Espacios. Vol. 33 (8) 2012. Pág. 13


Construção de Cenários: Apreciação de Métodos mais Utilizados na Administração Estratégica

Scenario Building: Consideration of Methods Used in Strategic Management more

Mariana Bassi Sutter 1, Daniel Estima 2, Edison Fernandes Polo 3 y James Terence Coulter Wright 4

Recibido: 10-01-2012 - Aprobado: 25-04-2012


Contenido

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RESUMO:
O presente estudo tem como objetivo trabalhar a importância da construção de cenários para o processo de Administração Estratégica ao analisar os principais métodos de construção de cenários e, com base nestes, apresentar considerações sobre os modelos estudados. Por se tratar de um tema exploratório, optou-se por realizar uma pesquisa bibliográfica com a análise de cinco dos diversos métodos de construção de cenários futuros, sendo que estes formam analisados sob as perspectivas de suas características, diferenças e complementaridades. O estudo considera que todas as metodologias estudadas trazem sua contribuição para a administração estratégica e qualquer método aplicado proporcionará o apoio necessário à organização que o aplicou. Cada método possui características que os diferem e que servem como opções para melhor se ajustar ao perfil da organização que utiliza os conceitos de estudos de cenários futuros.
Palavras chave: Administração Estratégica, Métodos, Construção de Cenários

 

ABSTRACT:
This study aims to work the importance of building scenarios for the process of Strategic Management, by analyzing the main scenarios´ construction methods and, based on these, sketch a model of scenario building. A literature research was conducted and five different methods of construction of future scenarios were analyzed form the perspectives of their features, differences and complementarities. The study finds that all the methodologies studied bring their contribution to strategic management and any method used can provide the necessary support to the organization that applied. Each method has characteristics that differ and that serve as options to best fit the profile of the organization that employs the concepts of future scenarios´ studies.
Keywords: Strategic Management, Methods, Scenario Building



1. Introdução

A empresa é a soma de suas escolhas ao longo do tempo, realizadas, ou não, com base em opções identificadas, avaliadas, selecionadas, implantadas, controladas e ajustadas. A administração estratégica busca dar maior racionalidade ao processo de escolhas relacionado aos alinhamentos entre a empresa e seus ambientes (Wrigtht, 2000).

O processo da administração estratégica é contínuo e dinâmico, “uma vez que a estratégia planejada seja implementada, frequentemente irá requerer modificações à medida que as condições ambientais ou organizacionais modificam-se” (Wright, 2000). Em função dessas possíveis modificações, ajustes quase sempre são necessários.  As simulações sobre cenários possíveis tornam-se importantes na medida em que podem minimizar a quantidade importância dos ajustes. 

A partir das simulações realizadas, as estratégias pretendidas são formuladas e implementadas, podendo ocorrer mudanças na estratégia formulada, ou sofrerem ajustes durante sua execução dando origem, no processo final, a estratégia realizada (o que a administração implementa de fato) (Wright, 2000).

Para Mintzberg (2006) a estratégia pode ser moldada, sendo diferente do que foi planejado. Segundo o autor “moldar evoca habilidade, dedicação, perfeição por meio do domínio dos detalhes”, deve-se concentrar menos no pensamento e na razão, mas sim no envolvimento com a estratégia, “um sentimento de intimidade e harmonia com os materiais disponíveis, desenvolvido através de longa experiência e comprometimento”. Por fim, Mintzberg acrescenta que a formulação e a implementação da estratégia fazem parte de um processo fluido de aprendizado pelo qual as estratégias criativas se desenvolvem.

A previsão do ambiente é uma ferramenta que auxilia no êxito do planejamento estratégico, mediante a adequada avaliação do ambiente interno e externo. Existem várias técnicas de previsão (Wright, 2000):

  • Análise por séries temporais: é o esforço em examinar os efeitos de tendências selecionadas;
  • Previsão por julgamento: a organização utiliza fontes de informação qualitativa sobre tendências futuras;
  • Cenários múltiplos;
  • Técnica Delphi: usada para, em determinados casos, prever o futuro.

Este estudo tem como escopo a análise de métodos de construção de cenários múltiplos. Ao longo da pesquisa, serão apresentados métodos propostos por cinco autores.

2. Metodologia

Este artigo tem como objetivo trabalhar o conceito de cenários múltiplos e os modelos e métodos mais elaborados atualmente utilizados. O estudo trabalha a importância da construção de cenários para o processo de Administração Estratégica, analisando os métodos de construção de cenários, suas principais características, diferenças e complementaridades, assim como, sugere um modelo de construção de cenários.

