Espacios. Vol. 35 (Nº 5) Año 2014. Pág. 11 |
Descarte de medicamentos: Panorama da logística reversa no BrasilDispose of medicines: Panorama of reverse logistics in BrazilFernanda Silva GRACIANI 1; Gabriel Luis Bonora Vidrih FERREIRA 2 Recibido: 25/02/14 • Aprobado: 23/04/14 |
Contenido |
RESUMO: |
ABSTRACT: |
1. IntroduçãoO medicamento constitui-se, nos termos da Lei nº 5.991/1973, como um produto farmacêutico “tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico”. Sua administração se efetiva com a intenção de promoção de resultados específicos como a cura da enfermidade, redução ou eliminação de sintomas, controle do progresso de doenças ou como medida de prevenção a enfermidades (Serafim et al, 2007). Com a evolução ao longo dos tempos os medicamentos tornaram-se um grande instrumento tecnológico do campo da saúde e o principal recurso terapêutico da medicina ocidental. Desta maneira, o medicamento industrializado moderno caracteriza-se como um objeto científico híbrido, podendo ser considerado tanto em sua vertente terapêutica como também em sua dimensão como bem de consumo (Renovato, 2008). Como produto de consumo produzido em larga escala, os medicamentos consolidaram-se como elemento acessível a todos os extratos sociais e passíveis de utilização por indivíduos de toda e qualquer faixa etária (Proença, 2011). Nestes termos, como um fenômeno cultural que se relaciona com os aspectos políticos e econômicos, a lógica do consumo de medicamentos relaciona-se, cada vez mais, com o poder aquisitivo da população “em detrimento das reais necessidades definidas pelos indicadores epidemiológicos que relatam as condições de vida” (Renovato, 2008). Com posição de destaque no cenário mundial de consumo de medicamentos, o Brasil é o país onde há o maior índice de farmácias por habitante no mundo. Dados do Conselho Federal de Farmácia (CFF) indicam que o Brasil possua mais de 60 mil farmácias e drogarias (principal canal de dispensação de medicamentos) alcançando uma proporção de 3,34 farmácias para cada grupo de 10 mil habitantes, levando em consideração uma população de 170 milhões de pessoas. Tais números indicam a existência de cerca de 3 vezes mais drogarias do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o que aponta 1 farmácia para cada grupo de 8 a 10 mil habitantes. O alto índice de consumo de medicamentos traz consigo a possibilidade de seu respectivo acúmulo nas residências seja em decorrência de sua não utilização ou de seu vencimento. Uma vez acumulados sob o domínio dos consumidores, os medicamentos passam a ser descartados sem maiores cuidados com a sua correta destinação. Neste sentido, a partir do momento em que se apresenta com prazo vencido ou quando passa a ser descartado pela população o medicamento transforma-se em uma espécie de resíduo trazendo preocupações em relação á saúde pública e meio ambiente. Em que pese não existirem dados oficiais sobre a questão do descarte de medicamentos no Brasil, estudos acadêmicos e experiências voluntárias permitem estimar que, anualmente, são descartados em nosso país um total entre 10,3 e 19,8 mil toneladas de medicamentos (Brandão, 2013) evidenciando a enorme complexidade socioambiental desta questão. 2. Impacto ambiental do descarte de medicamentosA preocupação a respeito da presença de fármacos no meio ambiente e seus respectivos efeitos nocivos à saúde e à natureza passaram a receber uma maior atenção ao longo dos últimos anos em função, principalmente, de trabalhos científicos que apontavam sua detecção em amostras de efluente de esgoto, águas superficiais ou águas subterrâneas (Bound, Voulvolis, 2005). Doerr-MacEwen (2007) indica que este interesse surgiu a partir da década de 70, primeiramente em países desenvolvidos onde enormes quantidades de produtos farmacêuticos são produzidos e consumidos pelo consumidor final ou aplicados na agricultura. A partir da década de 90 a maior densidade urbana e o uso crescente de medicamentos aliados ao desenvolvimento de