1. Introdução
A partir da década de 1990, um tema passou estar presente para todos os gestores: alternativas para melhorar a performance organizacional com foco na sustentabilidade, o desafio passou a ser minimizar os impactos ambientais e ao mesmo tempo manter a competitividade de mercado. A utilização de práticas ambientais, é uma excelente maneira de alcançar essas metas. Dentre as alternativas têm-se as metodologias de Produção mais Limpa (P+L), que integra uma estratégia tecnológica, econômica e ambiental aos processos/produtos, a fim de aumentar a eficiência no uso de insumos e matérias-primas, através da redução de desperdícios, não geração, minimização ou reciclagem, dos resíduos gerados, proporcionando benefícios econômicos e ambientais para as organizações.
Assim, nos últimos anos, melhorias de eficiência para gerar a entrada mais econômica de materiais e com menos energia são consideradas como sendo uma importante estratégia de alcançar o desenvolvimento sustentável (Robert et al., 2000). As metodologias de P+L contemplam mudanças nos processo e produtos produtivos a fim de reduzir ou eliminar todo tipo de resíduos antes que eles sejam criados, visando um impacto ambiental reduzido ao longo do ciclo de vida do produto (Dun; Bush, 2001; Baas, 2007;). A P+L não abrange apenas a responsabilidade ambiental e econômica, mas também a responsabilidade social. Considera que a redução da geração de resíduos em um processo produtivo, muitas vezes, possibilita resolver problemas relacionados à saúde e à segurança ocupacional dos trabalhadores (Severo et al., 2011).
Consoante a isso, as empresas vêm integrando em seus planos estratégicos a P+L, tornando-se viáveis benefícios ambientais, econômicos e de saúde ocupacional. Para tanto, reconhece-se a necessidade de uma mudança de atitudes de todos os membros da organização, desde os níveis de diretoria até os níveis operacionais (Guimarães, et al., 2011).
Coerentemente a posturas ambientalmente mais corretas, as organizações estão percebendo a importância de atuarem de forma menos agressiva ao meio ambiente, podendo lucros compatíveis a competitividade do setor, ao incluírem em suas estratégias empresariais as preocupações ambientais, adotando novas estratégias tecnológicas, implantando ferramentas de P+L e racionalizando o consumo dos recursos naturais (Severo et al., 2009).
Importantes estudos tem sido realizados para identificar elementos que contribuam para o sucesso da P+L, entre estes, a pesquisa de Tseng, Lin e Chiu (2009) identificou os fatores mais significativos, com base nos pesos prioritários a nível mundial, sendo estes (Fig. 1): i) gestão e liderança; ii) plano estratégico; iii) ferramentas e tecnologias; iv) análise e melhoria de processos; e, v) foco no cliente. Estes são os cinco atributos mais importantes para o objetivo global na implementação P+L. Entretanto, observa-se na literatura que a o sucesso da implementação pode ser medido através da performance organizacional, pois melhorar os resultados através da redução de consumo de recursos e da emissão de resíduos são os princípios primordiais da P+L, portanto este estudo tem como objetivo analisar os fatores críticos de sucesso da P+L, encontrados em cinco empresas de médio e grande porte do sul do Brasil, bem como identificar a performance organizacional como resultado da P+L.
2. Referencial Teórico
Para a implementação do P+L os gestores das empresas necessitam tomar decisões que priorizam fatores, os quais podem afetar o sucesso da P+L. O estudo desenvolvido por Tseng, Lin e Chiu (2009) apresenta um modelo de priorização dos fatores críticos de sucesso da P+L (Figura 1), o qual foi usado nesta pesquisa como base para investigação que resultou neste artigo. Neste capítulo está apresentada a revisão da literatura referente aos fatores críticos de sucesso, considerados significativos na pesquisa de Tseng, Lin e Chiu (2009).
Observa-se que todos os fatores apresentados na Figura 1 são importantes para a implementação da P+L, entretanto os fatores de gestão e liderança, plano estratégico, ferramentas e tecnologias, análise e melhoria de processos, bem como o foco no cliente, por apresentarem maior influência no sucesso da implementação da P+L (Tseng; Lin; Chiu, 2009) serão os objetos deste artigo.
