Espacios. Vol. 33 (3) 2012. Pág. 26


Análise dos custos da qualidade: um estudo de caso em uma empresa alimentícia

Analysis of quality cost: a case study in a food processing company

Ciro André de Lima Campão 1, Leoni Pentiado Godoy 2, Daniel Benitti Lorenzett 3 y Taís Pentiado Godoy 4

Recibido: 01-08-2011 - Aprobado 25-11-2011


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RESUMO
O aspecto custo é um fator de grande relevância na tomada de decisões gerenciais. Ciente disso, este trabalho objetiva identificar, quantificar, e propor indicadores embasados em um sistema de custos relacionados à qualidade para uma empresa de laticínios localizada na região Sul do Brasil. Com relação ao método, foi realizado um estudo de caso, com o emprego das técnicas de observação, pesquisa documental, e conversas informais, e para análise dos dados foram empregadas ferramentas da qualidade. Os resultados demonstram que, o custo da não qualidade é perda de lucratividade e está diretamente relacionado ao desperdício. Uma vez identificados os problemas, foram aplicadas ferramentas da gestão de qualidade para propor ações de melhoria, objetivando aumentar a produtividade e reduzir custos, melhorando a racionalização do processo de entrega dos produtos da empresa estudada.
Palavras-chave: redução de desperdício; otimização da distribuição; laticínio.
  ABSTRACT
The cost aspect is a highly relevant factor in making management decisions. Aware of this, this paper aims to identify, quantify, and propose indicators grounded in a system of quality related costs for a dairy company located in Southern Brazil. Regarding the method, we performed a case study, employing the techniques of observation, documentary research, and informal conversations, and for analysis of data were employed quality tools. The results show that the cost of absence of quality is a loss of profitability and is directly related to waste. Once problems identified, management tools were applied to propose quality improvement actions, aiming at increasing productivity and reducing costs, improving streamlining the delivery of products the company studied.
Keywords: waste reduction, optimization of distribution; dairy.

1. Introdução

A busca pela qualidade movimenta os diversos segmentos da economia mundial, motivada, sobretudo pela globalização econômica e alta competitividade dos mercados. A acirrada competição impõe que as empresas estejam comprometidas com a melhoria contínua de seus produtos e processos, com redução de gastos e eliminação dos desperdícios. Para a eliminação de deficiências, deve-se reduzir a frequência de erros, o desperdício e a insatisfação do cliente. À medida que os desperdícios vão sendo diminuídos, novos padrões de desempenho são alcançados. A eliminação de todas as formas de desperdício leva a empresa à melhoria da qualidade e produtividade, auxiliando na redução de custos e tornando-a mais competitiva. Os desperdícios são considerados custos resultantes da má qualidade dos processos produtivos, ou seja, resultam das falhas internas e externas e são alvo de ataque das empresas para alavancar a lucratividade de suas operações.

No caso específico da indústria de laticínios, a atividade de distribuição e vendas é desafiadora devido à natureza perecível dos produtos e a remuneração dos distribuidores pela quantidade vendida.  Há conflito de interesses: de um lado o distribuidor se sente encorajado a fazer grandes pedidos para obter maiores comissões de vendas e encher as gôndolas dos supermercados; do outro, os empresários querem evitar perdas em consequência de pedidos superdimensionados, que não são integralmente adquiridos pelos consumidores finais, gerando retorno dos produtos aos laticínios após perderem sua validade, representando custos de desperdícios.

A gestão da qualidade dos processos de distribuição dos produtos lácteos pode reduzir tais perdas e a utilização de medidas de controle de custos da qualidade torna-se ferramenta importante para melhorar a eficiência da cadeia produtiva. Nesse sentido, o presente trabalho busca responder a seguinte questão: existem mecanismos para transformar os custos gerados por produtos não adequados à comercialização, armazenados nos supermercados, em retorno financeiro e operacional para a empresa de laticínios?