melhores tecnologias relacionadas aos métodos de detecção e testes de toxicidade propiciaram maior eficiência para as pesquisas e, consequentemente, resultou no aumento da detecção de sua presença em amostras ambientais (Heberer et al, 1997) (Heberer, 2002). Retratando um aumento gradual na constatação de fármacos no ambiente Doerr-MacEwen (2007) analisou alguns artigos científicos apontando o número de princípios ativos apurados em cada pesquisa sendo que este número parte de 25 compostos detectados em 1996 para 80 diferentes substâncias detectadas em 2002. Em razão desta detecção generalizada de fármacos e dos riscos associados à sua introdução na natureza os resíduos de medicamentos acabam sendo considerados como uma espécie de contaminante ambiental emergente de maneira a se tornar uma questão importante para o poder público e fabricantes (Morley, 2009). A questão ganha maiores contornos na medida em que estudos confirmam que a maioria dos sistemas publicos de tratamento daágua não estão preparados para este problema não sendo dotados de mecanismos que promovam a remoção destes compostos (Martinho, Santos, 2011). No entanto, o conhecimento disponível acerca dos efeitos toxicológicos dos resíduos de medicamentos em relação à saúde ao meio ambiente ainda se mostra pouco abrangente, carecendo de maiores aprimoramentos científicos (Fent, 2006). Em que pese esta ausência de clareza quanto aos efeitos nocivos dos resíduos de medicamentos, são vários os estudos que indicam que tais substâncias possuem o potencial de interferir no metabolismo e comportamento dos organismos aquáticos (Carvalho et al, 2009). Em relação a estes possíveis efeitos, Bila e Dezotti (2003)mencionam que a ocorrência de fármacos residuais no meio ambiente pode acarretar resultados nocivos a organismos aquáticos e terrestres com seu efeito se manifestando em qualquer nível da hierarquia biológica: célula – órgãos – organismo – população – ecossistema, com alguns deles sendo observados em concentrações na ordem de ng/L. Muito embora os efeitos toxicológicos dos resíduos de medicamentos tenham sido identificados apenas em condições laboratoriais, o risco observado permite avaliar que as concentrações de alguns destes compostos encontradas em pesquisas é suficiente para representar uma ameaça para os organismos (Bound, Kitsou,Voulvolis, 2006). Apesar do comportamento e destino dos residuos de medicamentos no ambiente aquático não esteja bem eludicado, a baixa volatilidade dos fármacos aponta que sua distribuição ocorra por meio do transporte aquoso, sem desconsiderar também a dispérsão via cadeia alimentar (Fent et al, 2006). Tal fato faz com que os organismos aquáticos se estabeleçam como alvos particularmente importantes em virtude de sua exposição às águas residuais ao longo de sua existência (Fent et al, 2006). No que se refere aos possíveis efeitos em seres humanos, constata-se a existência de alguns indícios de sua prejudicialidade apurados em escala laboratorial. Nesse sentido, destaca-se a pesquisa efetuada por Pomati et al (2006) que relata que uma mistura de contaminantes farmacêuticos em concentrações ambientalmente relevantes, coletados no Rio Olona, próximo à cidade de Milão na Itália, inibiram o crescimento de células embrionárias (diminuição de até 30% na proliferação celular) com afetação à sua fisiologia e morfologia constatadas em testes de laboratório Conforme enfatiza Pomati et al (2008), farmacologicamente, todas as drogas à base de água podem ser consideradas como uma preocupação ambiental, já que, diferentemente de outros poluentes os medicamentos são concebidos com a intenção concreta de proporcionar alguma resposta biológica nos organismos. Projetados para atingir uma via metabólica específica, em seres humanos ou em animais (no caso de medicamentos veterinários), os fármacos possuem sequências de ação que nem sempre são perfeitamente conhecidas, mesmo em relação a organismos-alvo, o que acaba por se mostrar praticamente impossível antever