2.1 Organização interna
A implementação estratégica da P+L sistêmica tem sido muitas vezes considerada difícil, devido as barreiras culturais, econômicas, falta de políticas públicas, e investimentos nesta prática ambiental (Ciccozzi; Checkenya; Rodriguez, 2003; Stone, 2006; Shi; Peng; Zhong, 2007), apesar dos elevados benefícios potenciais para as organizações. Consoante isso, as dimensões humanas desempenham um papel significativo na absorção e difusão da P+L (Stone, 2000). Neste cenário, diversas iniciativas foram implementadas para integrar P+L com outras ferramentas, e assim superar os problemas com a adoção e integração da P+L, a exemplo da P+L e gestão de energia e sistemas de gestão ambiental (Dobes, 1999; Amundsen, 2000), a P+L e o Projeto de Eficiência Energética (UNEP, 2004), entre outras.
Para Moors, Nulder e Vergrat (2005) algumas organizações consideram o meio ambiente como uma nova arena estratégica, onde é possível tomar atitudes proativas em relação ao ambiente e capturar uma vantagem competitiva tanto mercadologicamente como econômico/financeira. Coerentemente, abarca uma gestão de liderança e compromisso, para promover a participação de funcionários, bem como um planejamento estratégico com foco no cliente.
Considera-se que das últimas décadas do século XX em diante a gestão e práticas de negócios ambientalmente conscientes, através de influências de atividades proativas e políticas estabelecidas pelas organizações passaram a ser uma constante (Tseng, et al., 2009). Conforme ressalta Stone (2006) existem diversos fatores na implementação de projetos de P+L, bem como pode ocorrer inadequações nos processos de mudança de gestão utilizados. Para o autor um conjunto de principais fatores organizacionais internos contribuiu fortemente para a absorção de uma P+L e afeta o potencial de melhoria contínua, abrangendo o aperfeiçoamento de liderança, o suporte, a comunicação, o envolvimento e a concepção do programa.
A liderança, o foco no cliente, a melhoria contínua e um plano estratégico interagem fortemente com a implementação da P+L (Tseng, et al., 2007). Isso auxilia a identificar clientes e partes interessadas, estimar a posição atual da organização em relação aos seus concorrentes no mercado, bem como projetar e implantar um plano estratégico de ações específicas sobre clientes com foco na organização (Tseng, Lin; Chiu, 2009).
2.2 Sistemas e tecnologias
A P+L trata-se de uma atividade contínua, semelhante a um sistema de produção ou melhoria de tecnologias que é realizado para alcançar a proteção do ambiente e, consequentemente, pode gerar, a curto e longo prazo, melhorias ambientais e sociais, mesmo para além dos programas de conformidade regulamentar (Tseng; Lin; Chiu, 2009; CNTL, 2012).
Conforme ressalta Dale e Lascelles (1990) por causa das diversas motivações para a melhoria contínua, é impossível identificar um plano de implementação único e esclarecer a ordem em que as ferramentas específicas e tecnologia devem ser usadas. Neste contexto, as organizações devem desenvolver a sua filosofia de qualidade, a gestão eficiente, a política ambiental, procedimentos e objetivos, e adquirir informações de funcionários, clientes, fornecedores e concorrentes para implementar um programa de P+L. Parcerias de longo prazo com os fornecedores também auxilia as partes envolvidas para resolver problemas ambientais e investir em esforços de melhoria ambiental (Tseng; Lin; Chiu, 2009).
Tecnologias de P+L ainda são usadas como um slogan verde, associada a produtos ou processos que são supostamente ambientalmente corretos. As tecnologias de P+L devem promover a ligação entre produtos finais e a reciclagem/reutilização de resíduos, abrangendo uma tentativa de cooperação para aperfeiçoar a eficiência ambiental. Este tipo de melhoria pode ser alcançada através da transferência direta de tecnologia avançada (Tseng; Lin; Chiu, 2009).
Outro aspecto importante é que as tecnologias limpas levam a um aumento de produtividade resultante da economia de custos e racionalização dos resultados nos processos produtivos (Getzner, 2002), Assim como a P+L melhora a imagem da empresa, já em termos econômicos, mercadológicos e ambientais, é muito menos dispendioso prevenir a poluição do que recuperar áreas ambientalmente degradadas, bem como há um prejuízo maior quando a empresa está associada a desastres ecológicos (Hunt; Auster, 1990). Além da imagem, a P+L contribui de maneira significativa em tornar a empresa um negócio sustentável, permitindo a redução de custos, fortalecendo a posição no mercado, criando novos mercados e evitando críticas de stakeholders externos, além de aumentar a possibilidade de sobrevivência das empresas a longo prazo (Cramer; Stevels, 2001). Contribuindo com a o tema de performance organizacional, Almeida e Giannetti (2006) destacam que a P+L é um conceito de melhoria contínua que permite aperfeiçoar a eficiência, a lucratividade e a competitividade das empresas, enquanto protege o meio ambiente, o consumidor e o trabalhador.