Quanto à metodologia, por se tratar de um tema exploratório, optou-se por realizar uma pesquisa bibliográfica com a análise dos diversos métodos de construção de cenários futuros. De acordo com Gil (1988), pode-se dizer que as pesquisas exploratórias possuem como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições. Ainda segundo Gil (1988), a pesquisa bibliográfica é composta por material já elaborado, principalmente livros e artigos. Embora quase todos os estudos exijam um trabalho desta natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas (Gil, 1988). As pesquisas bibliográficas podem ser definidas como estudos exploratórios por buscarem uma melhor visão e mais dados sobre o problema estabelecido. Para Marconi e Lakatos (2007), a pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre determinado assunto, pois a nova abordagem do tema pode levar a conclusões inovadoras.

3. Conceituação de Cenários

Na busca de definições sobre o conceito de cenários, seguem as visões de alguns autores. Para Ringland (2006) o planejamento de cenários é uma parte do planejamento estratégico que combina ferramentas e tecnologias para administrar as incertezas do futuro, são modelos para antecipar, o que o autor chama de vida real (2006). Para Schoemaker (1995) o planejamento por cenários é um método estruturado (disciplinado) para imaginar futuros possíveis. Dentre as diversas metodologias para se pensar o futuro, o planejamento por cenários se destaca pela habilidade de capturar uma grande gama de possibilidades, com alto grau de riqueza nos detalhes (Schoemaker, 1995). Na concepção de Porter (1996), um cenário é uma visão internamente consistente da estrutura futura de um setor. É baseado num conjunto de suposições plausíveis sobre as incertezas importantes que poderiam influenciar a estrutura industrial.  

Identificam-se algumas coincidências nas visões dos autores com relação a cenários:  criam visões estruturadas de situações  futuras;  falam de  incertezas e de como trabalhá-las  em situações futuras possíveis.

O método de cenários é importante instrumento do processo de tomada de decisões. O uso de cenários faz com que a organização pense de forma sistemática e estratégica sobre a variedade de potenciais resultados, sem a influência de seus próprios vieses, opiniões e preconceitos (Turner, 2008). O planejamento por cenários permite que a organização reflita e ensaie diversos futuros possíveis, e evita o comodismo ou receio de mudar uma situação presente favorável (Turner, 2008). Mc Master (1997) aponta que os cenários permitem conjeturar sobre possíveis situações futuras para que a empresa se adapte a fenômenos emergentes, adequando-se aos eventos na medida em que um dos cenários identificados se concretize, sem a necessidade de uma preparação cara e super-detalhada.

4. Apresentação de métodos de construção de cenários mais utilizados

4.1 Godet

Godet (apud Marcial; Grumbach, 2000) conceitua cenário como o conjunto formado pela descrição de uma situação futura e do encaminhamento dos acontecimentos que possibilitem passar da situação originária para a futura. A elaboração de cenários traz diversas vantagens: é possível tomar consciência dos múltiplos futuros possíveis, a obrigação de analisar a interdependência que relaciona os elementos a serem estudados e a possibilidade de identificação de problemas que  poderiam ser ignorados ou deixados de lado por métodos menos abrangentes.  O método de Godet, descrito por Ribeiro (1997), baseia-se na identificação e projeção de variáveis-chave de cenários e dos atores relacionados a estas variáveis, ou seja, os stakeholders para o qual os cenários são elaborados.

Segundo Ribeiro (1997), a interação e as relações de força entre os atores e as variáveis resultam na dinâmica em direção aos futuros possíveis. A descrição dos cenários estudados é baseada na evolução mais provável das variáveis-chave e nas hipóteses de comportamento dos atores. O método de Godet é dividido em três grandes blocos.