A perda de qualidade no processo de distribuição pode ser considerada um custo oculto que, caso possa ser quantificado, pode servir de insumo para o redimensionamento dos pedidos e melhoria dos processos de distribuição dos laticínios, reduzindo os desperdícios.  Por considerar o aspecto custo como fator de grande relevância na tomada de decisões gerenciais com vistas à competitividade mercadológica, esse trabalho busca identificar, quantificar, analisar e propor indicadores embasados em um sistema de custos relacionados à qualidade.

2. Referencial teórico

2.1 Gestão da qualidade

Conceituar qualidade, de forma abrangente é importante para se obter compreensão de como os conceitos são usados e quais são considerados mais adequados a cada realidade. Segundo Robles Junior (2003), os conceitos da qualidade podem ser divididos em períodos, que nortearam os esforços da manutenção desta ao longo do tempo. Para Hansen e Mowen (2001), produto ou serviço de qualidade é aquele que satisfaz ou excede as expectativas do cliente com relação às oito dimensões: desempenho, estética, facilidade de reparação, características, confiabilidade, durabilidade, qualidade de conformidade e ajustamento para o uso. Os autores alertam que dando ênfase na qualidade aumenta a lucratividade da empresa de duas maneiras: ao aumentar a demanda dos clientes e ao reduzir os custos de fornecer bens e serviços.

De maneira geral, a gestão da qualidade é definida de forma diferente pelos diversos autores. Os conceitos existentes definem a gestão da qualidade como uma filosofia, um conjunto de métodos, abrangendo ações para produzir, dirigir e controlar a qualidade, incluindo a determinação de políticas e objetivos voltados para a qualidade, utilizando indicadores e metas para a melhoria contínua em processos, produtos e serviços (CHAVES, 2010). A avaliação da qualidade depende mais dos valores atribuídos pelo consumidor do que das características dos produtos ou serviços oferecidos. Assim, quando se avalia a qualidade deve-se adotar como referencia o cliente e não o produto ou serviço (HECKERT e SILVA, 2008). Um sistema é um conjunto organizado de regras e ações, combinado por várias partes denominadas subsistemas, que trabalham de maneira harmônica para atender a um objetivo comum para o qual foi originado (PALADINI, 2004; MARANHÃO, 2006).

Nesse contexto, a qualidade percebida é o elemento central a ser perseguido pelas entidades, pois ele afeta determinantemente a satisfação dos clientes (TINOCO, 2006; JIANG e WANG, 2006; BRANCO, RIBEIRO e TINOCO, 2010). Todo processo que não agrega qualidade causa insatisfação aos clientes e, por conseguinte, torna-se uma das principais causas de perda do negócio. Logo, sem produtividade os custos encarecem, os prazos de atendimento são prejudicados, dando origem a preços e/ou prazos que não atraem o consumidor, contribuindo também para perda de negócios (KILIC e OKUMUS, 2005).

2.2 Ferramentas da qualidade

As ferramentas de qualidade são ferramentas empregadas utilizadas para definir, mensurar e analisar, propondo soluções para os problemas que interferem no desempenho dos processos produtivos de produtos e serviços (MALIK e SCHIESARI, 1998; PERTENCE e MELLEIRO, 2010). Essas ferramentas fazem parte de um grupo de métodos estatísticos elementares usados para a melhoria da qualidade de produtos, serviços e processos. Essas ferramentas podem ser entendidas como sendo sinônimo de instrumentos ou a técnica utilizada para se atingir determinada meta. O diagrama de Pareto pode ser usado para: identificar o problema; detectar as causas que atuam em um defeito; encontrar problemas (erro, falhas, gastos, retrabalhos) e causas (operador, equipamento, matéria-prima, entre outros); melhorar a visualização e priorização da ação; confirmar os resultados de melhoria; verificar a situação antes e depois do problema com às mudanças efetuadas no processo; detalhar as causas maiores em partes específicas, eliminando a causa; estratificar a ação (ROSSATO, 1996; BAMFORD e GREATBANKS, 2005).

