Espacios. Vol. 34 (3) 2013. Pág. 7


Abordagem sobre as vestimentas e a eficiência das normas regulamentadoras brasileiras e da ISO 9920: 2007 na promoção do conforto térmico ao trabalhador

Approach to the garments and efficiency of Brazilian regulatory standards and ISO 9920: 2007 in promoting thermal comfort to the worker

Louisi Francis Moura 1 y Antonio Augusto de Paula Xavier 2

Recibido: 11-09-2012 - Aprobado: 22-01-2013


Contenido

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RESUMO:
Este artigo aborda a importância das vestimentas do trabalhador quanto ao conforto térmico e sua abrangência na Legislação Brasileira e na Norma Internacional ISO 9920:2007. Através do levantamento bibliográfico e dados resultantes de pesquisa de campo, o artigo discute a importância da efetividade de normas que exijam a vestimenta adequada ao trabalhador. Conclui-se que são necessários avanços nos estudos e desenvolvimento tecnológico das vestimentas profissionais para que as normas brasileiras e internacionais apresentem maior eficiência na promoção do conforto térmico ao trabalhador considerando a subjetividade das pessoas e a variedade de conjuntos de vestimentas, tecido e modelagem.
Palavras-chave: vestimenta de trabalho, conforto térmico, normatização.

ABSTRACT:
This article discusses the importance of the worker's clothing as thermal comfort and its coverage in the Brazilian Legislation and the International Standard ISO 9920:2007. By surveying the literature and through evidence from field research, the article discusses the importance of effectiveness of rules requiring proper attire to the worker. We conclude that advances are needed in studies and technological development of professional clothing for the Brazilian and international standards have improved efficiency in promoting thermal comfort to workers considering the subjectivity of people and the variety of sets of garments, material and modeling.
Keywords: work clothes, thermal comfort, standards.


1. Introdução

Uma vestimenta se caracteriza como isolante térmico, interferindo na troca térmica entre ambiente e corpo. Tal característica aponta a roupa como uma das seis variáveis que interferem no conforto térmico: umidade relativa, temperatura do ar, temperatura radiante média, velocidade do ar (variáveis ambientais), isolamento térmico da vestimenta e taxa metabólica (variáveis pessoais).

A roupa de trabalho é considerada um equipamento de proteção individual (EPI) e seu uso é regulamentado na Legislação Brasileira através das Normas Regulamentadoras (NR). Sua abordagem apresenta-se como proteção contra riscos de origem mecânica, térmica, radioativa e outros (MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO, 2001).

Essas normas estabelecem parâmetros dentre os quais as organizações brasileiras devem adotar como prevenção dos acidentes e monitoramento dos riscos que uma atividade expõe ao trabalhador. Entretanto, levanta-se a questão da efetividade e confiabilidade dos dados disponibilizados. A declaração de análises técnicas é emitida pelo fabricante, não sendo regulamentado por órgão brasileiro competente.

O avanço tecnológico tem proporcionado melhorias nos tecidos e modelagens das roupas, o que é positivo na tentativa em oferecer conforto térmico às pessoas. Porém, identificar índices de conforto térmico a um grande número de pessoas é caro e complexo. Por isso, é comum o uso de experimentos em laboratórios para identificar as propriedades isolantes da roupa.

O uso de estimativas de valores do isolamento térmico da roupa se faz através de tabelas desenvolvidas em estudos específicos disponíveis na Norma Internacional ISO (International Organization for Standardization) 9920:2007, e seus valores são expressos em “clo” (expressão do valor do índice de Isolamento Térmico de Vestimenta). Os valores disponibilizados são derivados do Modelo de Conforto Térmico. A equação do Conforto Térmico descreve uma combinação das variáveis de entrada (ambientais e pessoais), que resulta na sensação térmica neutra e prevê condições em que os indivíduos sintam-se termicamente neutros. Para a determinação do Voto Médio Estimado (identificado como PMV) e da Porcentagem de Pessoas Insatisfeitas (identificado como PPD), também chamado de modelo PMV/PPD, ou Modelo de Conforto Térmico, é preciso o conhecimento dessas variáveis, ambientais e pessoais. Alguns autores interrogam a eficiência deste modelo, argumentando que os cálculos parecem mais eficientes em laboratório sendo considerado como atividade sedentária e roupas leves, do que em situações reais de trabalho (CHARLES, 2003); (OLESEN; PARSONS, 2002).