  • Construção da base analítica e histórica: representa o estado atual do sistema, incluindo a identificação das variáveis-chave e do conjunto de atores. Godet et al (2008) recomendam que esta fase seja produzida essencialmente em workshops que permitam um levantamento aprofundado. Nesta etapa as variáveis são definidas, classificadas e o relacionamento entre elas é analisado e estabelecido por meio de uma matriz. Tal matriz auxilia a classificar as variáveis segundo sua influência nos cenários e sua dependência de outras variáveis. Na análise da influência das variáveis, Godet et al (2008) indicam que seja analisado seu relacionamento direto e as relações indiretas e potenciais, que podem ser calculadas com o uso do software MICMAC, de autoria de Godet. Quanto aos atores, são analisadas suas evoluções no horizonte dos cenários estudados, bem como os autores podem ser classificados como invariantes, tendências pesadas (afetarão variáveis por longo período) e fatos portadores de futuro (poucos perceptíveis no presente, mas que podem virar tendências pesadas e ficar relevantes no futuro). Por fim, é feita a análise da relação dos atores com as variáveis-chave.
  • Exploração do campo das possíveis evoluções: bloco que resulta do estudo das incertezas. De acordo com Ribeiro (1997), pelo método de Godet, é feita uma análise morfológica das variáveis e fatos portadores de futuro mais importantes e que, consequentemente, podem chegar um grande número de potenciais cenários. É feita uma lista de combinações e possibilidades destes estados futuros, verificando restrições e incompatibilidades para combinar apenas conjuntos de estados futuros factíveis. A partir desta lista, uma matriz é construída com as combinações de maior contraste, para que passem por uma etapa de probabilização. Para a análise de probabilidade de cada combinação, Godet et al (2008) também recomendam o uso de um software, o SMIC Prob-expert, que receberá o resultado da consulta a especialistas quanto  às probabilidades de ocorrência de cada combinação em rodadas organizadas pelo software, que indicará o conjunto de combinações mais prováveis a partir das médias das notas dadas pelos especialistas.
  • Elaboração dos cenários: a partir dos conjuntos de combinações selecionados da etapa anterior, constrói-se o cenário de referência, com base na reunião dos conjuntos com maior probabilidade de ocorrência, além da construção de pelo menos um cenário contrastado, distinto do cenário de referência. De acordo com Godet et al (2008), para cada cenário designado deve-se construir uma narrativa sequenciada, partindo da situação atual e chegando à visão de futuro determinada pelo cenário escolhido, destacando rupturas e mudanças que aparecerão em cada cenário, além da descrição de um caminho que possa conduzir da situação atual para a desejada.

O método de Godet possui estruturação rígida, baseada na análise dos itens de cenários e com o apoio de softwares, que realiza interações matemáticas. Com a redação dos cenários, Godet et al. (2008) recomenda mais três passos adicionais, relacionados à reflexão prévia, escolhas de planos estratégicos e elaboração/operacionalização/monitoramento de plano de ação. Estes passos adicionais executados trazem a garantia, segundo os autores, de se colocar em ação tudo o que foi elaborado nos passos anteriores. Na sequência, descreveremos o método de Porter que tem como característica a análise do setor e da concorrência.

4.2 Porter

Para Porter (1999) o cenário baseia-se em um conjunto de suposições plausíveis sobre as incertezas importantes que, de alguma forma, poderia influenciar a estrutura setorial.  Ribeiro (1997) destaca que, na ótica de Porter, a unidade apropriada para a análise de Cenários é o setor ou indústria, pois as incertezas em nível macroeconômico, político, tecnológico são analisadas em busca de implicações para a concorrência. A base para a elaboração de cenários na metodologia de Porter é utilizado o modelo das cinco forças competitivas, conforme a figura 1 apresenta.

Figura 1: As cinco forças competitivas de Porter.

Fonte: Porter (1996)

De acordo com Porter (1996), o modelo das cinco forças representa a análise da competitividade e atratividade de um setor sob ótica de cinco principais elementos: rivalidade entre os concorrentes ameaça de novos competidores entrando no mercado, poder de negociação de compradores, poder de barganha de fornecedores e ameaça de produtos ou serviços substitutos. A construção de cenários no método de Porter passa pelos seguintes passos críticos:

  • Identificação de incertezas: nesta etapa devem ser levantados os principais aspectos que possam impactar no futuro da empresa. Porter (1996) defende que deve-se analisar cada elemento relacionado ao seu modelo forças e classificá-los em três categorias, conforme o grau de incerteza (elementos constantes, incertos ou pré-determinados – para os quais a mudança é previsível). Nesta análise, as incertezas são classificadas em tendências aparentes, germes de novas tendências ou ruptura de tendências aparente. Também nesta etapa são levantadas e identificadas as descontinuidades. Porter (1996) recomenda combinar a opinião de peritos com o de observadores externos a empresa, evitando pensamentos convencionais e permitindo identificar possibilidades de mudança.
  • Determinação dos fatores causais: devem-se determinar as principais causas dos elementos incertos identificados na fase anterior. Segundo Ribeiro (1997), esta tarefa é importante, permite entender quais elementos incertos podem influenciar outros elementos incertos, possibilitando entender o relacionamento dessas variáveis e identificar os fatores causais. Porter (1996) destaca que devem ser supostas as possibilidades de estado futuro para cada variável, identificando as configurações alternativas que podem surgir no futuro.
  • Escolha das variáveis de cenário: deverão ser selecionados os elementos incertos que apresentam maior independência em relação às outras variáveis e que apresentam maior grau de impacto em relação a indústria. Somente estas variáveis independentes serão consideradas as variáveis de cenários. Feita a identificação procede-se a análise mais detalhada de seus fatores causais (Porter, 1996).
  • Definição das configurações das variáveis de cenário: devem ser definidas as suposições plausíveis relativas a cada variável de cenário. Cada conjunto de suposições (chamado pelo autor de configurações) depende do quanto cada fator causal possa diferir em sua evolução futura. Para evitar que o número de combinações seja maior do que o tratável, Porter (1996) sugere restringir o tratamento de acordo com quatro características: evidenciar diferenças importantes na estrutura da indústria, destacar impacto sobre a estrutura, considerar opinião da alta administração em pelo menos um cenário e, por ultimo, considerar um limite quanto ao numero de cenários a construir (três ou quatro geralmente).
  • Construção dos cenários, a partir das configurações mais consistentes, escolhidas para cada variável: o cenário deve apresentar uma visão consistente da estrutura de relacionamento do estado futuro das variáveis. As variáveis de cenário, mesmo que razoavelmente independentes, se afetam mutuamente, facilitando a obtenção de combinações consistentes (Porter, 1996). Para cada estrutura de cenários, devem-se derivar o comportamento das variáveis dependentes e acrescentar os elementos pré-determinados e os elementos constantes, analisando com cuidado a intensidade com que cada um entrará em cada cenário.
  • Análise dos cenários: analise das implicações de cada cenário para a concorrência, sob a ótica das cinco forças competitivas, sobre a atratividade futura da indústria e sobre vantagens competitivas. Quanto à sequencia, Porter (1996) recomenda analisar primeiro os cenários mais distintos e deixar por fim o cenário mais provável, para que a visão mais diferenciada dos cenários exploratórios auxilie na variedade de opções estratégicas.
  • Introdução do comportamento da concorrência em cada cenário: Porter (1996) explica que o comportamento da concorrência, além de afetar a empresa diretamente, pode afetar a velocidade e a própria direção da mudança estruturais dos cenários. O comportamento da concorrência pode ser tratado de duas formas: deve-se introduzir variáveis de cenário relacionadas à concorrência se o comportamento desta for altamente incerto ou se a entrada de novos concorrentes seja provável. Outros comportamentos da concorrência devem ser tratados como elementos da análise crítica de vantagem competitiva de cada cenário.
  • Cenários industriais e estratégias competitivas: definir a estratégia da empresa de acordo com as possibilidades de evolução dos cenários analisados. Porter (1996) recomenda métodos básicos para lidar com incertezas na concepção da estratégia, estes incluem apostar em um dos cenários (mais provável, ou melhor, para a empresa), garantir resultados para qualquer cenário (preservando sua “flexibilidade”) e trabalhar para influenciar alguns fatores causais de acordo com o melhor cenário. Porter (1996) alerta para os riscos contidos em cada uma destas estratégias, que relacionam-se ao comprometimento prematuro de recursos, inconsistências das estratégias para cenários alternativos, probabilidade relativa dos cenários e custos para modificar a estratégia.

Porter (1996) finaliza apontando quatro aspectos que devem ser contemplados no trabalho com riscos: definição do cenário mais interessante de acordo com a posição competitiva inicial, importância e vantagens de ser o first-mover, atenção aos custos e recursos necessários e análise das escolhas esperadas dos concorrentes.

4.3 Ghemawat

Para Ghemawat (2007) o ambiente do setor em que a organização opera tem forte influência sobre seu desempenho econômico. O autor (2007) parte da análise de três estruturas, segundo ele mais genéricas, que foram apresentadas como soluções para a formulação de cenários de negócios: análises individuais da oferta-demanda de mercado, estrutura de “cinco forças” proposta por Porter para análise de setores e a “rede de valor” apresentada por Adam Brandenburger e Barry Nalebuff.

A teoria da oferta e demanda é uma das primeiras tentativas de análise de cenários, esta teoria baseia-se que interação entre oferta e demanda determina um preço natural (Ghemawat, 2007). Já o modelo proposto por Porter tem como base para a elaboração de cenários a utilização das cinco forças (ou 5 Forças) competitivas.