seus efeitos sobre outros organismos (Martinho, Santos, 2011). De uma maneira geral, o risco ambiental apresentado pelos resíduos de medicamentos dependerá da extensão à qual o meio ambiente for exposto e a concentração existente relativa a uma ou mais substâncias, No entanto, é possível destacar três características que realçam a sua periculosidade: a capacidade de bioacumulação, a dificuldade na sua eliminação (persistência) e seu potencial toxicológico (Paiva, 2009) Grande parte dos medicamentos possui propriedades lipofílicas que denotam a potencialidade de bioacumulação e persistência dos fármacos em virtude de sua capacidade de atravessar as membranas celulares (Proença, 2011). Conforme ressaltam Bila e Dezotti (2003), a persistência é uma qualidade proposital dos medicamentos levando em conta a necessidade de manutenção de suas propriedades químicas de modo suficiente para servir ao seu propósito terapêutico. No que se refere ao potencial toxicológico dos resíduos de medicamentos a literatura se direciona, em sua maioria, em relação aos efeitos agudos, geralmente focados em organismos aquáticos sendo apenas marginalmente conhecidas e raramente estudadas as conseqüências das exposições crônicas (Fent et al, 2006). O modo de ação dos medicamentos também possui relação com a sua toxicidade havendo certos fármacos com atuação seletiva em relação a certos tipos de células ou tecidos e outros cuja ação se mostra mais dispersa de maneira a provocar conseqüências em variadas células e tecidos (Paiva, 2009) Efeitos ambientais mais graves podem ser observados no que se refere a compostos desreguladores endócrinos, havendo demonstrações de que a exposição a efluentes de estações de tratamento de água pode causar a feminização de algumas espécies de peixes (Bound et al, 2006). Do mesmo modo, existem evidências de que os estrogênios podem afetar sistemas reprodutivos de determinados organismos aquáticos e terrestres ocasionando o surgimento de anormalidades e deterioração reprodutiva nos casos de exposição (Bila, Dezotti, 2003). Bound et al (2006) ressaltam que a resistencia a drogas consiste em outra significativa preocupação acerca das consequencias ambientais dos fármacos, em especial o potencial de criar cepas resistentes a antibióticos patógenos. No mesmo sentido, Hirsha et al (1999) aponta que os resídous de antibióticos são suspeitos de induzir resistência a cepas bacterianas representando uma ameaça a saúde publica em razão do tratamento de infecções não poder ser viabilizado com o uso de antídotos conhecidos no presente. No âmbito de pesquisa a respeito do descarte de medicamentos na Inglaterra e País de Gales, Bound e Voulvolis (2005), após revisão da literatura, elegeram oito grupos de fármacos, selecionados com base em variados critérios como o volume de prescrição, toxicidade, evidencias de presença no meio ambiente, e apontaram os fatores de risco que ensejam a preocupação ambiental a seu respeito, relatados na Tabela1:
No entanto, é preciso considerar que os resíduos de medicamentos geralmente são encontrados no meio ambiente sob a forma de misturas e não como contaminantes individuais havendo a necessidade de se considerar esta situação de exposição complexa (Cleuvers, 2003). Para Bound et al (2006), esta ciência da toxicidade de misturas se mostra bastante complexa em razão dos organismos estarem continuamente expostos a um largo espectro de substâncias no ambiente tais como pesticidas, subprodutos industriais, metais pesados e até mesmo certas toxinas naturais. Neste cenário, interações antagônicas, sinérgicas e dose de dependência de efeitos podem causar prejuízo à modelagem e previsão da toxicidade de misturas havendo estudos que sugerem que a investigação completa dos efeitos das misturas podem direcionar as preocupações ambientais em relação a uma grande gama de produtos farmacêuticos (Pomati et al, 2008). Trata-se, assim, de mais um campo onde se carece de maiores conhecimentos a respeito das consequencias ambientais dos residuos de medicamentos. 