A baixa correlação entre a sensação térmica real e os índices de PMV em alguns casos pode ser atribuída às imprecisões das variáveis pessoais (GRANDI, 2006). Quanto aos valores disponibilizados como índice de isolamento térmico das roupas a precisão dos valores varia em torno de 25% (XAVIER, 2000).

Nesse contexto, esse trabalho objetivou discutir a abrangência e a eficiência das normas brasileira e internacional na promoção do conforto térmico aos trabalhadores com o uso de vestimentas.

2. Procedimento metodológico

O artigo apresenta um levantamento bibliográfico sobre a complexidade de proporcionar o conforto térmico de trabalhadores, além de abordar a Norma Regulamentadora Brasileira que trata da vestimenta de trabalho e a Norma Internacional ISO 9920:2007.

Para alcançar o objetivo proposto, apresenta-se o resultado de uma pesquisa em nível strictu sensu que se propôs em verificar a existência de imprecisões nos valores do índice de Isolamento térmico de vestimenta da Norma ISO 9920:2007. Foram utilizados os valores decorrentes de uma pesquisa de campo a fim de avaliar a correlação dos valores tabelados com os valores empíricos.

2.1. A termorregulação humana através das vestimentas

A vestimenta pode ser indicada como um EPI por inúmeras razões. Dentre elas, sua interferência na troca térmica do organismo. “A vestimenta é uma camada de isolamento entre o corpo e o ambiente” (GRANDI, 2006, p. 29).

No passado, a roupa característica de climas frios era projetada de acordo com efeito isolante do material, que levou a roupas muito volumosas, sem ser confortável no uso. Hoje, busca-se oferecer roupas modernas a partir de níveis iguais de isolamento derivadas de várias camadas de materiais mais finos, com o intuito de renovar o ar que fica entre a pele e o tecido. O modelo tradicional de roupa tem um comportamento estático, através de trocas secas, e um comportamento dinâmico. Ou seja, o primeiro comportamento, refere-se ao isolamento comum, quase constante, útil para as condições ambientais. O outro, dinâmico, pode ser rapidamente modulado através do abrir e fechar a roupa através de botões, punhos, gola, a fim de manter um equilíbrio com diferentes atividades e ventilação do ar. Essas duas formas de isolamento são necessárias para adaptar as pessoas ao seu contexto de vida (BERGER; SARI, 2000).

Malcolm et al. (2000) realizou um estudo para examinar a resposta fisiológica e psicofísica dos participantes em condições tropicais enquanto usavam dois modelos de jaquetas. Todas as jaquetas utilizadas em atividade física sob condições tropicais prejudicaram a perda de calor e aumentaram o estresse fisiológico, exceto o modelo poncho que restringiu a perda de calor. Os modelos de jaqueta comum resultaram em aumento da temperatura corporal e diminuição do conforto térmico. Durante a atividade em condições de calor, movimento do corpo e correntes de vento, a roupa pode configurar uma ação de introduzir ar ambiente e facilitar a circulação interna, a convecção e a evaporação. Em condições de calor úmido, como estava presente na pesquisa, o calor preso entre o poncho e a pele, apesar de ser propagada pela ação de bombeamento dos braços não contribuiu para a perda de calor adicional, mas resultou em aumento no armazenamento de calor do corpo (MALCOLM et al., 2000).

Os estudos de Ueda et al. (1996) analisaram as temperaturas de microclima devido às vestimentas. Foram pesquisados 5 crianças, 5 jovens e 5 idosos em estado de conforto térmico, objetivando examinar as diferenças termorregulatórias relativas à idade relacionadas às temperaturas de microclimas pelas vestimentas. Os idosos ajustaram suas roupas de maneira similar, tanto em membros inferiores quanto nos superiores para manter o conforto térmico enquanto crianças e jovens ajustavam apenas as roupas da parte superior do corpo. Essas ações sugerem que a temperatura de microclimas devido às roupas pode ser derivada do decréscimo da termorregulação corporal pela idade (XAVIER, 2000).

Em outra pesquisa, desenvolvida por Donato et al. (1996), avaliou-se a capacidade na predição do PMV, encontrando-se diferenças significativas entre o PMV calculado e as Sensações Térmicas reais relatadas por crianças. A primeira diferença apontada foi em relação às vestimentas utilizadas, as quais apresentaram isolamento térmico médio de 0,9 clo, o que difere do valor recomendado para situações de inverno, como foi o caso da pesquisa. Quando o PMV apontava situação de conforto térmico, a Sensação relatada foi de desconforto sendo mais do que 10% de pessoas insatisfeitas (XAVIER, 2000).