A contribuição mais valiosa do modelo de Porter, segundo Ghemawat (2007), está no conceito de que são as forças que determinam a atratividade de um setor.  Ghemawat (2007), aponta que com o passar dos anos o modelo de Porter sofreu rearranjos e a incorporação de outras variáveis. Novos tipos de participantes foram agrupados à análise, sendo que a mais bem-sucedida tentativa de generalização da estrutura envolve a rede de valores criada por Adam Brandenurger e Barry Nalebuff (Ghemawat, 2007). Tal modelo enfatiza o papel crítico dos complementadores dos quais clientes adquirem serviços ou produtos complementares, ou para os quais os fornecedores comercializam recursos complementares (Ghemawat, 2007).

Figura 2: A Rede de Valor

Fonte: Ghemawat, 2007, p. 45

A partir de abordagens do cenário dos negócios o autor propõe uma abordagem para o planejamento e à ação estratégica. O principal objetivo do mapeamento de cenários está em - além de identificar se a organização opera acima ou abaixo dos padrões do setor em que opera - compreender as razões pelas quais a organização sofre variações e incorporá-las às ações estratégicas. Ghemawat (2007) propõe um processo que consiste em seis passos:

  • Coletar informações: mapear cenários de negócios com adequado nível de detalhamento geralmente requer um considerável volume de informações. Em função disso, há vantagem em se pensar de forma extensa a respeito das fontes de informação de forma a enriquecer esta etapa com as mais diversas fontes possíveis;
  • Estabelecer limites: decidir sobre os alcances e limites do cenário a ser estudo (Ghemawat, 2007). A definição do escopo pode ser realizada de três formas: escopo horizontal (produtos e mercados), escopo vertical (cadeia fornecedor-comprador) e escopo geográfico (locais, regionais e nacionais). O autor, no entanto, observa que devido às complexidades dos escopos não existe uma forma perfeita de determinação de fronteiras em cenários de negócios;
  • Identificar grupos de participantes/atores: além da identificação dos principais participantes que deverão ser considerados na construção dos cenários – concorrentes, entrantes, substitutos, complementadores, compradores e fornecedores – recomenda-se atenção para alguns procedimentos:
  • Classificar os grupos de participantes de modo claro e consistente, com base na perspectiva do setor para o qual a análise está sendo realizada;
  • Identificar subgrupos, como fornecedores;
  • Prospectar novos participantes, não se limitando a seguir a tendência de centrar-se somente nos existentes.
  • Compreender o poder da negociação do grupo: após a realização dos passos anteriores, deve-se compreender o poder de negociação do grupo. Essa análise é direcionada pela ideia de que o exame estrutural pode ajudar na identificação de participantes que irão competir fortemente para conquistar fatia de mercado.
  • Pensar dinamicamente: deve-se tentar entender o negócio a partir da perspectiva do futuro, de como deverá ser e não como foi no passado ou é atualmente. O pensamento dinâmico sobre como o cenário de negócios mudará ao longo do tempo mostra-se de grande utilidade e também desastroso ao antecipar mudanças de forma equivocada (Ghemawat, 2007).  Enfatiza-se a necessidade de se distinguir dinâmicas de curto e longo prazo. A figura 3 exemplifica algumas das mudanças que podem afetar mais de um conjunto de relações e refletir ciclos de longo prazo.
  • Adaptar e moldar o modelo de cenário de negócios: após mapeado as delimitações do setor e identificado as relações entre os grupos de participantes, os administradores devem utilizar esse conhecimento para ações estratégicas. Existem diversas possibilidades de usos para a análise de cenário, incluindo-se (Ghemawat, 2007):
  • Antecipar desempenhos de longo prazo;
  • Identificar grupos de participantes que devem ser repelidos para obtenção de bom desempenho;
  • Testar decisões para entrada/saída ou investimento em algum setor;
  • Avaliar os impactos de uma mudança significativa no cenário de negócios e adaptar-se à mesma;
  • Identificar formas de adaptar o cenário de negócios.

O principal objetivo de se fazer o exercício de mapeamento de cenários é o de sugerir formas através das quais as empresas podem se adaptar e moldar os cenários nos quais estão inseridas (Ghemawat, 2007).

Figura 3: Dinâmica Comum de Longo Prazo.

Fonte: Adaptado de Ghemawat, 2007, p.53

4.4 Schwartz

Para o autor o cenário é uma base para conversões estratégicas que levam à aprendizagem organizacional constante com relação a decisões-chaves e prioridades. Deve-se escolher de três a cinco futuros mais representativos e fazer com que a organização reflita sobre os mesmos (Schwartz, 2000). O objetivo da criação de cenários não é uma fotografia precisa do amanhã, mas fornecer subsídios para tomar decisões estratégicas mais acertadas e abrangentes.

