Espacios. Vol. 35 (Nº 5) Año 2014. Pág. 8 |
Crédito, consumo e endividamento: Uma Análise Econômica do Segundo Governo Lula (2007-2010)Credit, consumption and indebtedness: An Economic Analysis of Second Lula Government (2007-2010)Thiago de Sousa BARROS 1; Felício de OLIVEIRA Pinto 2 Recibido: 24/02/14 • Aprobado: 25/04/14 |
Contenido |
RESUMO: |
ABSTRACT: |
1. IntroduçãoO primeiro mandato do presidente Lula (2003-2007) foi marcado pela cautela, havendo manutenção da política econômica do governo anterior de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002), que consistia em cumprir com o regime de metas inflacionárias, superávit primário e câmbio flutuante. Para que as metas inflacionárias fossem atingidas, o governo Lula continuou adotando a política de juros altos, mas flexibilizou as operações de crédito, inclusive permitindo que funcionários da iniciativa privada, aposentados e pensionistas do INSS obtivessem empréstimos com desconto das prestações em folha de pagamento, como ocorria com outras categorias. O segundo governo é marcado por uma crise econômica, ocorrendo, entretanto, a manutenção de elevados índices de crédito aliada a uma política econômica mais expansionista. Destarte, o objetivo central desta pesquisa é analisar a expansão do crédito na economia brasileira durante o período de 2007-2010, bem como a sua utilização e desdobramentos. Ademais, este estudo avalia a evolução das taxas de juros das principais linhas de crédito e seus respectivos prazos, o que pode servir de incentivo para as famílias usufruírem das condições oferecidas pelo mercado creditício, além de impactar, diretamente, no volume de endividamento das mesmas. Para tanto, realizou-se uma pesquisa qualitativa e de caráter descritiva, que através de dados de órgãos oficias, tais como Banco Mundial, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Banco Central do Brasil (BACEN), permitiu desenvolver uma ampla análise conjuntural da situação do crédito, do consumo e do endividamento no Brasil, além de possibilitar a realização de inferências acerca da economia brasileira no período estudado, que compreende a série de 2007 a 2010. A análise da teoria econômica permitiu uma melhor compreensão acerca da temática principal deste artigo e possibilitou analisar a realidade a luz dos grandes autores, sendo esta etapa crucial na etapa de apuração de algumas variáveis econômicas de grande valor, a saber, o crédito, o consumo e o endividamento. Ademais, foram observadas as mudanças no arcabouço jurídico iniciadas no governo Lula, com a criação de leis que possibilitaram expandir o crédito consignado com o débito em folha de pagamentos, assim como as novas leis em vigência de alienação fiduciária que deram segurança e garantias às empresas ofertantes de crédito que, em contrapartida, buscaram ampliar os saldos de créditos concedidos nos segmentos de aquisição de veículos e imobiliário. Com efeito, investigar a respeito do perfil do consumo das famílias é de suma importância para compreender o desenvolvimento e crescimento do país, bem como a compreensão das formas utilizadas pelas famílias para alcançar esses níveis de consumo, como meio de averiguar a saúde financeira dos lares e seus reflexos na economia brasileira. Desse modo, esta pesquisa contribui para o entendimento desses fatores econômicos e apresenta resultados importantes, o que enfatiza, por fim, a relevância da mesma. 2. Crédito, Consumo e Endividamento: Uma Revisão da Teoria EconômicaConforme Smith (1996), o consumo é o único objetivo e propósito de toda a produção; ao passo que o interesse do produtor deve ser atendido somente na medida em que possa ser necessário promover o interesse do consumidor. O princípio é tão óbvio que seria absurdo tentar demonstrá-lo. Na moderna análise do consumo, iniciada por Keynes, sugere-se uma relação de dependência entre consumo e renda de um indivíduo, o qual tende a poupar a diferença entre a sua renda e os seus gastos com consumo. Um aumento na propensão marginal a consumir resulta no crescimento da demanda agregada e como consequência uma ampliação dos investimentos, e dado que as decisões de produção dos empresários dependem das expectativas em relação à demanda, há uma elevação no nível de produto e de emprego da economia (KEYNES apud PALOMBO, 2011). Como bem aduziu Moreira (2011) a sociedade capitalista conduziu, por um lado, à democratização do consumo e, por outro, ao constante aparecimento de novas e complexas necessidades. O ato de consumir deixou, por isso, de servir unicamente para satisfazer uma necessidade individual, para passar a responder a uma necessidade social: mostrar aos outros, o grupo ou a classe social ao qual se pertence. Associado a este crescimento do consumo, assistiu-se ao aumento do recurso ao crédito para o financiar (MOREIRA, 2011, p.1). O consumo, na visão dos economistas, é entendido como um ato econômico na medida em que permite adquirir bens e serviços que satisfazem as necessidades humanas (finalidade última da atividade produtiva). (CAMPBELL, 1995). No que se refere à abordagem macroeconômica, o consumo (sobretudo das famílias) é relacionado com o rendimento e a poupança 3. Desse modo, o consumo das famílias compreende a parcela do rendimento gasta em bens e serviços, afinal a poupança é a parte que não é consumida (SAMUELSON & NORDHAUS, 1993). Na esteira dos argumentos acima delineados, pode-se inferir que o fator econômico capaz de influenciar diretamente o consumo é o rendimento, pois como já havia demonstrado Keynes, em 1936, bastava um aumento nos rendimentos que as despesas com consumo também aumentavam 4. Esta análise realizada por Keynes foi de extrema relevância à teoria econômica, já que os economistas não consideravam a procura e, consequentemente, o consumo, variáveis relevantes para a economia. Com efeito, a relação entre rendimento e consumo foi descrita por Keynes, através da função consumo. Enveredando nesta seara teórica, Moreira (2011, p.96) advoga que Keynes considerava que “a taxa de juro não influenciava o consumo e que o consumo aumentava à medida que o rendimento também aumentava”. Desse modo, conforme o autor: A determinação do consumo agregado na “lei psicológica fundamental” segundo a qual as variações no nível de rendimento disponível conduzem a variações no nível de consumo mas numa proporção menor e a uma proporção média decrescente, quando o rendimento aumenta. Assim, na construção da função consumo inclui-se o consumo de todos os agentes, mas a propensão a consumir varia de agregado familiar para agregado familiar. Não é difícil perceber que os agregados familiares com rendimentos mais baixos apresentam valores para a propensão marginal a consumir mais elevados do que a média dos agentes. O patrimônio ou riqueza do agregado também interfere no valor da propensão média a consumir. Para o mesmo nível de rendimento um patrimônio mais elevado levará a um consumo mais elevado. A previsão sobre os rendimentos futuros de um indivíduo também contribui para as decisões de consumo. Se um indivíduo tomar conhecimento de que o seu rendimento vai aumentar, normalmente, aumenta