A interpretação dos resultados que envolvem a discussão da sensibilidade do método para identificar as variáveis, como taxa metabólica e isolamento térmico de vestimenta, são difíceis de estimar e, na prática, podem variar (OLESEN; PARSONS, 2002; CHARLES, 2003).

2.1.1. Dificuldades para o conforto térmico

Felix et al. (2010) apontam a dificuldade de proporcionar conforto térmico em ambiente cirúrgico. A pesquisa indica que proporcionar conforto térmico ao cirurgião e sua equipe está diretamente ligada com o sucesso nos procedimentos cirúrgicos. Foram avaliadas as condições de conforto térmico de quatro membros da equipe: enfermeiro, cirurgião, instrumentador e anestesista que apresentaram diferentes índices de isolamento térmico de roupa, tipo de atividade exercida e posição na sala cirúrgica. Devido à limitação de dados dos valores de isolamento térmico de vestimenta, os autores utilizaram os valores apresentados em pesquisas de Mora, English e Athinitis (2001) com a justificativa de que as roupas de trabalho em ambientes cirúrgicos são relativamente padronizadas.

Entre outras considerações, os autores concluem que vestimenta e nível de atividade são as principais dificuldades em proporcionar conforto térmico a uma equipe cirúrgica. Por isso, eles apontam que o conforto térmico do cirurgião deve ser priorizado já que tem a maior responsabilidade na operação (FELIX et al. 2010).

Um problema para o cálculo da temperatura neutra em um ambiente variável, como um edifício naturalmente ventilado, deve-se ao fato de este apresentar-se como um alvo móvel. Ele está constantemente mudando porque as pessoas se adaptam ao ambiente em mudança. Nas ações dos indivíduos está a mudança no conjunto de vestimentas e na atitude quanto ao ambiente. Essas alterações podem prejudicar os índices de PMV correlacionados às sensações reais térmicas. Se os ocupantes de um edifício forem autorizados a se adaptar ao ambiente mediante a adaptação do vestuário eles poderiam tolerar condições ambientais fora das condições recomendadas no estado estacionário e, portanto, dos padrões atuais de conforto térmico (CARTNEY; NICOL, 2002), (DEAR; BRAGER, 2002).

Se as pessoas se vestem apenas para a moda, então diferenças aleatórias nas vestimentas são suscetíveis de aumentar as diferenças individuais e aumentar o número de insatisfeitos. Sabe-se que mulheres apresentam maior variação de conjunto de roupas por estação que os homens, o que gera duas distintas sub-populações em termos de isolamento térmico. As implicações dessas e outras questões comportamentais quanto às roupas para o gerenciamento do clima interno necessita de pesquisa adicional (DEAR; BRAGER, 2002).

Pesquisas mostram que entre os mecanismos adaptativos para o conforto térmico de indivíduos o mais utilizado é a adaptação através das roupas. Nesse contexto, destaca-se a importância de roupas adequadas no trabalho (MOURA, XAVIER, 2012). Mesmo com índices de taxa metabólica semelhantes, os indivíduos apresentam sensação térmica diferente e conjunto de vestuário variado devido à sensibilidade de cada um.

2.2. Norma regulamentadora brasileira referente a vestimenta de trabalho

A Portaria N.º 25, de 15 de outubro de 2001, do Ministério do Trabalho e Emprego e da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Brasil, expõe a Norma Regulamentadora 6 e determina: “considera-se Equipamento de Proteção Individual - EPI, todo dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde no trabalho”. (MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO, 2001. p. 1).

Esta norma discorre parâmetros de fabricação, uso e dimensionamento dos equipamentos de Proteção Individuais (EPI’s). Esse EPI deve ser disponibilizado pela empresa empregadora gratuitamente. (SOUZA; ARAÚJO; BENITO, 1999).

A NR 6 identifica que cada EPI deve ser disponibilizado conforme a necessidade de proteção: cabeça, membros superiores, membros inferiores, contra quedas com diferença de nível, auditiva, tronco, corpo inteiro e pele.

Sarraf (2004) identifica que os trabalhadores têm preocupação quanto ao seu bem estar, conforto e segurança quanto ao uso de vestimentas de trabalho. A pesquisa apontou que o item mais citado pelos trabalhadores é a necessidade da roupa quanto ao conforto térmico.

A NR 6 não cita quanto ao material utilizado nas vestimentas. Por exemplo, quanto ao EPI que recobre o corpo todo, a norma especifica a necessidade do uso de vestimentas de proteção quanto a produtos químicos, operações com água e contra choques elétricos(MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO, 2001).