Segundo Gomes (2006), o diagrama de causa e efeito é também conhecido como diagrama de Ishikawa ou espinha-de-peixe. Kaoru Ishikawa foi um dos pioneiros nas atividades de controle de qualidade no Japão. O diagrama de causa e efeito é um importante instrumento a ser utilizado para descobrir os efeitos indesejados e aplicar as correções necessárias. É uma ferramenta simples, possui um efeito visual de fácil assimilação, e ajuda a sistematizar e separar perfeitamente as causas dos efeitos, onde a seta principal aponta para o efeito e as setas das ramificações representam os meios para alcançar o resultado almejado. Quando se utiliza o diagrama de causa e efeito no planejamento, deve-se atentar para o resultado desejado. Essa ferramenta identifica as causas possíveis, mas somente os dados indicarão as causas reais (COLETTI, BONDUELLE e IWAKIRI, 2010).

Conforme Grimaldi (1994), a técnica de GUT foi desenvolvida com o objetivo de orientar decisões mais complexas, isto é, decisões que envolvem muitas questões. É um sistema usado quando desejamos priorizar os itens obtidos através do brainstorming, especialmente se forem vários e relacionados entre si. O brainstorming,também conhecido por tempestade cerebral é uma ferramenta que ajuda na produção de idéias para resolução de problemas (COLETTI, BONDUELLE e IWAKIRI, 2010). Cada participante atribuirá às ideias apresentadas um peso que corresponde às prioridades por ele sentidas. São parâmetros adotados para se estabelecer prioridades na eliminação de problemas, principalmente se forem vários e relacionados entre si.

Segundo Meireles (2001), o 5W2Hs é um tipo de lista de verificação utilizada para informar e assegurar o cumprimento de um conjunto de planos de ação, diagnosticar um problema e delinear soluções. Essa técnica incide em equacionar o problema, sendo descrito, da forma como é sentido naquele momento particular: como afeta o processo e as pessoas. Assim que foram essa ferramentas que se mostraram eficientes no caso da empresa de laticínios, fácil de utilizar e resultado rápido em relação aos efeitos indesejados.

2.3 Custos da qualidade

Para mensuração da qualidade torna-se relevante quando essa passa a ser associada à produtividade e à lucratividade. Robles Jr. (2003) menciona que, para Deming a apuração dos custos da qualidade é trabalho em vão, em decorrência de considerá-la autofinanciável, mas que, Juran e Crosby defendem o desenvolvimento e a implantação de sistema de mensuração do custo da qualidade, mesmo que estes se limitem à apuração dos custos relacionados com o Sistema de Controle de Qualidade. Os custos da qualidade oferecem suporte ao gerenciamento de custos em conjunto com programas de qualidade ou de melhoria contínua, através de informações que possibilitam gerenciar os programas, de modo a priorizar a implementação de programas nas áreas mais críticas em função dos custos. Para um melhor entendimento do que vem a ser custos da qualidade é primordial conhecer outros dois conceitos: o de qualidade e o de custo. Isso é relevante, tendo em vista que a expressão custos da qualidade é derivada e composta, necessitando do conhecimento inicial das duas outras terminologias básicas (FEIGENBAUM, 1994; MOORI e SILVA, 2003).

 Poucos problemas ameaçam mais as empresas do que os custos da falta de qualidade, por isso elas devem ter um controle financeiro sobre esses custos com o mesmo rigor com que controlam as compras de materiais, pois tudo aquilo que não se mede não se pode controlar e, por conseguinte, não se pode melhorar. Até mesmo empresas conhecidas por sua excelência, tanto em produtos como em serviços, podem perder dinheiro porque deixam de usar oportunidades importantes para melhorar seus custos, principalmente os custos indiretos (OSTRENGA, 1993; HARRINGTON, 1992; MOORI e SILVA, 2003).

Os custos são classificados quanto à facilidade de atribuição em: custos diretos e indiretos. Os custos também são classificados quanto à variabilidade: em custos fixos e variáveis (HORNGREN, DATAR e FOSTER, 2000; KLIEMANN NETO, 2003). Para Robles Jr. (2003), os custos da qualidade podem ser agrupados em categorias que se inter-relacionam. Normalmente, a aplicação de recursos em uma categoria acarreta variações no montante de custos em outra. Segundo o autor, os custos do controle são medidos sob duas abordagens distintas: custos de prevenção e custos de avaliação. Para os custos provenientes de falhas no controle são igualmente medidos sob dois aspectos: custos de falha interna e custos de falha externa.