o consumo no presente. O mesmo acontece com a antecipação dos preços. Se um indivíduo antecipa uma subida no nível geral dos preços é natural que altere as suas decisões de consumo aumentando de imediato o nível de despesa de consumo (MOREIRA, 2011, p.96). Ademais, as preferências também influenciam o consumo, considerando que um gosto maior por determinado bem faz aumentar o seu consumo, além do grau de facilidade na obtenção de crédito e as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras que também impactam diretamente na variação dos níveis de consumo. Em síntese, as famílias aplicam o seu rendimento no consumo de diversos bens e serviços, designados Estrutura de Consumo, e estes impactam diretamente no grau de bem estar e nível de vida de uma sociedade, e têm forte correlação com nível de renda das famílias, pois os rendimentos determinam a alocação de recursos nos diversos níveis da Estrutura de Consumo (alimentação, saúde, lazer, habitação, entre outros). Em contrapartida, na esfera microeconômica, o pressuposto elementar erigido é de que os recursos são escassos, mas os desejos por bens e serviços ilimitados, ou tendencialmente insaciáveis. Assim, acredita-se que o consumo é uma escolha individual e utilitária, pois estando o consumidor ciente dos custos e benefícios inerentes às escolhas que estão à sua disposição, optará por aquela que lhe trará maior benefício. Dessa forma, o principal desafio enquanto consumidor é maximizar a utilidade esperada, aplicando os recursos limitados de forma a satisfazer, o melhor e mais possível, os desejos existentes. Sob esse enfoque, há que ressaltar que a utilidade é um conceito fundamental da teoria do consumidor, proposta pelos economistas utilitaristas, e representa o grau de satisfação que os consumidores atribuem aos bens e serviços que podem adquirir no mercado (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993). Em traço geral, a teoria acima referida explica de que maneira os consumidores racionais dividem os seus recursos escassos entre as alternativas que lhes proporcionam satisfação. Entre vários economistas, destaca-se Jeremy Bentham e John Stuart Mill, que ressaltam que a felicidade reside na aquisição daquilo que é útil, o que é capaz de provocar prazer, satisfação e bem-estar. Já os marginalistas, uma corrente teórica que surge depois, sintetizaram a tomada de decisão de consumo por meio do equilíbrio dos gastos marginais com os ganhos marginais, enfatizando que os desejos de cada indivíduo envolviam a escolha na margem 5. A utilidade marginal é exaustivamente estudada por esta teoria e a evolução dessa última subsidiou o pensamento neoclássico, fundado na compreensão de que o consumidor procura gerir seu próprio interesse, isto é, a teoria da escolha racional dos consumidores pressupõe que os consumidores têm as suas preferências bem definidas e, devido a isto, tentam satisfazê-las da forma mais eficiente possível (SAMUELSON e NORDHAUS, 1993). Demonstrada a importância do crédito também neste cenário, é de grande relevância estudar este assunto e situá-lo no contexto da teoria econômica. De acordo com Beckman e Foster (1969) o crédito ao consumo, através das instituições de crédito, foi introduzido pela primeira vez em Chicago, em 1878. Contudo, somente com a Revolução Industrial é que disseminou e ganhou autonomia, pois como salienta Frade (2007, p.51) com o advento do automóvel “a utilização do crédito começa a perder o seu duplo estigma de pobreza e prodigalidade”. Partindo dos argumentos construídos por Gelpi e Julien-Labruyère (2000), Moreira (2011) diz que: Henry Ford foi exímio em utilizar o crédito para controlar a sua força de trabalho, estimular a produtividade e aumentar as vendas, que levou à sua legitimação mais cedo nos EUA do que na Europa. O grande debate americano, decorrido entre a criação da Russel Sage Foundation, em 1908, e o Consumer Credit Protection Act, em 1968, constituiu o processo mais extraordinário de legitimação social do crédito ao consumo. Deste modo, as atitudes face ao crédito ao consumo mudaram dramaticamente. Uma revolução nos hábitos de consumo e no modo de os financiar entrou em vigor no mercado americano. Multiplicaram-se as instituições de crédito e o financiamento destas permitiu a sobrevivência dos pequenos estabelecimentos artesanais. Numa tentativa de proteção desses estabelecimentos surgiram as associações cooperativas de crédito, ou bancos do povo, à imagem da Raiffeisen alemã. O crédito democratizou-se, popularizou a sociedade de consumo e tornou as famílias americanas exemplos de sucesso e de felicidade (GELPI e JULIEN-LABRUYÈRE apud MOREIRA, 2011, p.105). A concepção de consumo toma ainda outra dimensão na teoria de Lebow (1955), onde o consumo deve assumir o modo de vida, convertendo a compra e uso de bens em rituais, e buscando a satisfação espiritual e do ego no consumo. Os padrões consumistas são as medidas de status social, de aceitação social e de prestígio, e o próprio significado de cada vida passa a ser expresso em termos consumistas. Quanto maior a pressão sobre o individuo para se conformar aos padrões de aceite sociais, mais ele tende a expressar sua individualidade em termos do que ele veste, seu veículo, sua casa, seu padrão de alimentação, seus hobbies. Estes serviços passam a ser oferecidos ao consumidor com maior urgência, acelerando o processo para desgaste, consumo, substituição e descarte em ritmo cada vez ascendente. Assim, o crédito ao consumo concedido pelas instituições bancárias permitia às pessoas comprar bens de consumo duradouros para melhorar o seu estilo de vida. Tantos nos Estados Unidos, como na Europa, a expansão do crédito teve vertiginosa aceleração a partir do início da década de 1980 através deste processo de democratização, somado à liberação da regulamentação do crédito ao consumo. Desse modo, a abertura ao mercado de crédito ao consumo gerou um processo de intensa concorrência entre as instituições responsáveis por fornecer este produto de grande rentabilidade, levando-os a anunciar e a estruturar produtos complexos e realizar inovações financeiras a fim de maximizar os lucros auferidos. (KILBORN, 2005). No Brasil não é diferente e ocorrem também movimentos no setor bancário e na disseminação do crédito para consumo que serão retratados ao longo deste estudo. Compreender a evolução normativa, jurídica, econômica e política do país, favorece o entendimento desse longo processo ocorrido no Brasil até a contemporaneidade. 