Figura 1 – Hierarquia para a implementação de produção mais limpa
Fonte: Tseng, Lin e Chiu (2009).
3. Metodologia da Pesquisa
Este estudo é uma pesquisa qualitativa, de caráter descritiva, que ocorreu através de um estudo de casos múltiplos, com o intuito de compreender o fenômeno observado (Hair Jr.; Bush; Ortinau, 2000; Malhotra et al. 2005), que no caso trata-se da implementação do P+L. Optou-se pelo estudo de caso múltiplo, pois segundo Yin (2009) mais de um caso único, onde a unidade de análise são organizações. A pesquisa ocorreu em cinco empresas situadas no nordeste do estado do Rio Grande do Sul, Brasil, que implantaram a P+L nos últimos seis anos. A amostra é considerada não probabilística por conveniência, pois as empresa foram escolhidas pela facilidade de acesso aos respondentes.
Os dados foram coletados através de entrevistas individuais semiestruturadas (Malhotra et al., 2005), aplicadas aos gestores da área de produção e os responsáveis pela gestão ambiental da empresa. As entrevistas ocorreram nos meses de agosto a outubro de 2012. Outra fonte de dados foram os relatórios de melhorias e projetos relacionados à P+L. As entrevistas foram gravadas por meio de áudio, bem como foram realizadas anotações de campo. O tempo médio de cada entrevista foi de 48 minutos. As entrevistas foram transcritas, como forma de proporcionar precisão, fidelidade e interpretação dos dados, conforme orientação de Gibbs (2009).
Na fase de análise e interpretação dos dados coletados, o método utilizado foi a Análise de Conteúdo, que segundo Bardin (2004) consiste em elementos que permitem a apreciação das comunicações e fornecem informações suplementares. As categorias de análise dos dados foram obtidas com base em Tseng, Lin e Chiu (2009) (Figura 1) e na revisão da literatura relacionada a P+L: i) organização interna (Gestão e liderança; plano estratégico; O foco no cliente); ii) sistemas e tecnologia (Ferramentas e tecnologias; processo de análise e melhoria); iii) sucesso da implementação da P+L (performance organizacional).
Com relação ao aspecto de confidencialidade, e por questões estratégicas, as empresas pesquisadas reservaram-se ao direito de não divulgar os nomes, portanto doravante neste trabalho serão denominadas Alpha, Beta, Gama, Delta e Zeta.
4. Resultados e Discussões
A pesquisa foi realizada em cinco empresas de médio e grande porte do sul do Brasil. As cinco empresas são indústrias de transformação do seguimento metalúrgico, comercializando seus produtos para o Brasil e outros países. Com relação a quantidade de trabalhadores no Brasil as empresas possuem em torno de: Alpha 8.000, Beta 7.000, Gama 200, Delta 1.200 e Zeta 1.400 funcionários. As empresas Gama e Delta possuem unidades apenas no Brasil, enquanto que a Alpha, Beta e Zeta possuem unidades na Europa, África e Ásia. As empresas Alpha, Beta e Zeta são de capital aberto, embora em todos os casos as empresas tem o domínio de mais de 50% de capital nacional. Estas empresas estão no mercado a mais de 50 anos, atuando em: i) a Alpha na produção de implementos rodoviários, ferroviários e silos; ii) a Beta é uma encarroçadora de ônibus; iii) a Gama fabrica acessórios para móveis; iv) a Delta é uma empresa que produz artefatos para iluminação residencial e comercial; v) a Zeta produz componentes para sistemas de frenagem. As empresas estudadas são consideradas líderes em seus segmentos, o que amplia a importância da análise dos casos.