A empresa fabricante do EPI deve providenciar os testes laboratoriais que comprovem a veracidade do material para a qual se destina o uso, solicitando o Certificado de Aprovação (CA). A empresa é responsável pelo certificado e a Norma exige que os órgãos do Ministério do Trabalho e Emprego no Brasil fiscalizem.

Os parâmetros uma vez identificados na Norma poderiam servir como base para a identificação do correto uniforme quando da compra pelos empregadores e melhor detalhamento das exigências para a fiscalização. A falta de parâmetros detalhados permite brechas para que as falhas ocorram e não se garanta a real segurança do trabalhador.

Em 2009, uma nova portaria descreveu os princípios obrigatórios na concepção e fabricação de EPI:

a) os EPI devem ser concebidos e fabricados de forma a propiciar dentro das condições normais das atividades o nível mais alto possível de proteção;

b) a concepção dos EPI deve levar em consideração o conforto e a facilidade de uso por diferentes grupos de trabalhadores, em diferentes tipos de atividades e de condições ambientais;

c) os EPI devem ser concebidos de maneira a propiciar o menor nível de desconforto possível;

d) o EPI deve ser concebido de forma a não acarretar riscos adicionais ao usuário e não reduzir ou eliminar sentidos importantes para reconhecer e avaliar os riscos das atividades;

e) todas as partes do EPI em contato com o usuário devem ser desprovidas de asperezas, saliências ou outras características capazes de provocar irritação ou ferimentos;

f) os EPI devem adaptar-se à variabilidade de morfologias do usuário quanto a dimensões e regulagens, ser de fácil colocação e permitir uma completa liberdade de movimentos, sem comprometimento de gestos, posturas ou destreza;

g) os EPI devem ser tão leves quanto possível, sem prejuízo de sua eficiência, e resistentes às condições ambientais previsíveis;

h) EPI que se destinam a proteger simultaneamente contra vários riscos devem ser concebidos e fabricados de modo a satisfazerem as exigências específicas de cada um desses riscos e de possíveis sinergias entre eles;

i) os materiais utilizados na fabricação não devem apresentar efeitos nocivos à saúde. (MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO, 2009, p. 2)

Nessa nova portaria é percebido melhor detalhamento dos equipamentos de proteção de forma a propiciar melhores condições de uso para os trabalhadores. Contudo, a falta de informações precisas ainda é perceptível e pode ser prejudicial, principalmente ao trabalhador que necessita da proteção individual. Há grande necessidade de estudos na área de tecnologia para o desenvolvimento de EPI’s adequados a cada ramo de atividade para que não haja generalização ao disponibilizá-los aos trabalhadores.

A falta de metodologias validáveis utilizadas no Brasil para EPI’s quanto ao conforto térmico e a avaliação de permeabilidade precisa ser considerada.

Existe uma grande carência no método de avaliação da resposta orgânica ao estresse térmico provocado pela vestimenta associado à condição climática desfavorável ao resfriamento corporal necessário para que ocorra a termorregulação corporal. [...] A legislação é omissa no que diz respeito a parâmetros sobre a termorregulação corporal e o conforto térmico. A legislação deve ser aprimorada, incorporando aspectos da termorregulação. Mas, para isso deve ser acompanhada pelo desenvolvimento tecnológico relativo à vestimenta de proteção do trabalhador. Cada EPI deve ser desenvolvido para uma atividade específica e se possível para uma população específica. (ALMEIDA; VEIGA, 2010, p. 37).

A NR 6 aponta que há variação entre os indivíduos tratando-se de equilíbrio térmico quanto à estação, vestimentas, stress ocupacional e adaptação.

Estar exposto ao frio pode ser tão prejudicial ao ser humano que empregados novos não devem ser submetidos à mesma carga horária de um trabalhador regular até que se dê tempo suficiente para adaptação do indivíduo com as condições que o trabalho ofereça e as vestimentas adequadas para a sua proteção. Além disso, variáveis como peso e volume das roupas precisam ser analisadas junto à estimativa de desempenho e produtividade do trabalhador.

2.3. Norma internacional quanto ao isolamento térmico de vestimentas

Se por um lado o Brasil possui em sua Legislação uma norma que trata da vestimenta sob seus vários aspectos, a ISO oferece uma norma internacional específica quanto ao isolamento térmico das vestimentas. A ISO 9920:2007 refere-se às estimativas de isolamento térmico e resistência quanto à evaporação das vestimentas com base em valores já determinados de isolamento das roupas e tecidos, considerando a movimentação do corpo e influência da penetração de ar sob os indivíduos.