O propósito das técnicas de implementação de um sistema de custos da qualidade é prover aos gerentes ferramentas que facilitem as atividades de melhoria da qualidade. As informações nas diversas categorias de custos da qualidade são usadas como pontos de oportunidades e ameaças para o sistema da qualidade. Times de melhorias usam essas informações para descrever os benefícios monetários das mudanças propostas (SUPERVILLE e GUPTA, 2001). Os modelos de Retorno sobre o Investimento (ROI), e outras análises financeiras, são construídos diretamente dos dados obtidos com o sistema de custos da qualidade.

Os estudos sobre custos da qualidade não mencionam os desperdícios nas categorias de custos da qualidade. Porém, seu conceito e as definições de custos da qualidade citados têm afinidade. Observa-se que, o desperdício de matéria-prima é aquele em que as mesmas foram despendidas de forma anormal ou acima do estritamente necessário à confecção do produto. Destaca-se que muitas vezes quando as empresas enfrentam problema de produtividade e de custos elevados, o problema pode estar associado aos desperdícios. (BORNIA, 1995; CHAPOVAL NETO, 2008). Esses custos poderiam ser eliminados se o produto fosse executado corretamente na primeira vez. Eliminando ou reduzindo esses desperdícios a empresa teria oportunidade de reduzir custos, aumentar a lucratividade e tornar-se mais competitiva. No entanto, as empresas precisam maximizar os seus recursos para melhorar seu desempenho. Mas, tais custos da qualidade não costumam ser devidamente mensurados.

Para uma organização competir no mercado, recomenda-se criar mecanismos para analisar se realmente está sendo competitiva e verificar se está aperfeiçoando sua forma de atuação (MUSCAT e FLEURY, 1993). É recomendável definir, medir e monitorar indicadores para melhorar seu desempenho competitivo. A escolha de quais indicadores a medir e monitorar deve estar vinculada às decisões da estratégia competitiva da organização.

3. Metodologia da pesquisa

Quanto à abordagem o presente estudo foi considerado qualitativo e quantitativo, pois segundo Gil (2009), pesquisas quantitativas ressaltam objetividade, existência e uso de mecanismos de controle durante a pesquisa e apuram opiniões e atitudes explícitas através de instrumentos padronizados para análise do problema, e as pesquisas qualitativas interpretam os fenômenos através da observação ou percepção sensorial do pesquisador. Assim que, a pesquisa teve a intenção de verificar as possibilidades de transformação dos custos gerados pela devolução de produtos à empresa em benefícios operacionais e financeiros, utilizando indicadores para melhoria contínua do processo de vendas e combate ao desperdício.

No que se refere aos objetivos a presente pesquisa classificou-se como descritiva e explicativa. A pesquisa explicativa é para Ponte et al. (2007), aquela onde se pretende explicar o porquê das coisas, aprofundando o conhecimento da realidade. Já a pesquisa descritiva, segundo Lorenzett e Rossato (2010, p. 118) consiste na “observação das situações e relações que ocorrem com o objeto estudado, sem que para isso haja interação do pesquisador com o objeto alvo de estudo.” Esses procedimentos foram utilizados em função do objetivo principal desta pesquisa que foram identificar os fatores que contribuem para a ocorrência dos fenômenos indesejáveis nos processos de distribuição do produto leite pasteurizado, e descrever as características da empresa de laticínios, respectivamente. Para o desenvolvimento do estudo, utilizou-se o procedimento técnico de estudo de caso, com a finalidade de executar uma análise profunda e exaustiva de uma ou poucas questões, visando permitir o seu conhecimento amplo e detalhado (MARCONI e LAKATOS, 2009). O estudo de caso foi realizado em uma empresa de laticínios, localizada na cidade de Caçapava do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil.