Na realização deste estudo utilizou-se como base de análise dos casos, questões aplicadas nas entrevistas que identificassem as seguintes dimensões: i) organização interna (gestão e liderança; plano estratégico; o foco no cliente); ii) sistemas e tecnologia (ferramentas e tecnologias; processo de análise e melhoria); iii) sucesso da implementação da P+L (performance organizacional). Tomando como base os fatores significativos do estudo de Tseng, Lin e Chiu (2009) e outras contribuições encontradas na revisão da literatura. Estas dimensões de análise estão apresentadas neste capítulo, bem como a comparação entre as empresas.
4.1 Organização interna
Entre as dimensões apresentadas por Tseng, Lin e Chiu (2009) destaca-se a organização interna da empresa, a qual é suportada pela estrutura formal de gestão e liderança, que apresenta as relações hierárquicas e o poder decisório. Outro elemento de suporte à organização interna é o plano estratégico, que é articulado pelo planejamento estratégico de longo prazo, o qual pode ser implementado utilizando ferramentas gestão como o Balanced Scorecard (BSC) e monitorado através de indicadores. Como diretriz organizacional é fundamental evidenciar a existência do foco no cliente, pois esta pode determinar ações internas nos processos produtivos e produtos que atendam o cliente nas expectativas específicas de cunho ambiental.
Na dimensão organização interna, sob a ótica da gestão, observou-se diferentes sistemas de organização hierárquicas nas empresas estudas, entretanto todas as empresas apresentam pelo menos níveis hierárquico da função menos complexa até o diretor da unidade de negócio, mostrando uma verticalizada estrutura funcional. Nestas empresas as diretrizes estratégicas e operacionais são transmitidas por uma liderança formal, não havendo alterações de planos por consenso da equipe, mesmo nas empresas Alpha e Zeta que apresentam um sistema de trabalho em equipe, onde os trabalhadores de cada setor se reúnem periodicamente para discutir a performance do grupo e desenvolver planos de ações para melhorar os indicadores, estas equipes seguem orientações estratégicas da empresa, as quais permitem o alinhamento com a organização, muito embora o sistema de trabalho em equipe incentiva uma gestão mais participativa, contribuindo com o comprometimento das pessoas.
No aspecto de liderança evidenciou-se que nas empresas Beta, Gama e Delta há uma liderança operacional formal, a qual garante a execução das políticas estabelecidas nos níveis estratégicos, trata-se de empresa com um perfil de liderança controladora, com eventuais participações dos operadores. Uma mostra de participação dos operadores é através de sugestões de melhorias que são coletadas mensalmente ou ainda articuladas através de grupos de melhoria contínuas, os quais são compostos por operadores, técnicos e analistas, que se reúnem periodicamente para implementar melhorias de qualidade, produtividade, meio ambiente e/ou condições de trabalho. Na Beta, Gama e Delta a liderança tem um papel de desenvolvimento de práticas ambientais e efetivo controle da execução, portanto cabe a liderança formal a manutenção e melhoria do P+L.
Nas empresas Alpha e Zeta ocorre uma liderança formal, porém mais participativa, que motiva o envolvimento do grupo na solução dos problemas e na construção de melhorias, que é uma caraterística necessária ao sistema de trabalho em equipe implantado nestas empresas, o que exige do líder competências de negociação e flexibilidade, para incentivar o desenvolvimento das pessoas que qualificam as ações em prol da empresa. Ser flexível ao entendimento das pessoas do grupo é uma habilidade necessária, pois culturalmente estas empresas valorizam as opiniões do indivíduo e a busca do consenso do grupo, sem que se oponha as diretrizes estratégicas da empresa.
As empresa Alpha e Zeta investiram em desenvolvimento dos lideres, através da formação acadêmica (Graduação e Pós-Graduação) e de cursos específicos de liderança e gestão de equipes, pois muitos dos lideres são oriundos dos cargos de operação da própria empresa. Nestas duas empresas as práticas ambientais, em especial a P+L são desenvolvidas e mantidas pelas equipes, ficando a cargo do líder a orientação com relação aos aspectos estratégicos e a liberação dos recursos financeiros e físicos para cada projeto de melhoria ambiental, entretanto destaca-se que somente projetos aprovados pela liderança imediata e pela a gestão da manufatura são efetivamente implementados.
Com relação ao plano estratégico identificou-se que apenas a empresa Gama não apresenta o planejamento estratégico estruturado, embora tenha formalizado planos de expansão e estratégias para o atingimento das metas estabelecidas, principalmente com relação as questões financeiras, vendas e produção. No quesito produção não foi identificado na Gama propósitos formais de P+L, entretanto há planos de continuidade dos ecotimes e manutenção das políticas ambientais da empresa, que presam pela redução do uso de recursos e produção resíduos, bem como as práticas de segregação de resíduos, P+L e reciclagem interna/externa de materiais.