3. O Cenário Econômico e PolíticoConforme Paula (2011), o Brasil tem historicamente um sistema financeiro de crédito bancário com forte participação do Estado, como nas linhas de crédito de financiamento do investimento (BNDES), financiamento imobiliário (CEF) e financiamento agrícola (BB). O que fica evidente no cenário brasileiro dos anos 1980, até meados dos anos 2000, é a desfuncionalidade para o desenvolvimento econômico brasileiro do sistema financeiro nacional, onde a oferta de crédito era baixa (em geral abaixo de 35% do PIB, bem menor que a média dos países desenvolvidos que é de 80%), ao mesmo tempo que a rentabilidade era elevada, cujos principais fatores foram a alta inflação (até 1994), crescimento econômico baixo e forte instabilidade econômica. Já a partir de 1988, os bancos múltiplos passam a assumir cada vez mais predominância, sendo estes conglomerados financeiros que atuam em diversos seguimentos financeiros. A volatilidade na oferta de crédito no Brasil esteve ligada aos movimentos do cenário internacional. As crises do México, em 1994/1995, da Ásia em 1997, da Rússia em 1998, são exemplos de choques externos que tiveram efeitos negativos na evolução das condições de crédito do país, e a própria crise brasileira em 1999, contribuindo para maior volatilidade (SANT’ANA et al, 2009). Nessa conjuntura econômica, a elevada rentabilidade obtida pelo setor bancário foi possível em função dos ganhos inflacionários, aplicações em títulos públicos indexados (Selic e Câmbio) e operações de empréstimo de curta duração num cenário de elevados spreads. Essas condições deflagram a falta do trade-off clássico entre liquidez ou rentabilidade na composição do portfólio, ao poderem ter as duas opções ao mesmo tempo. Esse “paraíso dos banqueiros” perpetua ao longo dos anos, pois ainda que o spread bancário tenha diminuído, as taxas cobradas em empréstimos e financiamentos continuam entre as maiores do mundo. O programa de reestruturação bancária adotado pelo Banco Central, devido o contágio da crise mexicana no início de 1995, estimulou a entrada de bancos estrangeiros no mercado doméstico para fortalecer o setor bancário, cujo fortalecimento foi determinante na expansão do crédito na economia em período subsequente. No que concerne ao volume de crédito presente na economia, Fortuna apud Sousa e Pinheiro (2012) ressalta que através do controle e seleção de crédito utilizada pelo BACEN, o contingenciamento do crédito pode ser obtido pelos controles: do volume e destino do crédito, das taxas de juros, fixação de limites e condições dos créditos. Observa-se que esta operação além dos bancos comerciais, às instituições financeiras não monetárias, abrangendo outros tipos de ativos financeiros. Assim, se o BACEN influencia na dívida total dos setores da economia, provavelmente este afeta o crédito oferecido ao governo, empresas e unidades familiares. O contexto da criação do Plano Real trouxe estabilidade a economia brasileira e um boom do crédito, mas as incertezas políticas no ano de 2003, com o início do mandato do presidente Lula e o receio com um governante de esquerda no Brasil (o chamado “risco Lula”), acarretou na redução do volume de crédito, atingindo 21% do PIB, em abril de 2003, além de uma série de ataques especulativos que acarretou em forte desvalorização da moeda. Porém, a mudança deu lugar ao continuísmo e o governo Lula manteve a lógica da política econômica do segundo governo FHC, qual seja: câmbio flutuante, para ajustar as contas externas; taxas de juros elevadas, para garantir o cumprimento das metas de inflação; e superávit primário elevado, para conter o endividamento público (CARVALHO e LEPIKSON, 2006). Assim, a nova fase expansiva do ciclo do crédito teve início ainda em 2003, como resultado da combinação de dois elementos: de um lado a confirmação da garantia de que não haveria alteração na política econômica do novo governo; de outro lado, a melhoria das contas externas no contexto internacional vigente a partir de então, em termos tanto do comércio exterior como das condições de liquidez para os países emergentes, o que trouxe menor volatilidade macroeconômica. Este cenário de menor volatilidade macroeconômica e de expectativas de redução nas taxas de juros – e consequentemente diminuição dos ganhos com as operações de tesouraria – levou os bancos a redefinir suas estratégias operacionais, priorizando a expansão do crédito, os quais identificaram nas pessoas físicas um enorme potencial de ganho, diante das expectativas otimistas de recuperação do emprego e da renda sob o governo Lula (FREITAS e PRATES, 2009). O estímulo ao crescimento da oferta de crédito no país a partir de 2004 teve como fatores:
O resultado da política em curso pelo governo, de aumento real do salário mínimo e forte crescimento no volume de crédito, contribuiu para significativo aumento do mercado interno, que juntamente com o fortalecimento dos bancos públicos (BNDES, BB e CEF) a partir de 2008, atuando de forma anticíclica na economia ao evitarem a contração creditícia, foram decisivos para o país atenuar os efeitos da crise mundial de 2008. Observa-se, a partir de 2003, a continuidade da política econômica do governo anterior, mas ocorreu uma mudança no entendimento conceitual de acesso ao crédito, passando a ser entendido através do conceito de microfinanças. Desse modo, de uma forma mais abrangente, ocorre um movimento de “bancarização” da grande parcela da população de baixa renda e a concessão de crédito indistintamente para consumo ou produção pelo Sistema Financeiro Nacional (BARONE e SADER, 2008). Entra em curso no governo Lula a inclusão de uma grande massa de pessoas no Sistema Financeiro Nacional, priorizando nas políticas públicas o acesso ao crédito. Enquanto no governo FHC o microcrédito era entendido como um crédito produtivo, capaz de alavancar a renda; no governo Lula o microcrédito passou a designar o crédito de pequeno valor, produtivo ou não, capaz de gerar renda. A legislação também evoluiu nesse sentido, dando sustentação ao crescimento do crédito. Conforme a Lei nº 10.735, de 11 de setembro de 2003, que estimula a “bancarização” para a população de baixa renda e a obrigatoriedade de direcionamento de 2% dos depósitos à vista, recolhidos compulsoriamente ao Banco Central, ao microcrédito. A importância dessa lei se deve a forte regulamentação sobre os valores a serem concedidos e os prazos de parcelamento do crédito, além de fixar às taxas de juros e regulamentar a profissão de técnico em crédito. Esse processo resultou num volume de crédito no Sistema Financeiro Nacional que passou de R$ 417,8 bilhões, em janeiro de 2004, para R$ 1,71 trilhão em janeiro de 2011, o que corresponde a um aumento de mais de 400% no volume de crédito na economia. Já a relação crédito bancário/PIB quase dobrou, passando de 24,3% para 46,5% no mesmo período (DEPEC-BRADESCO, 2011), mas os dados mostram que o país ainda figura entre os que apresentam menor relação crédito/PIB do mundo, como mostra o Gráfico 1 a seguir: Gráfico 1: Relação Crédito/PIB Entre Alguns Países. A relação entre os saldos dos empréstimos e o produto interno bruto (PIB) dos países é uma importante medida de referência das condições e da profundidade do mercado de crédito bancário, e percebe-se que esse percentual é significativamente maior nos países mais desenvolvidos. Juntamente com o nível e crescimento da renda per capita, a proteção aos direitos dos credores e o nível de informação disponível sobre os tomadores, exercem influência decisiva sobre o volume de crédito ofertado ao setor privado nos países (SANT’ANA et al., 2009). Assim, conforme o Banco Central do Brasil (2008), o estoque de empréstimos e financiamentos a pessoas físicas tem sido determinante para a manutenção do consumo e a expansão do crédito tem crescido a níveis mais intensos que a renda (Gráfico 2) :