Para entendimento do funcionamento das atividades, empregou-se o procedimento de observação, que permitiu a realização do mapeamento do processo na indústria estudada. Segundo Marconi e Lakatos (2009), esse procedimento possibilita a coleta de dados por meio do emprego da percepção sensorial do observador, constituindo-se em um procedimento empírico sensorial. Esse procedimento permitiu, ainda, o acompanhamento dos vendedores da indústria durante a entrega dos produtos nos pontos (praças de atuação) comerciais da região para verificação das devoluções de produtos, oportunizando a aplicação das ferramentas de gerenciamento da qualidade, com o objetivo de reduzir os prejuízos gerados por tais anomalias. Em entrevista realizada a gerência, foi possível conseguir a documentação necessária para a pesquisa documental, referente aos montantes de produtos vendidos e aos volumes que são devolvidos para a organização. Os dados e documentos disponibilizados, por decisão dos gestores, foram referentes às vendas e devoluções dos anos de 2007 e 2008.

4. Resultados e discussões

4.1 Ambiente da pesquisa

O estudo de caso realizado permitiu mapear os processos da entidade estudada, como pode ser observado na Figura 1.

Figura 1 - Fluxo do processo na indústria de alimentos estudada
Fonte: Pesquisa (2010)

Esses processos definem como os procedimentos são feitos em uma empresa, isto é, como ela agrega valor aos insumos para atender satisfatoriamente seus clientes e seus objetivos organizacionais. Conhecer os detalhes do processo é muito importante quando se pretende programar melhorias. O fluxograma da Figura 1 demonstra os processos facilitando o entendimento e a visualização do papel de cada um dos envolvidos no processo do princípio ao fim. A indústria recebe diariamente, em torno de 8.000 litros de leite, oriundos de 30 propriedades rurais dos municípios de Caçapava do Sul, São Sepé e Lavras do Sul. A empresa além de pasteurizar o leite, industrializa doce de leite, queijo mussarela, creme de leite e bebida láctea. A comercialização e distribuição dos produtos são feitas através de vendedores terceirizados nas cidades de Caçapava do Sul, São Sepé, Bagé e Santa Maria.  O foco desse trabalho concentra-se no produto leite pasteurizado.

A empresa possui 08 sócios e 11 funcionários, sendo 06 trabalhadores no Setor de Indústria de laticínios, 04 no Setor Administrativo e 01 no Setor de Transporte. A idade média da equipe é de 40,27 anos e o grau de instrução está assim dividido: 27,27% possuem ensino fundamental incompleto; 18,18% possuem ensino médio incompleto; 54,55% possuem ensino médio completo. Com o objetivo de entender a organização interna da empresa estudada, seus processos e identificação dos custos relacionados à qualidade, foram solicitadas reuniões com as pessoas responsáveis pelos setores, funcionários, para buscar informações a respeito da clientela e fornecedores.

4.2 Análise do retorno de produtos para a indústria nos períodos 2007 e 2008

Através do brainstorming realizado com os funcionários da empresa estudada chegou-se ao consenso que a empresa de laticínio apresenta retorno de parte do leite embalado, oportunizando a aplicação de ferramentas de gerenciamento da qualidade, com o objetivo de reduzir os prejuízos gerados por tais anomalias. Para tanto, foi procedida à coleta dos dados dos pedidos e das vendas efetuadas, no segundo semestre de 2007 e no primeiro semestre de 2008, para verificação e registro histórico, como se observa nas tabelas 2 e 3.

Tabela 1 – Pedidos e Vendas de leite pasteurizado padronizado, no segundo semestre de 2007
Fonte: Pesquisa (2010)

Observa-se que no segundo semestre de 2007 as vendas representaram 94,25% dos pedidos solicitados e de leite não vendido foi de 5,75%. Comparando-se com o primeiro semestre de 2008, permanece o mesmo desempenho. Por outro lado, o percentual de leite não vendido ainda manteve-se em torno de 5%. O setor lácteo no Brasil é um setor que se depara com mudanças, seja devido a fatores internos, ou para se adequar a questões externas. Segundo Bánkuti, Bánkuti e Toledo (2006), cabe às empresas inseridas nesse setor buscar capacitação para enfrentar a concorrência, atender aos requisitos legais e às exigências do consumidor e sobreviver no mercado.