As empresas Alpha, Beta, Delta e Zeta possuem o planejamento estratégico estruturado e viabilizado através do BSC. Observa-se que nos Mapas Estratégicos das empresas há objetivos específicos para a sustentabilidade ambiental, articulado através de práticas como a P+L, segregação de resíduos, sistema de gestão ambiental (SGA) e reciclagem interna/externa, ainda as empresas Alpha, Beta e Zeta possuem estação de tratamento de efluentes (ETE) e aterro sanitário. No planejamento estratégico estão previstos os investimentos para as práticas ambientais, as metas de redução dos índices de resíduos, reciclagem e consumo de recursos (agua, energia e matéria-prima.
Todos os objetivos estratégicos das empresas Alpha, Beta, Delta e Zeta são convertidos em planos de ações a nível operacional, que são responsáveis pela efetivação das práticas que resultam no atingimento das metas. As metas estratégicas são desdobradas em metas operacionais dos diferentes setores, fazendo com que estes tenham a preocupação com sua cota de esforço dedicado ao meio ambiente. Embora ocorra o necessário comprometimento do setores, observou-se que as empresas não vinculam as metas estratégicas de sustentabilidade ambiental às premiações de participação nos lucros e resultados, o que poderia servir como incentivo às práticas ambientais.
Outro aspecto importante para a P+L é o foco no cliente, observando sobre se há uma diretriz estratégica da empresa em estar orientada ao cliente e/ou se o cliente valoriza as práticas ambientais que a empresa fornecedora promove. As empresas Beta, Gama e Delta apresenta forte orientação estratégica para o cliente, o que pode ser comprovado na grande quantidade de alterações em seus produtos para atender solicitações dos clientes, oferecendo soluções customizadas. Embora este foco no cliente seja evidente, não há relação direta com às práticas ambientais desenvolvidas pela empresa, pois isto dependeria diretamente da solicitação dos clientes. Já as empresas Alpha e Zeta desenvolvem poucas ações customizadas às necessidades dos clientes, com mais de 90% dos seus produtos padronizados, entretanto estas possuem setores que se relacionam e mapeiam as necessidades, tendência e soluções inovadoras para os clientes.
Por outro lado a influência da valorização que o cliente dispõe às práticas ambientais é percebida nas empresas estudadas, especialmente nas empresas Alpha e Delta que desenvolveram materiais alternativos, menos poluentes para a pintura e para serem usados como componentes, como forma de benefício percebido pelos clientes e valorizado no momento da aquisição dos produtos. Estas duas empresas são seguidas pelos concorrentes, pois desenvolvem soluções inovadoras com custos menores e um reduzido impacto ambiental. As empresas Beta, Gama e Zeta tem clientes que valorizam a imagem do fornecedor relacionado às práticas ambientais, mas não estão dispostas a pagar um valor superior por este benefício, portanto além do respeito a legislação estas organizações desenvolvem estratégias e práticas ambientais que possam ser associadas ao nome e imagem da empresa, o que embora seja importante incentivador de muitas empresas, este ainda é um motivo frágil e não estratégico para implementar a P+L e outras práticas.
4.2 Sistemas e tecnologias
A dimensão sistemas e tecnologias proposta por Tseng, Lin e Chiu (2009), operacionalizou a análise das ferramentas e tecnologias, bem como o processo de análise e melhoria, os quais representam aspectos fundamentais na implantação do P+L. Com relação as ferramentas e tecnologias observou-se que há diferenças significativas entre as empresas formando dois grupos, um em desenvolvimento e o outro em plena maturação. O grupo de empresas considerado em desenvolvimento é composto pela empresa Gama e Delta que utiliza ferramentas e tecnologias para cumprir a legislação eficazmente, disponibilizando meios para os operadores de produção reduzir o consumo de recursos (água, matéria-prima e energia).
