela confiança, ela não pode ser formada pelo próprio capital. O capital tem uma característica própria que o distingue de todas as outras formas de capital, ele é um bem público, enquanto outros tipos de capitais tem como pressuposto básico ser um bem privado. Por isso, o capital social normalmente é insuficientemente valorizado, sendo deixado de lado pelos benefícios individuais de cada um. (PUTNAM, 1996).

Dessa forma, o Putnam chega à conclusão de que "o capital diz respeito a características da organização social, como confiança, normas e sistemas, que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as ações coordenadas" (PUTNAM, 1996, p. 177).

O autor faz a diferenciação entre as duas espécies de reciprocidade, generalizada e balanceada. A reciprocidade balanceada é a espécie citada no exemplo das associações de crédito, são trocas de elementos iguais ou de igual valor. Já a reciprocidade generalizada se trata de trocas de itens de diferentes valores ou funções, Putnam cita como exemplo de reciprocidade generalizada a amizade como forma de troca de favores, mas que esse conceito pode ser transferido para uma grande comunidade em forma de intercambio social, numa configuração que parece ser altruísmo ao olhar imediato e interesse próprio ao longo prazo, como forma de cultivar uma relação de mão-dupla. (PUTNAM, 1996).

Apesar da interpretação sobre o que efetivamente é o capital social ainda ser um espaço aberto para intensos debates, essa diversidade conceitual começa a convergir para uma formulação que o delineia em três grandes categorias (GROOTAERT, 1998). Conforme Woolcock (1998), vários tipos e dimensões sobre o capital social permitem incorporar uma nova visão multidimensional e dinâmica do seu conceito, contrariamente à concepção determinista e estática, presente em Putnam (2000) e em outros autores sobre o tema. Estes tipos de categorias variam conforme a posição das relações sociais, a saber: capital social comunitário, capital social extra-comunitário e capital social institucional (WOOLCOCK, 1999).

O capital social comunitário está associado a organizações locais, grupos cívicos e redes informais que nutrem as normas de confiança e reciprocidade, necessárias para o comportamento cooperativo. Neste sentido, a coesão interna do grupo é sinal de maior capital social. Esta categoria refere-se à capacidade que estes possuem para produzir relações sociais baseadas em reciprocidade e confiança nas suas comunidades, além do potencial organizativo que estas mesmas comunidades possuem.

A segunda categoria chama-se capital social extra-comunitário, que se agrega à primeira categoria na importância das ligações tanto verticais quanto horizontais entre pessoas de um mesmo grupo quanto com outros grupos. Esta se refere aos laços fracos caracterizados pelas relações entre grupos sociais distintos (WOOLCOCK, 1999).

A terceira categoria, de acordo com o mesmo autor, diz respeito ao capital social institucional, que agrega às duas primeiras os aspectos políticos e sociais que moldam a estrutura social e permitem que as normas de cooperação e reciprocidade se desenvolvam. Diz respeito especificamente ao acesso e à interferência que os grupos sociais têm sobre organizações formais, como o governo, sistema judiciário ou empresas. Esta categoria assume a ideia de que, além de coesão interna e da capacidade de interagir para além das suas fronteiras, o engajamento com instituições formais é crucial para aumentar a capacidade do grupo social em agir em prol de seus interesses coletivos (WOOLCOCK, 1999).

3. A Vila Emater: Origem e trajetória de desenvolvimento

O processo de urbanização é um fenômeno global que caracteriza a cidade como o espaço de desenvolvimento econômico pós-industrial. No Brasil, esse processo se reverteu em dois aspectos específicos exclusão social e segregação espacial.

Devido a esse processo de urbanização desenfreada e sem planejamento, as cidades adotaram algumas áreas de total incompatibilidade ambiental para construir os seus "lixões". Nesse sentido, Maceió adotou a área situada entre o bairro de cruz das almas e jacintinho, um local extremamente próximo do oceano. Como tudo na lógica do mercado tem uma reação, uma atividade de "catação de lixo" começou a ser desenvolvida para que algumas pessoas tivessem a possibilidade de se manter. Dessa forma, uma comunidade começou a habitar as redondezas do lixão de Maceió.