Tabela 2 – Pedidos e Vendas de leite pasteurizado Padronizado, no primeiro semestre de 2008
Fonte: Pesquisa (2010)

Analisando esses dados não foi possível fazer uma avaliação mais apurada do problema. Em função disto, alguns vendedores foram acompanhados, no momento da entrega do produto. Nada melhor do que presenciar na prática os resultados de qualquer ação, visualizando determinadas falhas, que corrigidas, agregam valor ao produto e retorno à empresa. Após o acompanhamento e procurando envolver a equipe na solução do problema, foi realizado um brainstorming.

Visando melhorar o aproveitamento do produto, eliminando o retorno, aplicou-se o diagrama de causa e efeito, que auxilia a pesquisa para eliminar os problemas através de suas raízes, como mostra a Figura 2. Para auxiliar na priorização das ações de melhorias, as causas relacionadas às falhas internas do retorno do leite embalado foram analisadas, utilizando o gráfico de Pareto, gerando a prioridade de correção dos desperdícios no processo de distribuição do leite. Silva (1999) afirma que, o custo do transporte do leite da fazenda à indústria pode representar de 4 a 25% do preço do leite pago ao produtor, atingindo até 40% em algumas regiões. Para fins de análise do percentual de solicitação dos pedidos por parte dos vendedores, foram elaboradas tabelas que mostrava a venda de cada vendedor e o percentual em ambos os períodos. Analisou-se após a participação das praças com relação aos pedidos solicitados além da necessidade dos clientes.  A praça 2 é a que mais contribui para o custo da má-qualidade, com o índice de 80,85% no segundo período de 2007 e com uma redução para 50,40% no primeiro semestre de 2008.

Figura 2Diagrama de Causa e Efeito, do retorno de leite em 2007/2008
Fonte: Pesquisa (2010)

Nos períodos de vésperas de fim de semana ou feriados, é normal a aquisição de volumes maiores, assim, é inevitável o carregamento de maiores quantidades e de uma taxa ainda elevada de retorno, a qual até o presente momento não foi caracterizada nenhuma solução ou forma de minimizá-la. Custo da má qualidade é o resultado oriundo do fato de uma organização não produzir corretamente seus produtos e ou serviços desde a primeira vez (JURAN, 1992). A avaliação dos custos, visando seu controle, é fator de sobrevivência de qualquer organização. Quando a má qualidade é produzida (Ramudhin, Alzaman e Bulgak, 2008), tem-se uma dupla perda: por produzir um produto que será rejeitado, ou, vendido a preço que pode ser inferior ao seu custo de produção; pelo tempo gasto no tratamento desta má qualidade, quando este tempo poderia ser aproveitado para produzir produtos de boa qualidade. A praça 2 destaca-se contribuindo com o índice de 66,05% de pedidos que não são absorvidos pelos clientes, no período de Julho de 2007 a Junho de 2008. Para um melhor entendimento, também foram analisados os fatos comuns somados os dois períodos estudados agrupados entre as praças.

Nos períodos estudados a praça 3 manteve-se praticamente com o mesmo percentual próximo de 75%.  A praça 2, no período de 2007, representava 5,48% e, em 2008 obteve um aumento significativo e passou para 12,84%. O mesmo acontecendo com a praça 4, que passou dos 5,83% para 12,12%. A praça 1 no período de 2007 era a segunda que mais contribuía para o custo da má-qualidade. E no período de 2008 a mesma não apresenta índice de problema de embalagem. Isso se deve ao fato de que a empresa realizou uma negociação com o vendedor que atua nesta região. A referida negociação regula que todo e qualquer estrago referente ao produto ficará de responsabilidade do vendedor desta praça. Como contrapartida, o vendedor teve um aumento na sua comissão de vendas, essa negociação refletiu na mudança dos índices das demais praças. O índice geral de embalagens danificadas com um percentual de 75,25%, sendo a praça 3, no período de Julho de 2007 a Junho de 2008, contribuindo para esta incidência no custo da má-qualidade.