O grupo analisado, considerado em estágio de maturação é composto pelas empresas Alpha, Delta e Zeta, as quais utilizam racionalmente os recursos (matéria-prima, água, energia e pessoas). Consoante isso, na concepção dos novos processos e produtos são avaliados os recursos, buscando a redução do consumo destes, bem como avalia-se as possibilidades de reduzir a emissão de resíduos e poluentes. Nestas empresas é frequente a utilização de modernas tecnologias de produção e materiais que causam impacto menor ao meio ambiente, sendo esta uma decisão operacional alinhada às estratégias ambientais da empresa. Neste grupo de empresas as ações vão além do cumprimento das diretrizes legais, pois há um conjunto de profissionais que trabalham no desenvolvimento de processos ambientalmente sustentáveis, preconizados pelo P+L.
No processo de análise e melhoria, observou-se que as empresas Gama e Delta não possui uma metodologia formal de avaliação periódica exclusiva para analisar a implementação do P+L. O acompanhamento do P+L ocorre em conjunto com outros indicadores de performance (financeiros, materiais e produtividade), entre estes, mensalmente são avaliados o consumo de matéria-prima, energia e água, a produção de sucata e refugo (resíduos reciclados internamente ou externamente). A análise efetiva das ações de P+L ocorre durante o desenvolvimento de projetos específicos, registrando a situação anterior e os ganhos com a implementação do projeto de melhoria do processo relacionado ao P+L.
As empresas Alpha, Beta e Zeta possuem metodologia de avaliação periódica dos ganhos com a implementação do P+L, além da análise pontual de cada projeto. A análise do P+L ocorre em virtude destas empresas possuírem um setor específico de gestão ambiental, o qual possui metas e indicadores específicos de performance ligados a questão ambiental. Entre os indicadores destaca-se o acompanhamento do consumo de recursos por produto produzido, emissão de poluentes no mês, produção de resíduos (sucata e refugo) por unidade produzida, ganhos financeiros com a implementação de novos projetos de P+L e controle de destinação dos resíduos por tipo e destinação final. Estes indicadores e controles permitem o monitoramento e incentivam a melhoria constante.
No que tange a melhoria contínua do P+L as empresas Gama e Delta promovem melhorias ambientais no momento de alterar ou desenvolver novos processos e produtos, permitindo ganhos financeiros e agredindo menos o meio ambiente. Estas empresas se utilizam do setor de engenharia e de grupos de melhoria para desenvolver novos projetos de P+L, não existindo um sistema de gestão que apoie e sustente a melhoria contínua da P+L.
Devido a estrutura formalizada de gestão ambiental as empresas Alpha, Beta e Zeta apresentam maior efetividade na melhoria contínua da P+L. O sistema de produção, baseado no Lean Production, e o sistema de garantia da qualidade existentes nestas empresas suportam as ações ambientais, ou seja, a estes sistemas foi acoplado o P+L como premissa básica no desenvolvimento de novos produtos e serviços, bem como na melhoria contínua de processo existentes através da metodologia Kaizen, com o uso de ferramentas do Método de Análise de Solução de Problemas (MASP) e Six Sigma em alguns casos.
4.3 Sucesso da implementação da Produção mais Limpa
O sucesso da implementação do P+L pode ser analisado através da performance organizacional, que considera resultados como a capacidade, custos e flexibilidade da produção, imagem da empresa, bem como aspectos ligados a saúde e segurança do trabalhador (Hunt; Auster, 1990; Cramer; Stevels, 2001; Getzner, 2002; Almeida; Giannetti, 2006).
A performance organizacional das empresas Alpha, Beta e Zeta, demonstrou que há importantes benefícios proporcionado pela P+L, pois estas apresentaram significativas melhorias, aumentando capacidade de produção e redução dos custos com o consumo de menor de recursos, flexibilizou a produção através da padronização de materiais e processos produtivos. A melhoria nos aspectos de saúde e segurança do trabalhador foi observado na empresa Alpha em ações de P+L que substituiu o processo de pintura, na empresa Beta pelas constantes eliminação de componentes do produto que eram confeccionados com fibra de vidro passando para plástico, e na empresa Zeta alterou-se máquinas e dispositivos que produziam mais resíduos por equipamentos que apresentam mais segurança para o operador e menor emissão de resíduos e poluentes. Para obter estas melhorias a empresas investiram em 2012 de 0,7% a 2% do faturamento em máquinas, equipamentos e dispositivos que resultaram em melhorias ambientais e produtividade.