A Vila Emater é o resultado da acomodação dos catadores nas regiões circunvizinhas do antigo lixão, que se desenvolveu e hoje é limitada pelos bairros de Jacarecica e do Sítio São Jorge, além dos anteriormente citados. Trata-se de um assentamento precário localizado em área pública pertencente ao Governo do Estado de Alagoas, ocupado por 250 famílias, cerca de 1.100 moradores.

A situação dos moradores da Vila Emater II, é emblemática, expressão extrema da pobreza urbana, segregação e grave risco social que atinge parte significativa da população de Maceió. O fechamento do lixão de Maceió, pouco importou em termos de políticas públicas de inserção dos antigos catadores de lixo em outras atividades profissionais. Apenas para uma minoria, cooperativada, representou certa inclusão social. A Pesquisa-Ação se propõe a analisar essa inclusão social a partir da teoria do capital social e verificar empiricamente os resultados dessa mudança.

A população da Vila Emater II encontra-se organizada em Associação com a finalidade de conquistar a regularização fundiária do local. Desde de 2004, a Associação de Moradores da Vila Emater (ASMOVE) encaminhou petição solicitando a Concessão Especial de Uso para Fins de Moradia para o funcionamento da Cooperativa de Reciclagem, e Doação para fins de moradia e interesse social, ambos os institutos com base no Estatuto da Cidade. Somente após 8 anos, o Governo do Estado autorizou a doação das terras para a associação, uma grande luta mobilizada pelos moradores e líderes da Associação.

Durante o tempo dessa ação, houveram grandes turbulências sofridas pelos moradores, como desabamentos de locais inapropriados para moradia. Além disso, aconteceram uma série de invasões de terra por grileiros, que ameaçavam todos os moradores que se queixavam de suas ações. O território da Vila Emater se torna alvo frequente desse tipo de ilícito por se tratar de uma zona de grande especulação imobiliária, próximo ao mar e ao novo shopping da cidade (Shopping Parque Maceió).

Somente em janeiro de 2014, o Juiz Federal responsável pela ação conseguiu remover uma hipoteca que impedia a doação do terreno e assim o registro foi finalizado e a construção de habitações do programa Minha Casa, Minha vida conseguiu ser iniciada. Essa forma de organização em Associação configura um empenho dos indivíduos pertencentes à comunidade em fortalecer o tecido social frente às demandas coletivas, dessa forma, se caracteriza como capital social comunitário.

Além disso, a comunidade da Vila Emater II também conta com a COOPVILA – Cooperativa dos Catadores de Lixo da Vila Emater, fundada em 8 de dezembro de 2008, com o objetivo de lutar pela valorização da profissão dos catadores. A cooperativa mobiliza demandas perante o Estado como a remuneração do serviço de coleta seletiva realizado na cidade. A COOPVILA é constituída por 30 cooperados atualmente, a maioria feminina e antigas catadoras de lixo do lixão que fora desativado em abril de 2010, na vila Emater.

 A COOPVILA também representa um capital social comunitário, porém, de acordo com o acompanhamento da instituição, podemos perceber que a cooperação entre os participantes da cooperativa é insuficiente para fazer com que a COOPVILA consiga competir no mercado, não só pelas condições subjetivas, mas principalmente pelas condições objetivas. Há a dificuldade de custear equipamentos como prensa e o funcionamento do caminhão, que aumentariam a capacidade da cooperativa de recolher e distribuir os elementos reaproveitados do lixo. Isso fragiliza a relação entre os indivíduos que estão inseridos internamente na cooperativa, configurando um capital social incipiente.

Existe também uma ligação entre o Centro de Educação Ambiental São Bartolomeu e os moradores da Vila Emater. A ONG teve a competência de agir na fundação e organização da COOPVILA, dando todo apoio jurídico e burocrático necessário, além de coordenar a própria reunião de catadores com o objetivo de materializar a ideia da união.

Além disso, outras oportunidades foram captadas e aproveitadas pelo CEASB para o fortalecimento comunitário como a criação do Baú dos Guerreirinhos por meio de um edital do Ministério da Cultura. O Baú dos Guerreirinhos se trata de um projeto que tentava por meio de incentivo à leitura e atividades lúdicas, estimular a criatividade e a cultura das crianças moradoras da vila. O projeto contou com ajuda de estudantes do curso de direito da Faculdade de Direito de Alagoas (FDA) como agentes culturais. O Projeto é um exemplo de capital social extra-comunitário, pois engloba ações promovidas por agentes pertencentes ou não a comunidade.