A importância deste documento pode ser atribuída a sua abordagem padronizada para pesquisadores do mundo todo para avaliar como um ser humano é afetado pelas roupas usadas em um dado ambiente. São descritas equações envolvendo interações do meio físico com o conjunto de roupas (VANOS et al., 2010).

“O isolamento total da roupa pode ser expresso como a soma das contribuições dos artigos individuais de vestimenta utilizada” (GRANDI, 2006, p. 29). Os valores de isolamento e a resistência quanto à evaporação dos conjuntos de roupa foram medidos usando equipamentos como manequins térmicos. Os dados apresentados foram obtidos na velocidade de ar abaixo de 0,2 m.s-1 – dados para ambientes de escritório. Devido ao alto custo e especialização no manuseio dos equipamentos, a medição real fica fora do alcance da maioria dos usuários. Nesse caso, os valores estimados de isolamento e evaporação das vestimentas devem seguir as cláusulas estimadas na Norma.

Os dados disponibilizados pela ISO 9920:2007 correspondem a valores de conjuntos de roupa e vestimenta isolada para que possa ser criado um conjunto completo. Segundo Vanos et al (2010), para uma pesquisa específica, essa ISO não considera a absorção da água pela roupa ou o conforto tátil. Também não lida com o isolamento separado em diferentes partes do corpo relacionadas com o desconforto causado pela assimetria de uma roupa.

2.3.1. Imprecisões no modelo do PMV

Para a utilização do modelo do PMV é necessário o conhecimento antecipado ou a estimativa dos valores do isolamento térmico das vestimentas. Entretanto, esses valores, em geral identificados pela Norma Internacional ISO 9920, são limitados considerando a grande variedade de vestimentas existentes (XAVIER, 2000). Segundo o autor, o modelo do PMV não leva em consideração os mecanismos adaptativos, como alteração nos conjuntos de vestimentas pelas pessoas.

A pesquisa de Grandi (2006), em um Centro de Controle Operacional apontou baixa correlação entre as Sensações Térmicas relatadas e o índice PMV. As possíveis causas foram atribuídas às imprecisões nas variáveis M (Taxa Metabólica) e Icl (Isolamento Térmico de Vestimentas) que tiveram seus valores tabelados.

Para Vanos et al. (2010) o fato dos valores de Isolamento Térmico de Vestimenta serem resultantes de medições em manequim estático e em condições padronizadas, ou seja, sem circulação de ar, é uma desvantagem significativa para as análises de conforto térmico, pois um padrão unidimensional é suscetível de estar em erro quando aplicado a velocidade de ar elevada.

Estudos mostram bom valor no índice de Isolamento Térmico da Vestimenta de acordo com manequins térmicos e seres humanos em atividades sedentárias, mas a correspondência diminui em outros níveis de atividade. Apesar de alguns estudos afirmarem que o movimento do corpo tem efeito mínimo sobre os valores do índice de Isolamento Térmico da Vestimenta, Charles (2003) explica que os estudos com os seres humanos apontam efeitos significativos. O corpo e o movimento do ar afetam o isolamento da roupa e, utilizando os dados da ISO 9920 para a avaliação do conforto térmico implicar-se-á em superestimação do isolamento real e a perda de calor será maior do que o sugerido pelos valores tabelados. Embora o conhecimento nessa área esteja em expansão, os valores do índice de Isolamento Térmico da Vestimenta são simples e não refletem inteiramente os efeitos da postura, material, corte da roupa, transferência de calor dinâmico ou variações da perda de calor pelo corpo todo.

Pode haver diferenças nas pesquisas em ambientes de laboratório climatizados e pesquisas de campo, pois diferenças de contexto social, expectativas e motivações podem afetar as respostas individuais quanto ao ambiente. Nessas circunstâncias, não é raro encontrar diferença entre o real e o previsto pelo PMV. “É possível que a utilização do PMV como um índice de conforto térmico não reflita a realidade encontrada em medições de campo, onde estão as verdadeiras sensações de conforto térmico relatadas pelas pessoas analisadas” (GRANDI, 2006, p. 94).