3. A PNRS e responsabilidade compartilhada pós-consumoEm 2010 a regulação ambiental a respeito dos resíduos sólidos ganhou maior relevo normativo no Brasil com a edição da Lei 12.305 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos após duas décadas de discussão e tramitação do projeto de lei. A PNRS engloba o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações destinados a proporcionar a gestão integrada e o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos. Uma das premissas estabelecidas pela PNRS consiste no reconhecimento de que o processo de gerenciamento dos resíduos sólidos deve envolver atribuições a toda a sociedade. Desta forma, consta como princípio da regulação dos resíduos a necessária cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade. Com efeito, compreendendo que poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações de gestão dos resíduos sólidos, a PNRS acaba por instituir (art. 30) a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos (desenvolvimento do produto, a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final) no âmbito da gestão dos resíduos sólidos no Brasil, prescrevendo obrigações a todos os envolvidos em sua geração. A responsabilidade compartilhada representa um conjunto de atribuições que abrangem fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, consumidores, prestadores de serviços de limpeza pública e manejo de resíduos sólidos, tendente a promover a minimização do volume de resíduos gerados e sua destinação ambientalmente adequada de modo a favorecer a diminuição dos impactos ambientais decorrentes do ciclo de vida dos produtos. Nos termos do art. 30, parágrafo único, os objetivos da responsabilidade compartilhada consistem em propiciar a compatibilização da gestão ambiental com os processos de gestão empresarial promovendo o uso de insumos menos agressivos, a redução na geração de resíduos ou o seu respectivo aproveitamento com o seu direcionamento para a sua própria cadeia produtiva ou para outras que possam lhe oferecer destinação adequada. A responsabilidade compartilhada deverá ser implementada de forma individualizada e encadeada. Isso quer dizer que cada agente envolvido precisará ter a sua respectiva obrigação especificamente delineada e que cada uma destas atribuições precisará estar relacionada de maneira a se abranger todo o ciclo de vida do produto e propiciar a gestão integrada dos resíduos sólidos. Como forma de fortalecer a responsabilidade compartilhada, a PNRS estabelece (art.31, III) que as incumbências dos agentes da cadeia produtiva (fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes) abrangem o recolhimento de produtos e resíduos remanescentes para sua respectiva destinação ambientalmente adequada. Trata-se, na realidade, de previsão que institui a responsabilidade pós-consumo também conhecida como responsabilidade estendida do produtor (REP) que visa implementar o retorno do produto ou resíduo descartado pelo consumidor aos agentes da cadeia produtiva proporcionando o tratamento ambiental adequado por meio da reutilização, reciclagem ou disposição final. A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) qualifica a REP como uma abordagem política ambiental que estende a responsabilidade por um produto e seu respectivo resíduo para a fase pós-consumo do ciclo de vida (OCDE, 2001). A REP amplia, assim, as responsabilidade ambientais tradicionais de produtores, importadores e comerciantes que passam a ter incumbências na gestão de seus produtos na fase pós-consumo (OCDE, 2001). A concepção geral deste instrumento consiste em proporcionar uma noção aos produtores acerca do impacto ambiental de seus produtos, favorecendo iniciativas direcionadas à minimização destas externalidades associadas à fase pós-consumo dos produtos (OCDE, 2001). 