O treinamento e conscientização dos responsáveis pelo transporte da indústria ao varejo devem ser geridos de forma a esclarecer a importância dessa etapa na qualidade do produto, bem como estimular a adoção de práticas que primem pela qualidade. A busca pela qualidade nessa etapa é muito importante devido a dois fatores principais: por se tratar de produtos elaborados (maior valor agregado - maior prejuízo financeiro) e tratar de problemas com a qualidade do produto que podem comprometer a imagem da marca no mercado. Estes não devem instigar a aquisição de produtos pelo varejo além da previsão de demanda, principalmente no caso de refrigerados. Produtos com prazo de validade vencido são de responsabilidade da indústria, que assume esse prejuízo. Acrescentando a esse fato, os vendedores devem ser conscientizados da correta utilização do caminhão refrigerado, não desligando a refrigeração (para economia de combustível) e/ou evitando a superlotação do caminhão, além de sua capacidade de refrigeração.

Quanto às trocas de leite pasteurizado padronizado, nota-se que houve um aumento significativo de retorno à empresa por problema de validade vencida, do período de janeiro a junho de 2008, em relação ao período de julho a dezembro de 2007. Fato este evidenciado na praça 3 em função desta ter uma representatividade de aproximadamente de 60%. Fazendo-se uma análise mais minuciosa, percebe-se que no período que houve uma maior incidência de vencidos, prende-se ao fato de ser época de temperaturas mais elevadas, diminuindo o consumo de leite.

O leite pasteurizado retorna a empresa por falta de planejamento e de indicadores para gerenciar os pedidos dos vendedores. O índice geral de troca do produto, com prazo de validade, com um percentual de 50,84%, sendo a praça 3 a que mais contribui para esta incidência no custo da qualidade da empresa. Os custos da indústria são compostos principalmente por matéria-prima, transporte (captação e distribuição), embalagens, produtos de limpeza e mão de obra. Visando à maior competitividade e sustentabilidade, os gestores dos laticínios devem buscar toda a redução possível de todos os custos, com ganhos de escala e, no mínimo, sem perda da qualidade. A fim de estabelecer critérios para resolução das supostas causas que levam a gravidade do problema, ou seja, o retorno do leite para a empresa por motivo de pedidos excedentes, embalagens danificadas e troca de leite por vencidos, foi utilizada a ferramenta da qualidade GUT. Com a utilização do Gráfico de Pareto priorizou-se as os problemas levantados.

4.3 Indicadores propostos

Ostrenga (1993) cita a importância da mensuração dos custos da qualidade como fonte de informação fundamental para a empresa progredir em direção às suas metas. O melhoramento contínuo exige que o sistema de indicadores de desempenho da empresa apoie suas metas, assim, os indicadores tornam-se muitas vezes mais importante do que o conhecimento das perdas. De acordo com a análise foram propostos indicadores conforme, Tabela 3, e também definidas metas mensais para serem atingidas num prazo de cinco meses, evidenciadas na Tabela 4. As metas definidas estão sendo revistas pela empresa pela segunda vez. Neste momento, estão sendo avaliados os resultados alcançados até final do ano de 2009. Desta avaliação serão definidas novas metas de redução de retorno do produto (pedidos excedentes, troca de produto por vencimento e embalagens danificadas) para o exercício seguinte.

Tabela 3 – Indicadores propostos
Fonte: Pesquisa (2010)

Depois de conhecidas as causas dos problemas, o próximo passo foi a elaboração do plano de ação para combatê-las, isto é, determinar mudanças admissíveis a curto, médio e longo prazos, com a intenção de melhorar os processos e reduzir os custos. Portanto, a melhor maneira é medir as perdas e quantificá-las em valores monetários; este é o primeiro passo para desencadear o processo.

Tabela 4 – Metas definidas
Fonte: Pesquisa (2010)

O próximo passo é fazer uma análise do processo para investigar as causas fundamentais do problema. O plano de ação para a resolução do problema deve ser sobre as causas e não sobre os efeitos. Uma vez implantadas as soluções, deve-se medi-las para verificar se foram eficazes e estabelecer um novo plano para que a causa seja definitivamente eliminada. Neste ponto, estabelecem-se novos padrões de desempenho para aquele processo.