Outro projeto que foi incentivado por instituições fora da comunidade foi a montagem do espetáculo teatral Histórias Recicladas, desenvolvida pela Companhia de Teatro Munganga de Amsterdam (Holanda), sob a coordenação do diretor Carlos Lagoeiro, em parceria com o CEASB, realizado através do Programa Petrobras Desenvolvimento & Cidadania. O espetáculo conta a história real da vida de nove catadoras da COOPVILA, montada de uma forma que gera uma reflexão sobre a questão social (o que faz alguém sobreviver da catação de lixo) e do próprio cuidado com o meio ambiente. Além do apoio para a realização do espetáculo, o programa trouxe ainda melhorias na infraestrutura da cooperativa, como equipamentos para garantir a saúde e a segurança dos cooperados.

4. Procedimento metodológico

4.1 Índice de Qualidade de Vida (IQV)

Para mensurar o Índice de Qualidade de Vida (IQV), foi utilizado o modelo proposto por Fernandes (1997) e utilizado por Monte (1999), Barreto e Khan (2006) e Mayorga et al. (2008), o qual foi organizado pelas etapas a seguir: estabelecer os indicadores que irão compor o índice de qualidade de vida e atribuir escores às variáveis que compõem cada indicador. Desta forma, com propósito de mensurar a qualidade de vida das famílias entrevistadas na Vila Emater II, foram elaborados sete indicadores com informações importantes que possibilitam a avaliação da qualidade de vida destas.

Portanto cada indicador utilizado possui um papel importante definido a seguir:

  1. Indicador Informação e Comunicação: indicador que verifica a distância da comunidade em relação ao centro da cidade, os acessos à estrada, ao serviço de telefonia, rádio e televisão. Espera-se que comunidades bem informadas e com bons serviços de comunicação tenham uma melhor qualidade de vida.
  2. Indicador Conflito e Violência: indicador que analisa o grau de violência existente na comunidade. Espera-se que quanto menor o grau de violência na comunidade melhor será a qualidade de vida.
  3. Indicador Saúde e Educação: indicador que verifica a disponibilidade de serviços de saúde e educação na comunidade. Espera-se que a comunidade que apresenta melhores serviços de saúde e educação tenha melhor qualidade de vida.
  4. Indicador Habitação: indicador que verifica o tipo de construção e iluminação das residências de uma comunidade. Espera-se que a comunidade com melhores residências, em relação à construção e iluminação, terá melhor qualidade de vida.
  5. Indicador de Condições Sanitárias e Higiene: este indicador verifica o tipo de destino dados aos dejetos humanos, tipo de tratamento dado à água para o consumo humano e o destino dado ao lixo domiciliar.
  6. Indicador Econômico: indicador que verifica a renda média mensal das famílias de uma comunidade. Espera-se que a comunidade com melhor renda seja convertida no consumo de bens duráveis e provavelmente terá uma melhor a qualidade de vida.
  7. Indicador de Capital Social: Este indicador verifica o grau de confiança e solidariedade existente na comunidade, bem como, ação coletiva e cooperação que analisa a presença de trabalhos comunitários. Espera-se que quanto maior for este indicador na comunidade melhor será a qualidade de vida.

4.2 Fontes de dados e o tamanho da amostra

A base de dados que irá compor a construção do índice de Qualidade de Vida dos moradores da Vila Emater II, será proveniente de dados primários oriundos da aplicação de questionários para o levantamento de informações quantitativas e dados secundários de natureza bibliográfica referente ao tema proposto, ou seja, no exame de diversos livros, artigos e periódicos que informarão os aspectos do tema na atualidade da pesquisa documental.

No que tange aos dados primários, a pesquisa de campo foi realizada com o objetivo geral de verificar se os integrantes das diversas formas de capital social tem uma qualidade de vida melhor do que os moradores da comunidade que não estão inseridos nas instituições comunitárias. Para que isso fosse verificado, as perguntas foram aplicadas com uma cisão clara em relação às pessoas que realizam alguma forma de trabalho comunitário ou não.