A metodologia proposta por Schwartz para elaboração de cenários é composta por oito etapas (1996):

  1. Identificação da questão central: define-se a questão estratégica que ocasionou a construção de cenários alternativos.
  2. Forças chave no ambiente local: deve-se identificar e listar as principais forças do ambiente local, que influenciam no sucesso ou fracasso da questão central.
  3. Forças Motrizes no macroambiente: devem-se identificar as forças motrizes do macroambiente que influenciam na evolução da questão central. Essa é a etapa mais intensa do processo de construção de cenários, fazendo-se necessário realizar pesquisas que abranjam mercados, novas tecnologias, fatores políticos, forças econômicas, entre outras.
  4. Ranquear por importância e incerteza: ranquear as forças motrizes e fatores-chave de acordo com dois critérios: o grau de importância para o sucesso da questão central e o grau de incerteza que permeia esses fatores e tendências. O objetivo é identificar os dois ou três fatores ou tendências que se mostram mais importantes e mais incertos.   
  5. Seleção das lógicas dos cenários: após listar por importância e incerteza os fatores-chave e as forças motrizes, passa-se a etapa da seleção das lógicas dos cenários. Etapa esta parte da análise do comportamento das variáveis ranqueadas, posicionando-as nos eixos ao longo dos quais os cenários serão desenhados. A determinação dos eixos é a etapa principal do processo de construção de cenário. O ideal é terminar o processo com apenas alguns cenários, cujas diferenças ocasionaram diferentes decisões a serem tomadas pelos estrategistas.
  6. Descrição dos cenários: neste momento detalham-se as lógicas de cenários previamente definidos. Para tanto, deve-se revisar a lista de fatores e tendências principais (etapa 2 e 3). Segundo o autor os cenários devem ser explicados de forma narrativa e apresentando detalhadamente a evolução durante o horizonte preestabelecido de tempo.
  7. Implicações: após a descrição dos cenários em detalhes, faz-se necessário voltar à questão principal, para então, verificar, em cada cenário, as possíveis implicações de cada decisão, as oportunidades existentes bem como as vulnerabilidades da organização. Desse modo, deve-se imaginar qual impacto teria uma decisão em todos os cenários descritos e se a estratégia poderia ser adaptada caso o cenário desejado não acontecesse.
  8. Seleção de indicadores e sinalizadores principais: selecionar indicadores e sinalizadores que possibilitem um monitoramento contínuo. Ao escolher tais indicadores de forma cuidadosa a organização poderá obter um salto competitivo e se apropriar de forma correta desse monitoramento, tendo mais informações de como o futuro poderá afetar a estratégia organizacional e as decisões na indústria. Pondendo se posicionar da melhor forma frente ao mercado.

4.5 Shoemaker

Segundo Schoemaker (1995), entre as diversas ferramentas que um gestor pode usar para o planejamento estratégico, a que possui maior capacidade de cobrir as possibilidades em detalhes minuciosos é a de planejamento de cenários, devendo ocorrer em dez etapas:

1- Definir o escopo e o período da análise: definição o escopo e horizonte de tempo para a análise. O horizonte de tempo depende de vários fatores, como ciclo de vida de produto, mudanças tecnológicas, eleições políticas e horizonte de planejamento da concorrência;

2 - Identificar os maiores principais stakeholders: papéis, interesses e posições de poder;

3- Identificar as tendências básicas: principais tendências ambientais e se as mesmas exercerão influência positiva, negativa ou incerta nas estratégias da organização;

4 - Identificar as incertezas chave: eventos e resultados incertos e se eles poderão afetar as questões com as quais a empresa está preocupada;

5 - Construir cenários iniciais: identificando tendências e incertezas;

6 - Verificar consistência e plausibilidade: análise da consistência interna alinhada às tendências e ao resultado das combinações e as reações dos stakeholders;

7 - Desenvolver cenários de aprendizagem;

8 - Identificar necessidades de pesquisa: verificar se há a necessidade de mais pesquisas para fortalecer o entendimento de incertezas e tendências;

9 - Desenvolver modelos quantitativos: a partir de pesquisas adicionais é possível reexaminar a consistência interna dos cenários e avaliar se certas interações podem ser formalizadas via modelos quantitativos;

10 - Evoluir para cenários de decisão: faz-se necessário convergir às direções de cenários que serão eventualmente utilizados para testar estratégias e gerar novas ideias. Caso o cenário realmente seja o definido, está pronto. Caso contrário, devem-se repetir os passos anteriores.