Para auxiliar a elaboração do plano de ação, recomenda-se a utilização da ferramenta 5W2H, pois essa ferramenta evita a dispersão de idéias ao promover o direcionamento das análises e discussões para um ponto focal. Sendo útil para a verificação da ocorrência de um problema, e para elaboração de um plano de ação (COLETTI, BONDUELLE e IWAKIRI, 2010). A finalidade é delinear as ações de forma precisa, e padronizando-as, evitando divagações e direcionando-as para os responsáveis pela execução.

Os planos de ação elaborados para controlar a quantidade de pedidos solicitados pelos vendedores, assim todos os planos de ações como: reduzir o índice de troca do produto por vencidos, problema da praça 3 e reduzir o índice de embalagens danificadas na praça 2 foram elaborados planos de ação para cada caso. Com a aplicação do check-list para o plano de ação, foi plausível delinear as ações de melhoria de modo padronizado, com a identificação de questões relevantes a atuação da empresa. As definições e responsabilidades do plano de ação estão dispostas de maneira clara e objetiva, para que todos os envolvidos possam entender e programar as ações, buscando a redução dos custos totais da qualidade pela minimização dos custos da não-qualidade.

5. Conclusão

As empresas de laticínios devido à grande concorrência buscam alternativas para melhorar a sua gestão organizacional, melhorando seus processos, reduzindo desperdícios e aumentando a satisfação dos colaboradores e dos clientes para alcançar maior estabilidade nos negócios. O objetivo proposto nessa pesquisa foi alcançado por meio da aplicação das ferramentas básicas da qualidade no processo de distribuição do leite pasteurizado de uma empresa de laticínios de pequeno porte. As ferramentas utilizadas possibilitaram a identificação e analise das causas do grande desperdício que ocorre na distribuição desse produto. As falhas no processo de distribuição do leite foram detectadas com o auxílio, da ferramenta Brainstorming entre vendedores e colaboradores, diagrama de causa e efeito e análise das tabelas específicas da representação das perdas de leite entregue nas praças de consumo.

A pesquisa contribui para o entendimento e disseminação da utilidade das ferramentas básicas da qualidade para redução de desperdícios. Esse trabalho objetivou o estudo da redução dos custosde operações de distribuição do produto estudado. Para tanto, é preciso treinar os participantes para evitarem desperdícios no processo da entrega e propor melhorias para eliminar esses desperdícios, objetivando aumentar a produtividade, reduzir os custos, racionalizando o processo de entrega de leite pasteurizado. Nesse sentido, a utilização de indicadores também pode auxiliar na redução do desperdício. Logo, foram desenvolvidos indicadores para os pedidos excedentes, para troca de produto por vencimento e para embalagem danificada. É evidente que o objetivo primordial desses indicadores deve ser a eliminação de todo e qualquer desperdício, principalmente, quando há desperdícios do tipo embalagem furada e danificada, que não pode ser reaproveitado, o produto é totalmente perdido.

Pela análise dos resultados, e com o intuito de responder o objetivo principal, destaca-se que, o estudo dos custos da não-qualidade, que foi entendido como benéfico pela equipe e pela direção com o retorno financeiro para a empresa, portanto, faz-se necessário uma atenção especial ao controle dos custos, para atingir as metas da empresa. Nesse caso, tanto na quantidade de litros de leite pasteurizado pedido em excesso pelos vendedores, quanto na falta de treinamento deles para manusear e transportar o produto sem que a embalagem seja danificada.

O trabalho possibilitou o entendimento de que uma redução contínua das perdas levará a empresa a baixar os custos de produção, propiciando o aperfeiçoamento geral dos processos e, consequentemente, haverá melhoria dos produtos. Espera-se que os resultados da presente pesquisa auxiliem pesquisas futuras para que as empresas de pequeno porte tenham cada vez mais ferramentas para que possam ampliar seus conhecimentos e potencialidades, eliminar suas falhas e desperdícios e, cada vez mais possa criar vantagens competitivas para enfrentarem o mercado competitivo, aproveitando melhor suas oportunidades.

Referências

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1.URCAMP, Brasil, email: ccampao@farrapo.com.br
2. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Brasil, email: leoni_godoy@yahoo.com.br
3. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Brasil, email: dlorenzett@gmail.com
4. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Brasil, email: taispentiado@yahoo.com.br


Vol. 33 (3) 2012
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