Estar em neutralidade térmica é uma condição física, mas que não garante que um indivíduo se considere em conforto térmico, porque é uma condição da mente, que varia pela atividade e expressa satisfação (MOURA, XAVIER, 2012). O PMV nem sempre é um bom modelo para identificação da sensação térmica real, particularmente em ambientes de estudo de campo (CHARLES, 2003). Discrepâncias entre o real e o predito na temperatura neutra refletem as dificuldades inerentes à obtenção exata de medidas de Isolamento térmico de vestimenta e Taxa Metabólica. Na maioria dos ajustes práticos, as pobres estimativas destas duas variáveis são suscetíveis de reduzir a precisão do índice PMV.

3. Resultados

A fim de verificar a existência de imprecisões nos valores de Icl da ISO 9920:2007, aponta-se o resultado de uma pesquisa em nível strictu sensu que se propôs em verificar a existência de imprecisões nos valores do índice de Isolamento térmico de vestimenta da Norma ISO 9920:2007.

Os cálculos descritos a seguir referem-se ao resultado derivado de 67 medições das variáveis ambientais e pessoais da pesquisa de campo em uma indústria do setor metal-mecânico (MOURA, 2012).

As etapas realizadas foram:

  1. Análise de Regressão Múltipla entre Sensação e variáveis (ambientais e pessoais), gerando a equação 1:

S = 0,01934.M+0,06213.Tar+0,06787.Trm-0,00764.Ur-0,14259.Var-1,35179.Icl-2,61482 [1]

Onde:

S = Sensação térmica;

M = Taxa Metabólica;

Tar = Temperatura do Ar;

Trm = Temperatura Radiante Média;

Ur = Umidade Relativa;

Var = Velocidade do Ar;

Icl = Isolamento Térmico de Vestimenta.

  1. Determinação do Icl calculado, isolando o Icl da equação 1, e calculando-o através da equação 2:
  2. Icl calculado= – (0,73976.S) + 0,0143.M + 0,04596.Tar + 0,0502.Trm –(0,00562.Ur) – (0,10548.Var) – 1,9343389 [2]
  3. Subtração do valor de Icl calculado do valor de Icl tabelado para cada uma das 67 medições da pesquisa de campo, resultando em uma média no valor de 0,05;
  4. Novo cálculo do Icl adicionando o valor de 0,05 considerando-o como um Incremento Numérico para fator de correção nos valores de Icl tabelados;
  5. Cálculo do PMV utilizando o novo valor de Icl com o Incremento Numérico;
  6. Análise de Regressão Linear entre Sensação e PMV obtido com o Icl incremento.

O valor de Icl calculado foi subtraído do valor do Icl tabelado, para cada medição. A média de valores dessa diferença foi de 0,05. Esse valor foi então adicionado ao valor do Icl tabelado, como um Incremento Numérico, considerando-o um Fator de Correção, resultando no Icl incremento. O PMV foi novamente calculado, utilizando os valores do Icl incremento.

A correlação entre a Sensação e o PMV com Icl incremento apresentou resultado de 0,7914 no R2 ajustado.

Ao aplicar o Incremento Numérico no valor médio de 0,05 nos valores de Icl tabelado como fator de correção foi obtida uma melhoria de 2,15% na correlação entre o PMV e a Sensação Térmica real.

4. Discussão

O objetivo do procedimento metodológico descrito no tópico anterior foi a melhoria da correlação entre PMV e Sensação considerando que pode haver uma variação significativa entre pesquisas em laboratório e pesquisas de campo. A metodologia proposta apresentou um aumento na correlação no valor de 2,15%. Apesar de ainda ser um valor baixo para caracterizar uma melhoria na correlação entre PMV e Sensação, a pesquisa pode avançar ao considerar variedade de vestimentas pelos trabalhadores como em outros estudos citados.

A pesquisa aponta que o que pode caracterizar as imprecisões significativas nos valores de Isolamento Térmico das Vestimentas apontadas na revisão de literatura e a não correlação de 100% no índice de PMV em relação a Sensação Térmica real, é a não caracterização correta da roupa devido a uma série de variáveis.

Os estudos e informações quanto ao correto conjunto de vestimenta ao trabalhador em diferentes ambientes e sob variadas atividades ainda é limitado. Especificamente quanto a Legislação Brasileira, as Normas Regulamentadoras tratam da roupa como um EPI, mas não detalham quais materiais e os níveis de necessidade para cada tipo de risco que o trabalhador esteja exposto. Quanto ao conforto térmico e as vestimentas de trabalho, a Legislação Brasileira precisa ser aprimorada, mas depende de estudos e desenvolvimento tecnológico voltado às roupas de proteção.