Gráfico 2: Evolução do Crédito e do Consumo no Período de 2007 a 2010. O período estudado no segundo governo Lula, de 2007 a 2010, compreende o início da crise internacional com início em 2008 e, mesmo durante esse período, permaneceu a expansão do crédito na economia brasileira. Conforme Gonçalves apud Sousa e Pinheiro (2012), as medidas iniciais para conter a crise mundial que eclodiu em 2008, foram: expandir a liquidez a partir de recursos de empréstimos, flexibilização da taxa de redesconto, redução dos depósitos compulsórios, expansão do crédito para o agronegócio, ampliação do financiamento dos exportadores; manter políticas expansionistas no sentido de não elevar a taxa SELIC e as taxas do mercado financeiro; conter a crise cambial com a desvalorização do Real. Essas medidas evitaram uma redução do PIB brasileiro, mantendo-se em taxas crescentes apesar do contexto mundial. 4. As Principais Linhas de Crédito na EconomiaA ampliação do crédito está associada a um contexto de aceleração do crescimento econômico, o controle da inflação, a elevação da renda, o aumento real do salário mínimo e a expansão dos programas sociais de transferência de renda, que estão produzindo no Brasil um fenômeno próprio de sociedades desenvolvidas: a criação de um mercado de massa, forte e cada vez mais complexo. O aumento desse potencial de consumo pode ser mais assimilado com a ascensão de 23,5 milhões de pessoas para a classe C (com renda de entre R$ 1.062 e R$ 2.017), apenas no período de 2005 a 2007, tornando-se o maior grupo de pessoas na pirâmide social brasileira (VENTURA, 2010). A maior disponibilização de crédito também deriva da melhora nas condições da oferta de crédito ocasionada pelo aumento do prazo das operações de crédito e diminuição das taxas de juros, além da maior bancarização dos brasileiros e pela trajetória ascendente de crescimento da economia com o aumento do número de empregos formais – criação de 17 milhões de empregos formais -, o crescimento do rendimento real – aumento de 66% do salário mínimo real – e da massa salarial, aliados as políticas governamentais de inclusão e financeiras. Nesse processo, o carro chefe do processo de aprofundamento do mercado de crédito no Brasil são as operações destinadas às famílias, que tiveram expansão de 242% de janeiro de 2004 a dezembro de 2009, sendo que os mais expressivos o crédito pessoal (consignado e não consignado), os créditos para aquisição de veículos e aqueles destinados a habitação foram os que mais cresceram no período em questão (LOPES, 2012). Segundo Freitas e Prates (2009) a expansão dos empréstimos a pessoas físicas desde o início do ciclo de expansão de 2003, nas modalidades de crédito pessoal, aquisição de veículos e cartão de crédito. O crédito pessoal, que inclui o crédito consignado, foi o maior responsável por esse crescimento, além da grande expansão do crédito para aquisição de veículos, que oferece a garantia da alienação fiduciária. Quanto à disposição das famílias em usufruir dessa disponibilidade de crédito e ampliar o endividamento também foi estimulada pelas principais redes varejistas, e logo imitada pelos bancos e suas financeiras, de alongamento dos prazos das operações de crédito ao consumidor, reduzindo as parcelas e diminuindo a inadimplência. Conforme Amorin (2010), no ano de 2009, as linhas de crédito que mais cresceram foram o financiamento para aquisição de veículo (146,9%), financiamento imobiliário (77,9%), linhas de crédito pessoal (35,9%) e cartões de crédito (20,6%), dados que representam bem o movimento do crescimento em curso. A elevação no segmento de crédito à pessoa física, nos últimos anos, está impulsionada pelas modalidades de menor risco, com foco em empréstimos consignados em folha de pagamento e nas operações destinadas à aquisição de veículos (BACEN, 2009). O Quadro 1 elenca algumas das principais e mais populares linhas de crédito presentes no mercado para pessoa física.
Quadro 1 : Principais Linhas de Crédito Para Pessoa Física. Historicamente, as instituições bancárias do país vinham mostrando pouco interesse no financiamento de crédito imobiliário, entretanto, a reforma jurídica de 2004 instituiu a alienação fiduciária, o que tornou a concessão de empréstimos mais segura e, gradativamente, embasou um sistema de financiamento em massa (AMORIN, 2010), incentivando os bancos privados a também ampliarem sua participação nessas linhas de crédito. Tanto o financiamento imobiliário, quanto o financiamento de automóveis estão amparados pelo mecanismo de alienação fiduciária, em que o bem é garantia do empréstimo e a inadimplência leva a transferência de posse ao credor. Além disso, a principal fonte de financiamento imobiliário, em 2010, foi à caderneta de poupança, correspondendo por aproximadamente 70% dos financiamentos. A liberação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para aquisição de imóveis ajudou a dar outra tônica ao setor imobiliário. Quanto ao crédito consignado, foi bastante incentivado durante o governo Lula, e é um tipo de tipo de crédito ofertado para os empregados do setor formal e/ou aposentados e pensionistas do INSS, com baixas taxas de juros, em que as prestações são descontadas diretamente de seus salários ou aposentadorias e pensões. O programa de empréstimos a aposentados e pensionistas do INSS, tendo consignação na folha de pagamento, foi autorizado pela Lei nº 10.820, publicada no diário oficial da União em dezembro de 2003 e as primeiras operações iniciaram em maio de 2004, com participação da Caixa Econômica Federal (BARONE e SADER, 2008). As condições estabelecidas pela legislação em vigor e a segurança no recebimento dos empréstimos consignados, mudou a forma de atendimento dos bancos aos aposentados e pensionistas, pois eles passaram a ser vistos como um mercado rentável, pois apesar de juros baixos, possui um risco quase nulo, o que acarreta em mais lucratividade. Além disso, o INSS é eficiente nos pagamentos, tanto do lado do beneficiário quanto para instituições financeiras, e por isso o risco com os aposentados e pensionistas é menor (LUCA apud SOUSA e PINHEIRO, 2012). Nesta conjuntura, algumas famílias acabam caindo na “armadilha da dívida”, pois ao comprometerem boa parte de sua renda no pagamento dos juros do empréstimo, acabam tendo que renegociar a respectiva dívida. 5. EndividamentoConforme Slomp (2008), a sociedade contemporânea tem como característica principal a cultura do consumo, na qual as pessoas associam felicidade e status com o ato de adquirir bens e serviços. Elas usam as mercadorias de forma a criar vínculos e estabelecer distinções sociais, e no contexto mais individual há os prazeres emocionais do consumo, os sonhos e desejos celebrados no imaginário cultural consumista, e para isso, além da renda, o grande viabilizador do consumo é o crédito, mas compromete a renda de quem o toma, conduzindo-o a uma situação de endividamento. Sob esse enfoque, o endividamento é um importante indicador da vulnerabilidade do equilíbrio orçamentário dos indivíduos ou das famílias, pois o endividamento exacerbado, ou sobreendividamento – situação que impossibilita o devedor de boa índole de honrar o conjunto de suas dívidas não profissionais, exigíveis e vencidas –, pode acarretar danos à saúde financeira das famílias, causando apreensão por parte dos credores (LOPES, 2012). Em termos gerais, a presença do crédito é inerente à economia capitalista, na medida em que se estabelecem trocas indiretas (surgindo o dinheiro) e que fornece para receber em período posterior está concedendo um crédito e gerando um débito (LESSA, 2011). Outro tema abordado pelo autor é o objetivo do endividamento, ao que se pretende definir um perfil desejado do crédito na economia:
A importância dessa abordagem remete a estrutura da dívida, pois pode refletir se está em curso na economia uma bolha de crédito e um crescimento insustentável, ainda que sua abordagem não sintetize o objetivo do governo e de grande parcela da população, que recorre ao crédito para poder suprir demandas reprimidas. Em termos gerais, o aumento no nível de endividamento, nos últimos, anos mostra-se associado ao próprio desenvolvimento do mercado de crédito, que era incipiente antes da consolidação da estabilidade macroeconômica (BACEN, 2009). Todavia, desde a crise financeira mundial de 2008-2009, se estabeleceu no Brasil uma discussão recorrente sobre o grau de vulnerabilidade do sistema de crédito brasileiro e a probabilidade de ocorrência de eventual crise no nível de inadimplência no mercado nacional. A princípio a discussão estava centrada no alto nível de concessões para financiamento de veículos, onde visões pessimistas enxergavam um potencial risco de mega-inadimplência, nos moldes da crise dos empréstimos imobiliários chamados de subprimes norte-americanos; mas nada aconteceu nesse sentido, dada a imensa diferença de volume, garantias, taxa de juros e demais exigências protetoras impostas pelo sistema financeiro nacional, se observando um cenário de equilíbrio em termos de risco sistêmico para o sistema creditício no país (FECOMERCIOSP, 2012). O que vem a ser destacado na análise do endividamento é a profunda transferência de recursos das famílias, que seriam direcionados ao consumo de produtos, para fazer frente ao montante de juros que têm que pagar para obter empréstimos. Nesse diapasão, conforme Fecomerciosp (2012), os números impressionantes: só em 2010 as famílias desembolsaram R$ 141,2 bilhões apenas com pagamentos de juros (FECOMERCIOSP, 2012). 6. MetodologiaA metodologia constitui, segundo Deslandes (1993, p.42), uma parte complexa e deve requerer maior cuidado do pesquisador, porque “mais que uma descrição dos métodos e técnicas a serem utilizados, indica as opções e a leitura operacional que o pesquisador fez do quadro teórico”. Partindo dessa premissa e a fim de alcançar os objetivos propostos para esta pesquisa, de analisar questões relativas ao crédito, consumo e endividamento no Segundo Governo Lula (2007-2010) e seus respectivos reflexos na economia brasileira, realizou-se uma análise descritiva, um tipo de estudo que busca investigar e conhecer a realidade, e tenciona descobrir e observar fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpretá-los. Transcendendo esses aspectos, é importante registrar que esta pesquisa é qualitativa, uma estratégia que se preocupa com a percepção da realidade, indo além da mera função de registrar e descrever os fatos e fenômenos, buscando, impreterivelmente, apreendê-los. Para este efeito, este estudo utiliza-se de vasta pesquisa bibliográfica, além de acesso a bases de dados de instituições fundamentais na divulgação de informações de cunho econômico, imprescindíveis para esta análise. Portanto, desenvolveu-se uma análise da conjuntura econômica brasileira, no período delineado (2007-2010), a partir de uma gama de dados secundários, coletados junto a órgãos oficiais, a exemplo do Banco Mundial – que possibilitou acompanhar a evolução do crédito entre as economias –, assim como indicadores do IBGE – que proporcionou o entendimento do movimento em curso do consumo sendo fomentado pelo crédito – e as bases de dados do Banco Central – que funcionaram como ferramenta para a coleta de dados relativos às linhas créditos em expansão, as taxas de juros praticadas e o progresso do uso dessas alternativas creditícias pelos tomadores de recursos. Assim, esta pesquisa cumpre com suas propostas centrais de compreensão da expansão do crédito na economia brasileira, em determinado hiato temporal, seus impactos e consequências, além da investigação no que tange a evolução das taxas de juros das principais linhas de crédito praticadas pelo mercado e os níveis de endividamento das famílias. 7. Apresentação e Análise dos ResultadosConforme Moreira (2012), desde 2003, o crédito vem assumindo cada vez mais um papel importante na contribuição para o PIB, não tendo sido afetada durante a crise financeira. Essa expansão da relação crédito/PIB, foi possível graças a mecanismos da política monetária, com o BACEN mantendo níveis mais baixos de recolhimento compulsório, o que possibilitou aos bancos públicos elevar o nível de crédito disponível num período em que os bancos particulares tendem a reduzir tal disponibilidade, agindo de forma a elevar o crédito na economia, fortalecendo a liquidez no sistema bancário, reduzindo a taxa sobre a captação e o custo de oportunidade dos recursos para os bancos, o que possibilitou a expansão da relação crédito/PIB de 47,85% em 2007 para 54,38% em 2010. No que diz respeito à taxa de juros Selic, mesmo estando entre as mais altas do mundo, apresentou queda no período analisado, passando de 13, 25% em 01 de janeiro de 2007 para 10,75% em 31 de dezembro de 2010, como expresso no Gráfico 3 a seguir: Gráfico 3: Taxa de Juros – Meta SELIC definida pelo COPOM – em % ao ano. A queda da taxa de juros Selic decorreu do aumento da credibilidade, melhora dos indicadores econômicos e da própria expectativa dos agentes de queda. A elevação no período de 2008 decorreu das incertezas geradas no mercado pela possibilidade da economia nacional ser afetada pela crise internacional. Essa redução das taxas de juros vieram acompanhadas do aumento do crédito, principalmente motivado pela expansão do crédito a pessoa física, e consequentemente do endividamento das famílias, como descrito no Gráfico 4: Gráfico 4: Elevação do Endividamento e Comprometimento da Renda das Famílias. A variável “Endividamento das famílias com o Sistema Financeiro Nacional” corresponde à série do Banco Central que relaciona o montante atual das dívidas das famílias com o SFN e a renda das famílias acumulada nos últimos doze meses, que passou de 24,94% em janeiro de 2007 para 39,16% em dezembro de 2010. Em contraponto, a variável “Comprometimento de renda das famílias com o serviço da dívida” relaciona o valor correspondente aos pagamentos esperados para o serviço da dívida com o Sistema Financeiro Nacional e a renda mensal das famílias, ajustado sazonalmente, que passou de 17,72% em janeiro de 2007 para 19,45% em dezembro de 