4. Logística reversa e o descarte de medicamentosComo conseqüência direta do estabelecimento da responsabilidade compartilhada pós-consumo, a PNRS prescreve (art.33) a obrigação de estruturação e implementação de sistemas de logística reversa, que, sem prejuízo de exigências específicas fixadas em lei ou regulamento, poderão ser viabilizados, dentre outras opções, mediante medidas de compra de produtos ou embalagens usados, disponibilização de postos de entrega de resíduos ou parceria com cooperativas ao associação de catadores. A PNRS conceituou (art. 3º, XII) a logística reversa como um instrumento econômico e social que envolve “um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”. O escopo da logística reversa condiz ao estudo de canais reversos de distribuição, os quais se orientam num fluxo oposto àquele da cadeia original de distribuição de materiais visando seu retorno ao agente produtor (Adlimaier, Sellitto, 2007), podendo englobar uma série de ações desde a simples revenda de um produto até processos que ensejam tarefas como coleta, inspeção, segregação, remanufatura ou reciclagem (Souza, Fonseca, 2009). No âmbito da operacionalidade da logística reversa, os materiais podem retornar em sua forma original (bens pós-venda) no caso de questoes relacionadas a defeitos, problemas comerciais, obsolescencia, perda de validade, dentre outros, ou sob a forma de refugos, rejeitos ou resíduos (bens pós-consumo), no caso dos consumidores estarem incapacitados de oferecer a destinação adequada aos materiais (Adlimaier, Sellitto, 2007). No que se refere à aplicação da logística reversa no campo do descarte de medicamentos vencidos ou não utilizados e suas respectivas embalagens, não se verifica ainda no Brasil a existência de um instrumento de aplicação nacional, havendo somente algumas iniciativas de âmbito municipal ou estadual, além do processo de consolidação do acordo setorial que poderá concluir no estabelecimento deste mecanismo. Neste sentido, Falquero e Kligerman (2013) ressaltam que a gestão de resíduos de medicamentos envolve necessariamento uma corresponsabilidade em sua efetivação, envolvendo as indústrias farmacêuticas, serviços de saúde (farmácias, drogarias, hospitais, distribuidores, dentre outros) e os usuários que lidam com medicamentos vencidos, sobras de tratamento e medicamentos danificados. Frisa-se que a PNRS, no âmbito da prescrição à responsabilidade compartilhada e consequentemente, da logística reversa, estabelece previsões que abrangem todos aqueles que direta ou indiretamente se envolvem na geração dos resíduos, inclusive os consumidores. Neste sentido, o art. 33 § 4o da PNRS especifica que os consumidores possuem a tarefa de concretizar a devolução de produtos e embalagens a serem descartados aos comerciantes ou distribuidores nos segmentos produtivos onde se aplica a logística reversa. Em relação aos países da Europa a Directiva 2004/27/CE da União Europeia acabou fixando a obrigação dos estados membro em implementarem sistemas adequados de recolha de medicamentos vencidos ou não utilizados. Após esta previsão, em 2007, a a Federação Europeia da Indústria Farmacêutica Industry Association realizou pesquisa em 28 paises na europa e constatou que 20 deles possuiam sistemas de recolha de resíduos de medicamentos sendo que a maioria deles se baseia na devolução às farmácias (Glassmeyer, 2009). Do mesmo modo, Martinho e Santos (2011) indicam que Programas de coleta de produtos farmacêuticos descartados já foram implementados em cerca de 30 países, em espacial na Europa, Estados Unidos e Japão com vistas a minimizar os efeitos ambientais relacionados havendo menção, também, de que o retorno às farmácias e drogarias se consolida como modelo mais utilizado. 