Ao analisar as fibras têxteis identifica-se que as fibras sintéticas como o poliéster tendem a apresentar tecidos mais leves ao toque, mas com a mesma resistência das fibras naturais. A interação devido ao contato entre a pele e a roupa pode desenvolver umidade, secreção e micose, mas isso pode ser evitado com a utilização de fibras têxteis que apresentem um desempenho adequado para as necessidades do corpo (SOUTINHO, 2006).

Existem tecidos tecnológicos que apresentam características especiais a fim de proporcionar conforto e proteção para o usuário. Tecidos com tecnologia para secagem rápida têm sido cada vez mais comuns nas ofertas de roupa profissional. Esses tecidos têm apresentado composição de poliéster, a fim de administrar a temperatura e a umidade da pele para absorver o suor mais rápido que os tecidos comuns e transportá-lo para a camada exterior do tecido (TECELAGEM PANAMERICANA, 2011).

Como o custo das fibras com agregado tecnológico tem custo superior ao convencional é conveniente que a utilização nos tecidos seja racionalizada com a quantidade no mínimo possível, mas que garanta o desempenho almejado (SOUTINHO, 2006). Se as pessoas vestem apenas para a moda, então diferenças aleatórias nas vestimentas são suscetíveis de aumentar as diferenças individuais e aumentar o número de insatisfeitos.

Além da composição dos tecidos utilizados, a modelagem das roupas é bastante variada e, aliada à diversificação dos tecidos, tem apresentado uma variação muito grande nos conjuntos de vestimenta. Uma simples camiseta de malha de algodão pode ser diversificada com o uso combinado com outros tecidos ou acessórios. A modelagem da camiseta pode variar como mostra a Figura 1.

modelos variados de camiseta

Figura 1: Modelos variados de camiseta tradicional
Fonte: Pesquisador.

O quadro poderia ser maior se fossem considerados também o modelo de camiseta gola polo e decote “V” manga longa, com ou sem punho, comprimento mais curto e com bolsos, gola careca e gola canoa. Maior ainda seria se fossem considerados os modelos femininos, com assimetria, mangas ¾, ? e outras variações.

Não são verificadas essas diferenças na Norma ISO 9920:2007. Nesse sentido, a dificuldade em caracterizar o modelo da roupa é fator que pode alterar a identificação do seu índice de isolamento térmico. Por mais que haja uma caracterização da modelagem, seus dados não são suficientes, como mostra a Tabela 1:

Tabela 1: Valores de Isolamento Térmico da peça de roupa

PEÇA DE ROUPA

Icl em “clo”

  • Camisas, blusas
  • Manga curta
  • Leve, manga longa
  • Normal, manga longa
  • Camisa flanelada, manga longa
  • Blusa leve, manga longa
  • 0,15
  • 0,2
  • 0,25
  • 0,3
  • 0,15
  • Calças
  • Curta
  • Leve
  • Normal
  • Flanelada
  • 0,06
  • 0,2
  • 0,25
  • 0,28
  • Vestidos, saias
  • Saia leve de verão
  • Saia grossa de inverno
  • Vestido leve, manga curta
  • Vestido de inverno, manga longa
  • Tailleur
  • 0,15
  • 0,25
  • 0,2
  • 0,4
  • 0,55
  • Jaquetas
  • Jaqueta leve de verão
  • Jaqueta
  • Guarda-pó
  • 0,25
  • 0,35
  • 0,3
  • Roupa do tronco
  • Casaco / Sobretudo
  • Jaqueta
  • Jaqueta modelo parca
  • Macacão
  • 0,6
  • 0,55
  • 0,7
  • 0,55

Fonte: Adaptado, ISO 9920:2007.

Se comparadas a Tabela 1 e a Figura 1 pode-se notar que a variação das camisetas tradicionais não é detalhada na ISO 9920:2007. Vestidos, casacos e outros podem apresentar variações significativas por modelagem e tecidos. Até mesmo um casaco-sobretudo que, em geral, é utilizado no inverno, pode ser confeccionado em tecidos pesados como em leves, caso o interesse seja mais na moda do que na proteção ao frio.

Um tecido apresenta um isolamento térmico diferente quando sua composição muda, ou o modo como o tecido foi produzido (tecelagem). Essa diversidade de opções em tecidos e modelagens é responsável pela variação da moda e no gosto das pessoas.

Em situações reais, as pessoas irão utilizar calçados, os quais irão apresentar variação de isolamento térmico e de transpiração. Até mesmo as meias apresentam variações de composição, gramatura e tamanho (como cano alto e curto). Especificamente quanto às vestimentas, o conforto térmico varia em um mesmo ambiente, pois as pessoas sentem-se confortáveis com roupas diferentes (AZEVEDO; BARBOSA; SILVA, 2005).