Para Schoemaker (1995) a utilização dos cenários é benéfica em situações que envolvam condições que apresentem: um alto grau de incerteza com relação à capacidade de predizer o futuro ou corrigir possíveis rumos; em que o histórico seja marcado por surpresas desagradáveis e onerosas; pensamento estratégico de baixa qualidade; mudanças significativas no contexto, já ocorridas ou prestes a ocorrer; necessidade de uma nova perspectiva e linguagem comuns, sem perder de vista a diversidade; fortes diferenças de opinião, e competidores utilizando de planejamento de cenário.

Para entender se os cenários estão adequados o autor pondera que deve-se verificar se  os cenários estão conectados diretamente com os mapas mentais e preocupações dos seus usuários. Além disso, os cenários devem ser internamente consistentes para serem efetivos, devendo descrever genericamente diferentes futuros em vez de variações em um tema, e, por fim, cada cenário idealmente deverá descrever um equilíbrio ou um estado no qual o sistema pode existir por algum tempo determinado, ao contrário de ser altamente transitório (Schoemaker, 1995).

5. Considerações sobre os métodos

Mediante análise da Tabela 1 verifica-se que todos os modelos são semelhantes mas também possuem aspectos complementares. Pode-se citar que a compreensão do poder de negociação em nível de grupo e o pensamento dinâmico proposta por Ghemawat (2007) são de extrema importância para o planejamento de cenário. Destaca-se, também, a hierarquização dos fatores chave e das forças motrizes por importância e incerteza e a seleção dos principais indicadores e sinalizadores são apresentados por Schwartz como fases importantes do processo. A hierarquização de atores e variáveis de cenários apoiados por software, sugerido por Godet, de uma forma geral difere dos outros métodos que sugerem matrizes a serem preenchidas por especialistas sem suporte matemático. A visão de Porter (aplicada também por Ghemawat) em delimitar a análise de cenários mediante a análise estrutural do setor (via cinco forças competitivas) auxilia na definição de objetivos e do escopo, porém pode limitar visões criativas sobre os problemas estudados.

Tabela 1 - Métodos e fases de Construção de Cenários

Fases

Schoemaker (1995)

Ghemawat (2007)

Godet (2008)

Schwartz (1988)

Porter (1996)

1. Coleta de informações iniciais e definição de escopo

Definição do

escopo e o

período de análise

Coletar

informações

Delimitação do sistema e do ambiente

Identificação da questão principal

Propósito do estudo

 

Estabelecer limites – definição setorial

Análise estrutural do sistema e do ambiente (construção da base analítica e histórica)

 

Estudo histórico e da situação atual

2. Identificação dos principais elementos dos cenários

Identificar os maiores stakeholders

Identificar grupos de participantes / atores

Identificação e análise de variáveis e atores

Identificação das principais forças do ambiente local (fatores-chave)

 

3. Principais forças motrizes e variáveis chave

Identificar as tendências básicas

 

 

Identificação das forças motrizes (macroambiente)

Identificação das incertezas críticas e descontinuidades

Identificar incertezas chave

 

 

 

 

4. Estabelecer condições futuras, testes e ajustes

 

Análise estrutural: Compreender o poder da negociação em nível de grupo

Seleção dos condicionantes do futuro

Hierarquizar os fatores chave e as forças motrizes, por importância e incerteza

Comportamento futuro das variáveis

 

 

Exploração das possíveis evoluções

Seleção das lógicas dos cenários

Escolha das variáveis de cenário e definição das configurações

5. Construção de Cenários

 

 

 

Construir cenários iniciais

Pensar dinamicamente

Elaboração dos cenários

Descrição dos cenários

Construção dos cenários

   

Geração de cenário de referência

   

6. Análise de implicações, testes de cenários e elaboração dos cenários alternativos

Verificar consistência e plausibilidade

Pensar dinamicamente

Testes de consistência, ajuste e disseminação

Análise das implicações e opções

Análise dos cenários sob as 5 forças e a concorrência

Desenvolver cenários de aprendizagem

 

 

 

 

Identificar necessidades de pesquisa

 

 

 

 

Desenvolver modelos quantitativos

 

 

 

 

7. Integração com a estratégia

Evoluir para cenários de decisão

Adaptar e moldar o modelo de cenário de negócios

Opções estratégicas e planos sobre monitoração estratégica

Seleção dos principais indicadores e sinalizadores

Elaboração das estratégias competitivas

Fonte: Elaborada pelos autores 

De uma forma geral, todas as metodologias podem ser agrupadas em grandes fases (ou conjunto de etapas, dependendo do autor), que denotam as semelhanças entre os métodos, ou seja:

  • A primeira fase diz respeito aos passos iniciais de um estudo de cenários, compreendendo a coleta de informações iniciais e, principalmente, estabelecimento do escopo do estudo, onde é importante a definição  do ambiente geográfico a ser estudado, do período futuro a ser projetado, do contexto inserido etc.;
  •  A segunda fase, conforme resumida por Schwartz (1988), consiste em identificar os principais elementos que irão interagir na visão de futuro, compreendendo as variáveis de cenários e os atores e stakeholders envolvidos com o cenário de uma forma geral;
  •   A terceira fase identifica as principais forças motrizes que influenciarão o futuro e os cenários de um modo geral e define as variáveis chave da construção dos cenários, o que permite contemplar suas possibilidades de estados futuros;
  • A quarta fase corresponde aos primeiros testes de condições futuras das variáveis chave e rascunho das possíveis visões de futuro;
  •  A quinta fase descreve um cenário inicial (ou de referência) com base nos estados futuro da fase anterior;
  • A sexta fase diz respeito às teses e verificações de plausibilidade, consistência e lógicas das estruturas (alguns modelos prescrevem análises de setor). Nesta etapa também são construídos os cenários alternativos;
  •  A sétima fase discute a implicação dos cenários construídos em face das estratégias corporativas da organização, onde opções de futuro são analisadas e são criados indicadores para possibilitar a monitoramento, de modo a inserir a discussão dos cenários na gestão estratégica da organização.

Uma forma de estruturar as fases (etapas) de construção de cenários contemplando os aspectos mais importantes dos métodos estudados é sugerida a seguir:

  1. Definir o problema a ser estudado e determinar o escopo e período de análise do futuro;
  2. Coletar Informações de modo a possibilitar a construção do histórico e da situação atual;
  3. Identificar grupos participantes, interessados e influenciadores dos cenários;
  4.  Análise estrutural do ambiente que possibilite a definição e hierarquização dos fatores chave e forças motrizes, com base em importância e incerteza:
  • Identificar tendências básicas;
  • Identificar incertezas chave;
  1. Estabelecer os comportamentos futuro da estrutura:
  • Selecionar condicionantes do futuro;
  • Comportamento futuro das variáveis;
  • Pensamento dinâmico;
  • Compreender o poder da negociação dos interessados.
  1. Estruturar a lógica do cenário de referência;
  2. Construir cenários iniciais e gerar cenários alternativos;
  3. Verificar consistência e plausibilidade, realizar teses de consistência e promover ajuste de disseminação;
  4. Identificar necessidades de pesquisa;
  5. Desenvolver modelos quantitativos;
  6. Selecionar principais indicadores e sinalizadores, além de analisar implicações e opções;
  7. Evoluir para cenários de decisão e integrar com a estratégia corporativa.

6. Considerações finais

A análise de futuro é componente importante de um processo de gestão estratégica dinâmico. A discussão de cenários futuros pode aprimorar a tomada de decisão organizacional e alinhar a estratégia presente de uma organização segundo as opções vislumbradas. A possibilidade de se trabalhar com visões de futuro e de delimitar as incertezas prepara a empresa hoje para eventos futuros sem análises e trabalhos demasiadamente caros e longos.

Diversos métodos de elaboração de cenários são aplicados e discutidos. Neste artigo cinco dos métodos e autores mais discutidos neste campo são apreciados. Todas as metodologias possuem grandes fases críticas semelhantes, com especial ênfase para cada uma, conforme o autor selecionado.  Enquanto Godet (2008) baseia seu método em análises quantitativas via software, Shoemaker (1995) considera análises qualitativas via matrizes quadradas e Schwartz (1988) recomenda a hierarquização dos elementos por importância e incerteza. Já Porter (1996) e Ghemawat (2007) sustentam e delimitam seus métodos pela análise do setor onde a organização está inserida.

Entende-se que todas as metodologias estudadas trazem sua contribuição para a administração estratégica e qualquer método aplicado proporcionará o apoio necessário à organização que o aplicou. Conclui-se que não cabe ao estudo apontar qual o melhor método, cada um possui características que os diferem e que servem como opções para melhor se ajustar ao perfil da organização e/ou equipe responsável pela aplicação dos conceitos de estudos de cenários futuros.

Referências bibliográficas

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1. Núcleo de Pesquisa em Gestão Estratégica da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP). Email: m.sutter@usp.br
2. Profuturo. Email: danielstima@gmail.com
3. Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP) e Núcleo de Pesquisa em Gestão Estratégica. Email: polo@usp.br
4. Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP) e Fundação Instituto de Administração. Email: jtwright@usp.br


Vol. 33 (8) 2012
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