5. Panorama atual da logística reversa de medicamentos no BrasilEmbora os resíduos de medicamentos não estejam especificamente previstos no art. 33 da PNRS, que fixa a obrigatoriedade da aplicação da logística reversa para alguns setores (agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, e produtos eletroeletrônicos e seus componentes), a lei estabelece mecanismos para extensão deste instrumento. Os parágrafos 1o e 2o do art. 33 estabelecem que, considerando a viabilidade técnica e econômica além do grau e extensão do impacto de certos resíduos à saúde e ao meio ambiente o sistema de logística reversa será aplicável a outros produtos e embalagens mediante previsão em regulamento, termo de compromisso ou acordo setorial. Trata-se, neste caso, de uma previsão genérica que mantém aberta e possível a aplicabilidade da logística reversa a outros setores que não aqueles especificamente mencionados na legislação, o que acaba por propiciar a inserção dos resíduos de medicamentos no âmbito das premissas de responsabilidade compartilhada fixadas pela PNRS. Lei nº 7404/2010 regulamenta a PNRS instituiu (art. 33) o Comitê Orientador para Implantação de Sistemas de Logística Reversa - Comitê Orientador (composto pelos Ministros do Meio Ambiente, Saúde, Desenvolvimento, Agricultura e da Fazenda) encarregado de implementar uma série de ações tendentes a favorecer a aplicação da logística reversa na gestão dos resíduos sólidos no Brasil. No rol de competências do Comitê Orientador (art.34 da Lei nº 7404/2010) destacam-se as atividades de orientação estratégica para a implementação da logística reversa, estudos de viabilidade técnica e econômica, definição de prioridades e cronogramas para propostas de acordos setoriais, revisão de instrumentos que disciplinam a logística reversa, dentre outras. Em suas ações, o Comitê Orientador é assessorado (art. 33 § 3o da lei 7404/2010) por grupo técnico composto pelos representantes de cada um dos ministérios que integram o referido comitê, havendo a possibilidade de se estender a participação sobre certas temáticas (art. 33 § 4o da lei 7404/2010) a representantes de outros ministérios, órgãos federais, estaduais, distritais e municipais além de entidades representativas de setores da sociedade civil diretamente impactados pela logística reversa. Neste sentido, em março de 2011, no âmbito do Comitê Orientador, foi criado o Grupo Temático de Trabalho (GTT) de Medicamentos sob a coordenação do Ministério da Saúde e apoio da ANVISA, contando com a participação de representantes de instituições públicas, do setor empresarial da cadeia farmacêutica, de entidades de classe e da sociedade civil (Anvisa, 2011). As atribuições do GTT de Medicamentos consistem em construir subsídios para a elaboração de Acordo Setorial para implantação de logística reversa de medicamentos desenvolvendo ações como o estudo de viabilidade técnica e econômica, avaliação de impactos da logística reversa de maneira oferecer informações para a tomada de decisão por parte do Comitê Orientador (Anvisa, 2011). Os Acordos Setoriais se caracterizam, ao lado dos regulamentos e termos de compromisso, como um dos instrumentos disponibilizados pela legislação para a implementação e operacionalização da logística reversa. O Acordo Setorial representa um ato de natureza contratual estabelecido entre o Poder Público e os agentes envolvidos no ciclo de vida de determinados produtos destinado a prescrever as obrigações de cada um dentro do âmbito da responsabilidade compartilhada. (art. 3º, I, PNRS) Conforme estabelece a Lei nº 7404/2010 (art. 20 e 21), quanto aos Acordos Setoriais desencadeados por iniciativa do Poder Público, a implantação da logística reversa terá inicio com a publicação de editais de chamamento pelo Ministério do Meio Ambiente, viabilizados após aprovação do Comitê Orientador quanto á sua viabilidade técnica e econômica promovida pelo grupo técnico. É tarefa do edital de chamamento dispor informações a respeito da proposta de Acordo Setorial, indicando os produtos, embalagens e etapas do ciclo de vida que serão objeto da logística reversa, as diretrizes metodológicas para avaliação dos impactos, a abrangência territorial do acordo dentre outros requisitos, além de convocar os interessados, durante certo prazo fixado, para apresentarem sugestões ou propostas visando aprimorar o sistema. A respeito dos trabalhos para