Assim sendo, dentre as 250 (duzentas e cinquenta) famílias residentes até o momento da pesquisa na Vila Emater II, em Maceió, Brasil, foi retirada aleatoriamente uma amostra formada por 70 (setenta) destes moradores, entre empregados, comerciantes, subempregados, empregados e cooperados. Essa diferença da natureza do trabalho foi realmente significativa em relação à inserção de cada pessoa dentro de sua comunidade.

5. Resultados

5.1 Perfil dos moradores

Conforme a Tabela 1, observamos que 100% dos entrevistados afirmam ter a sua disponibilidade os serviços médicos de saúde na forma de atendimento médico. Este fato decorre da presença de um posto de saúde na comunidade. Com relação ao item sobre educação a referida tabela mostra que 18,6% dos membros familiares dos residentes entrevistados em idade escolar não têm acesso a escolas de alfabetização na própria comunidade em que moram. Quanto à escola de ensino fundamental, 64,37% das famílias as possuem. Para as escolas do ensino médio apenas 17,1% dos entrevistados afirmaram possuir. O fato de não haver a presença física de escolas nos assentamentos cobrindo todos os cursos não significa privação para os alunos terem acesso à educação.

Tabela 1
 Indicador Saúde e Educação

Características para Saúde

Nenhum

Atendimento de primeiros socorros

Atendimento por agente de saúde

Atendimento médico

Qual a disponibilidade de serviços de saúde da sua família?

0,0%

0,0%

0,0%

100,0%

Características para Educação

Ausência de escolas públicas ou comunitárias

Escolas de cursos de alfabetização

Escolas de ensino fundamental

Escolas de ensino médio

Qual a utilização de serviços educacionais para as famílias da sua comunidade?

18,6%

0,0%

64,3%

17,1%

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

Os dados da Tabela 2.1 mostram que em relação ao tipo de construção, 72,9% das famílias entrevistadas dizem que moram em casa de ripa (madeira), 27,1% moram em casas de tijolo com reboco e piso e nenhum dos assentados mora em casas de tijolo, sem reboco e piso. Já para a fonte de energia residencial, de acordo com a Tabela 2.2, 100% das famílias analisadas dispõem desse serviço em suas residências.

Tabela 2.1

 Indicador para Habitação

Casa de ripa (madeira)

Casa de tijolo, sem reboco e piso

Casa de tijolo, com reboco e piso

Qual o tipo de construção da sua residência?

72,9%

0,0%

27,1%

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

----

Tabela 2.2

 Indicador para Habitação

Lampião a querosene ou a gás ou lamparina e/ou velas

Energia elétrica

A principal fonte de iluminação da sua residência é...

0,0%

100,0%

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

Conforme a Tabela 3, no caso do destino aos dejetos humanos, os dados da pesquisa revelam que 61,4% dos entrevistados afirmaram que estes dejetos são jogados a céu aberto ou enterrados, enquanto que 38,6% destas famílias residentes na Vila Emater dizem direcionar os dejetos à fossa ou a rede de esgoto.

No que se refere ao destino dado ao lixo domiciliar, os dados da pesquisa mostram que 54,3% dos entrevistados jogam ao solo ou queimam, enquanto que 45,7% afirmam que enterram ou que este lixo é recolhido por meio de uma coleta domiciliar. No caso do tratamento da água consumida pelos entrevistados e sua família a maioria, 52,9%, afirma que não prestam nenhum tipo de tratamento e apenas 22,22%, alegam que ferve ou filtra a água.

Tabela 3
Indicador para condições sanitárias e higiene

Características

Jogado a céu aberto ou enterrado

Dirigido à fossa ou rede de esgoto

Qual destino aos dejetos humanos

1,4%

0,0%

Características

Nenhum tratamento

Fervida, filtrada ou com hipoclorito de sódio

Qual tipo de tratamento dado à água para o consumo

1,4%

0,0%

Características

Jogado ao solo ou queimado

Enterrado ou recolhido através de coleta domiciliar

Qual destino dado ao lixo domiciliar

1,4%

0,0%

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

No que tange o aspecto sobre capital social, os resultados da pesquisa demonstrados na Tabela 4, indicam que a presença de um forte espírito de confiança entre os membros daquela comunidade, 72,9% dos chefes de família entrevistados afirmaram que confiam na maioria dos moradores da Vila Emater. No entanto, este sentimento não é revertido em ações coletivas, pois apenas 24,3% destes entrevistados alegaram ter realizado algum trabalho comunitário.