A avaliação do conforto térmico depende da avaliação do indivíduo, e esta é subjetiva; quanto ao uso de vestimenta de trabalho faltam informações mais completas.

5. Considerações finais

O artigo abordou a discussão sobre o conforto térmico das vestimentas para os trabalhadores e sua abrangência na Norma Regulamentadora brasileira e na Norma Internacional ISO 9920:2007 atingindo seu objetivo proposto.

Como não há legislação no Brasil que especifique como devem ser os uniformes profissionais para cada situação de trabalho não é comum a exigência da disponibilidade dos uniformes aos trabalhadores pelos empregadores brasileiros em todos os setores da indústria e comércio. Apesar disso, o avanço da tecnologia tem proporcionado que o conhecimento seja aplicado também no desenvolvimento de tecidos tecnológicos. Entretanto, o avanço da tecnologia precisa de investimento financeiro, afetando o preço final do produto, nesse caso, na roupa do trabalhador.

Na falta de uma cobrança mais específica quanto aos uniformes profissionais, não se tem a garantia que os tecidos tecnológicos irão ser utilizados nas vestimentas, pois tende-se a buscar preço baixo devido a alta rotatividade no uso de EPI’s. É importante que sejam detalhados tanto para alto risco à saúde e conforto do trabalhador como para baixo risco.

O avanço nos estudos quanto às vestimentas é importante para que as informações quanto ao conforto térmico sejam divulgadas para os empregadores e funcionários possibilitando um acesso rápido e fácil às informações e, na falta do uso adequado, a cobrança por parte dos órgãos de fiscalização brasileiros.

A Norma Internacional ISO 9920:2007 aponta valores do índice de Isolamento Térmico da Vestimenta que podem ser usados para identificar melhores conjuntos de vestuário, mas a pesquisa mostrou que seus dados são simples e insuficientes para uma análise completa de conforto térmico considerando a subjetividade das pessoas e a variedade de conjuntos de vestimenta, tecido e modelagem.

Percebe-se também a importância de estudos voltados para a vestimenta ao trabalhador haja vista a amplitude do mercado de confecção no Brasil. A matéria publicada pela ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção) expôs a necessidade de investir em design para roupa tanto de moda quanto de uniforme profissional, desenvolvendo uma política de desenvolvimento de produtos. Em 2010, a produção brasileira estava em 75% no território nacional, sendo 65% nas regiões sul e sudeste. Além disso, o Brasil destaca-se como um dos poucos países que agrega toda a cadeia produtiva, ou seja, desde a produção do fio têxtil até o produto final (ABIT, 2010).

Segundo a ABRAFRAS (Associação Brasileira de Produtores de Fibras Artificiais e Sintéticas) o setor têxtil brasileiro “é responsável por uma produção, entre fibras e multifilamentos artificiais e sintéticos, superior a 380 mil toneladas/ano [...] Esta produção resulta em um faturamento anual de US$ 1,06 bilhão e gera empregos diretos para cerca de 9.000 pessoas” (ABRAFRAS, 2012, p.1). O setor de fibras têxteis é caracterizado por ser um dos setores industriais com necessidade intensiva de investimento em pesquisa e inovação, além de sofisticação tecnológica a fim de melhorar as operações industriais, as políticas de custos e preços frente a sua competitividade internacional.

Em 2005, o número de empresas de confecção de vestuário no Brasil estava em 30 mil, com uma geração de 1,65 milhão de empregos diretos. Na indústria de transformação, o setor têxtil e de confecção classificou-se como o 2º maior empregador formal. Esse resultado colocou o país como 7º maior produtor têxtil do mundo, com uma produção de 7,2 bilhões de peças de vestuário por ano (PIMENTEL, 2006).

Este cenário aponta a importância de estudos voltados ao vestuário a fim de intensificar o desenvolvimento tecnológico do setor brasileiro. O avanço desses estudos pode proporcionar a elaboração de dados de conforto térmico que embasem o desenvolvimento tecnológico para vestimenta de trabalho, além de servir como informação para trabalhadores, empregadores e o aprimoramento da legislação que busca garantir saúde e segurança aos trabalhadores brasileiros.

Referências

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1 Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR – Brasil. Email: louisimail@yahoo.com.br
2 Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR – Brasil


Vol. 34 (3) 2013
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