aplicação da logística reversa nos medicamentos, após mais de 2 anos de discussões na GTT de Medicamentos, o Comitê Orientador aprovou, em agosto de 2013, o edital de chamamento para elaboração do respectivo Acordo Setorial fixando prazo de 120 dias, após publicação no diário oficial, para que o setor envolvido apresente suas considerações a respeito (Anvisa, 2013). O referido edital de chamamento estabelece algumas metas ambiciosas a serem cumpridas até o quinto ano após a aprovação do Acordo Setorial: a) proporcionar a destinação final ambientalmente correta de 100% dos resíduos recebidos na totalidade dos municípios com população superior a 100 mil habitantes; b) alcançar 5522 pontos de coleta de medicamentos em todo o pais; c) proporcionar o recolhimento de 3,79 kg de resíduos por mês em cada ponto de coleta (Anvisa, 2013). 6. Considerações finaisQualificados como materiais sensíveis ao meio ambiente e á saúde humana, os medicamentos se caracterizam como uma classe de resíduos que requerem critérios específicos para sua eliminação ambientalmente adequada, o que somente deve ocorrer com a efetivação da logística reversa neste setor. Neste contexto, a aplicação da logítica reversa no campo dos medicamentos é uma realidade que está tomando forma no Brasil através de mecanismos que permitem a participação das partes envolvidas. Programas de coleta de medicamentos já foram implementados em vários países por todo o mundo e, na maioria dos casos, as farmácias e drogarias se consolidam como elementos centrais deste sistema como ponto de retorno dos produtos á cadeia produtiva. Considera-se que este pode ser também o caso do Brasil, já que segundo dados do Conselho Federal de Farmácias, existem mais de 65.000 farmacias no solo brasileiro, o que alcança uma proporção de 3,34 farmacias para cada grupo de 10.000 habitantes. Este aspecto pode contribuir significativamente para a afirmação da logística reversa no Brasil, levando em conta que o sistema pode ter uma capilaridade, quantitativa e geográfica, com pontos de recolhimento suficientes para manter o processo de retorno dos medicamentos não usados ou vencidos. Do mesmo modo, se considera que esta posição confirma a evolução dos preceitos dos serviços de saúde a atenção farmacêutica, permitindo que as farmácias se estabeleçam como centro de saúde dirigido a proporcionar conscientização aos consumidores, não somente quanto ao uso racional, mas também quanto a importância de destinação ambientalmente correta dos resíduos de medicamentos. 7. ReferênciasAdlimaier, D.; Sellitto, M.A. (2007); “Embalagens retornáveis para transporte de bens manufaturados: um estudo de caso de logística reversa”. Produção, 17(2), 395-406. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. (2001); Descarte de Medicamentos - Responsabilidade Compartilhada. [Data de consulta: 22 outubro 2013]. Disponível em: http://189.28.128.179:8080/descartemedicamentos Agência Nacional de Vigilância Sanitária. (2013); Acordo setorial aborda descarte de medicamentos vencidos. [Data de consulta: 22 outubro 2013]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br Agência Nacional De Vigilância Sanitária. (2013); Descarte de Medicamentos - Responsabilidade Compartilhada. [Data de consulta: 22 outubro 2013]. Disponível em: http://189.28.128.179:8080/descartemedicamentos Bila, D.M.; Dezotti, M.(2003); Fármacos no meio ambiente. Quim. Nova, 26:523-530. Bound, J.P.; Voulvoulis, N. (2005); “Household Disposal of Pharmaceuticals as a Pathway for Aquatic Contamination in the United Kingdom”. Environ Health Perspect., 113(12), 1705–1711. Bound, J.P; Kitsou, K.; Voulvoulis, N. (2006); “Household disposal of pharmaceuticals and perception of risk”. Environ. Toxicol. Pharmacol. 