Tabela 4

 Indicador para Capital Social

Sim

Não

Em sua opinião, você confia na maioria dos membros da sua comunidade?

72,9%

27,1%

Você já realizou algum trabalho comunitário?

24,3%

75,7%

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

Os dados da pesquisa mostram na Tabela 5 que a maioria dos chefes de família entrevistados, 54,3%, ganha menos que um salário mínimo, enquanto que aqueles que ganham entre 1 a 3 salários mínimos representam 41,4% dos entrevistados e somente um pequena minoria, 4,3%, possui rendimentos acima de 3 salários mínimos.

Tabela 5

Indicador Econômico

Menor do que 1 salário mínimo

Entre 1 a 3 salários mínimos

Maior do que 3 salários mínimos

Sua família possui renda...

54,3%

41,4%

4,3%

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

Resultado geral do perfil dos entrevistados mostra que a maioria das famílias da Vila Emater tem sua principal fonte de renda fora da comunidade, seja por meio de prestação de serviços irregulares como fretistas, lavadeiras, vendedores de balas ou empregados como secretárias, motoristas e empregadas domésticas. Outra parcela é formada por comerciantes locais da comunidade, donos de mercearia, venda de roupa, borracharia e outros segmentos. Ademais, apresentaram, em sua maioria, casa com reboco e piso, além de fossa e caixa de gordura para destinar os dejetos humanos. Também são os únicos a conter famílias com renda maior que três salários mínimos. Outro ponto importante é que parte dessa fatia social demonstraram uma menor participação e confiança no crescimento da comunidade, no entanto é a parcela que mais se beneficia do capital social da comunidade e é a que menos acredita nos seus vizinhos.

Por outro lado, os moradores que exercem alguma forma de organização social e que participam de alguma ação coletiva apresentam-se como o grupo mais estável dentre os citados, a totalidade apresenta família que recebe entre um e três salários mínimos, como a cooperativa é formada quase que totalmente por mulheres, as que são casadas complementam a renda com o trabalho do marido e acabam conseguindo viver melhor que a parcela subempregada. As cooperadas que não são casadas informaram que recebem o complemento de renda pelo programa Bolsa Família.

5.2 Análise do Índice de Qualidade de Vida – IQV

Esta análise permite mostrar se há ou não diferença no bem-estar da população pesquisada entre aqueles moradores que de alguma maneira ou de outra participam de alguma ação coletiva dentro da comunidade quando comparada àqueles moradores que não praticam tal ação, bem como determinar as contribuições de cada indicador selecionado para a construção do índice de qualidade de vida.

Os resultados apresentado na Tabela 6 indicam a contribuição absoluta e relativa de cada um dos indicadores que compõem o índice de qualidade de vida das famílias da amostra total, nos diferentes grupos pesquisados, isto é, aqueles que praticam algum tipo de ação coletiva e os que não atuam em nenhuma forma de organização social, como por exemplo, pertencer alguma associação e/ou cooperativa.

Analisando-se a contribuição individual de cada indicador, na formação do IQV para amostra total das famílias entrevistadas na Vila Emater II, verifica-se que os indicadores de conflitos e violência, saúde e educação e capital social se destacam como os de maior contribuição, o que demonstra a sua importância relativa no bem-estar da população, segundo a Tabela 6.

Estes dados revelam ainda que o indicador econômico é o que possui a menor contribuição demonstrando que para aquelas famílias entrevistadas há outros fatores relativamente mais importantes no bem-estar do que a renda.

Conforme os resultados evidenciados na Tabela 6, quando se analisa a contribuição individual de cada indicador, na formação do IQV entre estes dois grupos de entrevistados, verificamos que os indicadores de capital social, conflitos e violência; saúde e educação se destacam como os de maior contribuição no grupo das famílias que praticam alguma forma de organização social, o que demonstra a importância relativa destes indicadores no bem-estar destas famílias. Enquanto que para o grupo das famílias entrevistadas que não praticam algum tipo de ação coletiva, observamos que os indicadores conflitos e violência; saúde e educação e habitação têm os maiores pesos para o bem-estar destas famílias.