2010. Verifica-se que ocorreu grande expansão do endividamento, devido a grande expansão do crédito e da “bancarização” da população, mas ao mesmo tempo o nível de comprometimento da renda não sofreu grande alteração, em grande medida pelo alongamento dos prazos para pagamento e diminuição das taxas de juros das linhas de crédito para pessoa física, o que demonstra que as taxas de comprometimento da renda no Brasil estão dentro dos valores que se têm como saudáveis do comprometimento da renda de 30%. Ademais, nota-se, no período em estudo, que as principais linhas de crédito em 2007 eram crédito pessoal consignado, aquisição de veículos e imobiliário; e em menores escalas cheque especial, cartão de crédito, crédito pessoal não consignado, aquisição de outros bens, além de outros. Além disso, a evolução do crédito pessoal pode ser segmentado em dois períodos, no primeiro (que vai do final de 2003 ao final de 2008) ocorreram aumentos acentuados nas participações das modalidades crédito consignado, de 6% para 14,8%, e aquisição de veículos que saltou de 19,9% para 26,1%; enquanto isso houve recuo nas modalidades de cheque especial, de 2,8%, e de crédito pessoal não consignado de 3,1%. Os desdobramentos da crise financeira internacional nos últimos meses de 2008 influenciou a conjuntura econômica, o que suscitou ações de política econômica visando assegurar as condições adequadas de liquidez, persistindo a trajetória crescente do segmento de crédito para pessoa física. Nesse segundo período destacaram-se as elevações nas participações das modalidades de crédito consignado e crédito imobiliário, do qual este foi beneficiado pelo impacto da estabilidade macroeconômica sobre as decisões de longo prazo das famílias. Em sentido oposto ocorreu à retração nos financiamentos dos bens duráveis, cheque especial, cartão de crédito financiado e crédito pessoal não consignado. A seguir será analisado, individualmente, cada um dos indicadores das principais linhas de crédito com as quais as famílias se encontram endividadas. A começar crédito pessoal consignado, representado pelo Quadro 2, em valores semestrais para recursos livres: Quadro 2: Crédito Pessoal Consignado Com Recursos Livres Para Pessoa Física Observa-se o grande peso do crédito a trabalhadores do setor público, com saldo que passou de R$ 34,319 bilhões em junho de 2007 para R$ 83,506 bilhões em dezembro de 2010 (aumento de mais de 240%), e pensionistas e aposentados do INSS, cujos saldos passaram de R$ 20,763 bilhões para R$ 41,271 bilhões (aumento de mais de 190%). No mesmo período a taxa média de juros passou de 31,5% a.a. para 27,7% a.a. Constata-se, portanto, um significativo aumento nos volumes transacionados, até mesmo por se tratar de um período que sucede uma crise financeira e a queda na taxa básica de juros Selic reflete na queda da taxa de juros cobrada no crédito consignado. O elaborado a seguir (Gráfico 5) apresenta a expansão do crédito consignado e a evolução da taxa de juros. Através do mesmo pode-se avaliar uma tendência de crescimento daquele, enquanto esta segue uma tendência de queda. Gráfico 5: Evolução do Saldo do Crédito Consignado e da Taxa de Juros. O cenário em estudo, de franca expansão do crédito consignado, é desdobramento da Lei nº 10.820 de dezembro de 2003, que autoriza a consignação em folha de pagamento. A segurança do recebimento, com os débitos em folha de pagamento deram confiança ao mercado para permanecer ofertando esse tipo de crédito mesmo durante a crise, conciliados com a eficiência do órgão governamentais no pagamento das aposentadorias, minimizam os riscos. Já a retração na taxa de juros para esse empréstimo segue a lógica da credibilidade da economia e melhora nos índices da economia, bem como da eficiência da politica econômica no controle da inflação, que repercutiu na própria retração da taxa de juros Selic e na taxa de juros para crédito consignado. Quanto ao Crédito Imobiliário, será analisado a disponibilização com recursos livres, que são livremente pactuados entre os indivíduos e as empresas ofertantes de crédito, conforme Quadro 3:
Quadro 3: Crédito Pessoal com Recursos Livres Para Financiamento Imobiliário O saldo total de recursos livres passou de R$ 1,626649 bilhões em junho de 2007 para R$ 7,358274 bilhões em dezembro de 2010 (aumento de mais de 450%); e desses recursos, aqueles concedidos com taxas pré-fixadas apresentam atraso de 15 a 30 dias no montante de R$ 4,058 milhões em junho de 2007 (que corresponde a 1,47% do saldo emprestado com recursos livres a taxas pré-fixadas), elevando para R$ 20,852 milhões em dezembro de 2010 (que corresponde a 1,67% do saldo emprestado com recursos livres a taxas pré-fixadas). Esses dados mostram que mesmo com a elevação do montante em atraso de 15 a 30 dias, ocorreu ligeira variação em proporção ao montante dos recursos livres a taxas pré-fixadas. O setor automobilístico é outro que representa grande peso na parcela do endividamento das famílias, como pode ser observado no Quadro 4: Quadro 4: Dados para veículos. As vendas apresentaram franca expansão no período em análise, com vendas que passaram de 232.835 unidades em junho de 2007 para 264.727 unidades em dezembro de 2010, ocorrendo significativa retração na produção em dezembro de 2008 por incertezas quanto à crise financeira internacional, mas a demanda permaneceu em níveis elevados. Quanto ao crédito para automóveis, os saldos passaram de R$ 71,053372 bilhões em junho de 2007 para R$ 140,339345 bilhões em dezembro de 2010 (aumento de mais de 190%). As taxas de juros também regrediram 4,24%, além da inadimplência, que também retraiu no período de estudo. Também se faz um estudo do cartão de crédito, pela sua propagação cada vez maior e por apresentar taxas de juros mais elevadas. Os saldos do crédito para aquisição de imóveis e veículos são maiores, mas atinge um número menor de pessoas pelas restrições e pelos valores, já o cartão de crédito atinge maior número de pessoas, mas com taxas mais elevadas. Quadro 5: Informações Sobre o Cartão de Crédito. Em face do quadro apresentado acima, é possível concluir que houve também um aumento significativo dessa linha de crédito, com valores que passaram de R$ 15,872651 bilhões em junho de 2007 para R$ 29,170289 bilhões em dezembro de 2010. Os prazos giram em torno dos 30 dias, o que é razoável de se compreender, dado que as faturas são mensais, mas o que mais impressiona são os montantes em atraso, cuja soma de todos os valores em atraso correspondiam a 36,67% em junho de 2007, passando para 36,52% do saldo total em dezembro de 2010. São cifras expressivas, ainda mais quando se analisa que é a linha de crédito que apresenta as maiores taxas de juros no mercado. Mesmo em meio a uma mudança no cenário, com o crédito imobiliário assumindo um peso maior na dívida das famílias, a partir de 2008, em relação ao crédito para aquisição de veículos e com o crédito consignado em franca expansão durante o período em análise, além da grande propagação do cartão de crédito com taxas de juros significativas, os dados da inadimplência mostram tendência de queda no período estudado.