21(5), 301-307 . Brandão, A. (2013); “Logística Reversa: Brasil busca solução para descarte inadequado de medicamentos”. Pharmacia Brasileira, 87, 7-11. Carvalho, E.V.; Ferreira, E.; Mucini, L.; Santos, C. (2009); “Aspectos legais e toxicológicos do descarte de medicamentos”. Rev. Bras. Toxicol, 22(1/2), 1-8. Cleuvers, M. (2003); “Aquatic ecotoxicity of pharmaceuticals including the assessment of combination effects” Toxicol Lett., 142(3), 185-94. Doerr-MacEwen, N.A. (2007); The Management of Human Pharmaceuticals in the Environment. Tese de Doutorado. Universidade de Waterloo , Ontário. [Data de consulta: 07 janeiro 2014]. Disponível em: https://uwspace.uwaterloo.ca/bitstream Falqueto, E.; Kligerman, D.C. (2013); “Diretrizes para um Programa de Recolhimento de Medicamentos Vencidos no Brasil”. Ciência & Saúde Coletiva, 18(3), 883-892. Federação Brasileira das Redes Associativistas de Farmácias. Varejo farmacêutico no Brasil [Internet]. 2013. [citado 2013 set 06]. Disponível em: http://www.febrafar.com.br/index.php?cat_id=1 Fent, K.; Weston, A.A.; Caminada, D. (2006); “Ecotoxicology of human pharmaceuticals”. Aquat Toxicol. 76(4), 122-59. Glassmeyer, S,T. (2009); “Disposal practices for unwanted residential medications in the United States”. Environ. Int., 35(3), 566-572. Heberer, T. (2002); “Occurrence, fate, and removal of pharmaceutical residues in the aquatic environment: a review of recent research data”. Toxicology Letters, 131, 5-17 Heberer, T.; Dunnbier, U.; Reilich, C.; Stan, H.J.; (1997); “Detection of drugs and drug metabolites in ground water samples of a drinking water treatment plant”. Fresenius Environ Bull, 6, 438–443. Hirscha,R.U.; Thomas, T.; Klaus, H.; Karl-Ludwig, Kratzb. (1999); “Occurrence of antibiotics in the aquatic environment”. Science of The Total Environment, 225(2), 109–118 Martinho, M.G.; Santos, J.M. (2011); Disposal of residential pharmaceutical waste An initial survey on attitudes, behaviors and risk perception in Portugal. 5th International Conference on Bioinformatics and Biomedical Engineering, (iCBBE), Wuhan. Morley, N.J. (2009); “Environmental risk and toxicology of human and veterinary waste pharmaceutical exposure to wild aquatic host–parasite relationships”. Environ Toxicol Pharmacol., 27(2),161-75. Organisation for Economic Co-Operation and Development (OCDE). (2001); Extended producer responsability: a guidance manual for governments. Paris: OCDE. Paiva, O.J.M. (2009); Estudo ecotoxicológico de medicamentos e outros químicos de Farmácias. Dissertação de Mestrado em Toxicologia e Ecotoxicologia. Universidade de Aveiro, Aveiro. [Data de consulta: 09 janeiro 2014]. Disponível em: http://hdl.handle.net/10773/8837. Pomati, F.; Castiglioni, S.; Zuccato, E.; Fanelli, R.; Vigetti, D.; Rossetti, C.; Calamari, D. (2006); “Effects of a complex mixture of therapeutic drugs at environmental levels on human embryonic cells”. Environ. Sci. Technol; 40(1), 2442–2447. Pomati, F.; Orlandi, C.; Clerici, M.; Luciani, F.; Zuccato, E. (2008); “Effects and interactions in an environmentally relevant mixture of pharmaceuticals”. Toxicol. Sci., (102), 129-37. Proença, P. N. P. (2011); Resíduos de medicamentos: estudo de caso sobre comportamentos, atitudes e conhecimentos. Dissertação de Mestrado em Cidadania Ambiental e Participação. Universidade Aberta, Porto. [Data de consulta: 07 janeiro 2014]. Disponível em: http://hdl.handle.net/10400.2/1893 Renovato, R. D. (2008); “O uso de medicamentos no Brasil: uma revisão crítica”. Rev.Bras. Farm., 9(1), 64-69. Serafim, E.O.P.; Del Vecchio A.; Gomes, J.; Miranda, A.; Moreno; A.H.; Loffredo, L.M.C.; Salgado, R.H.N.; Chung, M.C. (2007); “Qualidade dos medicamentos contendo dipirona encontrados nas residências de Araraquara e sua relação com a atenção farmacêutica”. Rev Bras Ciênc Farm, 43(1),127-135 Souza, S.F.; Fonseca, S.U.L. (2009); “ Logística reversa: oportunidades para redução de custos em decorrência da evolução do fator ecológico”. Revista Terceiro Setor, 3(1), 29-39. |
1 Farmacêutica. Doutoranda em Biociências e Biotecnologia pela UNESP. Professora da Universidade Paulista – Unip. Endereço: Rua Gumercindo da Cruz, n.3-30, CEP 17032-553, Bauru-SP, Brasil. Telefone: 55 14 996165806. Email: fergraciani@uol.com.br |