As empresa Gama e Delta tiveram melhorias expressivas com o P+L, proporcionais aos investimentos que ficaram em torno de 1% do faturamento de 2012. O aumento da capacidade de produção e redução dos custos ocorreram na Delta em decorrência da implantação de projetos que alteraram processos produtivos, eliminando operações e sobre tudo reduzindo materiais. A Gama reduziu os custos e aumentou a capacidade produtiva através da implementação de controles no posto de trabalho, tornando o operador responsável pela produtividade e consumo dos recursos. No sentido de reduzir a emissão de resíduos, aumentando a lucratividade a Gama substituiu alguns materiais de pintura, alterou processo que influenciaram diretamente na qualidade de vida no trabalho, assim como a Delta substituiu algumas máquinas que não ofereciam a segurança necessária à operação, além de apresentarem desperdícios de recursos.
5. Considerações Finais
As cinco empresas estudas fazem parte do setor metalúrgico, constituindo-se de empresas de médio e grande porte do sul do Brasil, estão na posição de líderes de seus segmentos, as quais implementaram a P+L. Estas empresa possuem importância estratégica na região pela influência junto aos fornecedores e concorrentes, bem como contribuem na disseminação de conceitos e práticas ambientais entre os seus funcionários, corroborando com a difusão do P+L proposta por Stone (2000). A influência sobre os diferentes stakeholders pode ser uma forma eficaz de disseminação do P+L, pois há exigências relacionadas a sustentabilidade ambiental aos fornecedores, bem como os concorrentes, na condição de seguidores, ajustam seus processos e produtos ao líder do mercado. Estes stakeholders, a exemplo das empresas líderes, buscam sistematicamente aprimorar a gestão de energia e as práticas ambientais (Dobes, 1999; Amundsen, 2000), para alcançar uma performance superior.
Este estudo analisou os fatores críticos de sucesso da P+L (Tseng; Lin; Chiu, 2009) e identificou a performance organizacional como resultado da implementação do P+L, evidenciando que as empresas que estão na fase de desenvolvimento de práticas ambientais, como é o caso da Gama e Delta, ainda investem em melhorias mais simples, de baixo valor financeiro e que são frutos apenas de projetos específicos, enquanto as empresas Alpha, Beta e Zeta já possuem uma maturidade de gestão ambiental, com altos investimento de infraestrutura e sistemas que apoiam as práticas ambientais.
Com relação a performance organizacional observou-se que todas as empresas estudadas apresentaram ganhos relativos aos investimentos em P+L, o que configura-se em um importante incentivador de outras empresas a implementar esta prática ambiental, bem como é um motivador das empresas estudadas, pois entre estas observou-se projetos que apresentaram retorno de investimento de 3 meses a 1,5 anos, o que segundo os entrevistados está dentro das políticas de investimentos das empresas. Estes investimentos em P+L influenciam diretamente na redução de custos e produtividade, e ainda contribuem na saúde e segurança do trabalhador.
Como acréscimo ao objetivo deste estudo, vale ressaltar que há outros fatores capazes de levaram as empresas a diferenciarem-se em relação a o nível de maturidade de P+L, pois todas possuem entre 50 e 60 anos, se originam de empreendedorismo familiar, sendo líderes de mercado possuem tecnologias e métodos de produção modernos. Entretanto nas entrevistas observou-se que na história das empresas há diferentes decisões entre os empreendedores fundadores, pois alguns tomaram mais cedo a decisão de profissionalizar a gestão da empresa, com a contratação de especialistas na gestão de processos e do negócio, que foi o caso da Alpha, Beta e Zeta. Embora o fator profissionalização da empresa possa ter contribuído para esta maturidade, este e outros fatores necessitam de uma investigação profunda e novos estudos.
A contribuição fundamental deste estudo foi desenvolver uma análise qualitativa de empresas de variados portes por meio de um modelo de fatores críticos elaborado por Tseng, Lin e Chiu (2009) em um estudo quantitativo, apresentando uma opção ao meio acadêmico e empresarial de análise da implementação do P+L. Entre as limitações da pesquisa está a amostra não probabilística, que analisou um número reduzido de empresas, inviabilizando a inferência dos resultados à outras empresas, entretanto as categorias e o método de análise podem ser usado para avaliar a implementação de P+L. Sugere-se estudos adicionais que avaliem outras empresas do setor metalúrgico e de outros setores, bem como, nesta pesquisas evidenciou-se a necessidade de compreender os motivos que levam as empresas a terem performance e níveis de implementação de P+L diferentes, constituindo-se em questões para futuras pesquisas.
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