Vale ressaltar também que, da mesma maneira como ocorreu para amostra total, os resultados mostram que o indicador econômico continua tendo menor contribuição para a qualidade de vida das famílias para os dois grupos analisados, embora este seja maior para as famílias que estão inserida em alguma forma de organização social, seja por meio de uma cooperativa ou por meio de uma associação. Este fato sugere que os laços de relação entre as famílias entrevistadas com a associação e/ou cooperativa vêm fortalecendo o tecido sócio-produtivo nesta comunidade.

Por fim, ainda na Tabela 6, ao observar a relação entre os Índices de Qualidade de Vida entre os dois grupos analisados (RIQV), podemos observar que este foi maior que um, portanto, isto indica que as famílias pertencentes ao grupo que possui um estoque de capital social maior também desfruta de um melhor bem-estar. Desta forma, os resultados corroboram com nossa hipótese inicial de que capital social importa para qualidade de vida dos moradores.

Tabela 6

Participação de cada indicador na construção do índice de qualidade de vida (IQV) e a Relação do IQV dos moradores da Vila Emater

Indicadores

Geral

Cooperados

Não cooperados

RIQV

Ci

%

Ci

%

Ci

%

Informação e Comunicação

0,099

13,56

0,102

12,59

0,0982

13,83

1,0387

Capital Social

0,1061

14,53

0,1429

17,62

0,0969

13,65

1,4747

Conflitos e Violência

0,1429

19,57

0,1429

17,62

0,1429

20,12

1,0000

Saúde e Educação

0,1214

16,63

0,1301

16,05

0,1193

16,8

1,0905

Habitação

0,1012

13,86

0,0939

11,58

0,1031

14,52

0,9108

Condições Sanitárias

0,0881

12,07

0,1037

12,8

0,0842

11,86

1,2316

Econômico

0,0714

9,78

0,0952

11,75

0,0655

9,22

1,4534

IQV

0,7301

100

0,8107

100

0,71

100

1,1418

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da pesquisa (2014)

6. Conclusões

A Vila Emater tem em sua história o fato de abrigar catadores de lixo por ser uma região próxima ao antigo lixão. Além disso, várias outras dificuldades dos habitantes para conseguirem se estabelecer com uma vida digna fez com que houvesse um processo de união entre os moradores.

Com isso, alguns pilares básicos para a formação de um capital social foram surgindo, como reciprocidade e confiança. Dessa forma, o tecido social foi fortalecido e isso se materializou em formas como a Associação de Moradores da Vila Emater (ASMOVE) e a Cooperativa dos Catadores da Vila Emater (COOPVILA).

Dessa forma, as instituições representativas dos moradores e trabalhadores da região foram responsáveis por conquistar objetivos impossíveis para indivíduos sozinhos, como por exemplo, a presença do programa minha casa, minha vida na região e a estruturação, ainda que básica, da cooperativa.

A partir desses dados históricos, foi possível aplicar questionários visando medir o índice de qualidade de vida dos moradores da Vila Emater de uma forma geral. Diante desse índice, conseguimos verificar a confirmação da teoria em prática. Portanto, A qualidade de vida das famílias que possuem um maior estoque de capital social também se beneficia de uma melhor qualidade de vida quando comparada àquele grupo de famílias que possui um estoque de capital social menor ou nenhum.

Ou seja, o capital social é elemento presente na comunidade da Vila Emater, além disso, é fator responsável pela melhoria da qualidade de vida daqueles que estão inseridos nas formas de cooperação presentes na comunidade.

Concluímos assim que políticas públicas voltadas à formação de capital social dentro de comunidades em geral é válida e proveitosa. Além disso, ações estatais positivas que fortaleçam e estruturem as formas de capital social são extremamente necessárias para que essa forma de desenvolvimento seja concretizada.

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1. keulerht@yahoo.com.br, FEAC/UFAL, Brasil

2. iagomacedo@gmail.com, FDA/UFAL, Brasil

3. gomesrodrigo.rgs@gmail.com, FDA/UFAL, Brasil


Vol. 36 (Nº 11) Año 2015
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