Gráfico 6: Inadimplência no Sistema Financeiro Nacional A inadimplência refere-se ao saldo das operações de empréstimo, financiamento, adiantamento e arrendamento mercantil concedidas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, que mesmo apresentando elevação entre 2008 e 2009, na análise do período em questão mostra relativa queda. Aprofundando nos dados de inadimplência e endividamento do consumidor, de forma geral, chega-se ao final de 2010, conforme Tabela 1, aos seguintes resultados: Tabela 1: Síntese dos Resultados de Endividamento e Inadimplência do Consumidor - 2010
Fonte: CNC, Elaboração Própria. Assim, pode-se inferir que o percentual da renda comprometido com dívidas mantém-se abaixo de 30%, apesar de mais de cinquenta por cento da população apresentar certo tipo de endividamento e conviver com o problema de comprometimento com dívidas há mais de seis meses. Observa-se um processo rápido e relativamente recente processo de expansão de crédito a parcelas maiores da população, o que acarreta em certas dificuldades em lidar com essas facilidades, e mesmo impulso para suprir demandas reprimidas, ou mesmo para os desejos consumistas presentes em nossa sociedade, desaguando no endividamento cada vez maior de famílias. Em outra via, assiste-se a retração nas taxas de juros, reduzindo os ônus da dívida, assim como a elevação dos prazos, permitindo que as parcelas se encaixem nas despesas familiares, o que conduziu a diminuição dos níveis de inadimplência. Em síntese, os dados apresentados permitem analisar a estabilidade da economia brasileira no período o que favoreceu a manutenção do consumo em ritmo aquecido, impulsionado pelo crédito em expansão numa situação internacional adversa. Observa-se que os maiores pesos das dívidas das famílias ainda são com aquelas linhas que apresentam menores taxas de juros, ainda que o crédito que atinge maior número de pessoas (cartão de crédito) apresente taxas de juros elevadíssimas, e seu descontrole pode atingir um número muito maior de pessoas, o que reforça a necessidade do orçamento pessoal e familiar para se estabelecer um equilíbrio dos gastos e receitas. Dessa forma, o cenário econômico no período de 2007 a 2010 permaneceu estável, como resultado da rápida recuperação do país diante da crise internacional e da melhora dos indicadores econômicos de emprego, da renda e do crescimento econômico. Portanto, as informações conjunturais, juntamente com o amplo arcabouço teórico delineado nesta pesquisa, reforçam a necessidade de se compreender a realidade de uma sociedade complexa, sua rápida transformação e os caminhos que estão sendo traçados para o futuro, principalmente no tocante aos seus aspectos de natureza econômica. 8. ConclusãoA relevância do estudo do crédito, do consumo e do endividamento no período de 2007 a 2010 se dá pela forma como afeta amplamente grandes parcelas da população. O cenário estudado reflete um período de rápida transformação da sociedade brasileira, com significativa “bancarização” da população e com elevação dos níveis de níveis de crédito na economia, e de melhoras significativas nas variáveis econômicas de crescimento, que se situa num período recente da economia e política nacional com o qual é defrontado num passado recente da vida de grande parte dos brasileiros. Desse modo, esta pesquisa possibilitou uma análise acurada do posicionamento conservador das políticas econômicas, permanecendo a relação crédito/PIB entre os menores no mundo, o que favoreceu a economia nacional ao ser menos atingida pelo capital especulativo financeiro. Nas questões ligadas ao crédito, verifica-se a expansão no período de 2007 a 2010, motivado principalmente pelo crédito para pessoa física, a fim de suprir as necessidades e anseios de consumo, o que instiga ao aprofundamento do assunto pela sua relevância para a sociedade, afetando diretamente a vida das pessoas nos seus objetivos de melhoria nos níveis de bem-estar. As principais linhas em expansão possuem uma legislação apurada, que eleva a confiança dos agentes ofertantes de crédito, com o crédito consignado sendo debitado diretamente em folha de pagamento e o crédito imobiliário e para aquisição de veículos possuindo alienação fiduciária. Outra linha de crédito para pessoa física abordada foi o cartão de crédito, que está disponível para maior número de pessoas, mas que possui elevadas taxas de juros, o que fortalece a necessidade do planejamento do orçamento familiar para lidar com esse processo em curso na economia de maior disponibilidade de crédito. Analisa-se também que mesmo com o acréscimo no nível de endividamento, observou-se relativa manutenção no nível de comprometimento da renda, além da queda na inadimplência da economia, como resultado da melhora no nível de emprego. Mas o processo não apenas virtuoso, a fragilidade na política econômica pode ser observada pelo fato do produto nacional estar sendo aquecido em boa medida pelo consumo, o que permite concluir que um cenário que reduza de forma significativa o crédito na economia pode afetar substancialmente o crescimento nacional e consequentemente o PIB. A análise descritiva dos dados do Banco Central (BACEN), Banco Mundial e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) possibilitaram um entendimento da conjuntura da economia nacional, mas também apresentaram limitações ao trabalho pela ausência de algumas séries temporais e mudanças nos critérios metodológicos utilizados para a construção de indicadores, o que afetou diretamente a pesquisa e impediu de se realizar um estudo que compreendia uma série temporal mais ampla. Por fim, como proposta de estudo futuro propõe-se estudar os primeiros anos do governo Dilma, com uma abordagem da conjuntura econômica nacional, dos novos desdobramentos do crédito na economia e quais linhas se sobressaem e o papel do consumo na expansão do produto nacional. Rerefências BibliográficasAMORIM, Guilherme. Crédito e Endividamento Familiar. Análise Conjuntural. Curitiba. v.32, n. 1-2, p. 13-14, jan./fev. 2010. BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2008. Relatório de Inflação. Copom, Brasília, v.10, n. 3. Disponível em <http://www.bcb.gov.br/htms/relinf/port/2008/09/ri200809P.pdf> Acesso em: 15 de outubro de 2013. BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2009. Relatório de Inflação. Copom, Brasília, v.11, n. 2. Disponível em < http://www.bcb.gov.br/htms/relinf/port/2009/06/ri200906P.pdf> Acesso em: 17 de outubro de 2013. BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2013. Relatório de Inflação. Copom, Brasília, v.15, n. 2. Disponível em <http://www.bcb.gov.br/htms/relinf/port/2013/06/ri201306b3p.pdf> Acesso em: 9 de dezembro de 2013 BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2013. Sistema Gerenciador de Séries Temporais. Disponível em <https://www3.bcb.gov.br> Acesso em: 7 de novembro de 2013 BANCO DO NORDESTE DO BRASIL, 2009. Conjuntura Econômica. Editora BNB. Fortaleza. n. 20. jan. – mar. de 2009. BANCO MUNDIAL, 2013. Domestic Credit to Private Sector (% of GDP). Disponível em <http://search.worldbank.org> Acesso em: 13 de novembro de 2013. BARONE, Francisco M.; SADER, Emir. Acesso ao Crédito no Brasil: Evolução e Perspectiva. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v.42, p. 1249-1267, nov. – dez. de 2008. BARROS, Carlos Augusto R. de. Educação Financeira e Endividamento. Disponível em: <http://www.fadergs.edu.br/fadergs/user/file/Carlos%20A_R_Barros.pdf>. Acesso em 7 de novembro de 2013. BECKMAN, T. N.; FOSTER. Credit and Collections. New York: Mcgraw-Hill Book Company. 1969. BRADESCO, 2013. Aumento do crédito e do endividamento das famílias no Brasil, nos últimos anos está longe de poder ser caracterizado como uma bolha de crédito. Disponível em: <http://www.acionista.com.br>. Acesso em: 20 de outubro de 2013. CAMPBELL, C. The Sociology of Consumption, Acknowledging Consumption. London: Routledge, 1995. CARVALHO, Everton F. de; LEPIKSON, João A. P.; Uma Breve Análise Crítica das Políticas Fiscal e Monetária do Governo Lula. Disponível em: <http://www.nec.ufba.br>. Acesso em: 9 de setembro de 2013. CNC, 2011. Níveis de Endividamento e de Inadimplência Sobem em Maio. PEIC. Disponível em: <http://www.cnc.org.br>. Acesso em: 3 setembro de 2013. CREDIT SUISSE, 2012. O Crédito na Economia Brasileira. Disponível em: <https://www.cshg.com.br>. Acesso em: 10 de setembro de 2013. CRUZ, Gisele N.; CASTRO, Mariana L. de. Cartão de Crédito e os altos Níveis de Endividamento da População Ludovicence. Disponível em: <http://www.sputtr.com/ludovicense>. Acesso em 13 de abril de 2013. DESLANDES, Suely Ferreira. A construção do projeto de pesquisa. In: MINAYO, Maria Cecília de Sousa (Org.) et al. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 19. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993. FECOMÉRCIO MINAS. Sondagem de Opinião do Lojista. Cartão de Crédito – Unificação do POS. Disponível em: <http://www.fecomerciomg.org.br/downloads/economia_pdf_2098.pdf >. Acesso em: 20 de outubro de 2013. FECOMÉRCIOSP. Radiografia do Endividamento das Famílias nas Capitais Brasileiras. Disponível em: <http://www.fecomercio.com.br>. Acesso em: 10 de dezembro de 2013. FRADE, C. A regulação do sobreendividamento. (Tese de Doutoramento), Coimbra: FEUC, 2007. FREITAS, Maria C. P. de; PRATES, Daniela M. O Mercado de Crédito no Brasil: Tendências Recentes. In: JUNIOR, G. B.; NOVAIS, L.F.; FREITAS, M. C. P. de. (Org). Panorama das Economias Internacional e Brasileira: dinâmica e impacto da crise global. São Paulo: Fundap, 2009, p. 215-234. FROYEN, Richard T. Macroeconomia. 5º Edição. São Paulo: Saraiva, 2002. IBGE, 2013. Séries Estatísticas. Disponível em <http://www.ibge.gov.br/home/>. Acesso em: 12 de novembro de 2013. KILBORN, J. Behavioral Economics, Overindebtedness and Comparative Consumer Bankruptcy. Journal of European Law. n22, p.13-46, 2005. KIYOSAKI, Robert. LECHTER, Sharon L. Pai Rico, Pai Pobre. 46º Edição. Rio de Janeiro: Elsevier. 2000. LEBOW, Victor. Journal of Retailing. Disponível em: <ablemesh.co.uk/PDFs/jornal-of-retailing1955.pdf>. Acesso em: 15 de janeiro de 2014. LESSA, Carlos. A expansão do crédito e do endividamento no Brasil: depoiment. [junho de 2011]. Rio de Janeiro: Jornal do Economistas. n. 263, p.5-8, junho de 2011. LOPES, Geovane de Oliveira. Endividamento das Famílias Brasileiras no Sistema Financeiro Nacional: O Impacto de Indicadores Macroeconômicos. Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2012. MARCONI, MARINA de A.; LAKATOS. Eva M. Fundamentos de Metodologia Científica. Atlas, São Paulo, 7º edição, 2010. MENDONÇA, Vivianne da S.; MELO, Maria de F. M. de. Economia Familiar, Consumo e Orçamento Doméstico. Disponível em: <http://www.xxcbed.ufc.br/arqs/gt5/gt5_07.pdf>. Acesso em 5 de agosto de 2013. MOREIRA, Filipa Ramos. O Consumo e o Crédito na Sociedade Contemporânea. Gestão e Desenvolvimento, Viseu, nº19, p.91-114. MOREIRA, Jessica S. O Controle do Crédito e Seus Reflexos na Economia: Crescimento Econômico e Endividamento. Monografia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Sapiranga, RS, 2012. PALOMBO, Paulo E. M. Fatores Determinantes da Trajetória do Consumo no Brasil Pós Plano Real. In: SemeAD: Seminários em Administração, XIV, 2011. São Paulo. Anais ... São Paulo:Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2011. PAULA, Luiz Fernando de. O recente boom de crédito no Brasil: uma avaliação. Jornal do Economistas. Rio de Janeiro. n. 263, p.3-4, junho de 2011. PAZZINI, F. L. S.; ROGERS, D.; ROGERS, P. Análise dos Fatores que Influenciam na Concessão do Limite de Crédito: Uma Aplicação Prática. Disponível em: <http://www.ead.fea.usp.br/semead/10semead/sistema/resultado/trabalhosPDF/215.pdf>. Acesso em 5 de novembro de 2013. SAMUELSON, P.; NORDHAUS, W. D. Economia. Portugal: Mcgraw-Hill, 1993. SANT’ANA, A. A.; BORÇA J., G. R.; ARAUJO, P. Q. de . Mercado de Crédito no Brasil: Evolução Recente e o Papel do BNDES (2004-2008). Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v.16, n.31, p.41-60, jun. 2009. SLOMP, Jerusa Z. F. Endividamento e Consumo. Revista das Relações de Consumo. Caxias do Sul. p. 109-131. 2008. SMITH, Adam. A Riqueza das Nações: Uma Investigação Sobre sua Natureza e Suas Causas. São Paulo: Nova Cultural, 1996. v.1. SOUSA, Katsuk R.; PINHEIRO, Valéria F. A Política de Crédito do Governo Lula, no período de 2003 a 2010. In: COLÓQUIO SOCIEDADE, POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMNTO, 2, 2012, CEARÁ. Universidade Regional do Cariri – URCA. 2012. p. 17. VENTURA, Rodrigo. Mudanças no Perfil do Consumo no Brasil: Principais Tendências nos Próximos 20 Anos. Macroplan. Ago. 2010. |
1 Professor Assistente do Curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Ouro Preto é mestre em Finanças pela Faculty of Economic the of University of Coimbra tsousabarros@gmail.com |